Renato Kehl e a eugenia no Brasil: ciência, raça e nação no período entreguerras | Vanderlei Sebastião de Souza

O livro de Vanderlei Sebastião de Souza, professor adjunto da Universidade Estadual do Centro-oeste (Unicentro-PR), consiste em um estudo sobre a atuação do médico Renato Kehl (1889-1974) como organizador do movimento eugênico brasileiro, entre 1917 e 1932. Originalmente apresentada como dissertação de mestrado no Programa de Pós-graduação em História das Ciências e da Saúde, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro, a pesquisa se baseou em amplo repertório de fontes bibliográficas e do arquivo pessoal de Kehl, incluindo atas e anais de congressos, artigos de periódicos e correspondências, contido no acervo do Departamento de Arquivo e Documentação da Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz.

Souza analisa os fatores que levaram a mudança nas concepções eugênicas de Kehl, a partir de finais da década de 1920. Conforme o argumento desenvolvido no livro, tal mudança se traduz pela passagem de um conceito amplo de eugenia e que esteve muito próximo dos ideais de reforma do ambiente social do movimento médico-sanitarista, para uma eugenia com fronteiras mais bem delimitadas e caracterizada por medidas radicais como o exame médico pré-nupcial obrigatório, a esterilização compulsória e a seleção dos imigrantes segundo critérios raciais. Leia Mais

Um médico brasileiro no front: diário de Massaki Udihara na Segunda Guerra Mundial | Massaki Udihara

É inverno. Um jovem de óculos, sentado em frente a uma lareira, escreve. Fora, cai neve nas montanhas da Itália. Esta imagem pareceria romântica, não fossem as condições em que o jovem de óculos escreve. Ele é Massaki Udihara, primeiro-tenente das Forças Expedicionárias Brasileiras, a FEB, durante a campanha brasileira na Segunda Guerra Mundial. Durante toda a sua participação na guerra, o jovem escreveu um diário, que começa no dia 29 de junho de 1944 e vai até o dia de seu retorno a São Paulo, 16 de junho de 1945.

O que é um diário senão as anotações mais íntimas daquele que escreve? É na realidade um monólogo consigo mesmo, uma forma de expressão daquilo que está ao seu redor, são observações, impressões, julgamentos que têm o centro no autor, sem a preocupação de ser avaliados por leitores ou críticos. O diário é uma forma de extravasar aquilo que se tem dentro de si através de palavras. Leia Mais

Ser médico no Brasil: o presente no passado | André Faria de Pereira Neto

O livro Ser médico no Brasil: o presente no passado, de André de Faria Pereira Neto, examina de forma muito original como elites médicas se mobilizaram no início do século XX, com o objetivo de avançar o processo de profissionalização dessas carreiras no país.

Esmiuçando os debates ocorridos entre participantes de um congresso de médicos realizado em 1922, o autor destaca no passado vários aspectos que continuam marcando a prática médica nos dias de hoje, dando novo significado às situações que presenciamos no cotidiano da medicina. Seu primeiro achado foi destacar o Congresso Nacional dos Práticos como o evento relevante a ser analisado. Esta opção, entre vários outros caminhos que ele poderia ter tomado para pesquisar o tema, abordou com criatividade o mundo dos médicos às voltas com o profissionalismo. Assim, escolheu a dedo um evento que melhor lhe permitiria pesquisar as preocupações dos médicos com a profissão em um contexto de mudanças nas formas de se exercer a atividade. Leia Mais

Dos micróbios aos mosquitos/ febre amarela e revolução pasteuriana no Brasil | Jaime Larry Benchimol

Há ainda uma certa historiografia da medicina que costuma tratar daqueles feitos que abriram novos caminhos e possibilitaram desco-bertas de grande importância. A medicina é analisada segundo a perspectiva do “progresso”, da descoberta de tal remédio ou instrumento que tenha salvado mais vidas e/ou minimizado o sofrimento das pessoas. Nesta abordagem, quando trata de personalidades importantes na história da medicina, só há lugar para aqueles cujos trabalhos científicos sejam considerados como contribuições ao que se chama de “avanço” da medicina.

Nestes termos, o livro de Jaime Larry Benchimol, Dos micróbios aos mosquitos, febre amarela e revolução pasteuriana no Brasil, vem no sentido contrário desta corrente, no que é muito bem-vindo. Traz um tema que para o leitor moderno, do mundo ocidental e urbano, tornou-se desconhecido: o da realidade da “peste”, no seu sentido mais amplo de doença mortal que se propaga, ceifadora de vidas numa proporção que já esquecemos tanto sua dimensão quanto seu significado. Leia Mais

O médico e seu trabalho: limites da liberdade | Lilia Blima Schraiber

O debate sobre a medicina no Brasil tem estado quase sempre fundamentado na razão técnica que, baseando a ética profissional, se desdobra, com iguais doses de normatividade, tanto nos projetos neoliberais quanto nos mais diversos projetos estatizantes. Variando a ênfase, ora posta nas condições de trabalho dos médicos, ora nas condições para o consumo efetivo pelos pacientes, sempre se supõe que o objeto da discussão, o ato médico, consista em aplicações tecnológicas impessoais das ciências médicas, por referência às quais a historicidade, a sociedade e a individualidade só apareçam sob a forma de condicionantes externos, menos ou mais indesejáveis. Portanto, para além da ética profissional, os projetos políticos e ideológicos supõem sempre a instrumentalidade neutra da técnica como fundamento, pretendendo em todos os casos legitimar-se como decorrência imperativa de sua verdade absoluta.

O estudo de Lilia Blima Schraiber tem, entre outras qualidades, o mérito de contribuir para a possível mudança desse estado de coisas, ao se situar distante tanto de qualquer aversão ou compromisso apriorísticos por referência ao ideário liberal, quanto de toda fobia ou simpatia de princípio e sem reservas por um suposto igualitarismo e uma pretensa racionalidade que seriam inerentes às ações estatais. Leia Mais