Pour l’histoire des relations internationale | Robert Frank

Publicada, em 2012, pela Presse Universitaires de France, a obra do renomado professor Robert Frank, herdeiro da Escola Francesa, é um manifesto em defesa da História das Relações Internacionais. A revolução da disciplina, feita por Renouvin e Duroselle, na primeira metade do século XX, transformou a história diplomática em um estudo mais amplo, analisando forças que vão além dos documentos oficiais e abrangem as relações entre os povos e as sociedades. Na visão do autor, apesar dessa revolução, a disciplina ficou com uma imagem negativa e anacrônica, pois permaneceu identificada à antiga história linear das chancelarias. Dessa forma, o historiador francês de origem judia e escocesa, escreveu este livro de referência, um verdadeiro manual, em que compila as principais evoluções desenvolvidas na Escola Francesa de Relações Internacionais desde seu surgimento até os dias atuais.

A obra está organizada em cinco grandes partes que, ao longo de trinta capítulos e 756 páginas, escritas com a colaboração de vinte e um autores, analisam as transformações na História das Relações Internacionais. A disciplina foi profundamente renovada pelo contato com outras ciências sociais e desenvolveu vasta diversidade de métodos e abordagens. Uma das preocupações principais do livro é analisar a relação entre a construção das democracias europeias e a evolução dos sistemas internacionais a partir do século XIX. O autor demonstra que medidas democratizantes, como a implantação do sufrágio universal, não foram acompanhadas de semelhante processo de democratização na política internacional, que, até a I Guerra Mundial, continuou sob o comando restrito de chefes de governo e de gabinetes diplomáticos, passando ao largo dos parlamentos e da opinião pública. Leia Mais

nserção Internacional: formação dos conceitos brasileiros | Amado Luiz Cervo

Eis uma criativa reflexão nacional, essencial às comemorações que se aproximam do centenário da disciplina dedicada ao estudo das relações internacionais. O livro de Amado Luiz Cervo inova ao sistematizar conhecimento brasileiro essencial à formação de conceitos em relações internacionais.

O argumento central do autor é que o Brasil, ao lado de uma dezena de países, propõe conceitos próprios a essa área do conhecimento, tanto quanto próprias são as concepções dos demais centros de produção científica para o estudo das relações internacionais em outras regiões do mundo. A espinha dorsal do livro situa-se no diálogo do pensamento brasileiro com os conhecimentos disponíveis na conformação epistemológica da disciplina. Situa Cervo o Brasil como uma nação de experiência singular ao fazer “de si idéia própria do papel a desempenhar no mundo”. Utilíssimo à grande área voltada para o estudo dos vínculos entre sociedades nacionais e o meio internacional, o autor se inspira no ambiente acadêmico brasileiro e latino-americano, e também na história acumulada pela prática diplomática brasileira bem como pela trajetória do Estado nacional. Leia Mais

Do nacional-desenvolvimentismo à internacionalização no Brasil subnacional: o caso do Ceará | José Nelson Bessa e Déborah Barros Leal Farias

Eis uma obra plasmada pela oportunidade e inventividade dos seus autores. Do nacional-desenvolvimentismo à internacionalização no Brasil subnacional: o caso do Ceará demonstra a renovação que vem se impondo, com grande naturalidade, na reformulação nos cânones da pesquisa e do ensino das Relações Internacionais no Brasil. Claro, sucinto e bem escrito, o livro tem duas claras contribuições. Por um lado, escrutina aspecto extremamente relevante para as sociedades democráticas modernas: o limites da high politics ante a necessidade imperativa do avanço da low politics. Embrenham-se os autores no esforço de demonstração da capacidade dos entes subnacionais na conformação da política externa do Estado nacional. Evidencia-se, na leitura da obra, o quanto o Brasil está atrasado na matéria e o quanto está para ser feito. Leia Mais

Política externa da Primeira República: os anos de apogeu (1902 a 1918) | Clodoaldo Bueno

Nas últimas décadas, o grande historiador Clodoaldo Bueno vem se destacando como um dos mais abalizados sobre a política externa brasileira, fenômeno que agora se repete com o lançamento de sua mais nova obra. Esta já surge como leitura essencial para os que militam no campo da história das relações internacionais, uma vez que o autor, demonstrando amplo conhecimento do tema em questão, narra, de forma celebrável, o desenrolar da formulação da política externa nos anos seguintes à década do nascedouro da República brasileira. O prefácio do professor Amado Luiz Cervo fala por si: a obra “compõe, ademais, a tríade de obras hoje indispensáveis ao conhecimento da evolução da política exterior durante a denominada República Velha”, juntamente com outro livro de Bueno, A República e sua política exterior, 1889-1902 (São Paulo: Ed. Unesp, 1995) e a Tese de Doutorado defendida por Eugênio Vargas Garcia, Entre América e Europa: a política externa brasileira na década de 1920 (Universidade deBrasília, 2001).

Apresentando recorte temporal de 1902 a 1918, Bueno seduz o leitor com a forma que o argumento principal de seu livro é exposto. Tendo como desafio principal “reconstruir o sistema de idéias de Rio Branco” (p. 23), o autor a ele dedica a parte mais longeva da obra, sem que haja, no entanto, a ausência de uma correta exploração da formulação da política externa brasileira nos anos que antecederam e precederam a chancelaria do Barão (1902-1912). Leia Mais

Israel-Palestina: a construção da paz vista de uma perspectiva global | Gilberto Dupas e Tullo Vigevani

Há algo singular na apreciação das relações internacionais contemporâneas e na história das relações internacionais do século XX. Apenas um tema tem sido ultrapassado, em volume e proporção quantitativa, pelo estudo das questões Israel-Palestina: a Grande Guerra de 1914-1918. Isso evidencia algo a nos induzir a uma forte preocupação: mais do que a paz, como lembram os clássicos realistas, a guerra é ainda o cerne a dar fundamento epistemológico às relações internacionais.

Nesse sentido, à primeira vista, pareceria que o livro organizado por Dupas e Vigevani padeceria da síndrome do sucesso do tema em voga ou da pouco criativa recorrência ao lugar comum, ao já dito, ao já qualificado. Em outras palavras, ao déjà vu. Mas não é isso o que emerge ao longo da leitura da coletânea conduzida pelos colegas paulistas. O conflito Israel-Palestina é posto em tela de uma maneira original, no esforço teleológico da busca de caminhos da paz. Os autores, ao aceitarem o desafio, não reificam a guerra, mas a desconstroem, de fato, por meio de múltiplos olhares e binóculos distintos, mas a partir da mesma colina: a da vontade de celebrar a convivência de contrários. Leia Mais

O Direito Internacional em um mundo em transformação | Antonio Augusto Cançado Trindade

Um livro de mais de mil páginas assustaria grande parte dos leitores contemporâneos, ávidos por literatura ligeira, descartável e de linguagem fácil. A esse leitor desapercebido, sem interesse ademais por um substantivo discurso jurídico – a incluir a dimensão de um “mundo em transformação”, quando o que lhe interessaria seria a “conservação do mundo”, da sua paróquia, da sua tribo, como nos faz recordar Mafesoli – o novo livro de Antonio Augusto Cançado Trindade nada lhe dirá.

A todos nós, no entanto, que acompanhamos desde os anos 1970, a difícil forja de um pensamento brasileiro de relações internacionais, não mais prisioneiro da cópia e da reprodução colonial que insiste em imperar nas salas de aula dos nossos cursos de graduação e pós-graduação na área, nada poderia ser mais bem recebido que o novo livro do grande internacionalista. Reagindo de forma explícita à reprodução do discurso dos outros, especialmente dos centros hegemônicos, mas antenado à revolução conceitual e na jurisprudência do Direito Internacional Público nas últimas décadas em muitas partes do mundo, a obra do elegante professor e jurista brasileiro das relações internacionais traz um contentamento elevado para todos aqueles que militam no campo. Leia Mais

Europa y la globalización. Tendencias, problemas, opiniones | Víktor Sukup

A nova obra do austríaco que se fez latino-americano, nas expressões de Aldo Ferrer no prólogo de Europa y la globalización, evidencia o ângulo de quem, há mais de dez anos, trocou a Áustria pelo Extremo Ocidente. A Europa é revisitada por meio de uma linguagem solta, sem as amarras do excesso de rigor da pesquisa documental do historiador das relações internacionais e com a desenvoltura da tradição ensaísta da América Latina. O europeu converte-se às hostes daqueles que buscam, por intermédio da vontade integradora da explicação e do uso de uma certa sociologia das relações internacionais, uma maneira toda especial de ver a Europa na passagem do milênio.

O norte da obra é o da relação da Europa com o fenômeno da globalização. Encontrará a Europa um lugar próprio na ordem global? Vem a Europa explorando as oportunidades abertas pelas novas rotas produtivas e financeiras mundiais? Há riscos para a inserção competitiva na Europa, particularmente diante da hegemonia norte-americana neste final de século? São essas algumas perguntas essenciais, abordadas por Sukup com elegância e vontade de intervir no espaço das decisões políticas do seu tempo. Leia Mais

L’Economie de l’Afrique / Philippe Hugon

Como a economia da África evoluiu da época colonial ao período da independência? Por que sua produtividade econômica se encontra em fase de estagnação? Quais os efeitos da intensa competividade internacional dos últimos anos sobre as debilitadas estruturas econômicas do continente? Os instrumentos tradicionais da análise econômica são eficazes diante dos desafios interpretativos que são impostos pelas novas condições econômicas da África? Por que as trajetórias econômicas de seus países são tão diversas entre si? A África, enfim, recusa o desenvolvimento? Essas, entre outras relevantes questões, constituem os pontos de partida do professor de economia de Universidade de Paris-X (Nanterre), Philippe Hugon, para a produção do sua obra, em formato de “livre de poche”, com a profundidade do especialista que tem o sentido do grande público leitor. Contando com a experiência da direção do Centre de Recherche en Economie du Dévelopment (CERED) e a autoria de muitas obras dedicadas à análise do desenvolvimento na África; com a vivência de inúmeras consultorias internacionais; e com as lições de dez anos como professor em diferentes países africanos (principalmente nos Camarões e em Madagascar), Hugon apresenta ao leitor uma obra condensada e rica.

Qualquer autor que pretenda produzir uma obra de síntese sobre o tema da economia africana enfrentará um desafio delicado. Há a dificuldade de delimitar o essencial, mesmo quando se pretende, como foi o caso na obra de Hugon, abordar exclusivamente a África ao sul do Saara. É que o subcontinente é uma terra de contrastes: nove grandes regiões, com 45 países, dos quais 35 possuem menos de 10 milhões de habitantes e 15 são enclaves. Todos eles abrigados sob um PIB da ordem de 230 milhões de dólares, em 1990, o mesmo do México ou dos Países Baixos. Somam cerca de 520 milhões de habitantes e representam, sem a África do Sul, 10% da população mundial, 2% do PIB, 1,7% das exportações e menos de 1% do valor agregado industrial do mundo. Abordar, portanto, essa diversidade no quadro da economia mundial é uma tarefa que impõe um tremendo esforço de síntese. Philippe Hugon dá provas da sua capacidade de construtor de sínteses através desta obra recém lançada.

Existem ainda as dificuldades metodológicas. Os utensílios da análise econômica devem ser aplicados linearmente ao continente? Ou devem ser questionadas as categorias da análise econômica a partir das particularidades africanas? Há uma complexa especificade africanista que deve ser compreendida, ao mesmo tempo que há legitimidade da economia. As perspectivas da longa-duração e os regimes de acumulação e de crise devem ser privilegiados sobre os quadros de equilíbrio e dequilíbrio de preços e quantidades? Para Hugon, a economia do desenvolvimento não deve ser somente a aplicação de um campo particular dos instumentos da análise econômica universal. E l a deve ser também um espaço de questionamento da “caixa preta” das estruturas sociais e dos mecanismo particulares dos países com herança colonial. Esse é exatamente o caso africano. Assim, a análise da economia do desenvolvimento africano não pode prescindir da História e dos enfoques econômicos de longa duração que permitem vislumbrar a gênese de parte das grandes questões sugeridas pela atualidade africana.

A partir das duas perspectivas anteriores, Hugon divide sua obra em três grandes unidades. Na inicial, apresenta a evolução estrutural da economia, da época mercantilista às crises contemporâneas. Em uma perspectiva macroeconômica, o autor trata o tema da colonização direta do continente, de 1870 a 1960, depois de uma abordagem bastante breve, mas convincente, dos séculos do tráfico mercantilista. Há também nessa unidade uma interessante análise das disfunções e desequilíbrios setoriais constituídos com o processo colonial na África.

Três temas extremamente reinteressantes encerram a referida unidade: a crescente marginalização internacional do continente, a crise comercial e o endividamento permanente. Lembrando Raffinot, o autor afirma claramente que “a África sub-saárica ficou, ao longo dos anos 80, presa à engrenagem do endividamento permanente.” (p. 48) A segunda unidade aborda as questões da racionalidade socio-econômica da economia do desenvolvimento africano. O autor busca atacar a antinomia colonialista da chamada irracionalidade do homo africanas contra a racionalidade do homo economicus. Mas isso não significa que não se deva buscar especificidades no comportamento econômicos dos agentes econômicos africanos. Hugon não deixa de discutir a lógica da minimização dos riscos, típica dos agentes econômicos africanos. O pouco investimento, o desinteresse pela educação e a tendência à diversificação seriam características bastante relevantes para a instabilidade e a incerteza econômica.

Ainda nessa segunda unidade, vale observar a análise de Hugon sobre a informalização da economia africana. Tema de grande interesse para o leitor brasileiro, a economia informal permanece como uma reminiscência pré-colonial, e colonial com grande significado no sistema econômico.

A terceira unidade do livro talvez seja a que mais chama a atenção. Hugon aborda o tema das políticas econômicas a do tadas e suas trajetórias históricas. Abordando desde as políticas liberais, de ajustamento ou de intervenção, o autor mostra seu ceticismo em relação à eficiência de tais políticas no contexto africano. Ao longo da histórica econômica do continente, elas não teriam conseguido enfrentar plenamente ou solucionar os principais desafios econômicos da África.

Outro aspecto interessante observado é a diversidade das trajetórias históricas dos diferentes modelos de política econômica. Os principais pólos regionais, em torno dos quais houve certo nível de desenvolvimento econômico, são analisados, a saber: a África do Sul, a Nigéria e a África Ocidental de expressão francesa.

Para concluir, Hugon discute perspectivas. Em uma visão bastante menos pessimista do que a maioria dos textos recentes sobre a economia da África, o autor não deixa de reconhecer a viabilidade do continente. Criticando o afro-pessimisme, Hugon acredita que será possível a saída do fundo do poço, desde que os países africanos, através de um esforço político brutal das suas elites, encontrem algum caminho menos tortuoso para o desenvolvimento.

José Flávio Sombra Saraiva

HUGON, Philippe. L’Economie de l’Afrique. Paris, Editions La Découverte, 1993. 124p. Resenha de: SARAIVA, José Flávio Sombra. Textos de História, Brasília, v.1, n.2, p.154-157, 1993. Acessar publicação original. [IF