Contribuição à Crítica da Historiografia Revisionista | Carlos Zacarias de Sena Júnior, Demian Bezerra de Melo e Gilberto Grassi Calil

Dando continuidade ao projeto iniciado em 2014 com a publicação de A miséria da historiografia, organizado por Demian Bezerra de Melo, (MELO, 2014), o livro ora resenhado objetiva escrutinar as implicações sociais da historiografia revisionista, especialmente, a brasileira. A hipótese geral que atravessa todos os artigos reunidos no livro vincula-se à posição de que os desdobramentos teóricos e historiográficos do revisionismo possuem relações diretas com as disputas políticas cotidianas.

Valendo-nos de um rápido exemplo sobre essas relações, o então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, em ocasião do evento que tratava dos “30 anos da Constituição Federal de 1988”, na Faculdade de Direito da USP, e após a polêmica nomeação do general da reserva Fernando Azevedo e Silva para assessorá-lo na presidência do STF, alegou que os desdobramentos político-militares de 1964 não são entendidos por ele como “golpe” ou “revolução”, mas como “movimento de 1964”, buscando responsabilizar tanto o suposto “radicalismo” de esquerda como o de direita como os verdadeiros motivadores da ação militar daquele período. Pata tais afirmações, dizia estar embasado na obra do historiador Daniel Aarão Reis Filho (TERRA, 2018), cujas produções mais emblemáticas e polêmicas estão circunscritas na temática revisionista. Muito embora o referido historiador da Universidade Federal Fluminense (UFF) tenha negado de forma veemente as relações entre a sua produção e a fala de Toffoli, o conjunto de sua obra retém significados que possibilitam interpretações análogas. Leia Mais

Ditadura/ anistia e transição política no Brasil (1964-1979) | Renato Lemos

Em tempos em que proliferam disputas narrativas e versões negacionistas a respeito da ditadura militar brasileira, a publicação do livro Ditadura, anistia e transição política no Brasil (1964-1979), do historiador Renato Lemos, chega em boa hora. Enquanto parte da população brasileira e políticos têm feito apologia do regime ditatorial, o autor expõe no livro o projeto daqueles que não agem assim por desconhecimento, mas sim por comprometimento com a face mais brutal da dominação burguesa no Brasil, como diz o professor Marcelo Badaró (UFF) no prefácio do livro.

Renato Lemos é professor titular de História do Brasil na Universidade Federal do Rio de Janeiro e coordena o Laboratório de Estudos sobre os Militares na Política (LEMP/UFRJ)1. O historiador marxista defende o uso da nomenclatura “ditadura empresarial-militar” para designar o regime de 1964-1985, no lugar de “ditadura militar”, por entender que esta generaliza os militares, ao mesmo tempo em que oculta os vínculos de classe das lideranças civis beneficiadas pelo golpe. Leia Mais

Marx, Espinosa e Darwin: pensadores da imanência | Maurício Vieira Martins

Ser imortal é insignificante; exceto o homem, todas as criaturas o são, pois ignoram a morte … Israelitas, cristãos e muçulmanos professam a imortalidade, mas a veneração que tributam ao primeiro século mostra que somente creem nele, uma vez que destinam todos os demais, em número infinito, a premiá-lo ou castigá-lo ( Borges, 2008 , p.19).

Pela parte do fogo 1 é que se reconhece um filósofo. Se o pensador tem a coragem para se entreter exclusivamente com a busca de causas que devem ser procuradas nesse mundo físico e material e na atividade humana; ou se apela, ou se submete, a causas transcendentais, religiosas, produtos de Deus ou de deuses. Marx, Espinosa, Darwin: pensadores da imanência , primeiro livro do sociólogo e filósofo Maurício Vieira Martins, demonstra que o conceito de imanência é central ao filósofo holandês Baruch Espinosa (1632-1677), ao sociólogo (ou economista) alemão Karl Marx (1818-1883) e ao naturalista (evolucionista) inglês Charles Darwin (1809-1882). E que esse conceito, mobilizado nas obras desses pensadores, permite que a filosofia e a ciência contribuam na luta contra a ignorância, o conservadorismo e o obscurantismo, que levam à violência, física e mental. Desde o prefácio, Martins (2017 , p.9) nos alerta para o “crescimento exponencial de movimentos religiosos pelo planeta afora”. O livro não é um libelo contra as religiões, mas desenvolve um argumento que nos leva a considerar crises atuais de uma perspectiva mais progressista e política. Leia Mais

A miséria da historiografia: uma crítica ao revisionismo contemporâneo | Demian Bezerra de Melo

Publicado em 2014, o livro organizado pelo historiador Demian Melo tem um título bastante sugestivo que nos faz lembrar, pelo menos, de duas grandes obras inseridas dentro do pensamento crítico: A miséria da filosofia, de Karl Marx (MARX, 2009), publicada originalmente em 1847, contra as formulações do socialista utópico Pierre-Joseph Proudhon, que não se baseava na luta de classes enquanto uma forma de transformação social; e a Miséria da Teoria, de Edward P. Thompson (THOMPSON, 1981), publicada em 1978, contra o teoricismo mecânico e, até mesmo, abstrato do filósofo marxista Louis Althusser. Leia Mais