Como as ciências sociais e humanidades veem, sentem e leem o território? / Ponta de Lança/2020

A pergunta que dá título ao dossiê representa anseios convergentes de diversas matizes que buscam não apenas sintetizar, mas todo o contrário, possibilita oferecer um exercício de análise que seja verdadeiramente abrangente.

O objetivo central deste questionamento é apresentar os diversos vieses científicos sobre os quais o território é encarado e discutido, desde sua tradição ontológica que traz o sentido de dimensão espacial que se revela através dos processos tanto de dominação concretos, quanto em termos imateriais na produção de identidades, subjetividades e simbolismos criados e recriados pelos atores / agentes responsáveis pela sua (re)produção. Leia Mais

Livros e leituras / Mnemosine Revista / 2015

Livros, leitura e múltiplas interpretações

“A maior parte do tempo de um escritor é passado na leitura, para depois escrever; uma pessoa revira metade de uma biblioteca para fazer um só livro.” Samuel Johnson

As palavras do escritor e pensador inglês Samuel Johnson (17091784) permite-nos conjecturar sobre a complexidade existente para se elaborar um texto: de início, a escolha de um assunto e sua consequente pesquisa; depois, a seleção de textos que possibilitem o estudo do conteúdo a ser pesquisado, que pode ser realizada em bibliotecas. A seguir, vem à leitura dos textos selecionados e, por último, a redação.

Hoje, no primeiro semestre de 2015, passados aproximadamente duzentos de cinquenta anos das palavras escritas por Samuel Johnson, e graças aos avanços tecnológicos, o acesso aos textos tornou-se facilitado, muito em decorrência da informática. Para muitos, com o advento e a proliferação da internet, a mudança de suporte, a tela e o teclado – que pode ser do computador, de telefones móveis ou dispositivos portáteis – substituindo o papel e a tinta, aumentou a eficácia no armazenamento, na manipulação e na maneira de comunicação e acesso aos textos anteriormente restritos apenas aos ambientes físicos de bibliotecas localizadas nos grandes centros (que podem estar perto ou longe do leitor) ou nos rincões mais afastados do planeta.

Na internet, as bibliotecas virtuais e os grandes repositórios de textos e livros permitem ao pesquisar o acesso a uma infindável quantidade de informações que, anteriormente, não se tinha. A cada ano, a quantidade de publicações e o aparecimento de periódicos científicos online aumentam substancialmente, ao ponto de não sabermos, ao certo, por exemplo, o número de revistas científicas existentes. As estimativas variam muito: a página do SciELO permite o acesso a mais de mil periódicos científicos em textos completos. O Portal de Periódicos CAPES dá acesso a mais de 35 mil revistas científicas.

Apesar de todas as facilidades no acesso aos textos e a dinâmica interativa da leitura e da escrita propiciada pelo computador, muitas pessoas ainda são reféns do folhear o papel físico e do sentir o cheiro de um bom livro “velho”. Outros aderiram ao texto digital, por propiciar leitura interativa e coletiva, em virtude das várias janelas hipertextuais multissequenciais que se podem abrir a todo o instante, fazendo com que a unidade de leitura se encaminhe rumo a novas e inesperadas conexões entre textos.

Ao lado dessas duas maneiras de acesso aos textos – impressos ou digitais – existem os leitores e pesquisadores que imprimem os textos online para lê-los no papel. Seja qual for a sua predileção, os textos do dossiê que vocês – leitores da revista Mnemosine – terão acesso, a seguir, foram escritos por leitores-intérpretes que compareceram a bibliotecas no desafio de escrever, após revirar os seus acervos na busca de respostas a suas inquietações e indagações de pesquisa.

Os onze artigos que constituem o presente dossiê analisam, a sua maneira, diversificadas práticas culturais e políticas transmitidas por agentes que intervieram nos episódios e processos históricos que participaram, possibilitando-nos conhecer, após as investigações de seus autores, as representações de mundo, os conceitos, as linguagens, as conjunturas históricas e as suas mais diversas formas culturais e políticas, registradas em uma determinada historicidade.

Guiando-se pela lógica de que a produção textual está imersa em circunstâncias, incidentes e intencionalidades do autor, operadas, por exemplo, para ensinar e desenvolver um espírito de universalidade, o dossiê se abre com o artigo de Rubens Leonardo Panegassi (Universidade Federal de Viçosa, UFV), que contextualiza a produção do humanista português João de Barros e o seu posicionamento político frente ao contexto histórico existente no reinado de dom João III.

Ainda com ambientação em Portugal, Adriana Angelita da Conceição (Pós-Doutoranda em História pela Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP) apresenta-nos a obra “O governador de praças”, de Antonio de Ville Tolozano, que serviu às discussões políticas travadas pelo vice-rei marquês do Lavradio durante seu governo no Brasil.

A fundação da Biblioteca Pública de Lisboa, em 1796, ocorrida durante a regência de dom João, serviu de mote para Juliana Gesuelli Meirelles (Pontifícia Universidade Católica de Campinas, PUCCAMPINAS) apresentar o bibliotecário régio Antonio Ribeiro dos Santos e discutir a circulação de livros particulares naquele período.

A seguir, Francisco Topa (Universidade do Porto, em Portugal) comenta a obra literária de João Mendes da Silva e descortina as suas indicações de leitura no contexto do Rio de Janeiro de finais do século XVII.

Encaminhando-nos rumo à América hispânica, chegamos a Clementina Battcock (Universidad Autónoma Nacional de México, UNAM) e Sergio Botta (Sapienza Università di Roma, Itália) que lançam luz sobre a guerra entre incas e chancas representada na obra “Historia del nuevo mundo” (1653), do cronista Bernabé Cobo.

Já Patricia Escandón (pesquisadora do Centro de Investigaciones sobre América Latina y el Caribe, CIALC, da Universidad Nacional Autónoma de México, UNAM) apresentanos a obra “Historia general del Perú”, do frei Martín de Múria.

Utilizando-se dos fotolivros “Au Mexique” e “Brésil”, de Pierre Verger, Carlos Alberto Sampaio Barbosa (Universidade Estadual Paulista, UNESP, câmpus de Assis) discute a importância dos fotolivros na construção de uma cultura visual latino-americana e como Verger ajudou a elaborar uma identidade visual naqueles dois países na primeira metade do século XX.

Por intermédio das análises de Neuzimar Campos e Silva (Frade da Ordem Franciscana) e Neimar Machado de Sousa (Universidade Federal da Grande Dourados, UFGD) chegamos ao filósofo argentino Enrique Dussel, considerado um dos mais destacados expoentes da Filosofia da Libertação e do pensamento latino-americano.

O romance “Um rio imita o Reno” serve de inspiração para Rodrigo Luis dos Santos (Mestrando em História pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos, UNISINOS) comentar a construção realizada por Clodomir Vianna Moog sobre o imigrante e descendente não vinculado de forma opcional à sociedade brasileira nas décadas de 1930 e 1940.

Roger Domenech Colacios (Universidade Estadual de Londrina, UEL, e Pós- Doutorando em História na Universidade Estadual Paulista, UNESP, câmpus de Assis) analisa as alterações realizadas pelo filósofo das ciências Bruno Latour em sua obra “Vida de laboratório: a construção dos fatos científicos”, escrita em coautoria com o sociólogo britânico Steve Woolgar, referente às edições francesa e brasileira, publicadas em 1988 e 1997, respectivamente, permitindo-nos pensar se as alterações realizadas em um texto impresso são apenas transformações dentro de uma obra ou se são transformações de um autor.

Assim, como autores e leitores que somos, cabe-nos praticar múltiplas interpretações dos impressos e textos eletrônicos que nos aparecem a cada dia.

Boa leitura!

André Figueiredo Rodrigues – Professor do Departamento de História da Faculdade de Ciências e Letras, da Universidade Estadual Paulista (UNESP), câmpus de Assis.


RODRIGUES, André Figueiredo. Apresentação. Mnemosine Revista. Campina Grande, v.6, n.1, jan. / mar., 2015. Acessar publicação original [DR]

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Mídias, leituras e viagens / Varia História / 2001

A revista do Programa, Varia Historia, redefiniu, a partir de 1999, os critérios para seu novo perfil, e iniciou sua reformulação editorial a partir do número 20, publicado no primeiro semestre daquele ano. Entre outros objetivos, pretendeu-se ampliar a participação de pesquisadores nacionais e internacionais refletindo o intercâmbio acadêmico que o Programa de Pós-graduação em História da UFMG vem solidificando. O número 25 apresenta mais uma inovação em seu projeto editorial: a organização de um dossiê temático. A opção pela confecção de dossiês se liga à estratégia de maior vinculação da revista às linhas de pesquisa que compõem o referido Programa, a saber: História e Culturas Políticas, História Social da Cultura, e Ciência e Cultura na História.

A Varia Historia vem se firmando como espaço privilegiado do debate histórico e a organização de Dossiês permitirá que as diferentes linhas explorem temas de pesquisa dentro do universo teórico de cada uma delas, envolvendo seus pesquisadores na preparação dos mesmos, em constante intercâmbio com os estudiosos de outras instituições. Os Dossiês também pretendem refletir os seminários e os debates promovidos pelas linhas no decorrer do ano acadêmico, envolvendo o corpo docente e discente e pesquisadores convidados.

O Dossiê Mídias, leituras e viagens foi uma iniciativa da linha de História Social da Cultura e reflete alguns dos temas que têm instigado os estudos no campo da cultura: a produção e a circulação dos livros, as práticas de leituras, os mecanismos de difusão e mídia, as teorias de recepção, tendo como pano de fundo o fenômeno e o movimento das viagens como espaços privilegiados para a produção de conhecimento. As viagens que nos interessam aqui são aquelas que significaram renovação do conhecimento, fruto da observação de todos aqueles, que “por meio das viagens, querem conhecer utilmente o mundo”.

O primeiro texto foi gentilmente cedido pelo Prof. Robert Darnton e discute os processos de formação e de difusão de notícias na França do Antigo Regime, tecendo instigantes questões a respeito da formação e do conceito de mídia para a época. Outra novidade que o autor apresenta é que a leitura do artigo não se esgota em si mesmo. O leitor é convidado a visitar a versão eletrônica do paper e acompanhar os caminhos e os instrumentos de investigação disponibilizados paralelamente on-line em janelas que podem ser acessadas enriquecendo a leitura e explorando as possibilidades que estes novos suportes apresentam à investigação histórica.

O texto do Prof. Miguel Benitez foi apresentado numa palestra promovida no referido programa no ano de 2001. Analisa a intersecção dos movimentos das viagens e da circulação de idéias heréticas, libertinas, muitas vezes na forma de livros ou textos proibidos, no espaço ibérico durante o período moderno.

Guiomar de Grammont no artigo “Catarse e teoria da leitura” explora as questões teóricas com que a história da literatura se debate hoje em torno das teorias da recepção, esta última reconstituída sempre como fragmento, como espaço imaginário que se caracteriza pela pluralidade e diversidade.

O tema da produção de conhecimento em relação aos fenômenos das viagens na esteira da constituição da identidade brasileira e da modernização da nação, no alvorecer do período republicano, foi o tema de estudo da Prof. Thais Velloso Cougo Pimentel. Num movimento inverso, são agora os brasileiros que se transformam em viajantes, buscando uma Europa mítica, berço de civilização, o exemplo a ser seguido, que permitirá a entrada do Brasil na modernidade.

A revista mantém sua prática de também receber contribuições espontâneas agregadas na seção Artigos. Mantendo-se como espaço referencial para os pesquisadores de diversas regiões e instituições que investigam a história de Minas Gerais, o presente número apresenta quatro artigos sobre a região entre os séculos XVIII e XIX.

Marco Antônio Silveira aborda a questão das práticas políticas utilizadas pelos diversos agentes na conformação do espaço minerador no início do século XVIII, quais sejam a conquista e a soberania. Ângelo Alves Carrara contribui para o entendimento do desenvolvimento urbano da sociedade mineira oitocentista em consonância com a pujança do setor agrário normalmente mais bem estudado. Dois artigos contribuem para desvendar o universo dos escravos que constituíram a maioria da população mineira no século XIX, tendo sido uma sociedade escravista voltada para a produção interna de produtos. Antônio Henrique Duarte Lacerda aborda o fluxo e as variáveis das alforrias concedidas em Juiz de Fora no declínio da sociedade escravocrata e Eliane Silva Guimarães analisa os crimes passionais ocorridos entre a comunidade escrava no mesmo município ao longo do século XIX.

A Varia Historia tem sido também, ao longo dos anos, espaço plural de debates sobre a história e tem recebido contribuições sobre as mais diversas temáticas. Johnni Langer e Sérgio Ferreira dos Santos apresentam um estudo sobre a criação da imagem oitocentista dos povos escandinavos, desnudando a constituições de mitos equivocados sobre a cultura e a sociedade dos povos nórdicos. Também explorando a questão da produção de mitos, Adriana Barreto de Sousa examina o processo de constituição da imagem do General Osório e do Duque de Caxias como heróis necessários à legitimação do regime republicano em seus diversos projetos, incorporando e justificando a participação dos militares na vida política brasileira.

Por fim, Jeffrey Needlle faz uma instigante resenha do livro de Kirsten Schultz, intitulado Tropical Versalles, enfatizando o aspecto inovador da abordagem que deixa de lado os lugares comuns que marcam as análises sobre a transferência da Corte portuguesa para o Brasil, salientando a forma como a monarquia redefiniu e mudou a sociedade e como estas mudanças foram percebidas pelos próprios brasileiros.

Júnia Ferreira Furtado – Organizadora.


FURTADO, Júnia Ferreira. Apresentação. Varia História, Belo Horizonte, v.17, n.25, jul., 2001. Acessar publicação original [DR]

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