Paisagem Cultural: uma contribuição ao debate histórico / Revista Eletrônica História em Reflexão / 2011

O conselho editorial da Revista Eletrônica História em Reflexão (REHR) tem o prazer de apresentar a sua X Edição (Jul / Dez de 2011), com o dossiê “Paisagem Cultural: uma contribuição ao debate histórico”. O conceito de Paisagem Cultural, compreendido a partir da Convenção da UNESCO de 1972, foi concebido para responder à crescente complexidade da sociedade contemporânea e a velocidade cada vez maior dos processos sociais econômicos e culturais. Para que a Paisagem Cultural se configure, esses fatores devem guardar uma relação complementar entre si, capaz de estabelecer uma identidade comum aos membros de uma mesma comunidade. Mesmo que a palavra “Paisagem” isoladamente encerra necessariamente uma dimensão territorial e uma dimensão natural. A Paisagem Cultural, não pode deixar ser uma paisagem natural fortemente humanizada e de elevado valor cultural.

Como não poderia ser diferente, a Paisagem Cultural, passa a ser também estudada e a dialogar com o Campo da História e da Historiografia. Nesse sentido, o objetivo desse dossiê é aproximar os objetos de estudo sobre paisagem cultural e a História. Assim são ricos os elementos que permeiam os artigos desse número da revista, como: como patrimônio, identidade, representação, entre outros. Os quais se encontram na ordem do dia em muitos dos trabalhos e das pesquisas no Campo Historiográfico. Abaixo seguem os trabalhos que constituem a X edição da Revista Eletrônica História em Reflexão.

O artigo que inicia o rol de textos do dossiê é de autoria de Amilcar Guidolim Vitor e de Julio Ricardo Quevedo dos Santos intitulado A construção social do patrimônio cultural através do processo de representações sociais. O trabalho aborda a influência do processo de produção de representações sociais na construção social do patrimônio cultural em relação ao Memorial Coluna Prestes, presente no município de Santo Ângelo do Estado do Rio Grande do Sul. Os autores procuraram verificar os interesses de grupos sociais conforme as representações criadas deste espaço de memória.

A seguir temos Concepções de cultura e etnia ucraniana, escrita por Janio Rodrigues, José Adilson Campigoto e Antônio Paulo Benatte. No artigo os autores tratam sobre a concepção de cultura e sua ampla utilização no âmbito da produção historiográfica em relação ao fenômeno da imigração ucraniana para o Estado do Paraná. De acordo com esse trabalho a forte presença ucraniana no Paraná, com seus falando a mesma língua, tendo a mesma região como lugar de origem e reconhecendo-se como grupo devido a várias práticas comuns, gerou um saber que chamaremos de discurso da etnicidade ucraniana.

Em Pantanal Sul mato-grossense a partir da construção poética de Manoel de Barros no Livro de pré-coisas (1985), Fernanda Martins da Silva discute sobre as características estéticas e identitárias do Livro de pré-coisas: roteiro para uma excursão poética no Pantanal (2003) de Manoel de Barros, escrito em 1985. Nesse artigo, a autora visou refletir sobre a apropriação do poeta em relação aos elementos pantaneiros ao transfigurá-los em poesia.

Já Carlos Almir Matias tem por objetivo refletir sobre a imagem apresentada no Evangelho de Judas, sobre a figura de Judas Iscariotes e dos doze discípulos. Em seu artigo intitulado A representação de judas e dos doze apóstolos no evangelho de Judas, o autor parte da hipótese de que esse evangelho faz uma alegoria apresentando Judas como o arquétipo do homem gnóstico perfeito, e que sofre perseguições por causa disso, enquanto que, os outros discípulos representariam a ala proto-ortodoxa da igreja.

O próximo trabalho foi elaborado por Tiago de Jesus Vieira cujo título Uma outra historiografia do punk fecha o rol de artigos do dossiê. Nesse texto o autor buscou estabelecer um outro balanço historiográfico acerca da temática punk que possa contribuir como complemento para a análise já existente da historiadora Ivone Gallo. Além disso, o autor discorre sobre diferenças entre os distintos grupos punks brasileiros.

Em seguida publicamos seis trabalhos da seção de artigos livres os quais enriqueceram a publicação da décima edição da revista. De início temos Articulação entre o pensamento foucaltiano e a Nouvelle Histoire: ressonâncias entre genealogia e historiografia, de autoria de Lucas de Almeida Pereira. Nesse artigo, o autor reflete sobre a relação dos Annales e o referencial teórico proposto por Michel Foucault. As discussões realizadas em seu texto se pauta no diálogo ocorrido nos anos 1970 entre os historiadores da nouvelle histoire e Foucault, buscando evidenciar o impacto deste diálogo na constituição da genealogia, modelo de análise histórico-filosófico desenvolvido pelo pensador.

Luciana Porto da Silva e Taíse Tatiana Porto da Silva apresentam o artigo Participação social nas conferências nacionais de Direitos Humanos: análise dos anos iniciais da gestão FHC e gestão Lula (1995-1996 / 2003-2004). De maneira geral, o texto uma análise da participação social nas políticas públicas de direitos humanos. Para tanto as autoras utilizam-se da I Conferência Nacional de Direitos Humanos, que ocorreu durante a gestão governamental de Fernando Henrique Cardoso. Do mesmo modo, são analisadas as medidas que dariam prosseguimento ao funcionamento dos órgãos instituídos e a realização da IX Conferência Nacional de Direitos Humanos, sob a gestão do governo Lula. Assim, verificam o processo participativo no Estado como política descentralizadora para o favorecimento da interlocução entre governo e sociedade civil.

O trabalho História e ficção no romance O Mulato de Aluísio de Azevedo: aspectos das relações “raciais” em São Luís do Maranhão na segunda metade do século XIX, cujo autor é Daniel Precioso reflete sobre a leitura histórica do romance O Mulato. Neste sentido, o objetivo do trabalho é dialogar com abordagens que o tomaram como documento, procurando entender como seus estudiosos lhe conferiram historicidade, sobretudo no que diz respeito à discussão das relações raciais em São Luís do Maranhão na segunda metade do século XIX.

Em Pela condução da ação política operária em Manaus: disputas entre os jornais Vida Operária e O Extremo Norte Luciano Everton Costa Teles discorre sobre dois jornais operários que veicularam em 1920. O objetivo central do artigo é caracterizar e diferenciar as propostas de condução política operária presentes nos jornais, pois tratavam-se de um espaço onde encontravam-se os ideais dos trabalhadores.

As eleições e o jornal O Progresso: estratégias discursivas (1954, 1958 e 1962) escrito por Fernando de Castro procura demonstrar as estratégias de Weimar Torres – político em Dourados pelo PSD, figura destacada na sociedade local –, e seu grupo político, na tentativa de conquista do poder na cidade localizada no sul do estado do Mato Grosso, utilizando como instrumento o periódico O Progresso, dirigido por ele. São analisados os discursos construídos pelo jornal durante as eleições de 1954, 1958 e 1962, com Weimar Torres e o PSD local usando as páginas do periódico para buscar alianças, propagandear as candidaturas do partido e criticar adversários.

O anticomunismo e a esquerda militar no Brasil: uma análise historiográfica de Carlos Henrique Lopes Pimentel, propõe um debate historiográfico sobre as práticas anticomunistas nas Forças Armadas Brasileiras e a existência de uma esquerda militar no país. Tal perspectiva baseia-se no entendimento que estas temáticas estão intimamente ligadas e se constituem como alicerces para a compreensão de importantes episódios da história republicana do Brasil, como os regimes de exceção de 1935-1937 e de 1964-1985, apesar de terem sido marginalizadas nos estudos históricos. Assim, a análise do autor se pauta em diversas obras, buscando o entendimento de seu tema.

O artigo de Roberto Mauro da Silva Fernandes fecha a seção de artigos livres. Em A Guerra do Paraguai: um evento que se originou devido ao segundo ciclo de Kondratieff de 1843 a 1896 o autor procurou compreender a relação dos ciclos sistêmicos da economia mundial e os ciclos de guerra com a Guerra do Paraguai. Conforme o autor, o estudo desses ciclos pode contribuir para se entender o conflito platino e qualquer processo conjuntural que leve a uma reviravolta na ordem política, social e geopolítica.

Ao finalizar essa edição trouxemos a resenha do livro O poder da arte de Simon Schama, elaborada pelo doutorando em história André Cabral Honor

O Conselho Consultivo e Editorial traz a público mais uma edição preparada com muito afinco a fim de colaborar com as reflexões que envolvem o conhecimento histórico. Desejamos uma boa leitura a todos!

Cássio Knapp

Fernanda Chaves de Andrade

Dourados Verão de 2011


ANDRADE, Fernanda Chaves de; KNAPP, Cássio. Apresentação. Revista Eletrônica História em Reflexão. Dourados, v. 5, n.10, jul. / dez., 2011. Acessar publicação original [DR]

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História Política e Política na História / Revista Eletrônica História em Reflexão / 2011

Dando continuidade em mais um ano de trabalho, a revista História em Reflexão (REHR) traz novos debates acadêmicos para o campo da História e Historiografia. Com muita satisfação o conselho editorial e consultivo apresenta, a você leitor e pesquisador da área, a IX edição da revista com seu dossiê “História Política e Política na História”. Referente ao período de janeiro-junho de 2011, a mais nova edição vem oferecer um panorama sobre a pesquisa histórica no Brasil, sobretudo em Mato Grosso do Sul e região, tendo como principal foco a aproximação entre academia e sociedade.

A fim de incentivar a produção acadêmica sobre a História em diversos sentidos, o objetivo da revista é oferecer subsídios básicos para futuras pesquisas na área, bem como oportunizar aos profissionais da História o acesso a debates acadêmicos atuais. Como um instrumento importante de divulgação do saber científico, a revista evidencia produções relevantes que podem servir de complementação aos temas trabalhados pelos docentes, tanto no que diz respeito ao ensino básico quanto à graduação.

A temática do dossiê dessa edição, foi escolhida de modo que respeitasse a discussão sobre a transformação na maneira de se pensar a política na História, em conseqüência do processo de reorientação metodológica de escrita. O dossiê História Política e Política na História, têm como proposta colaborar com os estudos sobre a postura teórica e metodológica que envolve as pesquisas a respeito do tema, bem como o intuito de oferecer novas e surpreendentes narrativas históricas, frutos de pesquisas realizadas em âmbito da graduação e pós-graduação. São Histórias que relatam os modos de vida dos sujeitos, em uma incessante busca pela sobrevivência que manifestam suas razões: social, cultural e política. Marcam um terreno de dissonâncias e harmonias, em que os sujeitos são levados a buscarem diversas formas de adaptações e resistências, nem sempre pacíficas, para a convivência social.

Uma série de desdobramentos – sociais, políticos, filosóficos e culturais –, permitiu repensar a escrita da História. Uma dinâmica diferenciada em seu processo de produção, fez brotar novos questionamentos para sua composição. Desde a segunda década do século XX, a preocupação com a escrita da História marcou época no cenário da produção do conhecimento histórico. Nesse movimento, segundo Peter Burke, se firmou uma historiografia comprometida com o combate aos ídolos da História, qual seja: o ídolo político, individual e cronológico. Michelet e Burckhardt, antes da atuação da escola dos annales, criticavam o historicismo alemão de Ranke, fornecendo, em certa medida, a base para a fundação da corrente historiográfica dos annales.

A crítica a História Política, direcionada por Marc Bloch e outros estudiosos de sua época, desenvolveu, portanto, uma postura diferenciada diante da análise do passado. Vale dizer que o empenho desses intelectuais, na luta por uma História problema, desconsiderava a forma como foi conduzida a produção do conhecimento histórico, que entendia a sociedade a partir dos grandes eventos. Os personagens que ganharam vulto na História, eram tidos como figuras representativas de uma complexa teia de relações sociais. Deixada de lado, a camada considerada inferior da sociedade, homens e mulheres comuns, na grande maioria dos estudos históricos de até então, não faziam parte do movimento social. As grandes batalhas, os grandes feitos, eram apontados como parte da supremacia intelectual dos dirigentes do poder, criando assim uma espécie de representação benéfica do sistema política de cada governante. Dessa forma, a História Política se estabelecia com primazia na análise historiográfica, a serviço da criação dos Estados Nacionais a partir do Século XVIII.

Assim, a História era vista como ciência que analisava os processos políticos de uma nação, reino, ou mesmo de uma determinada região. Na ousada frase vitoriana de Sir Jhon Seeley, catedrático de História em Cambridge, “História é a política passada: política é a História presente”. Isso significava para o historiador contar a história apenas das vestes dos reis e não dos camponeses, tão pouco da participação das pessoas comuns em processos históricos, que foram palco de profundas transformações na sociedade ocidental.

Nessa medida, a crítica estabelecida a partir do início do século XX, destacou a insuficiência de se pensar a História pelo prisma positivista. Foi esse o gtande questionamento realizado pelos historiadores desse movimento intelectual, constatando os problemas de olhar para a história da humanidade dessa forma. Postura adotada e sistematizada a partir de 1929 com a fundação da revista dos annales.

O retorno à análise da História Política – expressão cunhada a partir das décadas finais do século XX –, pode ser entendido como a antítese do modo como a História foi estabelecida antes da crítica levantada pela escola dos annales. Com divulgada expressão, mais ou menos, nas décadas de 1950 e 1960, a partir de alguns estudos, principalmente, dinamizados pela new left review, a sociedade presenciou uma nova forma de se explicar as relações sociais e políticas na história da humanidade. A revista apresentou um entendimento sobre o ser humano em sua complexidade, sujeito dotado de consciência e cultura em seu processo político de lutas sociais. Thompson e Hobsbawm, tiveram grande importância na divulgação dos ideais da revista que propôs, acima de tudo, entender o marxismo de outra maneira, na tentativa de não cair em uma análise estrutural da sociedade. Iniciava-se em meados do século XX, os pressupostos fundamentais para propor uma análise sobre a função política nas relações sociais.

Já nas décadas de 1970 e 1980, se apelava para uma História vista de baixo, preocupada com setores da sociedade deixados de lado na análise historiográfica. A história vista de baixo, em desuso hoje em dia, ganhou fôlego como resposta as imposições historiográficas estruturais e como um meio de mostrar a importância das pessoas comuns na História. Nesse sentido, entender a História política tendo como ponto de partida a história vista de baixo, significava analisar os mecanismos de produção das lutas político-sociais.

Embora como filha do seu tempo, a história vista de baixo acabou oferecendo uma ferramenta de análise importante para História Política, qual seja: entender a organização das lutas das classes pobres na história. Revelou pesquisas voltadas para um universo fora da representação da classe dominante. No entanto, a produção das idéias políticas da camada dominante passaram a ser vistas como parte integrante do emaranhado que compõem os processos históricos desse campo, e não como primordial para compreender as relações humanas e processos decisórios. A História Política é entendida, portanto, como expressão social de determinados grupos e não apenas em sentido político partidário, ou mesmo no plano da atuação do Estado nas vidas dos sujeitos. Processos sociais marcam a atuação de pessoas comuns na história, e a política ganha característica de organização de: luta, resistência, avanço e retirada. Enfim, a seguir seguem os trabalhos que compões a IX edição da Revista Eletrônica História em Reflexão.

O artigo que inicia o dossiê Integralismo: o fascismo brasileiro em Santa Catarina produzido pelo Dr. João Henrique Zanelatto, é analisado o contexto sócio-político de instalação do Integralismo em Santa Catarina, a sua organização nos municípios catarinenses, a constituição dos núcleos e sub-núcleos. Assim, a partir da expansão do fascismo brasileiro no Estado catarinense o autor analisa a sua influência em determinado espaço levando em consideração a atuação da imprensa e da Ação Integralista Brasileira (AIB).

O texto de Ludimila Gomides Freitas, Jogos Políticos por índio e mercês: as negociações da Câmara Municipal de São Paulo no século XVII, é tratado as relações dos paulistas camaristas e suas relações com diversas autoridades da colônia portuguesa onde hoje temos o território brasileiro. Por meio dessas relações os integrantes da Câmara paulistas puderam escravizar indígenas e receber mercês régias. A autora menciona que a Câmarara Municipal de São Paulo foi utilizada como instrumento político a fim de garantir o regime compulsório de trabalho. Outro fator citado no texto são as instabilidades políticas, sobretudo no nordeste, nas quais os paulistas foram requisitados para auxiliar a elite do nordeste a fim de auxiliar nos confrontos locais, fazendo com que alguns de seus interesses fossem atendidos.

O mestrando Bruno Silva de Souza traz para o dossiê da REHR o texto: A fé e a razão: antimaquiavelismo e Buena Razón de Estado no pensamento político espanhol do século XVII. Em seu artigo o autor relaciona dois campos em seu objeto de estudo: o religioso e o político, a fim de enriquecer a sua análise. Souza traz uma alternativa oposta do pensamento de Maquiavel, a qual questiona a teoria da secularização. A fim de discutir a questão, coloca-se em evidência o papel estruturante desempenhado pela fé católica no pensamento político espanhol do século XVII, analisando o ponto de vista de um militar que serviu a corte de Felipe IV que defendia a razão submissa do Estado a fé católica.

Já o artigo As reformas políticas e econômicas neoliberais no Brasil nas décadas de 1980 e 1990 elaborado por Fábio Luciano Oliveira Costa, mestrando em Educação, trata das reformas políticas neoliberais desde o final do regime militar até os anos de 1990. Na sua análise, o autor inicia tratando da preparação do regime militar para abarcar tais reformas a fim de ter a legitimação da população brasileira. A seguir o autor discute as reformas no contexto da década de 1990, que tiveram como atores o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI), e amparo dos acordos firmados do Consenso de Washington (1989). Em último lugar o autor vem argumentar a influência do neoliberalismo como forma de imperialismo exercida pelos países desenvolvidos, os quais, conforme o autor, são os únicos benefeciados das reformas existentes.

O trabalho de Leandro Araújo Crestani intitulado O surgimento do inimigo interno: Ditadura Militar no Brasil (1964 a 1985) traz a público outra produção que colabora com o dossiê desse semestre. Nesse artigo, Cristani vem tratar dos aparelhos repressivos da ditadura militar como a Doutrina de Segurança Nacional e a o Serviço Nacional de Informações, criados a fim de garantir a denominada “Segurança Interna”. No seu trabalho o autor buscou investigar as origens do golpe militar por meio de um estudo da Arquidiocese de São Paulo, buscando através de fontes e bibliografias o nascimento do poder coercitivo dos militares envolvidos nas teias do poder administrativo federal.

Em Uma visão da Revolução Cubana diante do ensino brasileiro de Raymond Willians o autor Caio Dias de Brito vem analisar quatro livros didáticos e sua forma pedagógico-ideológica da apresentação do conteúdo e a visão do autor do trabalho. A fim de dar maior colaboração para a discussão, Brito traz três conceitos do sociólogo galês Raymond Williams (Ideologia, Hegemonia e Tradição Seletiva). Autores como Mario Schmidt, Elza Nadai, Joana Neves, Carlos Guilherme Mota, Cláudio Vicentino e Gianpaolo Dorigo, são colocados no cenário deste trabalho.

Everton Demetrio publica nessa edição o artigo História Política e ficcção: Veredas de tradição e modernidade no sertão rosiano. Nesse trabalho o autor tem por objetivo analisar um episódio do livro Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa, especificamente, o caso do julgamento de Zé Bebelo, tratando-o como alegoria de momento singular da história republicana nacional. Em seu estudo Demetrio vem refletir através da literatura Grande Sertão: Veredas a confrontação entre o urbano e o rural e aspectos ligados a convulsões políticos institucionais presentes na passagem do regime imperial para o republicano. De todo modo, o autor traz em cena a delicada análise que se utiliza da literatura para se compreender aspectos do processo histórico.

O texto de Rosangela Baida e de Cándida Graciela Arguello Chamorro iniciam a sessão de artigos livros da IX edição da REHR. Esse trabalho é resultante de um estudo bibliográfico e de análise de fontes que discorrem a respeito de doenças que afetaram os povos indígenas da costa do Brasil, nos primeiros séculos da colonização. Em primeiro lugar as autoras descrevem as doenças as quais muitas eram epidêmicas. A seguir, foi considerado as etiologias das enfermidades ocidentais. A partir de alguns resultados, Baida e Chamorro verificaram que juntamente entendimentos científicos a respeito das doenças, esteve presente a compreensão mítico-religiosa entre os missionários e outros agentes civilizadores. De maneira geral, as autoras concluem que os dados obtidos na pesquisa serão de muito proveito para o estudo das doenças nos povos indígenas guarani falantes dos séculos XVI e XVII.

Kalhil Gibran Melo de Lucena e Maria Ângela de Faria Grillo são os autores de O uso de uma linguagem popular nas aulas de História: as representações da República Velha nos folhetos de Cordel. Nessa produção, os Lucena e Grillo compreendem a história da República Velha por meio da literatura de cordel possibilitando um olhar diferente do período. Para além disso, os autores propõem a utilização da literatura de cordel como um meio didático-pedagógico a ser empregado na sala de aula. Através dessa ferramenta, é proposto instigar os debates de modo reflexivo, por meio da musicabilidade das rimas e versos desse tipo de literatura, fazendo com que o aprendizado seja visto de maneira prazerosa aos olhos dos educandos.

A seguir está o trabalho do Mestre Ademar Alves da Silva, intitulado Os Batistas no contexto do protestantismo brasileiro discorre a respeito da implantação da Igreja Batista no Brasil. Para tanto o autor faz uma reflexão a respeito das Igrejas Protestantes no período colonial e após a independência. Ao longo do texto o autor disserta a respeito dos aspectos doutrinários da Igreja Batista e, ao concluir sua discussão, menciona que, em geral, os aspectos doutrinários dificilmente se modificam em seus conceitos, havendo também aquelas que são filiadas a CNBB, as quais não seguem os mesmos moldes.

Gelise Cristine Ponce Martins é autora de As relações cotidianas de uma família de cafeicultores nas memórias de Braz Ponce Martins (1897-1943). O trabalho trata da história de vida de Braz Ponce Martins, o qual foi filho de imigrantes espanhóis e cafeicultor, que teve sua vida relatada na autobiografia Memorial de um século de cafeicultores. Para facilitar a metodologia de seu trabalho a autora delecionou a história de sua origem e de sua infância, levando em consideração o contexto histórico, o qual remonta à imigração espanhola para São Paulo e à colonização do norte do Paraná. Percebe-se que Gelise C. P. Martins levou em consideração aspectos importantes para análise de uma análise biográfica: entender uma memória individual que se apóia na memória coletiva, tratando das narrativas históricas de cafeicultores da primeira metade do século XX.

Em Análise do nível de desenvolvimento socioeconômico do Estado de Mato Grosso do Sul o graduado Ricardo Fernandes Santos e a Professora Doutora Madalena Maria Schlindwein traz um estudo econômico que compara o desenvolvimento sul-mato-grossense com a média da região Centro-Oeste. Para facilitar a análise os autores utilizaram dados como: índice de natalidade, de mortalidade bruta e infantil, de Desenvolvimento Humano, taxa de fecundidade, de alfabetização, PIB (Produto Interno Bruto) per capita, entre outros. Alguns apontamentos de Santos e Schlindwein indicam que Mato Grosso do Sul têm o segundo melhor Índice de Desenvolvimento Humano da região. Porém, outros resultados referentes a indicadores econômicos citados no artigo apontam alguns aspectos não tão favoráveis.

A mestranda Ana Paula Menezes publica o artigo Colônia Agrícola Nacional de Dourados-História Memória: considerações acerca da construção de uma memória oficial sobre a CAND na região da Grande Dourados. O texto faz referência da implantação da CAND, um dos projetos do Estado Novo fruto do projeto político Marcha para Oeste. Conforme a autora a CAND teve grande repercussão devido ao desenvolvimento que possibilitou à região, o que lhe garantiu destaque na memória coletiva da mesma. Outro aspecto tratado no texto é a construção de uma memória oficial em torno da colônia que colaborou, de certa forma, para encobrir o mais simples e genérico significado da CAND na região de Dourados, atual Estado de Mato Grosso do Sul.

O próximo artigo livre Leitores eu vou contar, um caso impressionante, uma cena muito triste, e um crime horripilante: crimes e representações nos folhetos de cordel do Pará na primeira metade do século XX, de Geraldo Magella de Menezes Neto, analisa através de folhetos de cordel os diversos olhares e significados não só a respeito de crimes, mas também dos atores envolvidos. Conforme o autor desse trabalho o relato dos em poemas de cordel era comum e bem recebido em Belém do Pará na primeira metade do século XX. De acordo com Menezes, através de peculiar literatura, os poetas atribuíram valores aos criminosos e as vítimas, fatores discutidos ao longo do texto.

O graduando em economia Rafael Venturini Trindade nos traz o artigo A modernidade brasileira segundo Buarque de Holanda, o qual discute a evolução da sociedade nacional sob o olhar de Sérgio e Chico Buarque de Holanda. Para tanto, Trindade utilizou duas obras: Raízes do Brasil (1936) e Leite Derramado (2009). De acordo com o autor, principalmente em relação a Sérgio Buarque de Holanda, o trabalhos de alguns autores tratam as especificidades e angústias que comportam seu tempo.

O artigo da mestranda Rachel Gomes de Lima Contribuição a História da Freguesia de Inhaúma: Elites, Usos E Formas de Apropriação das Terras, Relações Sociais e Econômicas encerra a sessão de artigos livres dessa edição. Nesse trabalho Lima analisa as relações sociais e econômicas nas elites agrárias da freguesia rural de São Tiago de Inhaúma durante o século XIX. A partir das influências econômicas do período, a autora trata de fatores ligados a propriedades e uso da terra. O contexto histórico do Rio de Janeiro entre o final do século XVIII e primeira metade do XIX é levado em consideração para inserir São Tiago de Inhaúma no estudo.

A seguir a REHR apresenta três resenhas, sendo a primeira do livro O historiador e seu tempo: encontros com a história organizado por Tânia Regina de Luca, Antonio Celso Ferreira e Hollien Gonçalves Bezerra, a qual foi produzida por Diogo da Silva Roriz. A segunda O Crime do Restaurante Chinês – Carnaval, Futebol e Justiça na São Paulo dos anos de 1930 de Boris Fausto, resenhada por Daniel Rincón Caíres. E a terceira de Rute Guimarães Torres, A natureza dos rios: história, memória e territórios. Organizada por Gilmar Arruda.

Para finalizar essa edição trouxemos uma expressiva entrevista com o Padre Bartolomeu Meliá, expoente colaborador da Antropologia e História Indígena. A intenção do Conselho Editorial da revista é que a publicação das assertivas de Meliá, tragam novas reflexões para as pesquisas que integram o emaranhado histórico e antropológico indígena.

O Conselho Consultivo e Editorial lança mão de mais uma edição preparada com muito empenho pelo grupo que a compõe. Tenham uma boa leitura!

Cássio Knapp

Fernanda Chaves de Andrade

Diógenes Egidio Cariaga

Juliano Alves da Silva

(Editores)

Dourados-MS, Inverno de 2011.


ANDRADE, Fernanda Chaves de; CARIAGA, Diógenes Egidio; KNAPP, Cássio; SILVA, Juliano Alves da. Apresentação. Revista Eletrônica História em Reflexão. Dourados, v.5, n.9, jan. / jun., 2011. Acessar publicação original [DR]

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História e Mídia / Revista Eletrônica História em Reflexão / 2010

O Conselho Editorial e Consultivo da Revista História em Reflexão (REHR) apresenta para seus leitores a VIII Edição do periódico eletrônico. A temática do dossiê dessa edição, foi escolhida devido à crescente produção que envolve o uso das mídias, seja como objeto ou fonte de investigação histórica. Com imensa satisfação publicamos o dossiê História e Mídia, a fim de colaborar com as discussões dos historiadores acerca da utilização da imprensa na pesquisa histórica, assim como enriquecer o conhecimento acerca do tema.

Ao idealizarmos esse dossiê levamos em consideração a crescente produção acadêmica que se utiliza a imprensa como fonte e objeto de pesquisa. Além disso, tomamos como referência a crescente influência da mídia no cotidiano das sociedades, já que se utiliza de uma estratégia que procura inserir nas publicações o que é ansiado pelo seu público. A respeito desse aspecto, Robert Darton menciona em O Beijo de LamouretteMídia, Cultura e Revolução que devemos escrever para “imagens de pessoas”, as mais leigas possíveis (1990, p.71). Assim, entendemos a mídia como portadora de um discurso ideológico pelo qual procura influenciar os discursos, propondo representações carregadas de aspectos simbólicos. O fato das publicações dos diversos veículos da mídia se apresentar cada vez mais acessíveis, fez com que o mundo midiático fosse parte inerente do convívio diário humano.

Na historiografia brasileira que discute a imprensa, temos diversos autores e autoras que apresentaram propostas de metodologias que, sem dúvida, auxiliaram muitos dos trabalhos publicados nesse dossiê da REHR, são eles: Tânia Regina de Luca, Maria Helena R. Capelato, Nelson Werneck Sodré, entre outros. Tais autores apresentaram várias maneiras de se pensar historicamente, especificamente, a mídia imprensa. Destacam-se as colocações de De Luca ao considerar o fazer história “dos nos e por meios dos periódicos” através de um texto que merece a atenção dos historiadores, que foi publicado no livro Fontes Históricas organizado por Carla Bassanezi Pinsky (2005). De forma geral, as discussões acerca do universo midiático são muito amplas, dessa maneira a REHR procurou colaborar e apresentar textos que enriquecem tal historiografia.

Na atualidade, percebe-se um crescente aumento de trabalhos ligados à mídia considerada de “massas” como a televisão, rádio, Internet, por exemplo. No Brasil a popularização da mídia no final do século XX e início do XXI, fez com que muitos historiadores ligados à programas de pós-graduação se debruçarem à discussão acerca da cybercultura e do cyberespaço. Em geral, esses termos da atualidade apresentam a emergência de novos espaços de sociabilidade de um ambiente virtual que, com esse tipo de mídia cada vez mais próxima da população, anunciam um tempo em que a Internet permanece inerente ao convívio social de muitos. De certa maneira, assim como outros meios de comunicação, o ambiente virtual têm a Internet como um objeto que vem merecendo atenção dos historiadores, seja pelo apelo ao consumo que possui ou por ser uma ferramenta que auxilia e coloca o internauta em outra esfera de relacionamento humano.

A respeito do dossiê desse semestre (julho- dezembro / 2010) informamos que está repleto de artigos relacionados ao “universo da mídia”, além daqueles norteados por temas livres. A somar, resenhas e uma entrevista são apresentadas também nessa edição. De início temos o artigo Quantas grafias compõem a historiografia? Multimídia e novas linguagens em História de Genaro Vilanova Miranda de Oliveira, o qual cita que as mídias audiovisuais e sonoras que ainda não têm a atenção que merece da historiografia. Conforme o autor seus questionamentos estão centrados na possibilidade de pesquisadores, professores e alunos de História escreverem a partir de “alfabetos” baseados em sons e imagens e não apenas em textos de arquivos. Em um estudo que chama atenção, apresenta-se um método não convencional de escrita, a historiomidiografia. Através de uma proposta metodológica Oliveira propõe o uso de editores de imagem, de som e de ferramentas de Web design para ampliar as formas de narrar à disciplina histórica.

Em a Imprensa e Política no Brasil: considerações sobre o uso do jornal como fonte de pesquisa histórica, Márcia Pereira da Silva e Gilmara Yoshihara Franco discutem a utilização da imprensa como fonte de pesquisa focando as análises do político. As autoras colocam a imprensa como fenômeno da modernidade situando historicamente o advento da mídia imprensa no contexto brasileiro. Dessa forma, são analisados especificamente os jornais utilizando uma abordagem bibliográfica que pretende auxiliar àqueles que se iniciam na escrita histórica.

O trabalho Escrita histórica e escrita midiática: a produção de sentidos históricos e o acontecimento emblemático contemporâneo produzido por Sônia Meneses também compõe esse rol de artigos. Através desse estudo Meneses problematiza entre outros fatores os conhecimentos e acontecimentos históricos do mundo contemporâneo conforme as relações história e mídia. Dessa forma, a autora discute a influência da mídia no processo histórico, relacionando a formação e a relação do acontecimento midiático com o acontecimento histórico.

O trabalho de Juliana dos Santos Pereira e Fabiano Coelho Considerações sobre o “milagre econômico” brasileiro na imprensa douradense (1970-1973) se utiliza do campo político para analisar o discurso da imprensa da cidade de Dourados do atual Mato Grosso do Sul acerca do “milagre econômico”. Dessa forma, os autores apresentam o comportamento do periódico Folha de Dourados diante de um fenômeno que conheceu o surto desenvolvimentista do setor industrial e de sua infra-estrutura. De modo geral, o estudo procura analisar as representações do impresso diante as ações do Estado.

Diego Abelino José Maximo Moreira traz seu artigo O começo do rádio no antigo sul de Mato Grosso: instalação das primeiras empresas e seus objetivos (1930-1970). Nesse trabalho, Maximo analisa a instalação de emissoras de rádio nas seguintes cidades do atual Mato Grosso do Sul: Corumbá, Dourados, e Campo Grande. O autor leu em consideração a origem, capital e dificuldades enfrentadas pelas empresas. Conforme as colocações contidas no texto os proprietários eram de diversas localidades, localizados até mesmo fora do Estado de Mato Grosso.

No que se refere ao artigo A construção fílmica do passado: imagens e narrativas do movimento belicista de 1930, André Luiz dos Santos Franco discute sobre as representação fílmica contida em “Revolução de 1930” de autoria e direção de Silvio Back. O filme remonta ao ano de 1980, cinqüenta anos após o movimento civil militar que, através de um golpe, colocou no poder Getúlio Vargas. De acordo com o autor, o processo histórico onde se localiza o conflito serve de objeto para que o historiador possa compreender os métodos e técnicas utilizadas para originar a representação fílmica.

A seguir apresentamos aos leitores a sessão de Artigos livres dessa edição da REHR, iniciamos com o trabalho de Miguel Pacífico Filho Consenso, anacronismo e violência: a historiografia brasileira sobre a escravidão, que procura colocar em primeiro lugar fatores sobre a historiografia que versa sobre a escravidão, a partir de um confronto entre formulações que possuem sua base no consenso e aquele que considera a violência entre senhores e escravos como sendo plausível. Sendo assim, o autor salienta como tais debates se fundamentaram sob argumentos de anacronismo. Para além de tais questões elucidadas no texto, o autor expõe apontamentos mencionando alguns fatores que demonstra que tais debates extrapolam o universo acadêmico, situando por fim, o seu trabalho de doutoramento na discussão.

Luciano Demetrius Barbosa Lima apresenta o artigo Entre Cabanos e plebeus: a presença da história clássica romana na obra Motins Políticos. O autor toma como referência o livro Motins Políticos ou história dos principais acontecimentos políticos na Província do Pará desde o ano de 1821 até 1835 do historiador Domingos Antônio Raiol, para abordar questionamentos acerca da utilização por intelectuais brasileiros do século XIX, de fatores ligados à sociedade greco-romana. Lima através de seu estudo percebe tais referências em meio a uma descrição de conflitos políticos-sociais do Pará no texto de Raiol. O autor trata as menções à história Greco-romana a partir da noção de representação.

O artigo de Eder da Silva Silveira Estudo de caso e micro-história: distanciamentos, características e aproximações busca refletir sobre duas modalidades de pesquisa: o Estudo de Caso e a Micro-História. Atravéz de seu estudo o autor objetiva sinalizar algumas das principais características, distanciamentos, relações e aproximações entre Estudo de Caso e Micro-história.

No texto História Oral, Memória, História de Rodolfo Fiorucci sobre o uso da história oral e as publicações acerca da memória na trajetória epistemológica da disciplina histórica. No decorrer de seu texto Fiorucci faz uma breve explanação referente ao uso da história oral no Brasil e, além disso, trata dos métodos e teorias dessa vertente historiográfica.

O artigo do historiador José Costa D’Assunção Barros cujo título A escola dos Annales: considerações sobre a História do Movimento faz uma análise acerca do movimento dos Annales e suas respectivas fases que o compõe. Ao levar em consideração a sua importância para a historiografia, Barros trata de aspectos específicos que versam sobre a identidade dos Annales quanto um movimento. Desse modo, são analisados fatores ligados a interdisciplinaridade, a problematização da História, e as novas proposições nas formas de conceber o Tempo. Conforme esse entendimento o autor situa a discussão levando em consideração os novos rumos do saber histórico promovido pelos intelectuais ligados às fases tal movimento.

Rodrigo Machado da Silva apresenta o artigo Nas páginas descritivas do passado: a escrita da história como discurso para a civilização que traz um estudo sobre o que o intelectual mineiro Diogo de Vasconcellos discute a respeito da função e concepção de História. Através de livros de tal autor, como História Antiga Média de Minas Gerais Rodrigo M. da Silva analisa a construção e recepção da narrativa histórica na produção desse intelectual. Outro ponto abordado é aquele onde o autor do artigo analisa, é sobre a retórica utilizada para inserir Minas Gerais no que o estudioso mineiro tange como “ápice da civilização ocidental” durante o limiar do período republicano brasileiro.

Breno Mendes publica na presente revista uma análise cujo título Nossa (cordial) Revolução: o legado dos desterrados em sua própria terra remonta sua análise em algumas questões referendadas por Sérgio Buarque de Holanda que tiveram relevo na historiografia brasileira. Ao tratar de um tema que vincula esse historiador de renome, Mendes aborda de duas categorias referidas por Holanda: “cordialidade” e “nossa revolução”. O autor propõe analisar nesse texto o lugar social de Raízes do Brasil e na tentativa colocada pelo autor de uma “superação do passado”. Em linhas finais, o autor articulação entre conceitos que foram propostos por R. Koselleck e F. Nietzsche na narrativa de Holanda.

José Carlos da Silva Cardozo produziu e publica seu artigo O Juizado de Órfãos e a organização da sociedade nos anos iniciais do século XX, nesse texto, Silva estuda a atuação do Juizado de Órfãos da capital Gaúcha, Porto Alegre. Conforme os argumentos do autor, a instituição auxiliou para a regularização social de famílias da cidade, as quais enfrentavam uma situação de desagregação familiar, envolvendo menores durante o início do século XX. A partir de fontes que possuem informações sobre as tutelas dos menores, o autor percebe os valores morais nas decisões e desfechos de tutelas dos adolescentes e crianças.

Em Roma Locuta: Causa Finita? O repto da Igreja brasileira ao papado de João Paulo II texto elaborado por Lucelmo Lacerda, que procurou observar a formação do Cristianismo da Libertação e a oposição do Vaticano quanto à posição da primeira. Em seu texto o autor percebe a independência do modelo eclesial vinculados à Teologia da Libertação no interior da Igreja do Brasil. A partir de uma vasta bibliografia e entrevistas o autor propõe reordenar o relacionamento da Santa Sé e Igrejas locais.

Nesta edição a Revista Eletrônica História em Reflexão teve a honra de poder entrevistar o professor Jose Augusto Valladares Padua, professor do Departamento de História da UFRJ, que se dedica a pesquisar e escrever sobre a História Ambiental, figurando como um dos mais respeitados intelectuais brasileiros nesse campo. Influenciado por Warren Dean, seu livro Um Sopro de Destruição: Pensamento Político e Crítica Ambiental no Brasil Escravista (1786-1888) é, certamente, uma indispensável leitura para os interessados na temática Ambiental sob a ótica do conhecimento histórico.

Para fechar essa edição da REHR, publica a resenha produzida por Ismael Gonçalves Alves, cujo livro resenhado é História da infância em Pernambuco organizado por Humberto Miranda e Maria Emília Vasconcelos.

A Equipe que compõe a REHR deseja para os leitores um ótimo aproveitamento dos textos publicados. Agradecemos a todos a credibilidade confiada e que o labirinto da História apresentado nessa edição colabore para as reflexões de todos!

Camila Cremonese Adamo

Fabiano Coelho

Daniele Reiter Chedid

Cássio Knapp

Fernanda Chaves de Andrade

(Editores)

Dourados-MS, Verão de 2010.


CREMONESE, Camila Adamo; COELHO, Fabiano; CHEDID, Daniele Reiter; KNAPP, Cássio; ANDRADE, Fernanda Chaves de. Apresentação. Revista Eletrônica História em Reflexão. Dourados, v. 4, n.8, jul. / dez., 2010. Acessar publicação original [DR]

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Mundos do Trabalho: história e historiografia / Revista Eletrônica História em Reflexão / 2010

Apresentar mais uma Edição da Revista Eletrônica História em Reflexão (REHR) é motivo de imensa satisfação. Fruto de um esforço coletivo dos editores discentes do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal da Grande Dourados, dos membros do Conselho Editorial e do Consultivo, a cada lançamento a REHR tem dado passos relevantes na tarefa de se consolidar como meio de interlocução acadêmica na área de História em Mato Grosso do Sul, e no cenário brasileiro. Para tanto, evidentemente, vale destacar a confiança dos diversos autores de todo o país que contribuem com seus trabalhos e acreditam na seriedade e qualidade da Revista.

Em sua VII Edição, a REHR traz o dossiê: Mundos do Trabalho: história e historiografia. Esta temática permitiu abranger diversos trabalhos com problemáticas referentes aos “mundos do trabalho”, em suas mais diferentes relações. Questões como trabalho e trabalhadores, participação política, formas de organização, resistência e cultura de classes são algumas das perspectivas que abordam os artigos que compõem o dossiê. As abordagens evidenciam também as ações de trabalhadores diante das condições de trabalho desfavoráveis, as resistências e os modos constitutivos de seus universos culturais inseridos na dinâmica do trabalho, tanto no campo quanto na cidade. Sem mais delongas, apresentamos os trabalhos!

Iniciando o Dossiê, em O Mundo do trabalho lembrado e revivido por ex-moradores da “cidade flutuante” de Manaus, Leno Barata Souza preocupou-se em discutir aspectos do mundo do trabalho em Manaus, entre 1920 e 1967, através de narrativas orais. Este período foi marcado pela formação, sobre as vias aquáticas da cidade, de uma expressão cultural marcada por modos de vida próprios que foram pontos de partida para determinadas disputas sociais. Tais disputas tornaram as margens fluviais lugar de memórias para os entrevistados de Souza, especialmente o que diz respeito às sociabilidades do mundo do trabalho. A Zona Franca, inaugurada em 1967, fez desaparecer muitas destas relações sociais, porém, ainda permanecem na memória dos entrevistados, que a utilizam para reconstruir o passado e discutir sobre presente e futuro da cidade de Manaus.

O trabalho de Eric Gustavo Cardin, Os Trabalhadores das vias Públicas de Ciudad Del Este: considerações preliminares sobre os mesiteros e suas associações problematiza aspectos das relações de trabalho estabelecidas pelos trabalhadores das vias públicas da Ciudad Del Este nos últimos trintas anos. Através de pesquisas documentais disponibilizadas pela Associação dos Trabalhadores das Vias Públicas de Ciudad Del Este, levantamentos estatísticos e entrevistas exploratórias de trabalhadores do microcentro, foi possível compreender a história dos trabalhadores e os conflitos existentes na configuração e utilização do espaço público em questão, de modo a surgir, gradativamente, diferentes ocupações e suas respectivas associações e sindicatos. Nesta perspectiva, procurou construir reflexões sobre os vínculos existentes entre as organizações sociais e a municipalidade, além de observar determinadas mudanças no funcionamento e objetivos das associações de trabalhadores, e esboçar algumas considerações sobre o perfil dos mesmos.

Saulo Álvaro de Mello, em Recrutamento Compulsório e Trabalho em Mato Grosso: disciplina, violência, castigos e reações, discute a participação de marinheiros submetidos à violência sistêmica nas embarcações da Flotilha de Mato Grosso (1825 e 1879), evidenciando assim o anacronismo e a violência verificados nas Companhias de Aprendizes Marinheiros e Imperiais Marinheiros em Mato Grosso, tal como acontecia na Marinha Imperial. Foram utilizadas como fontes documentais correspondências, relatórios provinciais e ministeriais como suporte para as discussões, que enfocaram o homem livre pobre, enjeitados, órfãos e vadios, como principais vítimas.

“E ninguém parece sentiu saudade”: narrativas e memórias da diferença, trabalhadores horteleiro no Extremo-Oeste do Paraná é ó título do artigo de Gilson Backes, que propõe investigar as dinâmicas sociopopulacionais desencadeadas nas décadas de 1960 e 1970, no extremo oeste do estado do Paraná, de modo identificar as diferentes maneiras que trabalhadores migrantes circunscreviam suas dinâmicas de trabalho no período em questão.

Raimundo Lima dos Santos discute em Manoel Conceição Santos: de camponês a líder político a história de um camponês maranhense que se tornou um dos maiores articuladores da luta camponesa em resistência ao regime militar do país. Manoel Conceição Santos foi organizador do sindicato de trabalhadores rurais no vale do PindaréMirim, no Maranhão e, posteriormente, participou da organização de entidades como a Central Única dos Trabalhadores (CUT), o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Centro de Educação e Cultura do Trabalhador Rural (CENTRU). Por estas ações, Manoel Conceição Santos foi perseguido, preso e torturado na ditadura militar, até ser exilado em Genebra, onde, juntamente com outros exilados políticos, organizou a luta contra governos repressivos do período. Após seu retorno ao país, depois de três anos de exílio, manteve sua luta por uma sociedade mais justa, através do trabalho de associações e cooperativas, visando o aperfeiçoamento dessas organizações e o bem-estar dos trabalhadores.

Selva Trágica: imposições e resistências é o artigo de Fábio Luiz de Arruda Herring. A proposta é analisar os pontos históricos da obra de Hernani Donato: Selva Trágica: a gesta no sulestematogrossense. As discussões estão inseridas no cone sul do atual estado de Mato Grosso do Sul, no período correspondente ao início do século XX e problematizam as imposições feitas à cultura dos trabalhadores da Companhia Matte Larangeira e as formas de resistência criadas por eles para manter os elementos constitutivos de sua cultura.

Divino Marcos de Sena, em Camapuã no Período do Ocaso das Monções: população, trabalho, lavoura, exploração e resistências explica como as monções contribuíram para garantir a expansão do território da colônia portuguesa na América, através de saídas da capitania de São Paulo, que tinham por objetivo dar suporte aos núcleos populacionais que se formavam no decorrer do século XVIII e nas primeiras décadas do século XIX. Assim, as monções proporcionaram o florescimento de vários povoados e, entre eles, Camapuã, que se tornou uma importante localidade para dar apoio aos viajantes. A proposta do autor é apresentar algumas características de Camapuã no período final da rota das monções, enfocando o quanto sua existência foi fundamental no período monçoeiro.

O trabalho de Nilo Dias de Oliveira, A Vigilância do DOPS-SP: vigia-se tudo e todos, analisa a prática da vigilância do Serviço Secreto do DOPS-SP durante a década de 1950, que durante o período, recaiu sobre os mais variados personagens da esfera civil e militar do país. Foram evidenciadas como, no período, qualquer tentativa de participação ou engajamento político partidário ou mesmo movimentos reivindicatórios que demonstrasse ser de posição contrária ao estabelecido pelas esferas governamentais tornava-se alvo de suspeita imediatamente.

Encerrando o Dossiê, Jorge Eremites de Oliveira, em Sobre a Necessidade do Trabalho Antropológico para o Licenciamento Ambiental: avaliação dos impactos socioambientais gerados a partir da pavimentação asfáltica da Rodovia MS-384 sobre a comunidade Kaiowa de Ñande Ru Marangatu, apresenta uma avaliação dos impactos socioambientais sofridos pela comunidade Kaiowa de Ñande Ru Marangatu durante e após a construção da rodovia estadual MS-384, no distrito de Campestre, município de Antônio João. O estudo enfoca os muitos aspectos negativos diretos na comunidade, que se estruturaram em dois momentos: o primeiro durante a pavimentação asfáltica e o segundo após sua inauguração, e vão desde a discriminação racial, doenças decorrentes da inalação de poeira e do estresse causado durante a obra até atropelamentos com vítimas fatais.

Na sessão de Artigos Livres, iniciamos com o artigo de Edianne dos Santos Nobre: Porta dos Céus: Juazeiro como lugar de salvação a partir de narrativas femininas (Ceará, 1889-1896). O artigo se propõe analisar as narrativas das beatas envolvidas nos episódios de fé em Juazeiro, de modo a compreender, a partir de tais narrativas, as imagens que fundaram o local como um espaço sagrado e de salvação nas imagens presentes em um conjunto de narrativas femininas no final do século XX.

Literatura e Política na Revolução Mexicana: a visão crítica de Mariano Azuela é o artigo de Warley Alves Gomes que discute como a Revolução Mexicana, marco na história daquele país, teve seus desdobramentos por todo o século XX, principalmente no que concerne o intenso caráter popular e a participação das classes populares, até então à margem da vida política mexicana. A Revolução Mexicana é vista neste artigo a partir da visão crítica de Mariano Azuela, um renomado escritor mexicano, que evidencia como as artes e literatura exerceram um importante papel na reflexão sobre o conflito.

Margarida do Amaral Silva, em Codificação das Diferenças: a invenção do homem latino propõe discutir as desconstruções dos discursos produzidos sobre aqueles dos quais suas vozes sempre foi nula ou irracionalizada pelas teorias vigentes sobre grupos subalternos, no que diz respeito à raça, gênero ou posição social. A subalternidade racial é adotada como perspectiva por discutir e ampliar a visão da idéia de subalternidade das colônias modernas, da racionalização do sujeito e do conhecimento.

Hermes Gilber Uberti, no artigo: Assumindo Outros Papéis: o caso da viúva Francisca Pereira Pinto, teve por objetivo analisar situações ligadas à trajetória da mulher no processo de povoamento e colonização da fronteira oeste do Rio Grande do Sul, a partir da análise das migrações que Francisca Pereira Pinto realizou ao longo do século XIX naquela região. Alguns papéis foram assumidos por ela, ao longo das andanças, entre os quais o de viúva que a levou, entre outras coisas, a assumir a gerência dos negócios, condição que a fez recorrer a diferentes instâncias do poder para fazer valer seus direitos. Além do patrimônio, estavam em jogo interesses outros, como seu reconhecimento social, sua respeitabilidade e o nome da família que pertencia.

Janderson Clayton Farias Machado, com o artigo: O Despertar do Recife no Brasil Holandês propõe abordar como se estruturou o desenvolvimento experimentado por Recife após a invasão holandesa em Pernambuco, enfocando as transformações que a tornaram um grande centro político, econômico e cultural na América Portuguesa, considerando a importância que a administração de Maurício de Nassau teve e o modo como ficou marcada na história de Pernambuco.

Estados Unidos: o contexto dos anos 1970 e as crises do petróleo é o artigo de Havana Alicia de Moraes Pimentel Marinho, que discute o panorama das várias crises dos anos 1970 dentro da perspectiva dos Estados Unidos. No período em questão, dominava a sensação de forte declínio da economia após os frutíferos “anos dourados” do pós-guerra, deste modo, as conseqüências políticas e econômicas dos acontecimentos e as decisões da política externa serão avaliadas no período proposto.

Finalizando a Edição, apresentamos duas resenhas: O desafio biográfico (2009), de Dosse François, resenhada por Fernanda Lorandi Lorenzetti, e George Zeidan Araújo apresentou a resenha da obra Política, cultura e classe na Revolução Francesa (2007), de Lynn Hunt.

Desejamos prazerosas e profícuas leituras!

Camila Cremonese Adamo

Fabiano Coelho

Daniele Reiter Chedid

Cássio Knapp

Fernanda Chaves de Andrade

(Editores) Dourados – MS, Inverno de 2010.


CREMONESE, Camila Adamo; COELHO, Fabiano; CHEDID, Daniele Reiter; KNAPP, Cássio; ANDRADE, Fernanda Chaves de. Apresentação. Revista Eletrônica História em Reflexão. Dourados, v. 4 n.7, jan. / jun., 2010. Acessar publicação original [DR]

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