Por Escravos e Libertos / Revista Brasileira de História / 2018

Dossiês em Perspectiva

Antes de adentrar o tema escolhido para este Editorial (a organização de dossiês), não podemos deixar de chamar a atenção para o fato de a Revista Brasileira de História vir a público num momento muito tenso da história do Brasil. Após a decisão do eleitorado no segundo turno em 28 de outubro de 2018, o presidente eleito Jair Messias Bolsonaro começa a definir seu Ministério e suas principais políticas para a gestão que começará em 1º de janeiro de 2019. Entre as políticas anunciadas que causam justificadamente mais controvérsia estão: 1) a vinculação do Ensino Superior ao Ministério da Ciência e Tecnologia, saindo do Ministério da Educação (MEC); 2) o apoio à aprovação do Projeto de Lei 7180 / 2014, que institui a chamada “Escola sem Partido”, ameaça à liberdade de ensino e uma forma de discriminar e, eventualmente, punir docentes por pretensos “delitos de opinião”; 3) a promessa de intervenção na autonomia universitária. Tudo isso significará, para a disciplina História, muitos desafios, e exigirá muita atenção e resistência. A Associação Nacional de História (Anpuh-Brasil) une-se a outras associações científicas no intuito de garantir a liberdade de pensamento e o crescimento da qualidade da pesquisa e do ensino de História.

A publicação de dossiês, ou seja, de conjuntos de artigos sobre uma mesma temática mais ou menos estrita, faz parte integrante dos periódicos acadêmicos e evoluiu em suas formas ao longo do tempo. Esse tipo de instrumento, mesmo se usado por títulos especializados, é de grande importância para publicações como a Revista Brasileira de História que, sumamente generalista, publica artigos sobre os mais variados temas. Os dossiês têm originalmente como função dar um estado da arte sobre o tema abordado. Mais ainda do que os próprios periódicos acadêmicos, que “fixam-se no presente”, perdendo muitas vezes sua atualidade com o tempo,1 os dossiês estão claramente vinculados ao momento em que são publicados, pretendendo dar a ver novas abordagens de temas antigos, e também temas novos, em todo caso em sua abordagem histórica. Isso, é claro, apesar de tudo o que escrevemos estar fatalmente vinculado ao seu tempo.

Pode, no entanto, acontecer de dossiês se tornarem clássicos da historiografia, como é o caso daquele organizado neste periódico por Silvia Hunold Lara sob o tema da escravidão há exatos 30 anos. Tratava-se de aproveitar o centésimo aniversário da Lei Áurea não para comemorá-lo, mas para dar a ver temas até então pouco ou nada abordados pelos historiadores, como o da criança e da família escravas, ou o da diversidade regional mas também social da escravidão no Brasil (Lara, 1988). Os historiadores então convidados a colaborar com a revista, já eram ou rapidamente se tornariam referências nos estudos sobre a condição escrava no Brasil, assim como os textos que aqui publicaram. Pareceu natural que chegando os 130 anos da abolição, a mesma especialista do tema coordenasse mais um número da RBH, não só por conta da efeméride, mas igualmente pelo fato de o tema da escravidão contemporânea e as discussões de como defini-la e combatê-la preocuparem cada vez mais historiadores e cientistas sociais.2 No entanto, diferentemente do que foi feito 30 anos atrás, não se buscou mostrar a diversidade de temas passíveis de serem abordados em torno do tema da escravidão, mas, com o foco na importância das experiências individuais para a compreensão da realidade histórica, a chamada feita por Lara para o dossiê deste ano buscou incitar a produção de textos sobre como os próprios cativos e os libertos entendiam e viam suas condições. Tendo em vista o modo como são atualmente produzidos os dossiês, os resultados foram diferentes do esperado, mas nem por isso (muito pelo contrário) insatisfatórios, como a Apresentação que se segue a este Editorial claramente mostra.

As mudanças no modo como o dossiê devia ser elaborado de 30 anos para cá levam a pensar nas justificativas dessa organização. Com efeito, em 1988 Silvia Lara convidou individualmente os possíveis autores e com eles dialogou – antes e depois da recepção dos textos – sobre o conteúdo do que seria publicado. Outro modelo de dossiê (ou de coletânea, como eram chamados) era a publicação de trabalhos apresentados em conjunto em eventos acadêmicos, como no nº 5 (1983), com publicações resultantes do encontro da diretoria da Anpuh durante a 34ª reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), sobre o tema “Documentação e pesquisa histórica”; ou ainda o nº 11 (1985 / 1986), com coletânea sobre “Sociedade e trabalho na História”, resultante do XIII Simpósio da Anpuh. Naquela época não se mobilizavam pareceristas, cabendo ao eventual organizador do dossiê, ao Editor e ao Conselho Editorial da revista decidirem sobre a relevância dos textos submetidos e, assim, sobre sua eventual aceitação ou recusa. O que se buscava, em 1988, era não só a qualidade dos textos, mas também certo diálogo entre eles e sua coesão, naquele caso relacionada à maior amplitude possível de abordagens.

Atualmente, os organizadores convidados elaboram a chamada do dossiê, que é aberta. Mesmo se um ou outro autor pode (e é) convidado a enviar um texto, sua submissão passa, como todos os demais textos da RBH, pelo processo de avaliação às cegas por pares. Uma primeira triagem feita pelo corpo editorial e pelos organizadores deixa de lado propostas que não se adequam à proposta do dossiê. Uma vez os textos retidos avaliados e aceitos pelos avaliadores, mesmo que condicionalmente, os organizadores também fazem correções e sugestões. Esse sistema de chamada universal e de avaliação às cegas, imposto pelas instâncias avaliadoras dos periódicos, tem como objetivo obter garantias da maior diversidade institucional dos autores e da maior isenção na avaliação possíveis. Ele tira uma parte do protagonismo dos organizadores, como de modo geral do próprio Editor, mas creio que apesar disso temos conseguido intervir positivamente nos dossiês. Se o sistema em uso poderia resultar em dossiês pouco coesos ou de relevância limitada, não é esse habitualmente o caso na RBH. Que o leitor o julgue.

O próprio formato dos dossiês mudou nas últimas décadas. Era habitual, nos anos 1980, haver dossiês sem apresentação específica; os artigos eram apenas publicados em conjunto sob um título único para o volume. Em outros casos a Apresentação, a cargo do Conselho Editorial, era bastante sumária e raramente fazia mais do que descrever os artigos publicados. Ultimamente a RBH vem pedindo aos organizadores apresentações mais densas, com algum tipo de discussão historiográfica que não só situe e justifique a temática abordada pelo dossiê, mas também se sustente enquanto contribuição acadêmica. Esperamos, com isso, que os dossiês aqui publicados tenham ganhado em relevância.

Desde que a RBH assumiu o formato quadrimestral, a praxe tem sido a publicação de dois números com dossiês por ano, deixando um número exclusivamente para artigos avulsos, o que não exclui estes últimos de também serem publicados nos outros números. Desse modo, o leitor encontrará aqui dois artigos de temática diferente da do dossiê. Os textos retidos abordam ambos a realidade política dos anos 1960 no contexto de maior tensão da Guerra Fria. O primeiro, de autoria de Rodrigo Patto Sá Motta, revê, nos 50 anos de sua promulgação, e a partir de fontes inéditas, as origens do Ato Institucional 5, chamando a atenção para o seu uso como instrumento de controle de segmentos integrantes do próprio campo do regime. Jaime Yaffé, por sua vez, analisa a atuação do Partido Comunista Uruguaio levando em conta suas posições heterodoxas entre a retórica incendiária cubana e o caminho pacífico, por via democrática, ao socialismo.

Este número também traz três resenhas, duas delas com análises de obras que dialogam com a temática do dossiê: “Por escravos e libertos”.

Ao lhes desejarmos uma boa leitura, não podemos deixar de agradecer ao Conselho Editorial, à Editoria Associada Internacional, aos Assistentes Editoriais Pablo Serrano e Marcus Vinicius Correia Biaggi, assim como à equipe de edição da RBH – Armando Olivetti, Flavio Peralta e Roberta Accurso.

RBH não teria a qualidade que tem sem o apoio do Programa de PósGraduação em História, Cultura e Práticas Sociais da Universidade do Estado da Bahia (PPGHCPS-Uneb) e do CNPq.

Notas

  1. Enquanto os livros, por exemplo, teriam uma temporalidade mais longa (CALDEIRA, 2018).
  2. Veja o evento organizado também por Silvia Hunold Lara no dia 24 de setembro deste ano sobre as “Condições de trabalho no Brasil contemporâneo: políticas públicas e memória institucional” na Unicamp (programa disponível em: https: / / www.foruns.unicamp.br / eventos / condicoes-de-trabalho-no-brasil-contemporaneo-1; acesso em: 29 out. 2018) e o livro recentemente publicado por Ângela de Castro Gomes e Regina Guimarães Neto (GOMES; GUIMARÃES NETO, 2018) sobre o trabalho forçado na Região Amazônica.

Referências

CALDEIRA, Ana Paula S. Editorial: o tempo das revistas. Varia Historia, Belo Horizonte: UFMG, n.65, 2018. http: / / dx.doi.org / 10.1590 / 0104-87752018000200001. [ Links ]

GOMES, Ângela M. de C.; GUIMARÃES NETO, Regina Beatriz. Trabalho escravo contemporâneo: tempo presente e usos do passado. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2018. [ Links ]

LARA, Silvia Hunold. Apresentação. Revista Brasileira de História, São Paulo: Anpuh, v.8, n.16, p.7-8, 1988. [ Links ]

Bruno Feitler – Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Departamento de História. Guarulhos, SP, Brasil. E-mail: [email protected] http: / / orcid.org / 0000-0003-1468-5680


FEITLER, Bruno. Editorial. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.38, n.79, set / dez, 2018. Acessar publicação original [DR]

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História e Arquivo / Revista Brasileira de História / 2018

Arquivos sob ameaça: os perigos de uma política antiarquivística

Vivemos a era da extinção do papel. Não cabe aos historiadores assumirem uma posição conservadora, defendendo suportes documentais tradicionais. Porém, não cabe também a eles abraçarem ingenuamente a tecnologia. Duas iniciativas em curso devem ser acompanhadas com preocupação. Uma delas é a adoção, pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, do Sistema Eletrônico de Informações (SEI). Essa ferramenta consiste em um sistema informatizado de Gestão Eletrônica de Documentos (GED) e está sendo implantada na administração federal, sendo também crescentemente adotada por administrações estaduais e municipais. O SEI prevê a extinção, na administração pública, de documentos produzidos em papel. Frente a tal proposta, o Arquivo Nacional emitiu nota técnica afirmando que esse sistema não cumpre requisito algum de preservação digital, complementando: “O órgão ou entidade que adotar o SEI, ou qualquer outro sistema informatizado para a produção de documentos digitais, precisa prever uma política de preservação digital para garantir o acesso de longo prazo a estes documentos” (Arquivo Nacional, 2015, grifo no original).

Conforme é possível observar, no SEI, a preservação digital não é um requisito obrigatório, abrindo caminho para que muitos órgãos públicos não a implementem de fato. Além da insegurança jurídica que isso pode causar, também há o gravíssimo risco de perdas substanciais do patrimônio arquivístico brasileiro. Mais grave ainda é o Projeto de Lei (PL) 7.920 / 2017, que atualmente – ou seja, em junho de 2018 – tramita na Câmara de Deputados. Essa proposta, na forma de Projeto de Lei do Senado – PLS 146 (Senado Federal, 2007), foi aprovada nessa última casa legislativa. Na Câmara dos Deputados, a Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática votou favoravelmente ao PL 7.920, acrescentando “prazo mínimo de dois anos para guarda dos documentos após efetuar-se o processo de digitalização”. Esse acréscimo revela um desconhecimento monumental a respeito dos instrumentos legais (Tabelas de Temporalidade e Destinação de Documentos de Arquivo), que definem os prazos de guarda dos documentos públicos. Além disso, essa Comissão fez algumas alterações, no projeto original, no que diz respeito à certificação digital ou à menção ao Conselho Nacional de Arquivos (Conarq). Contudo, a essência do PLS 146 não foi alterada, pois continuou a admitir que: “O documento digitalizado produzido a partir do processo de digitalização disciplinado em regulamento terá o mesmo valor legal, para todos os fins de direito, do documento não digital que lhe deu origem” (Câmara dos Deputados, 2017).

Tais projetos também autorizam esses procedimentos em relação aos documentos privados, sejam de empresas ou pessoais. O PLS 146 indica, em seu artigo 1, que os “órgãos públicos federais, estaduais e municipais, e de entidades integrantes da administração pública indireta das três esferas de poder político serão regidos pela presente lei”. O Conselho Nacional de Arquivos (Conarq), órgão da administração pública federal encarregado de formular a política nacional de arquivos, emitiu nota técnica criticando duramente essas iniciativas. Alerta-se que a proposta de digitalização seguida da eliminação dos documentos originais “possui equívocos ao alterar importantes dispositivos legais”, pois extingue “a função genuína de ‘prova’ e / ou ‘testemunho’ de grande parte dos documentos arquivísticos” (Conselho Nacional de Arquivos, 2016). Mais ainda: “a fácil manipulação” das imagens digitais inviabiliza a “análise forense ou diplomática forense, em casos de contestação de veracidade, impugnação e / ou denúncias de adulteração e falsificação de documentos”.

Cabe aqui lembrar que esse debate não diz respeito aos documentos gerados em meio digital (os denominados nato-digitais), mas sim aos que são produzidos em papel e depois digitalizados. Embora a presença de documentos digitais seja comum, a maior parte da administração pública e privada brasileira ainda trabalha com sistemas híbridos, em que são produzidos documentos em formato digital e em suporte de papel. Além disso, o mais preocupante é que há imensos conjuntos documentais da administração pública, posteriores a 1950, ainda não avaliados e, portanto, não recolhidos aos arquivos públicos. Ao que tudo indica, eles seriam digitalizados e os respectivos originais seriam eliminados.

A eliminação em massa de documentos teria efeitos danosos ao patrimônio arquivístico brasileiro. O Conarq sublinha a inconsistência de um dos principais argumentos dos defensores dessas propostas. Esses últimos alegam que a medida implicaria substancial economia de recursos públicos, devido à “redução de áreas destinadas aos arquivos físicos” ou à “redução dos gastos com papel, o que favorece a preservação do meio ambiente”. Frente a esse argumento, a nota técnica do Conarq alerta que a “preservação e acesso de longo prazo” dos documentos digitalizados implica a “previsão de planejamento e investimentos constantes”, assim como “custos elevados com a manu­tenção do ambiente tecnológico ao longo dos anos”.

Os defensores do PLS-146, por sua vez, contra-argumentam que o segundo inciso do artigo 2 da versão do Senado prevê que: “Os documentos de valor histórico, assim declarados pela autoridade competente, embora digitalizados, não deverão ser eliminados, podendo ser arquivados em local diverso da sede do seu detentor”. Alerta semelhante pode ser observado na versão do texto que atualmente tramita na Câmara de Deputados: “A Administração Pública deverá preservar os documentos não digitais avaliados e destinados à guarda permanente, conforme previsto na Lei nº 8.159, de 8 de janeiro de 1991, ainda que também armazenados em meio eletrônico, óptico ou equivalente”. Destaca-se aqui a menção à Lei de Arquivos (Lei nº 8.159 / 1991), que prevê em seu Art. 9º: “A eliminação de documentos produzidos por instituições públicas e de caráter público será realizada mediante autorização da instituição arquivística pública, na sua específica esfera de competência”.

Cabe ainda sublinhar que em nenhum momento o PLS 146 ou o PL 7.920 definem as noções de “documentos de valor histórico” ou “destinados à guarda permanente”. Igualmente, não se define quem seria a “autoridade competente” ou o gestor da “Administração Pública” que se encarregaria de avaliar os documentos enquanto patrimônios históricos. Na prática, há risco de se preservar apenas os registros esparsos referentes às grandes personalidades, sem consideração por séries documentais de natureza econômica e demográfica, ou as demais que preservam registros da memória das camadas populares.

Em outras palavras, essas proposições normativas abrem as portas para que a escolha dos “documentos de valor histórico”, a serem preservados, fique sujeita a critérios altamente subjetivos do gestor público do momento. No contexto administrativo brasileiro, em que a gestão de documentos arquivísticos ainda está em fase de implantação, é bem provável que esses agentes simplesmente não considerem nenhum documento público como tendo “valor histórico”, eliminando sua totalidade após a reformatação digital. Dessa maneira, há grande chance de se perderem tanto os documentos originais quanto suas representações digitais, principalmente quando se tem em vista os elevados custos de mantê-las a longo prazo. Fere-se, assim, de maneira mortal a formação do patrimônio documental brasileiro. Caminha-se, na prática, para a legalização da destruição em massa dos documentos arquivísticos, seja em sua função de evidência, seja para o acesso a direitos ou para preservar a memória brasileira para as futuras gerações.

A Anpuh vem acompanhando esses debates e tem se posicionado claramente contra esses danosos projetos. O Dossiê publicado neste número, intitulado “História e Arquivo”, ao trazer um panorama da atual produção sobre a história dos arquivos e da arquivologia, tem como objetivo, em nome da Associação, alertar para as problemáticas que suscitam os projetos legislativos e administrativos em curso.

Este número da RBH apresenta, assim, novas perspectivas de análise sobre o patrimônio arquivístico e a arquivologia. Através da história desse campo de conhecimento, assim como das instituições e das políticas de formação de acervos, lança-se luz sobre as potencialidades de pesquisa nos, por assim dizer, “arquivos dos arquivos”, ou seja, na documentação acumulada pelos arquivos públicos no exercício de suas atividades. Procura-se também promover uma reaproximação entre a história e a arquivologia, áreas muito conectadas no passado, mas que conheceram desenvolvimentos específicos no século XX, gerando afastamentos ou mesmo mal-entendidos (Blouin Jr.; Rosenberg, 2011).

O primeiro texto do dossiê, de autoria de Angelica Alves da Cunha Marques, Georgete Medleg Rodrigues e Christine Nougaret, explora a evolução histórica da arquivologia no Brasil e na França, apontando influências e singularidades nas respectivas configurações nacionais dessa área, principalmente em sua relação com a ciência da informação. O segundo texto, de autoria de Ana Canas Delgado Martins, desvela as complexas relações da constituição do fundo Conselho Ultramarino, assim como de sua custódia, tema de grande importância para o Brasil e Portugal. O terceiro artigo, de Marcelo Thadeu Quintanilha Martins, traça a história do fundo arquivístico da Secretaria de Governo da Capitania de São Paulo, revelando as potencialidades dos estudos sobre a evolução desse tipo de custódia, tema ainda muito pouco conhecido no Brasil.

Rita Sampaio da Nóvoa e Maria de Lurdes Rosa investigam, em seguida, as potencialidades dos arquivos de família. Trata-se de um tema fundamental, não apenas para entender a gestão patrimonial privada no Antigo Regime, como também o próprio funcionamento da monarquia. Sabe-se que antes do surgimento dos arquivos nacionais, havia arquivos dinásticos (Delmas; Nougaret, 2004), que recolhiam documentação das casas aristocráticas responsáveis por várias funções do Estado. O estudo desses conjuntos documentais, que eventualmente também permaneceram em posse de famílias, em muito permite entender o funcionamento da antiga administração portuguesa no reino e ultramar. O texto seguinte, de Thiago Lima Nicodemo e Paulo Teixeira Iumatti, desloca o eixo de discussão para um tema caro ao Brasil: a escrita da história a partir dos arquivos pessoais, particularmente a história social e cultural dos intelectuais, como no caso das redes de sociabilidade que esse segmento constituía ou as relações que mantinha com a esfera pública, dimensões que ficaram ali registradas.

Em sua contribuição, Paulo Roberto Elian dos Santos aborda a formação do campo arquivístico do Brasil contemporâneo, focalizando a primeira grande reforma administrativa federal, ocorrida na década de 1930, responsável pela criação do Departamento Administrativo do Serviço Público (Dasp), que atuou como autoridade arquivística, influenciando em muito a constituição desse campo. O texto de Maria Teresa Navarro de Britto Matos desloca essa discussão para o caso da Bahia, onde tentativas de modernização do arquivo público estadual foram frustradas. Esse episódio revela a existência de agentes públicos que, embora sintonizados com a discussão contemporânea da gestão documental, não puderam contar com base política, ou mesmo apoio na burocracia estatal, para que suas iniciativas prosperassem. Complementando esse ambíguo quadro das iniciativas modernizantes, o texto de Clarissa Moreira dos Santos Schmidt, Renato de Mattos e Natalia Bolfarini Tognoli mostra a natureza fortuita da criação do Sistema Estadual de Arquivos em São Paulo da década de 1980. Esse caráter fortuito, ironizado no título do artigo, decorre do fato de essa iniciativa não ter sido precedida de diagnósticos da documentação e da infraestrutura existentes, assim como de estudos sobre o quadro de profissionais disponíveis ou das necessidades dos potenciais usuários desse sistema. Na realidade, tal iniciativa decorreu de um leilão ilegal de documentos. A desconexão entre essa iniciativa e a gestão documental talvez ajude a compreender o atraso em sua implantação. O caso paulista serve de exemplo da fragilidade das políticas arquivísticas e de sua demora de implantação no Brasil. Concluindo o Dossiê, Caio César Boschi apresenta o Projeto Resgate, iniciativa que influenciou uma geração de historiadores e foi responsável pela digitalização de milhões de páginas de acervos relevantes para a história luso-brasileira. Esse texto sintetiza a evolução e dilemas desse projeto e, de forma inédita, fornece um guia de seus principais instrumentos de pesquisa, também anunciando a retomada dos trabalhos após alguns anos de arrefecimento.

Esse conjunto de reflexões em muito contribui para entender a arquivística brasileira contemporânea. Embora a utilização de documentos de arquivo seja frequente em várias áreas de conhecimento, ainda são raras as histórias de sua custódia institucional e das formas de uso dessas fontes. Espera-se que os textos presentes no Dossiê inspirem novas investigações. Ainda há muito a ser estudado a respeito de como se deu a formação dos acervos arquivísticos luso-brasileiros ou as mudanças nas definições de fundos e coleções. Isso para não mencionar como esses registros foram utilizados na escrita da história política, econômica, social e cultural, ou quando, e de que forma, a antropologia, a sociologia, a ciência política e demais áreas do conhecimento começaram a recorrer a eles. Também se conhece muito pouco a respeito da evolução da gestão dos arquivos públicos brasileiros e de seus serviços, bem como sobre a história dos procedimentos técnicos de classificação dos documentos de arquivos, de sua avaliação, conservação, descrição, difusão e acesso.

Embora estudos seminais tenham sido realizados por vários historiadores e arquivistas (Santos, 2010Estevão; Fonseca, 2010Marques, 20132014Bellotto, 2014Bottino, 2014 – somente para citar alguns exemplos), esse continente de pesquisa ainda está à espera de novos e necessários desbravadores.

Para além do Dossiê, este número traz dois artigos avulsos. Numa abordagem original dentro da área da História dos esportes, Victor Andrade Melo e André Leonardo Chevitarese, recorrendo aos jornais da época, analisam aspectos sociais das atividades de um turfe carioca de fins do século XIX, o Prado Guarany. Já Wellington Castellucci Junior revela, pela trajetória de Marcos Pimentel e de seus descendentes, as origens da linhagem dos sacerdotes do candomblé Ilê Axé Opô Afonjá de Itaparica, e ao mesmo tempo traz um detalhado exemplo das estratégias de construção patrimonial de libertos na Bahia da segunda metade do século XIX. Finalmente, dentre as três resenhas publicadas, uma complementa em boa hora o Dossiê “História e Arquivo”. Nela, José Francisco Campos aborda a atualíssima questão da preservação dos arquivos nato-digitais por meio da análise de Existir em bits: arquivos pessoais nato-digitais e seus desafios à teoria arquivística, de Jorge de Abreu.

Ao lhes desejarmos uma ótima leitura, não podemos deixar de agradecer ao Conselho Editorial, à Editoria Associada Internacional, aos Assistentes Editoriais Pablo Serrano e Marcus Vinicius Correia Biaggi, assim como à equipe de edição da RBH – Armando Olivetti, Flavio Peralta e Roberta Accurso.

RBH não teria a qualidade que tem sem o apoio do Programa de Pós-Graduação em História, Cultura e Práticas Sociais da Universidade do Estado da Bahia (PPGHCPS-Uneb) e do CNPq.

Referências

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CÂMARA DOS DEPUTADOS. Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática. Projeto de Lei nº 7.920, de 2017. Altera a Lei nº 12.682, de 9 de julho de 2012, a Lei nº 8.159, de 8 de janeiro de 1991, o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), a Lei nº 12.865, de 9 de outubro de 2013, e a Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), para dispor sobre a digitalização de documentos. Disponível em: Disponível em: http: / / www.camara.gov.br / proposicoesWeb / prop_mostrarintegra?codteor=1632805&filename=Tramitacao-PL+7920 / 2017 ; acesso em: 20 jun. 2018. [ Links ]

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Renato Pinto Venancio – Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Escola da Ciência da Informação, Departamento de Organização e Tratamento da Informação. Diretoria de Arquivos Institucionais (DIARQ-UFMG). Belo Horizonte, MG, Brasil. Editor convidado. Pesquisador do CNPq 1D. E-mail: [email protected]
http: / / orcid.org / 0000-0003-0819-3671

Bruno Feitler – Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Departamento de História. Guarulhos, SP, Brasil. E-mail: [email protected] http: / / orcid.org / 0000-0003-1468-5680


VENANCIO, Renato Pinto; FEITLER, Bruno. Editorial. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.38, n.78, mai / ago., 2018. Acessar publicação original [DR]

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Processos judiciais como fonte para o historiador / Revista de Fontes / 2014

Os processos judiciais tem sido uma fonte praticamente inesgotável para os historiadores desde há muito tempo. Ao menos desde que a história passou a ser contada não apenas com grandes personagens e heróis, com a definitiva entrada em cena de novos agentes cuja abrangência social impôs a necessidade de buscar suas pistas, trajetórias e formas de ação e pensamento em uma maior multiplicidade de resquícios do passado. Não há dúvida que, com isso, ganhou a realidade histórica uma dimensão mais humana, marcada por conflitos, tensões e / ou acomodações nos seus vários níveis, e seu conhecimento com novos problemas e perspectivas de análise. O dossiê que ora se apresenta pretende revisitar, aqui, algumas dessas perspectivas tendo em vista dois pontos de discussão que consideramos de fundamental importância quando falamos hoje de processos: sua dimensão institucional e a necessidade de se pensar a justiça para além do espaço propriamente judicial.

Quanto ao primeiro ponto de discussão, não se pode negar o impacto profundo e positivo que houve na historiografia, ao menos no Brasil, com o estudo dos casos de litígios na justiça, sobretudo criminais, para se entender a vida social com a inclusão das categorias que outrora se classificava de “subalternas” – pobres, escravos, libertos, etc. – como sujeitos ativos de sua própria história.

Assim, convém destacar que a normatividade a que dá corpo este tipo de fonte não tem, recentemente, passado despercebida, como os textos aqui apresentados expressam. Ao contrário, a análise institucional de funcionamento dos órgãos, tribunais e seus agentes, que há poucos anos poderia cheirar a uma história de tipo tradicional, com uma dimensão administrativa identificada com um caráter oficioso, gerando certa ojeriza a muitos dos dedicados a nosso ofício, tem se revelado fundamental. Não como pastiche, como um arrazoado vazio de normas e regulamentos, mas sim enquanto uma cultura de práticas, ritos e formas que revelam não só o que punir, mas como fazê-lo, bem como o que deve ser perdoado e mesmo valorizado em uma verdadeira gramática social.

A contribuição de Alejandro Agüero caminha por essas sendas, ao mostrar como o pensamento social impactava nas práticas da cultura jurídica hispânica, a partir do exemplo da mais distante periferia da estrutura judicial do império espanhol, sem que essas práticas fossem exclusivas desse contexto periférico.

Em relação aos estudos sobre a justiça propriamente dita, além da percepção e análise de suas várias instâncias como extremamente importantes, impõe-se cada vez mais a ampliação de seu entendimento para espaços de resolução de conflitos além dos que mais tradicionalmente interessam à História do Direito moderno (os foros criminal e civil). O artigo de Pollyanna Gouveia Mendonça Muniz mostra, nesse sentido, a incrível potencialidade dos arquivos dos tribunais episcopais para uma visão mais ampla da realidade múltipla dos foros de uma sociedade estamental.

É verdade que, para o caso particular do que se convencionou chamar de Antigo Regime, a justiça estava na base da concepção social que se traduzia nas mais distintas formas de manutenção da ordem. Nessa sociedade, o rei seria o supremo provedor dos distintos corpos, concebidos como desiguais por natureza. Este papel do soberano se expressava na concepção de administração – profundamente manipulada por autoridades dotadas de jurisdição, ou seja, de poder de julgar -, na pluralidade de tribunais específicos que muitas vezes se sobrepunham em suas funções com outros; e também nos diferentes meios de ascensão social, que também se valiam de procedimentos processuais, ou seja, da justiça. Esse papel da justiça como meio de legitimação social e assim também de mobilidade, é perceptível na contribuição de Aldair Rodrigues que analisa as potencialidades para a História d os processos de habilitação ao sacerdócio e à familiatura do Santo Ofício no caso luso-brasileiro.

No entanto, a validade de se pensar a abrangência da justiça e dos processos para resolução de tensões políticas e sociais não se esgota até hoje, mesmo com a ruptura constitucional e a formação dos novos Estados liberais no século XIX, que pretenderam circunscrever o espaço da justiça como um dos seus poderes. O que fica especialmente evidente na concepção que a Constituição deveria ser a norma (o “código dos códigos”) que vincularia todas as outras, numa chave bem distinta do pluralismo jurídico predominante no paradigma anterior, em que as infrações à Carta passariam a ser delitos que deveriam ser processados. É assim que, num marco temporal bastante atual, Andrei Koerner analisa os processos de ação direta de inconstitucionalidade (ADI) após a Constituição de 1988, no contexto das decisões do Tribunal sobre o tema, detalhando os argumentos dos ministros e as implicações jurídicas e políticas da decisão.

Do ponto de vista metodológico, é evidente que, como toda fonte, os processos devem ser manejados como extremo cuidado e compreendidos dentro do quadro cultural e institucional em que foram produzidos. A contribuição de Bruno Feitler ao dossiê propõe-se a tratar dessa questão tendo como horizonte os debates existentes em torno dos processos-crime da Inquisição portuguesa.

Os artigos aqui reunidos – apresentados na “Primeira jornada de fontes do departamento de História da Unifesp”, realizada no dia 3 de dezembro de 2012 – não são mais do que alguns exemplos da grande potencialidade que os processos judiciais têm para as Ciências Sociais (em particular para a História), e procuram, assim, incentivar o estudo desse tipo de documento em suas mais variadas e múltiplas formas.

Andréa Slemian – Universidade Federal de São Paulo. E-mail: [email protected]

Bruno Feitler – Universidade Federal de São Paulo / CNPq. E-mail: [email protected]


SLEMIAN, Andréa; FEITLER, Bruno. Apresentação. Revista de Fontes. Guarulhos, v.1, n.1, 2014. Acessar publicação original [DR]

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Pureza, Raça e Hierarquias no Império Colonial Português / Tempo / 2011

O tema da discriminação racial, das cotas universitárias para os negros, enfim, da identidade baseada na raça, está constantemente presente na imprensa escrita e televisiva. Nos últimos anos, o governo brasileiro investiu em políticas sociais dedicadas a minorar as distâncias econômicas e educacionais entre os cidadãos. Parte do mesmo debate, os estudos sobre a escravidão no período colonial pretendem, em grande parte, investigar as desigualdades sociais de ontem e de hoje e entender o processo gerador do descompasso entre os extremos da pirâmide populacional.1 Embora a história social dos negros e mulatos tenha notavelmente avançado nas últimas décadas, ainda são poucos os estudos dedicado às ideologias geradoras ou legitimadoras da discriminação, sobretudo no que toca o período colonial.

Em perspectiva panorâmica, Charles Boxer analisou as relações raciais no império colonial português e fez ruir o mito da integração harmoniosa entre os portugueses e os povos coloniais, conforme defendiam Gilberto Freyre e a historiografia salazarista.2 Apesar desse notável pontapé inicial, os estudos mais centrados no preconceito racial no mundo português dedicaram-se especialmente ao problema cristão-novo, pouco investigando os impedimentos discriminatórios referentes a negros, índios e mulatos: Maria Luiza Tucci Carneiro e José Alberto Veiga Torres, ou ainda Fernanda Olival, em suas importantes contribuições, analisaram os estatutos de pureza de sangue e as habilitações para cargos na Inquisição ou para hábitos de Ordens Militares, privilegiando os impedimentos ligados à origem judaica dos habilitandos.3 Por certo, nos últimos anos, não surgiram novas pesquisas dedicadas às hierarquias sociais sustentadas pela ideia de raça capazes de avaliar, de modo ao mesmo tempo mais amplo e mais fino, os privilégios e impedimentos que sustentavam ou barravam a ascensão social de portugueses, africanos, índios e mestiços no mundo português.4 Faltam portanto pesquisas mais alentadas sobre a construção das noções de pureza e de raça no mundo português do Antigo Regime. O presente dossiê pretende investigar o tema e incentivar as análises que partam não somente de um grupo específico, mas sobretudo de uma avaliação mais ampla dos diversos segmentos sociais nos diferentes recantos do império português.

Em geral, historiadores e cientistas sociais investigam a questão racial nos fenômenos contemporâneos, pois consideram que as classificações sócioraciais tenham tomado importância somente a partir de meados dos oitocentos. Para esta vertente, seria impróprio o emprego da noção de raça para entender a dinâmica social do Antigo Regime.5 Esta vertente também pode ser identificada por entre os especialistas da história da época moderna. Segundo Jean-Pierre Zuñiga, por exemplo, na América espanhola, as classificações étnicas de um indivíduo eram muito instáveis. A denominação de mestiço, mulato ou espanhol variava segundo sua posição social, domínio da língua castelhana, aparência e até mesmo do testemunho que registrou a sua classificação. À época, os mestiços não eram entendidos como fruto da mistura de raças, mas como mistura de sangues, na acepção nobiliárquica do termo. Ou seja, a classificação étnica era, em grande parte, determinada pelo sangue. O casamento de indivíduos com qualidades diferentes, entre espanhóis e índias, produzia uma “mésalliance”, união entre indivíduos desiguais. Para o estudioso, seria portanto um evidente anacronismo empregar aqui o conceito de raça na sua acepção biológica, mais adequado então era recorrer à concepção nobiliárquica, a ideia de linhagem e sangue.6 Em suma, em defesa desta primeira vertente, Zuñiga contesta o emprego de raça para o Antigo Regime e recorre à ideia nobiliárquica de sangue. No entanto, nos parece que o argumento somente se sustenta quando se refere à dicotomia entre nobres e plebeus, puros e impuros, espanhóis e índios. A ideia de sangue, sangue misturado (sang-mêlé), não comporta a variedade de tipos sociais, não explica a dinâmica das hierarquias próprias do mundo colonial pois iguala e concebe como inferiores a todos os que não eram espanhóis. Sobre a complexidade de tipos raciais e sociais na América espanhola, vale lembrar a fabulosa pintura de casta e seu inventário visual das misturas entre índios, espanhóis e africanos.7

Em contrapartida, alguns estudiosos buscam dilatar a existência do racismo. Christian Delacampagne situou suas origens na Antiguidade enquanto James H. Sweet identificou as suas raízes na Península ibérica, recorrendo ao legado árabe e cristão medievais.8 De fato, as duas vertentes trazem problemas e não destacam as variações históricas da noção de raça. A primeira minimiza as manifestações racistas anteriores ao século XIX, e, portanto enfatiza a importância da origem religiosa (ou seja, cristã) para o surgimento e difusão da noção de pureza de sangue. Seguindo este pressuposto, esses estudiosos desconsideram as experiências coloniais, ou seja, as conexões metrópole-colônia e a dominação colonial pautada pela inferioridade dos povos ultramarinos. Já a segunda vertente banaliza os preconceitos racistas e os torna universais e quase atemporais, naturalizando assim perigosamente a sua existência.

Num terceiro ponto de vista, o historiador canadense Pierre H. Boulle considera que o racismo não apareceu repentinamente. Aliás, modificou-se ao longo tempo, aglutinando elementos novos, formando-se aos poucos. Tal construção ideológica teria tido uma tríplice origem que remonta aos séculos XVI e XVIII. Segundo Boulle, ela se iniciara sob a influência da expansão marítima europeia e da conquista de povos ultramarinos. A segunda grande contribuição para a construção do racismo viria do desenvolvimento das ciências, responsáveis pela melhor compreensão dos processos naturais e da transmissão das características humanas. Finalmente o fim do predomínio da explicação religiosa, em favor da razão matemática, fomentou a ideia de progresso material e da superioridade tecnológica dos europeus.9 Tais elementos esclareceriam, enfim, os vínculos entre ciência e racismo, entre controle da natureza e hierarquia entre os povos. Embora o estudo de Boulle explore o caso francês, os estudos sobre as sociedades ibero-americanas não divergem nos resultados.

Para o mundo hispânico, a perspectiva atual pretende não apenas analisar as ideias de pureza e raça antes de determinismo biológico, mas também demonstrar que o princípio religioso não era a única e determinante forma de classificação social na Espanha e no seu império colonial antes do advento do século XIX. Para além da ampliação cronológica do problema, os atuais estudos não pretendem restringir a análise às sociedades do Velho Mundo, 10 mas ampliar o seu espectro em direção ao mundo colonial, assim como fizera o historiador canadense. Não mais se concebe o ultramar como mera extensão das áreas metropolitanas, ou como áreas apartadas da civilização europeia.11 Assim, ultimamente os estudos sobre o conceito de raça enfatizam as trocas culturais e as dinâmicas sociais comuns a metrópole e colônias.12 Eles entendem o pensamento racial, como Jean-Frédéric Schaub em artigo seminal,13 como parte de um sistema ideológico forjado não apenas nas sociedades europeias, mas também na vivência colonial, nos contatos íntimos entre brancos, índios, negros e asiáticos. Inevitavelmente, as trocas e os conflitos entre esses povos eram mais intensos no ultramar, mas cidades como Lisboa, Sevilha e Paris não ficaram imunes aos movimentos migratórios e à miscigenação. No presente dossiê, exploram esta perspectiva os artigos de Giuseppe Marcocci, Ângela Barreto Xavier, João de Figueirôa-Rêgo e Fernanda Olival.

Ao propormos um dossiê sobre a ideologia da raça na época moderna, pretendemos analisar a dinâmica das sociedades, as hierarquias e os diferentes graus de mobilidade social. Focados notadamente entre os séculos XVI e XVII, os artigos primam por analisar: o sangue como distinção entre nobres e plebeus (artigo de Arlette Jouanna); a hierarquização entre índios e negros (artigo de Giuseppe Marcocci); os discursos sobre pureza entre os brâmanes (artigo de Ângela Barreto Xavier). Com enfoque social, os estudos de Francis Dutra, Fernanda Olival e João de Figueirôa-Rêgo analisam a presença de negros e mulatos nas Ordens Militares em Portugal e na administração colonial.

O dossiê aborda então questões da maior relevância. A noção de pureza da raça, inicialmente, tencionava naturalizar as diferenças morais entre plebeus e nobres.14 Determinava ainda o forte vínculo entre superioridade do sangue e capacidade de governar. O líquido vital respaldava a continuidade da casa real: o poder régio não se estribava somente nos exércitos e na tradição, mas particularmente na natureza, na hereditariedade transmitida entre pais e filhos, como demonstra o artigo de Jouanna. No entanto, a defesa da pureza do sangue não se restringiu aos circuitos cortesãos e se expandiu pelos mais diferentes estratos das sociedades europeias e coloniais.

Aliás, para receber títulos, assumir cargos eclesiásticos e postos na administração régia, os súditos não poderiam ter origens cristã-nova ou moura. Os defeitos de “qualidade” ou “defeitos mecânicos” eram também impedimentos, embora fossem menos graves e mais facilmente perdoados, segundo o caso, pela monarquia. As investigações mais recentes, aos poucos, demonstram que a origem gentia, negra ou mulata não era concebida como defeito de sangue, mas de qualidade, como defende Maria Elena Martinez em seus trabalhos15 e Francis Dutra neste dossiê. Na época moderna, porém, a ideologia da raça ainda não era capaz de excluir índios, negros e mulatos dos cargos eclesiásticos, administrativos e militares, sobretudo em áreas despovoadas de homens brancos.16 O artigo aqui assinado por Olival e Figueirôa-Rêgo demonstra o quão frequente era a presença de homens sem a devida qualidade nos postos chaves nas colônias da África e da América. Embora considerados inferiores, os aliados da monarquia eram indispensáveis para a defesa e gerenciamento das possessões régias. Ao reconhecer e remunerar os serviços de índios e negros, a monarquia contrariava os princípios da hierarquia racial defendida onde ocorria o predomínio de súditos brancos e cristãos-velhos, ciosos de sua honra e privilégios.

Segundo Paolo Prodi, no correr da época moderna, uma paulatina decadência da ideologia nobiliárquica, “última trincheira na defesa da cadeia hierárquica dos seres e da ligação entre as gerações” deu pouco a pouco lugar a um novo tipo antropológico, a nobreza como raça ou casta garantidora do mando sendo substituída por uma outra, de serviço, que busca a honra e o exercício de uma função social.17 Podemos também dizer que esta mesma decadência acaba por abrir espaço para o surgimento de outras hierarquias, de outras explicações para as diferenças entre as pessoas, ou seja: as que hoje chamamos raciais. Ainda, as infindáveis querelas que perpassam boa parte dos séculos XVII e XVIII sobre a importância da origem, do mérito, da virtude, dos favores ou da riqueza para se definir o lugar de um indivíduo na sociedade, são um importante sintoma do que importava na definição do corpo social,18 mas também mostram que esse mesmo corpo estava vivendo um momento de redefinição.19

Este já não era mais o caso no século das luzes quando os filósofos dividiram a humanidade entre coletores, caçadores e agricultores, entre caucasianos, africanos, asiáticos e americanos, entre arianos e semitas. Valorizavam assim não somente os costumes e a forma física, mas também a capacidade de controlar os processos naturais. A condição material dos povos era um diferencial entre europeus e os povos do ultramar. Desde então o progresso tornou-se parâmetro que concorria com a antigas bases religiosas do preconceito. Nessa conjuntura, entre fins do século XVIII e inícios do XIX, a ideia de raça se consolida para respaldar a alegada superioridade dos brancos, promotores da civilização e da ciência, sobre os territórios coloniais.20

Notas

1. Como exemplos, vale mencionar os estudos de Jacob Gorender, O escravismo colonial, São Paulo, Editora Ática, 1980; [ Links] Kátia de Queirós-Mattoso, Ser escravo no Brasil, São Paulo, Editora Brasiliense, 1982; [ Links] Stuart B. Schwartz, Segredos internos, São Paulo, Companhia das Letras, 1988; [ Links ] Silvia Hunold Lara, Campos da violência, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1988; [ Links ] Manolo Florentino, Em costas negras, São Paulo, Companhia das Letras, 1997; [ Links ] Hebe Mattos, As cores do silêncio, 2a ed., Nova Fronteira, 1998. [ Links ] 2. Vale lembrar Charles Boxer, O império colonial português (1515-1825), 3a ed., Lisboa, Ed. 70, 1981 [1969] [ Links ]; Relações raciais no império colonial português, Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1967. [ Links ] Mencionemos ainda os estudos que enfatizam questões étnicas, embora não explorem a ideologia e as classificações raciais: Stuart B. Schwartz, “The formation of colonial identity in Brazil” in: N. Canny & A. Pagden (eds.), Colonial identity in the Atlantic World, Princeton, Princeton University Press, 1987; [ Links ] A. J. R. Russell-Wood: “Comunidades étnicas” in: F. Bethencourt e K. Chaudhuri (eds.) História da expansão portuguesa, v. 3, Lisboa, Círculo de Leitores, 1998. p. 210-222. [ Links ] Para um estudo sobre a questão racial entre os historiadores entre os séculos XIX e XX, veja o artigo de Ronaldo Vainfas, “Colonização, miscigenação e questão racial: notas sobre equívocos e tabus da historiografia brasileira”, Tempo, 8, 1999. [ Links ] 3. Maria Luiza Tucci Carneiro, Preconceito racial em Portugal e no Brasil colônia, 2a ed. São Paulo, Perspectiva, 2005 [1983] [ Links ]; José Alberto Veiga Meira Torres, “Da repressão religiosa para a promoção social: a Inquisição como instância legitimadora da promoção social da burguesia mercantil”, Revista Crítica de Ciências Sociais, 40, 1994, pp. 109-135; [ Links ] Id., Limpeza de geração, Viana do Castelo, Câmara Municipal, 2008; Fernanda Olival, “Rigor e interesses: os estatutos de limpeza de sangue em Portugal”, Caderno de Estudos Sefaraditas, 4, 2004, pp. 151-182. [ Links ] 4. Sobre o serviço régio enquanto instrumento de mobilidade social, cf. Nuno G. Monteiro, Pedro Cardim, Mafalda Soares da Cunha (ed.) Optima Pars. Elites Ibero-Americanas do Antigo Regime, Lisboa 2005 e F. [ Links ] Chacón Jiménez e Nuno G. Monteiro (ed.), Poder y movilidad social. Cortesanos, religiosos y oligarquias em la península ibérica (siglos XV-XIX), Madrid, 2006. [ Links ] 5. Sobre a relação estreita entre raça e ciência, veja: Michèle Duchet, Anthropologie et Histoire au siècle des Lumières, Paris, Albin Michel, 1995; [ Links ] Emmanuel C. Eze (ed.), Race and the Enlightenment, London, Blackwell, 1997; [ Links ] Tzvetan Todorov, Nós e os outros: a reflexão francesa sobre a diversidade humana,v.1.Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 1993; [ Links ] H. F. Augstein (ed.) Race; The origins of an idea, 1760-1850, Bristol, Thoemmes Press, 1996; [ Links ] Stefano F. Bertoletti, “The Anthropological Theory of Johann Friedrich Blumenbach” in: S. Poggi & M. Bossi (ed.) Romanticism in Science, Dordre-cht, Kluwer, 1994. [ Links ]; Marvin Harris, The rise of Anthropological Theory, London, Routledge & Kegan Paul, 1968; [ Links ] Georges Gunsdorf, Introduction aux Sciences Humaines, Paris, Ed. Ophys, 1974; [ Links ] Sergio Moravia, La scienza dell’uomo nel Settecento, Bari, Editori Laterza, 1970; [ Links ] Para a estreita ligação entre o surgimento da linguística e da ideia de raça: Maurice Olender, Les langues du paradis. Aryens et sémites: un couple providentiel, Paris, Seuil, 1989. [ Links ] 6. Jean-Pierre Zuñiga, “La voix du sang. Du métis à l’idée de métissagen en Amérique espagnole”, Annales, v. 54 n. 2, 1999. pp. 443-444. [ Links ] 7. Ilona Katzew, Casta painting, New Haven, Yale University Press, 2004. [ Links ] 8. Christian Delacampagne, L’invention du racisme: Antiquité et Moyen Age, Fayard, Paris, 1983; [ Links ] James H. Sweet, “The Iberian Roots of American Racist Thought.” The William and Mary Quarterly, 3rd Ser., Vol. 54, No. 1 (Jan., 1997), pp. 143–166. [ Links ] 9. Pierre H. Boulle, Race et esclavage dans la France de l’Ancien Régime, Paris, Perrin, 2007, pp. 61-62. [ Links ] 10. Como é o caso do clássico livro de Albert Sicroff, Los estatutos de limpieza de sangre, Madrid, Taurus, 1979 [1960] [ Links ], ou ainda da obra de Juan Hernández Franco, Cultura y limpieza de sangre en la España Moderna, Murcia, Universidade de Murcia, 1996. [ Links ] 11. Estes estudos são fortemente influenciados por Sanjay Subrahmanyam, “Connected Histories: Notes towards a Reconfiguration of Early Modern Eurasia”, Modern Asian Studies, v. 31, n. 3, 1997, pp. 735-762. [ Links ] Aliás, neste dossiê os artigos de Giuseppe Marcocci e Angela Barreto Xavier exploram especificamente esta perspectiva.
12. Para os estudos dedicados ao conceito de raça nas metrópoles e no ultramar, veja: Nicholas Hudson, “From ‘Nation’ to Race, The Origin of Racial Classification in Eighteenth-Century thought”, Eighteenth-Century Studies, v. 29, n. 3, 1996, pp. 247-264; [ Links ] Roxann Wheeler, The complexion of race; categories of diference in Eighteenth-century British culture, Philadelphia, University of Pennsylvania Press, 2000; [ Links ] John Beusterien, An eye on race; perspectives from Theater in Imperial Spain, Lewisburg, Bucknell University Press, 2006; [ Links ] Kim F. Hall, Things of darkness; economies of race and gender in early modern England, Ithaca, Cornell University Press, 1995. [ Links ] 13. Jean-Fredéric Schaub, “La catégorie – études coloniales – estelle indispensable?”,  Histoire, Sciences Sociales, 63, 2008. [ Links ] 14. Vale mencionar o principal estudo sobre a idéia de sangue nobiliárquico: Ellery Schalk, L’épée et le sang, Seyssel, Champ Vallon, 1996. [ Links ] 15. Maria Elena Martínez. Genealogical fictions, pp. 91-122. Veja também Dutra, Francis, “A hard-fought struggle for recognition”, The Americas, n. 56, 1999, pp. 91-113. [ Links ] 16. Para os estudos sobre a limpeza de sangue dos índios, ver: Ronald Raminelli, “Servicios y mercedes de los vasallos de la América Portuguesa”, Historia y Sociedad, v. 12, 2006, p. 107-131; [ Links ] Id. “Jefes potiguaras, entre portugueses y neerlandeses, 1633-1695”, Historias (México), v. 73, p. 67-85, 2009. [ Links ]; Ide. “Privilegios y malogros de la familia Camarão” in: Giovanni Levi (org.), Familia, jerarquización y movilidad social, Murcia, EDITUM – Universidad de Murcia, 2010, pp. 45-56. [ Links ] 17. Paolo Prodi, Introduzione allo studio della Storia Moderna, Bolonha, Il Mulino, 1999, pp. 57-58. [ Links ] 18. Natalie Zemon Davis, L’histoire tout feu, tout flame. Entretiens avec Denis Crouzet, Paris, Albin Michel, 2004, pp. 115-116. [ Links ] 19. Especificamente sobre a questão do mérito: Jay M. Smith, The Culture of Merit: Nobility, Royal Service and the Making of Absolute Monarchy in France, 1600-1789, Ann Arbor, University of Michigan Press, 1996. [ Links ] Sobre as hierarquias sociais no mundo ibérico, ver Rodrigo Bentes Monteiro et alii (org.), Raízes do privilégio. Mobilidade social no mundo ibérico do Antigo Regime, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, [ Links ] 2011 e as obras citadas acima na nota 4.
20. Ronald Raminelli, Viagens Ultramarinas, São Paulo, Alameda, 2008. cap. 5; [ Links ] Id. “As raças contra a nação: reflexões do médico Francisco Soares Franco” in: J. L. Cardoso, N. G. Monteiro e J. V. Serrão (orgs.) Portugal Brasil e a Europa Napoleónica, Lisboa, ICS, 2010. pp. 415-434 [ Links ]

Ronald Raminelli

Bruno Feitler

RAMINELLI, Ronald; FEITLER, Bruno. Apresentação. Tempo. Niterói, v.16, n.30, 2011. Acessar publicação original [DR]

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