Do Romantismo a Nietzsche: Rupturas e Transformações na Filosofia do século XIX – ARALDI (CN)

ARALDI, Clademir Luís. Do Romantismo a Nietzsche: Rupturas e Transformações na Filosofia do século XIX. Pelotas: Dissertatio Filosofia, 2017. Resenha de: MEIRELES, Tulipa Martins. Dos românticos a Nietzsche. Oito estudos sobre a Filosofia do século XIX. Cadernos Nietzsche, São Paulo, v.39 n.3  set./dez. 2018.

Compreendemos que o período moderno e contemporâneo da história da filosofia ocidental é permeado pelo sentimento de crise e crítica vivenciado pelo ser humano europeu no final do século XVIII e ao longo do século XIX. Nesse contexto, o indivíduo passa a perceber a si mesmo a partir do estabelecimento das novas estruturas do mundo moderno que afetam sua maneira de viver. Após o triunfo científico e a derrocada dos ideais religiosos e humanistas próprios de uma sociedade dominada pela secularização e industrialização das massas, a constituição do sentido da vida e das formas de existir encontram na criação artística, na concepção de Subjetividade, própria do Gênio, e na noção de Natureza criadora uma forma de unir o Espírito com a Natureza, a Ciência com a Arte. Essa atitude, como manifestação do sentimento e do conflito entre a interioridade inquieta e a realidade racionalizada, tanto quanto os esforços por preencher o “vazio moderno” a partir de ideais laicizados como os de progresso, razão e ciência, parece ter ocupado grande parte do pensamento dos artistas e filósofos da época, assumindo sua forma mais acabada e radical no pensamento tardio de Nietzsche1.

Em Do Romantismo a Nietzsche: Rupturas e Transformações na Filosofia do Século XIX encontramos uma seleção de estudos que oferecem um desenvolvimento para essa temática. A obra foi publicada em 2017 e constitui-se do material produzido em 2015 para a disciplina História da Filosofia Moderna e Contemporânea do curso de Licenciatura em Filosofia a Distância da Universidade Federal de Pelotas (CAPES – UAB). Ao selecionar os oito estudos que compõem essa obra e ao discutir com pensadores como Karl Löwith e Eric Hobsbawn, o autor propõe uma investigação sobre as “rupturas e transformações que se deram no âmbito da Filosofia Moderna e Contemporânea”. Essas transformações são tentativas de responder a questão: “Como a Filosofia reage ao triunfo das ciências naturais e da industrialização no século XIX?” (p. 2). Conforme expõe, o século XIX sentiu o impacto de dois importantes acontecimentos: a dupla revolução, francesa e industrial e o progresso tecnocientífico do mundo. Sua hipótese é que a dupla revolução no mundo ocidental e a consequente transformação no modo de viver das pessoas, gerou um desconforto por parte do indivíduo que sentiu o vazio deixado pela crise dos antigos valores que resultou em certo sentimento de perda do sentido da própria existência. A essa crise, a Filosofia encontrou nas noções de arte, natureza e subjetividade uma forma de conceber, pela via da arte, um caminho fecundo na direção de uma nova concepção de vida.

Nesse contexto, o Romantismo apresenta-se como uma das primeiras reações à secularização e à racionalização, propondo a criação artística e a Filosofia da arte como crítica às estruturas modernas, a partir da qual era possível ressignificar o mundo. O ímpeto revolucionário da arte e da criação artística perpassa os oito estudos propostos pelo autor, que encontra traços da atitude romântica de Schelling a Hegel, passando pelo Idealismo de Fichte e de Marx a Nietzsche, passando por Schopenhauer, Kierkegaard e o materialismo de Feuerbach. Nietzsche é apresentado como o filósofo que sustenta a crítica mais radical da modernidade. Ao anunciar a morte do Deus cristão como advento fundamental e a radicalização do niilismo moral consequente, o filósofo sustentaria a necessidade de instaurar um projeto de “transvaloração dos valores”, a partir do qual a criação de valores afirmativos da vida seriam possíveis.

O livro integra oito Capítulos e é precedido por uma Apresentação, na qual o autor expõe o tema geral, as principais problemáticas que serão tratadas e o desenvolvimento dessas questões por parte dos filósofos. A proposta dos românticos a Nietzsche torna visível tanto a crise da filosofia metafísica e moral como os novos caminhos que se abrem para a filosofia nessa época de crise e crítica da modernidade. Nelas são valorizadas as especulações românticas, assim como o reino da arte, no seio de uma época secularizada e dominada pela ciência natural. Araldi apresenta a riqueza do pensamento filosófico do século XIX, quando a modernidade passa a pensar a autossuperação de si mesma.

O capítulo 1, intitulado Os românticos e o idealismo alemão, é dividido em dois tópicos: Gênio, natureza e sentimento e Schelling e a filosofia da arte romântica. O autor apresenta o Romantismo como um movimento cultural, artístico e filosófico que pretendia através arte, do gênio artístico e criador, revolucionar todas as estruturas do mundo moderno. O Romantismo é caracterizado pelas noções de Subjetividade, próprias do gênio criador, de arte e de Natureza que se apresentavam como atitude, maneira de viver e movimento cultural e filosófico que tinham como objetivo preencher o “vazio da modernidade” a partir da união entre Espírito e Natureza. Pela arte e pela obra de arte os românticos manifestavam o caos e o desconforto que traziam dentro de si. Mesmo não sendo um movimento homogêneo, os românticos tinham em comum a busca pela “fuga da modernidade” que se dava no âmbito do refúgio em um passado remoto ou na projeção de um futuro utópico.

No contexto da “dupla revolução”, românticos como Hölderlin, Schlegel, Schelling e Schopenhauer consideravam que a Filosofia e a vida filosófica encontravam-se ameaçadas tanto pela política, como pela economia e pela ciência. Conforme Araldi, “A modernidade é marcada por abalos das estruturas religiosas, políticas e culturais tradicionais, assim como pelo pressentimento de novas formas de vida” (p. 9). Segundo ele, os românticos tinham consciência de que estavam vivendo em um período de transição para uma “nova era”.

Schelling é o considerado o principal filósofo do Romantismo, por ter construído uma Filosofia da Natureza que é também uma Filosofia da arte. Seu pensamento foi uma tentativa de unir a filosofia de dois pensadores importantes para o Romantismo: Fichte, filósofo da Subjetividade, que influenciou diretamente os românticos por ter valorizado o Espírito (Eu Absoluto) em sua Filosofia Idealista, e Goethe, através de sua concepção de Natureza criadora. Para Schelling, a Natureza possui um valor tão elevado quanto o Espírito, sendo também ela incondicionada, dinâmica e viva. O princípio originário em Schelling, como união entre Natureza e Espírito, não é, contudo, inteiramente racional e consciente, pois o Espírito não é somente razão, mas sobretudo vontade originária. Ainda que diferente de Schopenhauer, para quem a vontade é a própria origem consciente do mundo, a vontade para Schelling anseia pela consciência. A intuição estética, própria do gênio artístico, é considerada a via privilegiada para alcançar o princípio originário, pois a criação artística é o meio de tornar concreta a manifestação do Espírito. Schelling é nesse sentido considerado o pensador que traz os traços mais marcantes do Romantismo em sua Filosofia da arte, que é desenvolvida principalmente na obra Ideias para uma filosofia da natureza (1797).

O capítulo 2, intitulado De Fichte a Hegel: idealismo subjetivo e dialética especulativa, é composto por dois tópicos: Fichte e o idealismo da subjetividade e Dialética especulativa de Hegel. Segundo o autor, Fichte foi o filósofo que pretendeu unificar os antagonismos herdados da filosofia kantiana, tentando superar o dualismo entre o mundo da necessidade natural e o mundo do Espírito, da liberdade. Fichte fez a opção pela supressão de um dos termos e sustentou que o Espírito e sua interioridade eram o que havia de mais efetivo. Em sua obra Fundamento de toda Teoria da Ciência (1794) ao colocar o “Eu puro” no centro da filosofia teórica e prática, ele construiu um Idealismo da Subjetividade, que influenciou tanto o Romantismo como Hegel. Hegel, por sua vez, teria radicalizado a teoria da Subjetividade a partir da construção de uma “dialética especulativa”, na qual elaborou uma Metafísica da Subjetividade Absoluta, tendo sido o ponto culminante do Idealismo alemão.

Assim como os românticos, Hegel considerou a modernidade o momento de transição para uma época radicalmente nova, sendo o primeiro a desenvolver um conceito de modernidade propriamente filosófico. Em Fenomenologia do espírito (1807) o filósofo concebeu a filosofia como um processo histórico, sem, contudo, abdicar de pressupostos racionais e dialéticos. Assim, se Fichte está interessado pela história atemporal do Eu e Schelling pela história do mundo, da arte e dos mitos, Hegel estaria interessado pela “vida do Espírito” que ele considera um procedimento histórico no qual o Absoluto se manifestaria de maneira contínua, progressiva e racional. Sua intenção seria construir uma Filosofia da História, mostrando que o Espírito é história e que a História Universal resulta do Absoluto. No entanto, na visão do autor, Hegel não conseguiu unir satisfatoriamente os movimentos fenomenológicos com os históricos, nem sua Filosofia da História com a Filosofia do Espírito, pois ao valorizar a vida universal do conceito, Hegel teria desvalorizado as transitoriedades históricas. Seu método “dialético especulativo”, como o esforço sistemático para elaborar a primazia do Espírito diante das contradições e limitações do mundo histórico e real expôs, contudo, a miséria da filosofia idealista, e nesse momento a história entrou no período da crítica da esquerda hegeliana.

O capítulo 3, intitulado Feuerbach e a esquerda hegeliana é também apresentado em dois tópicos: Feuerbach, Hegel e a esquerda hegeliana e A crítica da religião e a antropologia. Segundo Araldi, a esquerda hegeliana considera-se a herdeira legítima da filosofia de Hegel e Feuerbach (1804-1872) é o filósofo que rompe com a “Direita hegeliana” escrevendo em 1830 a obra Pensamentos sobre a morte e a imortalidade, em que se afasta das tentativas de justificar o Estado e a Religião pela razão. Em 1839 escreve a obra Crítica da filosofia hegeliana, na qual compartilha com outros autores da esquerda hegeliana a proposta de “despotencializar a filosofia”. No entanto, Feuerbach é um filósofo recolhido demais para propor a transformação da filosofia em práxis. Ainda assim, foi um importante pensador do materialismo do século XIX, tendo construído uma filosofia como tentativa de reduzir a metafísica e a teologia à antropologia. Com essa redução o filósofo pretendia sustentar a verdadeira essência do cristianismo, que tinha como foco o indivíduo. Sua obra A essência do cristianismo, escrita em 1841, teria sido muito relevante, segundo Engels, por pelo menos dois aspectos: por seu materialismo, a partir de sua concepção de natureza; e pela crítica à religião, que teria influenciado Marx. Segundo Araldi, a antropologia de Feuerbach consiste na compreensão de que todos os resultados da religião podem ser reduzidos à essência humana, definida como Razão, Vontade e Coração.

O capítulo 4, intitulado A dialética e a práxis histórica em Marx é apresentado em três momentos: A crítica a Hegel: a miséria da filosofiaA dialética como práxis histórica e Fim da Filosofia, Fim da História? Do círculo dos jovens hegelianos de esquerda, Marx foi o pensador que mais se destacou ao propor a superação da Filosofia a partir de uma crítica da sociedade inseparável da práxis revolucionária. Segundo o autor, a crítica de Marx a Hegel se dá pelo caráter abstrato atribuído ao homem. Hegel concebe a essência do homem como autoconsciência, pensamento puro e nesse sentido, a alienação para ele, é alienação da autoconsciência. Diferentemente, para Marx, a autoconsciência é apenas um aspecto da natureza humana e seu interesse é investigar a “alienação efetiva”. Desse ponto de vista, a dialética para ele consistiria no esforço em recuperar as forças essenciais do homem, que foram alienadas, e nasceram para a objetivação, concebendo o homem como ser objetivo e natural. Com relação a sua práxis histórica, o jovem hegeliano propôs uma Filosofia como “crítica interventora”, na qual concebeu a possibilidade de transformar a práxis histórica, política e social a partir da tomada de consciência do sujeito humano, em meio às tensões da sociedade. Para ele, esse caminho da sociedade culminaria no “comunismo”. O que move o processo histórico, em sua concepção, são as próprias capacidades dos seres humanos: a produção, o trabalho e a práxis social.

O capítulo 5, intitulado Schopenhauer, o pessimismo e o valor da vida, é exposto a partir de três tópicos: O pessimismo na juventude de SchopenhauerO Pessimismo e a sabedoria dos Antigos e A vontade de viver, o ascetismo e o Nada. Nesse capítulo o autor sustenta que o tema do pessimismo esteve presente no pensamento de Schopenhauer desde sua juventude. Ainda que não tenha sido uma invenção sua, pois o pessimismo já estava presente na Antiguidade, tanto na filosofia como nas religiões, o pensamento de Schopenhauer é considerado ‘a forma mais acabada de pessimismo’. O filósofo pretendeu construir uma metafísica maior, ‘verdadeira’, que é também uma arte da vida, assente na ascética, sendo esta a proposta de uma “arte de viver pessimista” e afirmativa.

Em O mundo como vontade e representação Schopenhauer desenvolve sua “Verdadeira metafísica” que considera a vontade como o que há de mais essencial e originário, ela é a “coisa em si”. Para ele, o mundo dos fenômenos possui em relação ao mundo da representação uma preocupação prática, ética e ascética, que torna difícil justificar uma separação entre o mundo e a vontade. Enquanto “coisa em si”, a vontade é a essência do próprio fenômeno, mas ao mesmo tempo em que é independente, ela penetra no mundo para poder se manifestar. Para ele a vontade, ao se manifestar, abre a possibilidade para a “autorredenção”. A proposta do filósofo é conceber uma vontade que seja capaz de alterar o próprio querer e assim negar a vontade de viver.

Para ele, a vida é um constante necessitar e o homem é a manifestação concreta do querer que busca incessantemente saciar suas necessidades e logo após é conduzido ao tédio e à dor. A vontade de querer viver é nesse sentido negativa e consiste na passagem para o “nada”. Sua perspectiva sobre a vida ocorre, portanto, a partir da recusa no núcleo da vida e do vivente, no sentido de elevar-se acima do querer. Essa perspectiva é “relativa e fugaz”, proveniente de um indivíduo que a partir de si, se volta contra os instintos de dentro e de fora de si. Nesse movimento ele pode retornar a si transformado, mas nunca abandona completamente seu ser. A forma mais eficiente de arrancar-se dessa existência, para Schopenhauer, está no âmbito da ascese, mas também da arte e da ética. Assim, em meio às esperanças revolucionárias do século XIX, Schopenhauer quer livrar-se das paixões da vida e das ilusões modernas a partir de uma “arte pessimista de ser feliz”. Segundo o autor, o pessimista teria sido um dos primeiros a criticar o pensamento idealista de Hegel, por não considerar a efetividade do mundo, os sofrimentos do mundo, que ele compreendia como vontade e representação.

O capítulo 6, de título Kierkegaard: o indivíduo, o desespero e a fé cristã é constituído também por três seções: Kierkegaard e seu tempoDa estética para a ética: por que Don Juan e Abraão se desesperam? E A doença para a morte. Segundo o autor, o filósofo dinamarquês buscou a superação da filosofia na religião, na fé e no desespero, a partir da estética e da ética. Para ele, o indivíduo decidido a si mesmo só poderia superar o desespero da existência no confronto com Deus. No contexto da existência transitória e angustiante da vida moderna, Kierkegaard sustentou que o indivíduo experimenta possibilidades de liberdade que o levam ao desespero. A angústia está na base da subjetividade própria do ser humano, tanto no estágio estético em que o indivíduo se depara com toda a transitoriedade da vida, como no estágio ético, em que se defronta com seu “eu mais próprio”, não podendo se furtar de assumir a tarefa de sua existência. O desespero, enquanto aspecto abstrato, pode ser considerado em Kierkegaard uma vantagem do ser humano em relação aos outros animais, mas pode também ser visto, como uma das “piores misérias”. Para ele é somente pela fé cristã que o homem consegue elevar-se acima do desespero, consistindo no ápice do desenvolvimento espiritual do ser humano. Contudo, segundo Araldi, o pensamento de Kierkegaard apresenta um paradoxo filosoficamente desafiador, a partir da concepção de um indivíduo único, como um Si-mesmo, que se eleva diante de Deus.

O capítulo 7, intitulado O positivismo e as ciências no século XIX, apresenta a importância filosófica do positivismo do século XIX com relação as ciências naturais que se consolidavam em todas as esferas da vida humana, em duas seções: Auguste Comte: a física social e a lei dos três estados e Spencer e o positivismo evolucionista. O positivismo de Comte é considerado a expressão do triunfo das ciências naturais no século XIX e também signo de uma nova mentalidade cientificista que tinha pretensão de torna-se a “nova religião”. A partir de sua “física social”, Comte pretendia compatibilizar a visão humanista com os progressos científicos, mas acabou em uma visão dogmática. Spencer por seu lado, pretendia compatibilizar as aspirações humanas e morais com o pensamento científico a partir de uma ciência moral e social, pela fisiologia. Nesse capítulo vemos os esforços da filosofia para preencher o vácuo da modernidade através da compatibilização com o progresso científico. Será, contudo, com Nietzsche que essas ideias encontrarão uma radicalização mais acentuada e à filosofia ficará a tarefa de “criar novos valores”, como tentativa de unir a ciência com a arte.

O capítulo 8, intitulado Nietzsche: a crítica da moral e a filosofia do futuro, é constituído por cinco tópicos: As três transmutações do EspíritoA crítica da moral em Humano, demasiado humanoA crítica da modernidade em Além do bem e do malA genealogia da moral e A criação de novos valores e a filosofia do futuro. Nesse capítulo, o autor apresenta os aspectos críticos e criativos do pensamento de Nietzsche, que busca ir além da modernidade ocidental, não só na moral, mas na metafísica e na religião. A partir da ênfase na tarefa afirmativa deixada à filosofia do futuro, como tentativa de compatibilizar a ciência com a “ética-estética”, encontramos nesse capítulo um dos projetos mais ambiciosos do século XIX para superar a crise dos valores.

A partir da exposição sobre Das três transmutações, discurso presente em Assim falou Zaratustra, o autor apresenta a tentativa ali presente de “abarcar todo o movimento do espírito humano, da vida do próprio Nietzsche e da história da filosofia ocidental” (p. 117). Segundo Araldi, estaria na base do pensamento de Nietzsche a ideia de uma “transmutação radical” na qual o indivíduo, livre dos valores transcendentes, buscaria ultrapassar a si mesmo para criar novos valores.

Através da criação da Filosofia do Espírito Livre, presente na segunda fase do pensamento de Nietzsche, o filósofo buscaria libertar-se dos mestres Schopenhauer e Wagner, que até então marcavam seu pensamento, buscando refúgio na ciência, no filosofar histórico, no positivismo e na psicologia moral de Paul Rée. A proposta de uma ‘história efetiva da moral’ teria sido realizada nas últimas décadas do século XIX, momento no qual Nietzsche compartilha com Paul Rée a derivação dos sentimentos morais a partir dos sentimentos de prazer e desprazer. Perspectiva que irá mudar na fase tardia, com o desenvolvimento da doutrina da vontade de potência que passa a ser o novo critério para a avaliação dos valores morais.

Em Além do bem e do mal, obra do período tardio do pensamento nietzschiano, a história natural da moral ganharia um novo desenvolvimento a partir do método de análise genealógico. Para Nietzsche, a vontade de potência foi o critério utilizado para criticar não só os valores morais tradicionais, mas também para estabelecer novos e construir uma tipologia da moral, que definiu dois tipos de moral: uma afirmativa, proveniente da moral dos senhores, e uma moral negativa, proveniente da moral dos escravos. O projeto de naturalizar a moral em Além do bem e do mal encontra, contudo, lacunas que Nietzsche irá tentar preencher em Genealogia da moral. Mas essa obra também não esgota o estudo sobre a história da moral e suas consequências niilistas, deixando a promessa para um estudo que estaria por vir: A vontade de potência que, no entanto, não fora concluída.

Ao distinguir o surgimento de dois tipos de moral, a moral dos senhores e a moral dos escravos, o genealogista mostra que no tipo nobre, o valor de bom, se refere ao que provém dos instintos fortes da vida. Em oposição, ruim, é tudo aquilo que é desprezível e fraco em relação ao nobre, que é forte. Para o tipo de homem da moral escrava a moral nasce a partir da forma de valorar do fraco: o bom é tudo que se opõe ao nobre, guerreiro, forte e dominador, que é considerado mau na moral escrava. Nietzsche compreende a forma de valorar do sacerdote ascético nos seguintes termos: “Ao ‘dizer-não’ para o odiado nobre, ao voltar-se para fora de sua existência malograda, o sacerdote propriamente não cria, mas inverte valores” (p. 129). A história da moral teria sido assim, dominada por essa inversão dos valores. Para ele, se a moral escrava triunfa é a partir da negação dos instintos afirmativos da vida, considerados bons na moral dos fortes. A análise genealógica, nesse sentido, apontaria a fonte moral não só da verdade e da religião, mas da metafísica e da ciência.

Conforme o autor apresenta, no período tardio das obras de Nietzsche, entre 1885-1888, o filósofo insere o caráter artístico no procedimento de criação de valores. Para Nietzsche, a moral poderia ser justificada como fenômeno estético, na medida em que os juízos e valores morais teriam origem em percepções estéticas, sem o suporte das oposições metafísicas. O projeto de reduzir a moral à estética, presente nos escritos tardios, deveria, contudo, ser questionado. Segundo o autor, esse projeto está no âmbito do indivíduo singular que se colocaria para além do período moral da humanidade. Para Nietzsche, o indivíduo soberano é aquele que, liberado da moralidade dos costumes, é igual apenas a si mesmo. O indivíduo soberano, considerado um indivíduo singular e autônomo, estaria no final do processo da história universal da moral. Ele encontrar-se-ia, portanto, no período “extramoral”, cuja condição é a naturalização do homem, que se torna possível através da investigação genealógica-histórica da moral. Para Nietzsche, a própria moralidade revelaria a imoralidade reinante tanto na natureza como na história.

Para o autor, Nietzsche seria precursor de uma “nova filosofia afirmativa”, como intenção de superar a moralidade consolidada no homem moderno. No entanto, teria se restringido a investigar criticamente a história natural da moral e lançado à filosofia do futuro a tarefa de afirmar a si mesmo pela via ético-estética – que consiste na sua tentativa de romper com a crise do mundo moderno. Segundo Araldi, é somente pela arte que a existência pode ser afirmada para Nietzsche. E para propor valores não-morais, como uma arte afirmativa de si mesmo, o homem precisa se liberar dos velhos valores herdados da tradição europeia. E nesse sentido, o projeto de naturalizar a moral, auxiliaria na tarefa deixada aos filósofos do futuro.

Ao final de sua trajetória Do Romantismo a Nietzsche, o autor deixa o questionamento: “Num mundo dominado pelas ciências, o que resta para a filosofia?” (p. 136). Esse questionamento encontra ao longo dos estudos selecionados por Clademir Araldi o seguinte desenvolvimento: a filosofia do século XIX buscou na união tanto do Espírito com a Natureza como da Arte com a ciência uma maneira de reagir ao vazio deixado na modernidade. Por meio desses estudos recentes, compreendemos que o filósofo alemão descreveu o espírito moderno a partir do niilismo moral, enquanto um processo que encontra aí sua forma mais radical. Esse sentido já estava presente em seu trabalho anterior Para uma caracterização do niilismo na obra tardia de Nietzsche (1998), a partir da qual percebemos que a criação de novos valores como forma de conceber uma maneira de viver afirmativa torna-se necessária. Em Do romantismo a Nietzsche o autor insere tal problemática no contexto histórico da filosofia moderna e contemporânea que se apresenta como crítica mais radical a esse estado de crise já reivindicado pelos primeiros românticos.

Da subjetividade do gênio criador à tentativa de reduzir a ética à estética a partir de uma análise genealógica dos valores morais, vemos um percurso na história do pensamento ocidental que privilegia a via artística como tentativa de conceber a noção de vida, a partir de um indivíduo, que para além da moral e do progresso tecnocientífico, busca dar um sentido afirmativo à existência. Em nossa concepção, a aposta nos filósofos do futuro, enquanto criadores de novos valores, deixa, portanto, essa tarefa a ser realizada pela filosofia: a de conceber novos valores para a vida, que encontra na trajetória dos românticos a Nietzsche, como herança do ímpeto tempestuoso e ao mesmo tempo criador da modernidade, uma via significativa.

Referências

ARALDI, Clademir. Do romantismo a Nietzsche: rupturas e transformações na filosofia do século XIX. Pelotas: NEPFIL Online, 2017. [ Links ]

ARALDI, Clademir. Para uma caracterização do niilismo na obra tardia de Nietzsche. Cadernos Nietzsche, São Paulo, n. 5, p. 75-94, 1998. Disponível em: <Disponível em: http://www.gen.fflch.usp.br/sites/gen.fflch.usp.br/files/upload/cn_05_05%20Araldi.pdf >. Acesso em: 30/04/2018. [ Links ]

HOBSBAWM, Eric. A Era das revoluções: Europa 1789-1848. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1998. [ Links ]

Notas

1 Assim, percebemos que se a ideia que dominou o século XX deixou de lado a compreensão das raízes românticas do século XIX, o historiador Eric Hobsbawm em A Era das Revoluções: Europa 1789-1848 ([1998]) apreendeu diferentemente esse significado, atribuindo grande valor a Filosofia da Natureza Romântica para o século XIX, contribuindo inestimavelmente para o pensamento filosófico contemporâneo, na mesma esteira seguida por Araldi.

Tulipa Martins Meireles – Doutoranda da Universidade Federal de Pelotas, UFPEL, Pelotas, RS, Brasil. E-mail: [email protected]

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Après Bergson: portrait de groupe avec philosophe – BIANCO (RFMC)

BIANCO, Giuseppe. Après Bergson: portrait de groupe avec philosophe. Paris: PUF, 2015. Resenha de: SOUZA, Herivelto P. Revista de Filosofia Moderna e Contemporânea, Brasília, v.4, p. 141-146, n.1, 2016.

  1. Como se escreve a história (da filosofia)?

Em Après Bergson: portrait de groupe avec philosophe, o pesquisador Giuseppe Bianco apresenta uma versão reduzida e modificada de seu trabalho de doutorado, no qual a recepção da obra de Henri Bergson no pensamento francês contemporâneo — com especial ênfase à “prosa de ideias”, ou seja, ao âmbito filosófico — é exposta de maneira minuciosa e bem documentada, destrinçando e alinhavando os mais diversos fatores que compõem aquilo que se pode chamar de “a herança intelectual” dessa que se tornou uma figura maior do cânone filosófico. O assunto convoca logo de saída questões metodológicas que podem perturbar adeptos de uma historiografia da filosofia mais, digamos, ortodoxa (à la Gueroult ou Goldschmidt), uma vez que experiências intelectuais que deram ensejo a importantes posicionamentos filosóficos são retratados não em sua coerência sistêmica autorreferenciada, mas em meio a teias de relações reconstruídas e analisadas a partir de uma abordagem que retoma instrumentos da história das ideias e da sociologia do conhecimento1 . Uma das conquistas mais evidentes desse tipo de postura é a de se retirar o discurso filosófico de um suposto lugar aquém (primeiro, mais fundamental) ou além (último, mais acabado) de outras formas discursivas, de modo tal que conceitos possam mostrar a amplitude de sua eficácia histórica e teórica. Nesse sentido, é feliz a escolha de submeter o caso Bergson a esse tipo de escrutínio, já que se trata de um autor que mobilizou os mais diversos tipos de reação; e embora possa-se perguntar com qual grande filosofia o mesmo não ocorreu, fato é que o século XX francês foi palco de uma profusão teórica muito significativa, no qual comentário de texto e reflexão original não se apartaram, tendo a obra bergsoniana constituído aí um referencial incontornável. Mas para compreender adequadamente tal cenário, noções como as de autor, obra ou escola não podem não ser problematizadas, pois se não se leva em conta os modos pelos quais são remanejadas em cada caso, perde-se de vista boa parte das nuançadas vicissitudes pelas quais uma experiência intelectual pode mostrar seu impacto, sem que aí esteja pressuposto qualquer resquício de teleologia, o que tornaria inevitável a leitura de que a tal “glória” de Bergson estivera já prenunciada por tal ou qual fator que se queira destacar.

Dessa forma, o estudo de Bianco distanciase também de um tipo de reconstrução que se restringe a interlocuções privilegiadas, aquelas nas quais se tenta mostrar como a influência mais decisiva de um determinado autor é um determinado outro autor. Isso deverá causar uma certa estranheza a quem possa estar muito habituado a algo que se encontra de maneira recorrente em trabalhos de história da filosofia; logo nos primeiros parágrafos do livro explicita-se essa escolha metodológica:

A despeito da problematização de noções como as de autor, obra e de continuum biográfico, introduzida em história intelectual por Foucault, Barthes e Bourdieu, a ideia desacreditada de que a produção filosófica seja redutível a uma performance solitária vinculável a uma subjetividade criadora e cujo objetivo é o de construir uma obra ou um sistema permanece tenaz quando se chega à metodologia realmente utilizada pelos historiadores da filosofia. Nestas páginas, os personagens se comportam diferentemente: eles pensam e falam sempre, para retomar a expressão de Judith Schlanger, “com a boca cheia”. Cada um deles fala em seu nome, mas com a boca cheia das noções, dos conceitos, das torções, das expressões, dos tiques de linguagem, das posturas de outros. Tenta-se assim seguir um programa forte que visa fazer desaparecer, do ponto de vista metodológico, a distinção entre personagens principais e personagens secundários, entre os grandes e os pequenos, entre os indivíduos e os “dejetos’”, para retomar a terminologia de Böll. (BIANCO, 2015: 4)

Qualquer leitor do livro perceberá com qual seriedade o compromisso com tal programa metodológico é seguido, e a que ponto se adensa conceitualmente a imagem do campo intelectual no qual o bergsonismo se inscreve, ou melhor, o campo que o mesmo ajudar a compor, de maneira decisiva.

Temos, portanto, uma história da filosofia cuja temporalidade não é linear, marcada pela regularidade de uma sucessão (de autores, doutrinas, etc.), mas plural, com diferentes escalas ou ritmos, uma temporalidade na qual o surgimento e consolidação de “-ismos” ou de “modas” podem ser postos em confronto com “a história dos programas, das instituições e das disciplinas” (2015: 7). O que muda? Para citar apenas um emblemático exemplo, a opinião um tanto aceita e repetida de que Bergson, até a publicação do livro de Deleuze de 1966, seria um “cachorro morto”, cuja obra sequer era lida ou vista como relevante, pode ser vigorosamente problematizada, se não rechaçada, mostrando-se 1) como antes mesmo de toda a celebração do centenário, em 1959, desde os anos 1940 aliás, obras como A evolução criadora e Matéria e memória já figuravam no programa da agrégation, e que, para professores “como MerleauPonty e Jean Hyppolite, os cursos de agrégation representam uma oportunidade para colocar Bergson em relação a outras correntes filosóficas contemporâneas” (2015: 258); 2) mostrando-se também que, mesmo durante os anos da hegemonia estruturalista, é possível encontrar menções a conceitos bergsonianos no interior de debates centrais. Ora, o livro oferece suficientes elementos de que seria muito mais justo falar em uma espécie de presença subterrânea de Bergson do que em sua ausência ou falta de relevância, pois fica claro que os conceitos bergsonianos foram sempre bastante frequentados e, é claro, muito criticados. Mas alguém ainda acredita que o impacto de uma experiência intelectual, ou a relevância de uma herança conceitual, efetiva-se apenas pela via do elogio? A frequentação de textos filosóficos fornece sem dificuldades exemplos de como, às vezes, quem se pretendeu o mais fiel seguidor tenha acabado por constituir, por assim dizer, um grande deturpador da obra de seu mestre, não porque haja um lastro que possa assegurar uma interpretação unívoca de um texto, mas justamente por causa da ausência da mesma.

  1. Uma aufhebung histórica do bergsonismo?

A reconstrução que o livro apresenta é escandida em três tempos, que segundo o autor correspondem, grosso modo, a três “momentos” da filosofia francesa contemporânea: o do “espírito”, o da “existência” e o da “estrutura”. Contudo, a divisão tripartite do livro não representa uma separação da recepção da obra bergsoniana em fases estanques, ou mesmo progressivas, na medida em que permite acompanhar as diferentes estratégias de apropriação dos diversos aspectos do pensamento bergsoniano. Nessa direção, o livro de Bianco é precioso, pois aspectos inauditos da centralidade do bergsonismo são trazidos à tona, não desacompanhados das referências a aspectos já há muito explorados, com diferentes níveis de aprofundamento: as críticas de Alain e alguns de seus principais seguidores – com destaque para o imbróglio que envolveu a participação francesa na primeira grande guerra -, bem como aquelas dos neokantianos franceses; as dívidas e rupturas dos existencialistas e fenomenólogos franceses; o estruturalismo e o papel de suas teses na rejeição do bergsonismo como uma espécie de psicologismo; a recepção por parte de um pensamento filosófico cristão, bem como a criação da “Sociedade dos amigos de Bergson”; a atenção que as assim chamadas “ciências psi” (psiquiatria, psicologia, psicanálise) deram à guinada introspectiva presente no pensamento bergsoniano; a importância que teve para vanguardas artísticas e literárias; a reviravolta desencadeada pela retomada deleuzeana da filosofia de Bergson. Como se pode vislumbrar, pouco escapa ao olhar atento de Bianco, embora, como já indicado, ele dedique fôlegos diferenciados a cada um desses diversos pontos.

A primeira parte do livro persegue as vias pelas quais se constitui, no cenário filosófico francês dos dois primeiros decênios do século XX, uma polarização entre “intelecção” e “intuição”, ou seja, uma tensão opositiva entre o modo pelo qual os neokantianos retomam o trabalho de fundamentação das condições de possibilidade do conhecimento racional e os efeitos da proposição bergsoniana de um método para a metafísica centrado no acesso intuitivo ao imediato. Em jogo aí está a ressonância das ideias de Bergson e os modos pelos quais elas logo geraram reações críticas muito severas. Entre as primeiras que se configuraram, e que tiveram seu impacto no modo como Bergson foi lido no decorrer do século, merecem destaque da parte de Bianco: 1) o ensino de Alain no Liceu Henri-IV, ao qual estiveram vinculados, entre outros, Canguilhem, Hypollite e Simone Weil; 2) duas frontes dominantes na Sorbonne à época: o neokantismo, proeminentemente impulsionado por Léon Brunschvicg, e a escola durkheimiana capitaneada por Célestin Bouglé; e 3) a tomada de partido em favor da teoria da relatividade por ocasião do confronto da metafísica de Bergson com a física de Einstein, exemplarmente manifesta na obra de Bachelard. O livro defende que essas “três barreiras antibergsonianas […] se combinam e influenciam a elaboração de textos na fronteira entre filosofia e prosa de ideias em um momento no qual a filosofia universitária não oferece perspectiva de carreira aos novos ingressantes.” (2015: 108) Com efeito, trata-se de um conjunto de perspectivas críticas a partir das quais a obra bergsoniana se viu continuamente sob ataque, já que a consideração de que o método da intuição é insustentável — uma vez que acaba por deixar o pensamento sem uma efetiva ancoragem no objeto — tem incidência não apenas epistemológica (impossibilidade de dar conta das condições de possibilidade da objetividade dos juízos), como também ético-política (sem ponto de referência, a razão torna-se refém das paixões, enreda-se em um inaceitável relativismo). Levado a seu ponto extremo, esse psicologismo ressaltado como inerente à intuição redundaria nitidamente em solipsismo: o pensamento bergsoniano padeceria então de todas as desastrosas consequências daí oriundas.

Ao longo de páginas muito estimulantes, a segunda parte do livro aborda a face que o bergsonismo adquire no panorama intelectual do entre-guerras, período decisivo no qual eclode a filosofia existencialista, consolida-se a influência da fenomenologia, sem perder de vista como se movem algumas peças importantes do tabuleiro, como Canguilhem, Lacan ou Jankélévitch. Mas tudo isso aparece precedido pela exploração mais detida dos movimentos argumentativos contidos na peculiar obra de um autor que representou um verdadeiro ponto de referência intelectual: trata-se de Georges Politzer. E isso não apenas por que crítica epistemológica e crítica política encontram aí uma espécie de sintonia perfeita, a ponto de se tornarem inseparáveis, mas sobretudo pela potência conceitual resultante desse embate crítico, com a proposta de que uma psicologia epistemologicamente consistente deveria estar assentada na noção de concreto. Este é um ponto que exige muito cuidado, pois quem conhece a obra de Bergson sabe que a noção de concreto é mobilizada para criticar o modus operandi abstracionista da velha metafísica. Politzer faz tal crítica voltar-se contra o próprio Bergson, e Bianco faz questão de apresentrar detalhadamente o que está em jogo: o cerne da crítica politzeriana reside na leitura de que tudo o que a filosofia da duração consegue fazer é dinamizar um pouco a fixidez das hipóstases da psicologia clássica, uma vez que generalidades sobre o fluxo do tempo em sua dimensão qualitativa não são suficientes para desvencilhar-se daquele realismo criticado. Tomar o qualitativo como princípio de individuação, tendo o fluxo dos dados imediatos do vivido como solo do sentido, seria relegar a experiência concreta do indivíduo no mundo a uma mera espécie de registro introspectivo. Afinal, para Politzer, a clivagem entre prático e especulativo, entre inteligência e intuição, entre espaço e duração dá-se ainda dentro do horizonte realista da metafísica, de modo que a adesão bergsoniana a um dos lados da separação o mantém rigorosamente apartado do concreto.

Ora, a leitura politzeriana será fortemente empregada por diversos autores que, mesmo antes do impacto do estruturalismo na filosofia e nas ciências humanas, criticarão incisivamente Bergson por todo seu descrédito com respeito às capacidades da linguagem em dar conta do objeto do pensamento. Ela será ainda uma ferramenta preciosa nas mãos de autores como Lacan, Foucault e Althusser, quando cada um, a seu modo, posicionar-se contra uma tendência ecletista na psicologia. Para Lacan, por exemplo, será ocasião de responder a uma série de críticas recebidas, as quais ele rotula, em 1935, como “intuicionismo bergsoniano”, colocando em relevo as consequências irracionalistas do mesmo. Por outro lado, o livro acompanha a série de mediações teóricas que levam a uma virada na avaliação da filosofia de Bergson por Canguilhem, o qual, enquanto jovem alainista, seguia de perto as críticas de seu mestre, mas que retorna mais tarde ao textos bergsonianos, encontrando neles elementos importantes para pensar as relações entre técnica e ciência sobre o pano de fundo de uma consequente reflexão filosófica sobre o vivente.

A leitura canguilhemiana não será desprovida de consequências para as formas pelas quais Bergson será lido em seguida. Ao lado daquela empreendida por autores como Jean Hyppolite, Raymond Aron ou Paul Ricœur, os quais tinham como uma questão central a história, a terceira parte mostra como a noção de vida é importante para a crítica do humanismo como resquício de uma metafísica a ser abandonada, problema que o pensamento francês articula a partir do influente texto heideggeriano de 1947.

Mas eis que a trama de reconstituição teórica da herança intelecutal bergsoniana enfim trata da “criança monstruosa” resultante da leitura à contrapelo realizada por Gilles Deleuze. Aqui, temos ocasião não apenas de ponderar elementos do percurso formativo que permitiram a configuração desse modo muito peculiar de se debruçar sobre a história da filosofia, como também – e, com isso, alcançamos talvez o ponto alto do livro – somos colocados em presença de uma articulação teórica decisiva a partir da qual da noção de diferença advirá uma espécie de centro de referência para a vindoura constelação conceitual deleuzeana, que se estabiliza, por assim dizer, com Diferença e Repetição. Destaque-se a atenção dedicada a escavar a gênese desse problema a partir de dois textos aparentemente menores, mas que ganham uma importância inaudita quando inseridos no desenvolvimento da produção teórica deleuzeana: a resenha de um livro de Hyppolite sobre Hegel e o artigo sobre a concepção de diferença em Bergson. Se Deleuze elogia o esforço interpretativo de Hyppolite em desvincular o sistema hegeliano de uma impostação antropológica, em favor da ontologia como dimensão mais fundamental, seu confronto com o bergsonismo o fará ressaltar aí essa passagem como já algo acabado, isto é, como uma filosofia cujos conceitos nos permitem pensar a diferença em si mesma, em sua imanência ao real, e não a partir de um quadro de projeções que a prenderiam, na experiência e, consequentemente, em certo regime de pensamento, como um sistema fixo de oposições. Ora, a operação deleuzeana é muito hábil em elevar a problema central esse tema da diferença, que, a rigor, “é totalmente ausente da obra de Bergson” (2015: 293), sem que se trate, no entanto, de uma imposição arbitrária à mesma: afinal, uma tal “singular perversão do bergosnismo” (2015: 296) envolve mostrar como a intuição pode ser rigoroso “método de compreensão do real” (2015: 298), uma vez que a consistência do real é durativa, isto é, “se diferencia imediamente consigo mesma” (2015: 301).

Ainda que por menções breves, mas sem jamais cair em generalizações grosseiras, Bianco deixa registrado como o confronto com Bergson será profícuo e se estenderá até o final do percurso intelectual de Deleuze, o qual coincide com os últimos decênios do século XX, do qual o livro nos fornece um panorama sucinto, com ênfase no papel do bergsonismo dentro do debate entre Deleuze e Badiou acerca da teoria das multiplicidades.

  1. Experiência ou conceito?

Ao fim da leitura surge uma estranha impressão de ter passado por todo um livro sobre o bergsonismo sem se deparar com qualquer citação do próprio autor. O curioso é que não se deve esperar do livro um comentário textual de Bergson, pois seu propósito é reconstruir os diversos modo de apropriação de uma obra em um determinado contexto histórico. Assim, possíveis críticas de que tenha faltado entrar no mérito da análise textual dos argumentos são descabidas na medida em que isso foge ao escopo do estudo. De fato, como o próprio autor aponta logo de saída, o livro não é bergsoniano. Mas não conter análise e citações de Bergson parece estratégico, pois permite tornar manifesta uma certa “ausência do autor” que coloca em relevo as modalidades discursivas de apropriação que justamente configuram a complexa feição de determinado autor.

Ora, tal feição é o resultado de textos em confronto com textos, e a nitidez dela dependerá de como esse entrelaçamento textual é apreendido. Ora, Bianco sabe muito bem que a trama aí é bem intrincada, na medida em que os textos não são apenas unidirecionalmente voltados para Bergson, mas se atravessam e dialogam entre si, extrapolando a referência ao autor privilegiado pelo recorte. E se há todo o esforço de dar conta das relações entre eles, em certas ocasiões alguns elementos poderiam ser mais explorados, como o papel de Koyré no contexto das críticas epistemológicas, ou mesmo nomes como Ruyer e Simondon, que não apenas eram leitores atentos de Bergson, mas tiveram uma parcela não negligénciável de importância para autores bem mais conhecidos como Canguilhem, Deleuze e Lacan (no caso do primeiro). Não se trata, é claro, de apontar tal ou qual aquela referência faltante, e sim de ressaltar em que medida o assunto é complexo, dada a profusão de experiências intelectuais originais em jogo, e de como a tarefa de realizar um retrato consequente é muito mais árdua do que pode parecer.

De qualquer forma, o livro não se destina apenas a quem quer conhecer melhor o contexto histórico de recepção da filosofia bergsoniana, mas deverá interessar bastante a pesquisadores dedicados a compreender o aparato conceitual da mesma, na medida em que tais conceitos são empregados em problemáticas diversas. Particularmente rico é o lugar atribuído a Bergson na oposição, tornada famosa por Foucault, entre experiência e conceito, pois Bianco dedica uma seção a mostrar, retomando o que já havia analisado de maneira mais demorada anteriormente2 , como tal oposição é incapaz de dar conta do que representou o bergsonismo, tanto em uma insidiosa influência subterrânea, quanto em seu recente interesse renovado para discussões muito próximas de problemas científicos.

Conta-se que o Prof. Bento Prado Jr. costumava dizer, acerca da filosofia francesa contemporânea, que todo mundo havia lido Bergson. Com este livro de Bianco podemos compreender melhor o como e o porquê daquela afirmação.

Notas

1 Na Introdução várias páginas são dedicadas às devidas considerações e justificativas metodológicas, nas quais as escolhas de certos instrumentos e objetos de análise é explicada — como, por exemplo, a forma pela qual textos bergsonianos são introduzidos na composição de programas, disciplinas, discussões, etc. Do ponto de vista de alguém interessado na minuciosa reconstrução sistemática da obra de um autor, tais justificativas podem não parecer convincentes de saída. Cabe ressaltar, no entanto, que o desenvolvimento do livro deixa bastante claras as dinâmicas de funcionamento do “campo filosófico” relevantes para o assunto, aí inclusas suas tensões e transformações em um período de muita reviravolta política e efervescência cultural, de modo que o “retrato de grupo” resultante possui uma notável densidade histórica, com a devida descrição da trama teórica envolvida.

2 Cf Bianco, G. Experience vs. Concept? The Role of Bergson, in Twentieth-Century French Philosophy, in: The European Legacy, vol. 16, n. 7, p. 855-872, 2011.

Herivelto P. Souza – Professor do Departamento de Filosofia UnB.

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Uma vida humana – COSTA (RFMC)

COSTA, Uriel da. Uma vida humana. Tradução, posfácio e notas de João Alberto da Costa Pinto. Goiânia: Editora da Universidade de Goiás, 2015. Resenha de: RUFINONI, Priscila Rossinetti. Revista de Filosofia Moderna e Contemporânea, Brasília, v.3, p. 171-175, n.2, 2015.

Entre dois anjos: Gabriel-Uriel da Costa

O pequeno livro que a UFG dá a público, na tradução de João Alberto da Costa Pinto, em edição do selo Todo Tipo, é um documento estranho da história da filosofia. Escrito provavelmente em 1640, em latim, com o título Exemplar humanae vitae, trata-se não apenas de um opúsculo de debate teológico, ou canônico, mas da suposta carta de um suicida que, após o desenlace fatal, foi reproduzida por cultores e detratores do judaísmo. Não temos, portanto, o texto pela mão de Uriel, mas citado por outrem. Na encruzilhada de um opúsculo confessional, embora apócrifo, o texto quer dar forma a uma vida, concedendo-lhe, não necessariamente essência, mas o sentido natural de uma conclusão honrada. Assim, não é exatamente a carta de um suicida. Aliás, como bem atenta Cecília Michaëlis de Vasconcelos, o vocábulo “suicida”, de origem francesa e posterior ao acontecido, não se aplica aqui tão certamente quanto o próprio latino homicidium sui, ou o grego eutanásia (VASCONCELOS, 1922: 56).

Que não se espere, entretanto, texto apressado, escrito no calor da hora, ou composição retórica confessional. Apesar de sabermos, por comentadores e pelo próprio Uriel da Costa, que este conhecia e compunha bem em latim, ou seja, que era versado na arte da escrita, não se trata de uma peça de retórica confessional, composta sob essas regras (cf MORDOCH, 2011: 23). Bem composto, claro e conciso nos detalhes narrativos, o opúsculo é antes uma exposição de ideias, um testamento intelectual. A tradução da UFG, ao apostar nesse sentido, concede ao texto uma espécie de ardor desapaixonado, cujo contraste com a tradução da edição de Braga, por exemplo, nos leva a aquilatar as escolhas do tradutor. Compare-se os dois trechos finais. Na edição de Braga, em tradução de Castelo Branco Chaves, com acento mais quente, pelo uso de fórmulas como “vão espetáculo”, “que vosso coração pese na balança” e “demônios”:

Tal é a verídica narração da minha vida. A personagem que representei no vão espetáculo do mundo, durante esta pobre vida, expu-la aos vossos olhos. E agora, filhos dos homens, que vossa justiça julgue, sem que vosso coração pese na balança. Acima de tudo, pronunciai uma sentença livre e conforme a verdade. É isso que incumbe aos homens dignos de tal nome. Se a narração da minha vida vos oferece alguma coisa que mereça a vossa comiseração, reconhecei a miséria da condição humana e chorai, lembrando-vos que vós próprios dela participai. E para que tudo fique dito, revelarei que em Portugal, como cristão, me chamava Gabriel da Costa, e entre judeus (e que demónios me conduziu para eles?), Uriel. (COSTA, 1995: 584)

E o mesmo parágrafo final, na presente edição brasileira, contida no uso dos termos e metáforas:

Aqui tendes a verdadeira história da minha vida e a personagem que no teatro do mundo tem interpretado ao longo de uma honesta e sempre insegura vida está aqui apresentado diante de vós. Julgai-me agora corretamente, filhos dos homens e sem emoção alguma, emitam então uma sentença verdadeira, isto é um julgamento particularmente digno dos homens que realmente merecem esse nome. E, se alguma coisa encontrardes que vos arraste á comiseração, e deplorai a miserável condição humana da qual também sois participantes. E para que nada falte nesse julgamento, meu nome, o nome cristão que tive em Portugal era Gabriel da Costa. Entre judeus, oxalá nunca os tivesse encontrado, foi ligeiramente modificado, fui chamado Uriel. (COSTA, 2015: 33)

O texto traz a narrativa dessa vida exemplar, tornada destino pela eutanásia, um todo fechado que se abre ao juízo do leitor. Narra-se a vida de Gabriel da Costa, nascido no Porto, de pai cristão novo. Faz questão de frisar, este narrador Gabriel, que o pai era bom cristão. Também o narrador, criado nos evangelhos, era cristão devoto, não seguia o rito apenas pela necessidade formal de todo converso, necessidade provavelmente comum entre a comunidade de comerciantes judeus a que a família dos Costas pertencia, ditos em Portugal “gente da nação” ou “homens de negócio”. Gabriel estudou direito canônico, foi jurista, como bem explica Cecília Michaëlis, não necessariamente uma advogado formado, mas estudante de direito, especialmente direito canônico, com idas e vindas pela Universidade de Coimbra, atestando, talvez, já as indecisões e dúvidas que o moveriam durante sua vida. Cecília Michaëlis, em sua biografia, prefere então chamá-lo “canonista”, ou seja, estudioso das leis religiosas. O próprio Uriel, por sua vez, em seu texto Exame das tradições farisaicas, se diz “jurista hebreu”. Nesse contexto antes de tudo acadêmico, é a comparação racional entre os evangelhos, com suas minúcias intrincadas, e a clareza da lei mosaica original, que leva o cristão à reconversão ao judaísmo. Ou seja, a volta ao judaísmo original não se dá, pelo menos segundo a carta, por qualquer atavismo ou por resquícios da antiga prática religiosa arraigada à vida familiar. Segundo o texto, não eram os Costas, como se diria à época, judaizantes, acusação que levaria à condenação, anos depois, de outro famoso escritor judeu de língua portuguesa, o dramaturgo brasileiro Antônio José da Silva, dito “o judeu”.

Não se descartam, evidentemente, outras hipóteses, não contempladas pelo racionalismo piedoso desse Uriel narrador: os irmãos também o seguem na reconversão ao judaísmo, movidos quem sabe pelas facilidades da vida religiosa e do comércio na comunidade judaica livre de Amsterdã. Sabe-se das dificuldades dos judeus conversos na Península ibérica, exilar-se e reconverter-se não deve ter sido incomum na Europa do século XVII (cf MORDOCH, 2011: 14). O fato é que no texto de Uriel, não se elencam problemas pessoais ou de negócios, sabemos por este apenas que emigrou com a mãe, seus irmãos e irmã, após a morte de seu pai que lhe fez então chefe da família. Das intenções dos irmãos, das dificuldades, dos debates familiares, das relações cotidianas com as tradições judaizantes (ou não), quase nenhuma menção. Não há nem mesmo menção ao desfecho da vida de sua mãe, Branca Dinis da Costa ou Sara da Costa, também excomungada por segui-lo. Não há pois muito de uma confissão pessoal, de biografia no sentido lato, da narrativa dos atos de uma pessoa e de seus haveres com a fortuna. Assim que chegou a Amsterdã com a família, só nos dá notícia de que continuou seu trabalho canônico de pesquisar e estudar a fundo as leis divinas.

Mas, a religião judaica, após anos de cismas e êxodos, também havia se tornado outra, permeada de apêndices à lei mosaica, de leis convencionais de tradição oral, de hierarquias e mesmo preconceitos quanto às origens dos judeus. Na sua breve apresentação de Espinosa, Marilena Chauí nos dá um fino relato das divergências histórico/canônicas em voga na Amsterdã do século XVII. Dividiam-se em classes sefarditas de sangue ibérico e os demais judeus não ibéricos, dividiam-se marranos e não-marranos, divisões que davam cor político-social às querelas religiosas entre racionalistas e materialistas, cultores da lei mosaica original, e os fariseus, ligados à lei oral e rabínica:

Dividia-se por fim, religiosa e teologicamente, entre fundamentalistas tradicionais e deístas racionais, e entre talmudistas e cabalistas místicos. A divisão religiosa recobria e dominava as divergência socais e políticas, dadas as peculiaridades de uma comunidade que não possuía autonomia política, e não constituía propriamente um Estado e cujos costumes eram regulados pela religião e por tradições teocráticas. (CHAUÍ, 1995: 16)

No livro ora comentado, o tradutor, João Alberto da Costa Pinto, professor de História da UFG, também expõe em perspectiva histórica os vários cismas, as sinagogas, enfim o lugar no qual aportou esse Gabriel-Uriel cristão novo ex-converso. O posfácio e as notas de João Alberto da Costa Pinto, esclarecedores, têm ainda o mérito de facultar ao leitor uma bibliografia acessível, no mais das vezes de viés histórico. Talvez por essa escolha histórica não conste da publicação remissão à também acessível apresentação de Espinosa, aqui citada. Entre as lembranças dignas de nota, o tradutor remete ao livro da escritora portuguesa Agustina Bessa-Luís, Um Bicho da terra, biografia romanceada do nosso escritor. 1 Apenas um senão quanto à remissão às demais obras de Uriel da Costa: é difícil saber, pelo posfácio ou pelas notas, se há outras obras que escaparam, como esta, da perseguição e da fogueira2 , e a menção ao livro no qual estão compilados capítulos das obras de Uriel, de Samuel da Silva, não consta da bibliografia final. Há um texto que vem referido como Costa, 1995, na página 39, mas tal referência também não se encontra listada na bibliografia. Acreditamos tratar-se do volume publicado em Braga que citamos. Outra questão sobre as obras de que sentimos falta seria uma discussão sobre o estatuto apócrifo do Exemplar (c f MORDOCH, 2011). Apenas detalhes fáceis de se corrigirem numa próxima edição, como uma e outra gralha tipográfica.

Mas voltemos ao embate entre Uriel e os fariseus seus contemporâneos, tal como aparece no texto. Logo o autor percebe que as leis farisaicas, contras as quais escreve, muito se afastaram da original lei mosaica, sendo portanto leis históricas e humanas, como aquelas dos evangelhos que havia renegado em Portugal; e, no seu estudo incansável, mesmo os livros sagrados, as leis originais, se lhe afiguram eivados de contradições, humanas, demasiado humanas. A única lei a que podemos conceder divindade é a lei natural. O autor do testamento o diz com todas as letras. Não é difícil trazer à memória as preocupações de Espinosa com a historicidade muitas vezes imagética da Bíblia e da própria língua sagrada, o hebraico, premida entre a possibilidade de uma exposição geométrica e a experiência dialetal do falante (SANTIAGO, 2013).

O resto da história, muito já se comentou. Uriel é condenado várias vezes, em Hamburgo, Veneza e Amsterdã, – fatos aos quais o narrador também não acrescenta detalhe em sua Vitae – é separado da comunidade, apartado dos irmãos, impedido de contrair um segundo casamento e constituir uma família. Em 1640, diante da sinagoga, e talvez dos olhos de um menino chamado Bento Espinosa, todos o dizem, o homem se retrata, lê a infame confissão que para ele escreveram, é açoitado, pisoteado. Em seguida, apesar de reaproximado da comunidade, prefere tirar a própria vida. Por que teria aceitado tal humilhação, se na confissão final não há a mais mínima sombra quanto a suas convicções? Por atavismos lusitanos, como sugerem uns, por covardia, como querem outros? Seria, por outro lado, o texto apócrifo eivado de apêndices posteriores, estranhos à pena do Uriel histórico? 3

Não é o caso de se condenar ainda outras vezes o autor. Longe do homem, fiquemos com a letra. Quando Uriel aceita, ao fim de longos 7 anos, depois de uma condenação anterior de mais 15 anos, passar pela humilhação da confissão na sinagoga, talvez o tenha feito em nome de suas convicções, conforme a confissão deixa entrever. Em nome daquela lei divina, natural, que une em laços afetivos pai e filhos, irmãos, amigos e amantes, uma lei simples, para a qual nenhum deus poderia solicitar o absurdo do sacrifício de Abraão; supremo sacrifício ao qual condenaram o próprio Uriel por anos, o de ser espicaçado pelos irmãos e amigos. Uma lei de afetos, forte, firme, lei de bicho da terra, lei sem Bem e Mal, que não condenaria nem mesmo o ódio que alguns creditam a Uriel contra seu denunciante4. Esses afetos tornariam uma sociedade coesa, feliz; essa lei faria viver livre o cidadão, mais que qualquer fariseu ou cristão, ao permitir “proclamar-se simplesmente homem”. Nas palavras do próprio narrador:

Afirmo que essa lei é comum e inata para todo os homens, pelo fato mesmo de serem todos humanos. Ela liga todos entre si com mútuo amor impedindo divisões que é a causa original de todo ódio e dos maiores males. Ela é a mestra do bem viver porque distingue o justo do injusto, o abominável do belo.(COSTA, 2015: 26)

O comentário de João Alberto da Costa Pinto, no livro da UFG, aponta por fim para a filiação materialista dessa lei vislumbrada por Uriel. Ideias que serão, ao cabo de alguns anos, o fermento para renovadores como Espinosa, para as ideias de um deísmo ético, que frutificariam ainda nos séculos seguintes. Sejam ou não totalmente autorais, as ideias do Exemplar ainda assim refazem o fundo movediço das mudanças em curso. A edição da UFG é bem-vinda ao reapresentar ao público brasileiro esse documento estranho, cruel, signo vivo tanto do racionalismo cristalino do século XVII, como da turva intolerância, capaz de sobreviver mesmo nas sociedades mais livres.

Notas

1 Não deixa de ser notável, como escreve Mordoch, que Uriel da Costa tenha mais vida na ficção que no debate filosófico. São dignos de nota, além do romance de Agustina Bessa-Luís, a peça de Karl Gutzkow, Uriel Akosta, de 1846, e o interesse de Goethe pelo Exemplar.

2 Sabemos que se encontrou em Copenhague um exemplar único do Exames das tradições farisaicas, e que alguns capítulos de outra obra, destruída ou não publicada, principalmente a parte sobre a imortalidade da alma, foram compilados, com função de crítica, por Samuel da Silva. Assim, há apenas um texto que podemos creditar totalmente a da Costa: o exemplar de Copenhague, escrito em português

3 Neste sentido, escreve Mordoch: “Mas foi o famoso Exemplar Humanae Vitae o grande impulsionador dos estudos sobre Uriel da Costa. A já mencionada problemática quanto ao caráter semi-apócrifo dessa obra não impediu que a pesquisa o atribuísse a da Costa e, de fato, a leitura do Exame das tradições aponta coincidências que corroboram a autoria do Exemplar atribuída a da Costa. Alguns trechos específicos despertaram a desconfiança de que o Exemplar recebeu enxertos apócrifos, entre eles a descrição da cerimônia do erem (excomunhão) ou, de maneira geral, o modo como a narrativa tenta representar Uriel da Costa quase como um Cristo moderno”. (MORDOCH, 2011:8)

4 Cecília Michaëlis comenta os rumores de que Uriel teria atentado contra o primo que o denunciara e só então se suicidado, num ato de furor. Para a autora, os documentos nos quais assentam tal denuncia são espúrios e servem mais para abrandar o papel da sinagoga no desfecho da vida de Uriel

Referências

CHAUÍ, Marilena. Espinosa, uma filosofia da liberdade. São Paulo: Ática, 1995.

COSTA, Uriel da. Exame das tradições farisaicas, acrescido com Samuel da Silva, Tratado imortalidade da alma. Introdução, notas e carta genealógica por H. P. Salomon e I.S. D. Sassoon. Braga: Edições APPACDM, Distrital Braga, 1995.

MORDOCH, Gabriel. A Língua e o discurso do Exame das tradições phariseas de Uriel da Costa. Dissertação de mestrado. Universidade de Jerusalém, 2011.

SANTIAGO, Homero. “O Compêndio de gramática hebraica de Espinosa”. In: Trans/form/ação. Marília, nº 36, vol 2, 2013, p. 26-44.

VASCONCELOS, Cecília Michaëlis. Uriel da Costa. Notas relativas à sua vida e às suas obras. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1922 (Separata da Revista da Universidade de Coimbra, vol. VIII, nº 144).

Priscila Rossinetti Rufinoni – Professora adjunta – UnB.

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Observações filosóficas – WITTGENSTEIN (Ph)

WITTGENSTEIN, Ludwig. Observações filosóficas. Trad. por Adail Sobral e Maria Stela Gonçalves. São Paulo: Edições Loyola, 2005. Resenha de: PORTO, André. Philósophos, Goiânia, v.14, n. 2, p.209-217, jul./dez., 2009

Reza a “versão oficial” da história da filosofia, do final do século XIX para cá, que o ponto de separação entre as duas grandes tradições filosóficas do século XX – a tradição analítica e a fenomenológica – teria se dado após a publicação da resenha de (FREGE, 1997) à Filosofia da Aritmética de (HUSSERL, 2006). Daí em diante, segundo a versão normalmente aceita, essas duas tradições teriam tomado caminhos divergentes e até opostos. Tentativas (tímidas) de reaproximação só teriam começado a se dar no final do século XX.

De certa forma, o volume Observações Filosóficas, publicado em tradução brasileira em 2005 pela Loyola, desmente essa versão oficial. Nessa obra (e no Big Typescript), ambas do assim chamado “período intermediário” de Wittgenstein, encontramos o autor se aproximando de temas tradicionais da filosofia moderna tais como o problema do Idealismo e do Solipsismo3 e, mais surpreendente ainda, se aproximando de temas caros à fenomenologia de Husserl, como o problema da temporalidade da experiência imediata. Não exageremos a convergência. Para Wittgenstein, ainda se trata de “esclarecer a gramática” desses vários tipos de proposições e não de “descrever a estrutura da subjetividade imediata”, como em Husserl. Ainda assim, é difícil de não se perceber uma agenda de questões comuns entre, digamos, as famosas Lições para uma fenomenologia da consciência interna do tempo, de Husserl (HUSSERL, 1994), e os capítulos V e VI das Observações Filosóficas, de Wittgenstein.

Esse surpreendente envolvimento do filósofo com temas advindos do coração da filosofia da consciência parece, por vezes, ter produzido reações estranhas nos seguidores do autor do famoso argumento contra a linguagem privada. Até onde vai o conhecimento desse resenhista, o primeiro volume que se dedica diretamente à exegese desse material foi publicado apenas em 1995, por David Stern (STERN, 1995). E até os dias de hoje, não parece exagero dizer-se que o trabalho de análise mais aprofundada dessas ideias ainda se encontra em seus estágios iniciais4.

Até mesmo do ponto de vista de acesso bibliográfico, o trabalho dos comentadores estava, até há bem pouco tempo, dificultado. A publicação em inglês de Philosophical Re-marks data 1975. Mas a obra fundamental do período intermediário, o monumental Big Typescript, só foi efetivada em 2005. Antes disso, tínhamos apenas o estranho pastiche chamado de Philsophical Grammar.5 Ora, naquela obra, ape-nas uma das duas partes (a parte II), trás textos extraídos do Big Typescript. O resto do material, incluindo temas como Idealismo, Fenomenologia, Tempo da Memória, foram deixados de lado. No lugar deles, encontramos uma reconstrução, feita por Rush Rhees, a partir de várias revisões diferentes de Wittgenstein do material do Big Typescript, algumas delas contemporâneas ao Livro Azul! (VON WRIGHT, 1982, p.50; STERN, 1996). Além disso, o acesso aos outros numerosos manuscritos do período só foi viabilizado de forma mais geral a partir da publicação (em alemão) de (WITTGENSTEIN, 1999) e da Edição Berger (WITTGENSTEIN, 2000). Tem-se por vezes a impressão de que os executores do testamento de Wittgenstein hesitavam em tornar público esses embaraçosos envolvimentos de seu mestre com a famigerada filosofia da consciência6.

Passemos ao texto de Wittgenstein. As Observações Filosóficas são a reunião, um tanto apressada, dos resultados das pesquisas filosóficas do filósofo, de seu retorno a Cambridge em Janeiro de 1929, até Maio de 1930. Como nos informa Rhees, nessa última data o Conselho do Trinity College solicitou a Russell um parecer sobre os progressos de Wittgenstein, com vistas à renovação de sua bolsa de pesquisador (WITTGENSTEIN, 2005, p.287). O texto das Observações Filosóficas é fundamentalmente uma reunião e organização do material filosófico constante de 4 cadernos manuscritos por Wittgenstein, os manuscritos 105 até 109 com vistas a esse parecer. No material original, não havia nenhuma marcação de interrupção no texto. A organização atual em capítulos, e o sumário detalhado que encontramos no início da obra (WITTGENSTEIN, 2005, pp. 11-33) foram feitos por Rhees, mas já estão consagrados pela comunidade filosófica. De fato, eles ajudam muito a visão sinóptica da obra, tão cara a Wittgenstein7.

Em uma famosa carta a Schlick, Wittgenstein afirma que havia retornado a Cambridge e à pesquisa filosófica para “trabalhar sobre o espaço visual e outros assuntos”. (WAISMANN, 1979, p.17) A observação nos dá uma chave para uma das linhas de desenvolvimento principais da obra. Como muito do que ocorre nesse período intermediário, as origens da preocupação de Wittgenstein com o espaço visual estão no Tractatus. Como sabemos, segundo aquela obra, por trás de nossas proposições ordinárias se esconderia uma intrincada forma lógica, complexas estruturas puramente verofuncionais de proposições elementares, não passíveis de ulterior análise. Essas proposições elementares, por sua vez, projetariam estados de coisas atômicos, eventos mínimos do espaço lógico tractariano.

Pois bem. Uma mutação filosófica importante que abre o período intermediário é a definição, por Wittgenstein, da natureza desses eventos mínimos, os estados de coisas. 8 Em 1929, esses eventos mínimos são claramente determinados como sendo fenômenos, ocorrências em nossos espaços sensoriais. Daí o interesse de Wittgenstein no espaço visual como espaço fenomênico por excelência. Dada essa mutação, o processo de análise preconizado pelo Tractatus transforma-se então em descrição fenomênica. É isso que encontramos nos primeiros manuscritos de Wittgenstein na época (MS105 e 106) e no famoso artigo de Wittgenstein Some Remarks on Logical Form de Junho de 1929: o uso extensivo de coordenadas para empreender uma descrição fenomenológica com a “correta multiplicidade” e assim fornecer uma análise (ainda final) das proposições ordinárias. (WITTGENSTEIN, 1993, p.31)

Rapidamente, a própria possibilidade de se postular uma análise assim é posta em dúvida por Wittgenstein. Ao invés de encontrarmos a linguagem primária (fenomênica) postulada por Wittgenstein como resultante da análise lógica das proposições ordinárias (chamada na época de linguagem secundária), essas duas linguagens ganham independência uma da outra. A linguagem primária mantém com a secundária apenas uma relação na verificação: os conteúdos da linguagem ordinária fisicalista (secundária), uma vez restringidos às suas implicações estritamente fenomênicas, dariam lugar a expressões da linguagem primária que, por sua vez, seria então verificada ou falseada pela experiência.

O projeto original de Wittgenstein tem uma série muito rápida de desdobramentos e alterações, no período. O problema das coordenadas desencadeia uma longa investigação, na filosofia da matemática, sobre os números irracionais e sobre a noção de número em geral. Por sua vez, o abandono da ideia de uma única sintaxe lógica em prol de uma multiplicidade de gramáticas lógicas independentes oferece a Wittgenstein uma nova maneira de tratar os problemas fundamentais da filosofia da consciência que mencionamos no início dessa resenha: o problema da subjetividade, da temporalidade, etc. O período intermediário é muito rico e de extraordinária importância para se aquilatar corretamente, não somente o período final, maduro, da filosofia de Wittgenstein, mas, como antecipamos, para lançar uma nova luz sobre as relações entre a filosofia analítica e fenomenológica no século XX.

Uma nota sobre a tradução brasileira. Infelizmente, como tantas vezes acontece em nosso país, a presente tradução deixa a desejar em muitos aspectos. Uma primeira deficiência decorre do fato dessa tradução ser indireta. Ao invés de usar o texto original, em alemão, empreendeu-se uma tradução da versão inglesa (WITTGENSTEIN, 1975). Ora, a tradução de 1975 não prima pela precisão, tanto na escolha dos termos equivalentes, mas até mesmo do trabalho editorial geral: há uma frase interia do parágrafo 48 do original alemão que foi omitida, por descuido, na versão inglesa (a omissão foi repetida na versão brasileira).

As deficiências da tradução inglesa foram multiplicadas na brasileira. Tomemos como exemplo, os termos alemães Bild e Vorstellung. Na Nota do tradutor do texto inglês para o português, no final do volume (WITTGENSTEIN, Observações Filosóficas, 2005) os tradutores corretamente elegem a tradução de Bild por afiguração (proposta consagrada na tradução do Tractatus do professor Luiz Henrique dos Santos). Porém, em parte seguindo as opções de seus colegas ingleses, os tradutores brasileiros traduzem Bild algumas vezes por imagens [figurações]. A confusão atinge o clímax quando o termo Vorstellung também é traduzido por imagem e até mesmo por imagens [figurações]! Assim, por exemplo, temos o trecho:

Sabemos o que é uma imagem [figuração], mas as imagens [figurações], com certeza, não são nenhum tipo de imagem [figuração] (Sic) (WITTGENSTEIN, 2005, p.66).

Notas

1 Esses temas já tinham sido enunciados nos parágrafos 5.6 do Tractatus, mas é nesse período intermediário que eles recebem uma atenção não dividida por parte de Wittgenstein.

2 Em nossa língua, temos o importante trabalho do professor Bento Prado Neto (PRADO NETO, 2003).

3Traduzido em Português como (WITTGENSTEIN, 2003).

4 Von Wright é taxativo em classificar esse material como sendo de “valor intrínseco menor” (VON WRIGHT G., 1984, p.13).

5 Uma divisão em capítulos e seções do Big Typescript, semelhante a das Observações Filosóficas, é feita diretamente por Wittgenstein.

6 Ou a explicitação de uma definição que já estava implícita no Tractatus, segundo alguns autores.

7 Essa confusão tem início na tradução inglesa, que verte o termo Bild algumas vezes por image ao invés de Picture.

REFERÊNCIAS

FREGE, G. (1997). Review of E.G. Husserl ‘Philosophie der Arithmetik’. In: M. BEANEY, Frege Reader (pp. 224-226). Oxford: Blackwell.

HUSSERL, E. (1994). Lições para uma fenomenologia da Consciência Interna do Tempo. Lisboa: Imprensa Nacional Casa da Moeda.

HUSSERL, E. (2006). Philosophy of Arithmetic. Dordrecht: Kluwer Academic Publishers.

KENNY, A. (1976). From the Big Typescript to the Philosophical Grammar. In: G. H. VON WRIGHT, Essays on Wittgenstein in honour of G. H. von Wright (pp. 41-59). Amsterdam: North Holand.

PRADO NETO, B. (2003). Fenomenologia em Wittgenstein: Tempo, Cor e Figuração. Rio de Janeiro: Editora UFRJ.

STERN, D. (1996). The availability of Wittgenstein’s Philosophy. In: H. SLUGA, & D. STERN, The Cambridge Companion to Wittgenstein (pp. 442-76). Cambridge: Cambridge University Press.

STERN, D. (1995). Wittgenstein on Ming and Language.  Oxford: Oxford University Press.

VON WRIGHT, G. (1984). A Biographical Sketh. In: N. MALCOLM, Ludwig Wittgenstein, a memoir (pp. 3-20). Oxford: Oxford University Press.

VON WRIGHT, G. (1982). The Wittgenstein Papers. In: G. VON WRIGHT, Wittgenstein (pp. 35-62). Minneapolis: University of Minesota Press.

WAISMANN, F. (1979). Wittgenstein and the Viena Circle. Oxford: Basil Blackwell.

WITTGENSTEIN, L. (2003). Gramática Filosófica. São Paulo: Edições Loyola.

_____. (2005). Observações Filosóficas. São Paulo: Edições Loyola.

WITTGENSTEIN, L. (1974). Philosophical Grammar. Oxford: Basil Blackwell.

WITTGENSTEIN, L. (1975). Philosophical Remarks. Oxford: Basil Blackwell.

WITTGENSTEIN, L. (1993). Some Remaks on Logical Form. In: L. WITTGENSTEIN, Philosophical Occasions, 1912-1951 (pp. 28-36). Indianapolis: Hacket Publishing Company.

WITTGENSTEIN, L. (2005). The Big Typescript. Oxford: Basil Blackwell.

WITTGENSTEIN, L. (1994). Tractatus Logico-Philosophicus. São Paulo: Edusp.

WITTGENSTEIN, L. (1999). Wiener Ausgabe Studien  Texte: Band 4: Bemerkungen zur Philosophie. Bemerkungen zur philosophischen Grammatik . Nova Iorque: Springer.

WITTGENSTEIN, L. (2000). Wittgenstein’s Nachlass: The Berger Edition. Oxford: Oxford University Press.

André Porto – Professor-adjunto do Departamento de Filosofia da Universidade Federal de Goiás (UGF), Goiânia, Goiás. E-mail: [email protected]

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Dissertatio | UFPEL | 1995

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