Narrativas, Universidades e educação | História Oral | 2020

No final de 2019, lançamos por esta revista de História Oral uma chamada para submissão de trabalhos para o dossiê Narrativas, universidades e educação que ora apresentamos. Nosso objetivo era congregar trabalhos que versassem sobre a trajetória das universidades e de seus profissionais. Autores diferentes estabelecem marcos distintos para aquela que teria sido a primeira universidade do país – dentre outras, a Universidade de Manaus, atual Universidade Federal do Amazonas (UFAM) em 1909, a Universidade do Paraná, hoje Universidade Federal do Paraná (UFPR), em 1912, e a Universidade do Rio de Janeiro, depois Universidade do Brasil e, por fim Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em 1920) – sendo, não obstante, seguro dizer que já nos aproximamos dos seus primeiros cem anos de atividade no Brasil. Especialmente aqui, essas instituições se constituíram como o espaço primordial de produção em ciência, tecnologia e conhecimento, possuindo também relevante papel na formação de professores para todos os níveis de educação. Diante dos desafios que têm acometido os estabelecimentos de ensino superior nos últimos anos, nós, organizadoras deste dossiê junto com as editoras que acolheram nossa proposta, acreditamos na importância de reunir trabalhos que registrem e debatam o papel da comunidade universitária nas múltiplas dimensões que ela pode ter assumido: na abertura de novas áreas de conhecimento, na interiorização de seus serviços e, especialmente, na formação de professores. Leia Mais

História e Demandas Sociais / Revista Brasileira de História / 2013

Neste número 65 da Revista Brasileira de História estamos completando 4 anos à frente de sua editoria e totalizando a coordenação da edição de oito números, com a publicação de 140 artigos. Durante esse período a RBH, criada em 1981 com o objetivo de se constituir em um canal de divulgação da produção dos professores e historiadores brasileiros, vivenciou significativas transformações, passando a ser exclusivamente digital e a oferecer uma versão em inglês. Essas inovações têm ampliado o escopo de sua circulação, permitindo o acesso à nossa produção por um público não conhecedor da língua portuguesa e agilizando a consulta dos volumes novos e antigos.

Neste número o Conselho Editorial elegeu o tema “História e Demandas Sociais” para o dossiê que, seguindo a trilha do anterior, também está sofrendo uma ampliação no que diz respeito ao número de artigos publicados. Como já dissemos, o interesse em publicar na RBH tem sido crescente na comunidade de historiadores e cientistas sociais, e a cada número aumenta o volume de contribuições para avaliação. Pode-se destacar, por exemplo, o aumento de 226% no volume de textos recebidos do ano de 2009 para 2010, quando a revista se tornou exclusivamente digital. Paralelamente, observa-se um crescimento de 227% no volume de acessos à RBH no –SciELO, comparando-se o período em que a publicação era impressa e digital e o atual, desde dezembro de 2009, em que ela é exclusivamente eletrônica. Essa nova busca da produção historiográfica brasileira por canais para internacionalização dos seus estudos é muito bem-vinda, mas coloca muitos desafios para a RBH e indica a necessidade não só de ampliarmos a extensão dos números, mas também de adotarmos uma maior periodicidade. Este número conta com 14 artigos.

O Dossiê “História e Demandas Sociais”, sintonizado com a temática do Simpósio Nacional, tem o objetivo de contribuir para os debates acerca dos usos da história e do papel do historiador. A noção de demanda social da história permanece ainda vaga, é usada em contextos de análise muito diferentes e abrange fenômenos muito diversos; as demandas memoriais e as demandas midiáticas e editoriais são alguns exemplos. O boom de memórias e o interesse crescente dos diferentes grupos sociais pelo passado têm ampliado o espaço dos historiadores nos meios de comunicação e nas publicações para o grande público, mas ao mesmo tempo colocam para eles o desafio de transpor e adequar seus conhecimentos em busca de comunicação com um público não especializado. Muitas vezes, isso leva o historiador à tentação de recorrer a fórmulas simplistas e a respostas ambíguas às demandas vindas da sociedade e do Estado. Além disso, podemos mencionar os riscos de interferências externas que podem colocar em questão a autonomia da história como disciplina científica e contaminar o julgamento científico pelo juízo midiático. Nesse quadro é preciso estar atento à instrumentalização da história pela demanda social e repensar o vínculo entre função do conhecimento e função social da história, sobretudo quando se trata da análise de passados sensíveis, tais como o holocausto e as ditaduras na América Latina.

Se os pontos levantados são ameaças para os historiadores, a omissão ou o isolamento também podem acarretar consequências graves. Inúmeras vezes essas demandas sociais veiculadas não sensibilizam os historiadores que não conseguem transpor as novas contribuições acadêmicas para o leitor não especializado. Por sua vez, essa postura acarreta que os livros de vulgarização e os manuais produzidos por jornalistas ou autores não especializados preencham esse vazio e acabem sendo privilegiados pelo mercado editorial.

Diante do conjunto de textos recebidos e selecionados podemos dizer que essa área apresenta-se agora como um grande desafio para os historiadores. Para o Dossiê foram selecionados sete artigos, cinco dos quais focados na realidade brasileira, e dois tomando como referência o México e a Europa. No que diz respeito aos recortes temporais, foram privilegiados textos que abordavam temas relacionados com a História do Tempo Presente. Quanto às formas de abordagem, são apresentados trabalhos que adotaram como estratégia a discussão teórica e metodológica de pesquisas sobre os chamados temas traumáticos, como o estudo da repressão e do trabalho análogo a de escravo no Brasil e os usos políticos do passado, em especial quando se trata dos livros didáticos.

Iniciamos com o artigo de Antoon De Baets “Uma teoria do abuso da História”, que pretende esboçar uma teoria voltada a controlar o uso irresponsável da história. O abuso da história é definido como a utilização de maneira não científica do conhecimento histórico com o intuito de ludibriar e enganar a sociedade acerca de eventos traumáticos e polêmicos. Joana Maria Pedro e Anamaria Marcon Venson, no texto “Tráfico de pessoas: uma história do conceito”, tratam da discussão sobre o tráfico de pessoas focalizando a questão específica da prostituição. Alberto del Castillo Troncoso em “Memória e representações: a fotografia e o movimento estudantil de 1968 no México” focaliza a história desse movimento e as complexas relações entre a imprensa e o poder político da época, privilegiando a análise dos usos político e cultural das fotografias por parte das diferentes facções. Américo Oscar Guichard Freire em “Intelectuais, democratização e combate à pobreza no Brasil Contemporâneo” aborda o tema da participação de intelectuais em projetos e programas de inclusão social no país tomando como objeto de análise a trajetória político-intelectual de Herbert de Souza, o Betinho, e Carlos Alberto Libânio Christo, o Frei Betto. Ernesta Zamboni e Cristiani Bereta da Silva no texto “Cultura política e políticas para o ensino de história em Santa Catarina no início do século XX” apresentam análises das relações estabelecidas entre a produção historiográfica e a produção de uma história de Santa Catarina para o uso escolar, com vistas a enfrentar o desafio de desenvolver uma educação cívico-patriótica voltada para projeções simbólicas sobre o futuro do Brasil. Maria Aparecida Leopoldino Tursi Toledo em “Os lugares da produção do saber histórico escolar no Brasil: compêndios de história e narrativas conciliadoras no Paraná (1876-1905)” discute o papel dos livros didáticos na construção do Estado nacional e no sentido de nação, destacando, no caso do Paraná, como a História nacional teve dificuldades em se firmar como disciplina autônoma até os anos iniciais da República brasileira. Por fim, Alexandre Veiga trabalha com “Acervos da Justiça do Trabalho como fonte de pesquisa”. O artigo descreve a trajetória do Memorial da Justiça do Trabalho no Rio Grande do Sul, relatando suas experiências de atuação na área da preservação e divulgação do patrimônio documental e museológico da Justiça do Trabalho no Estado.

A seção de avulsos apresenta sete artigos. Andréa Lisly Gonçalves reconstitui no artigo “A luta de brasileiros contra o miguelismo em Portugal (1828-1834): o caso do homem preto Luciano Augusto” alguns aspectos da resistência ao regime implantado pelo rei d. Miguel (1828-1834) no intuito de esclarecer o trânsito de pessoas e de ideias no império português, permitindo até mesmo o estabelecimento de contrastes entre o contexto americano e o europeu. Jaime Rodrigues em “Um mundo novo no Atlântico: marinheiros e ritos de passagem na linha do equador, séculos XV-XX” analisa as origens, a disseminação e a transformação desses rituais na cultura marítima. Giselle Martins Venâncio em “Comemorar Camões e repensar a nação: o discurso de Joaquim Nabuco na festa do tricentenário de morte de Camões no Rio de Janeiro (1880)” analisa os eventos realizados durante essa comemoração com objetivo de destacar um ideal de identidade nacional brasileira definida como fundamentalmente lusitana. Jeffrey D. Needell no texto “O chamado às armas: o abolicionismo radical de Joaquim Nabuco (1885-1886)” trata do papel de Nabuco no movimento abolicionista e das transformações das suas próprias visões políticas no contexto da trajetória histórica do movimento. Juliana Miranda Filgueiras no texto “A produção de materiais didáticos pelo MEC: da Campanha Nacional de Material de Ensino à Fundação Nacional de Material Escolar” analisa a constituição e as principais realizações da CNME e da Fename e como essa produção evidenciou a atuação do Ministério da Educação em uma área dominada pelo mercado privado, sobretudo pela indústria editorial de didáticos. Cristiane Hengler Corrêa Bernardo e Inara Barbosa Leão no artigo “Formação do jornalista contemporâneo: a história de um trabalhador sem diploma” objetivam analisar o contexto em que a profissão de jornalista se desenvolveu no Brasil, as influências que sofreu, bem como as mudanças técnicas que alteraram a sua base material de produção. Por fim, João Márcio Mendes Pereira no artigo “O Banco Mundial e a construção política dos programas de ajustamento estrutural nos anos 1980” discute a gestação e operacionalização dos programas de ajustamento estrutural do Banco Mundial ao longo da década de 1980.

Neste número temos dois textos que destacam momentos e personagens importantes da história da Anpuh. A conferência proferida pelo então presidente da Anpuh, Durval Muniz de Albuquerque Júnior, “Ritual de Aurora e de Crepúsculo: a comemoração como a experiência de um tempo fronteiriço e multiplicado ou as antinomias da memória”, por ocasião do aniversário de 50 anos na nossa entidade, em julho de 2011, e uma homenagem ao professor John Monteiro, figura de grande relevância acadêmica, falecido recentemente, escrita pela professora Regina Celestino.

Temos ainda duas entrevistas com os historiadores Jean-François Sirinelli, da França, e Eugenia Meyer, do México, e publicamos quatro resenhas: Jaime Valim Mansan analisa En el combate por la historia: la República, la guerra civil, el franquismo, organizado por Ángel Viñas; Wanderson da Silva Chaves apresenta Racecraft: the soul of inequality in American Life, de Karen E. Fields e Barbara J. Fields; Kleiton de Sousa Moraes resenha O que é um autor? Revisão de uma genealogia, de Roger Chartier, e Fernando de Araujo Penna analisa Qual o valor da história hoje?, organizado por Marcia de Almeida Gonçalves, Helenice Aparecida de Bastos Rocha, Luís Monteiro Resnik e Ana Maria Ferreira da Costa Monteiro.

Mais uma vez convidamos nossos leitores a consultar os sites da Anpuh e do SciELO e baixar nos computadores ou nos leitores digitais os artigos de seu interesse.

Marieta de Moraes Ferreira


FERREIRA, Marieta de Moraes. Apresentação. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.33, n.65, 2013. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

Trabalho e Trabalhadores / Revista Brasileira de História / 2012

Revista Brasileira de História, criada em 1981 com o objetivo de se constituir em um canal de divulgação da produção dos professores e historiadores brasileiros, está lançando seu 64º número. Com periodicidade semestral, a partir do número 59 a RBH iniciou uma nova etapa, passando a ser somente digital e a oferecer uma versão em inglês. Essas inovações visam agilizar a consulta dos volumes novos e antigos, bem como ampliar o escopo de circulação do periódico, permitindo que um público não conhecedor da língua portuguesa possa acessar nossa produção.

Neste número o Conselho Editorial elegeu o tema “Trabalho e Trabalhadores” para o Dossiê que, seguindo a trilha do anterior, também está sofrendo uma ampliação no que diz respeito ao número de artigos publicados. Como já dissemos, o interesse em publicar na RBH tem sido crescente na comunidade de historiadores e cientistas sociais, e a cada número aumenta o volume de contribuições para avaliação. Neste número, recebemos cerca de cem artigos apenas para o Dossiê, dos quais um montante expressivo foi aprovado pelos nossos pareceristas, sem que tenhamos condições de publicar todos. Essa nova demanda da produção historiográfica brasileira em busca de canais para internacionalização dos seus estudos é muito bem-vinda, mas coloca muitos desafios para a RBH e indica a necessidade não só de ampliarmos a extensão dos números, mas também de repensarmos sua periodicidade. Este número conta com 15 artigos.

Para o Dossiê “Trabalho e Trabalhadores” foram selecionados nove artigos focados essencialmente na realidade brasileira, com apenas dois dedicados aos Estados Unidos e a Portugal. No que diz respeito aos recortes temporais, pudemos selecionar textos que abordavam diferentes conjunturas, contemplando desde as relações de trabalho no final do século XIX até a problemática do trabalho análogo ao escravo, já no século XXI. Quanto às formas de abordagem, são apresentados trabalhos que adotaram como estratégia de pesquisa o estudo de trajetórias de lideranças, assim como análises de movimentos sociais como greves e lutas contra a repressão. Do conjunto de textos recebidos e selecionados podemos dizer que essa área de trabalho, que por um expressivo período se mostrou em declínio, apresenta-se agora com grande dinamismo e de maneira renovada. Assim, do ponto de vista historiográfico é possível detectar que esse campo de investigação sobre o trabalho dá indicações de voltar a ser alvo de grande interesse dos pesquisadores, conquistando um novo espaço entre os objetos nobres de pesquisa. Iniciamos com um artigo de Leon Fink que apresenta análise historiográfica com foco especial nos Estados Unidos sobre a renovação dos estudos na área de trabalhadores. Joana Vidal de Azevedo Dias Pereira estuda espaços industriais e comunidades operárias na periferia de Lisboa, na virada para o século XX. Joseli Maria Nunes Mendonça no artigo “Sobre cadeias e coerção: experiências de trabalho no Centro-Sul do Brasil do século XIX” trabalha com a história de uma imigrante portuguesa estabelecida no Centro-Sul cafeeiro de meados do século XIX, com o objetivo de recuperar aspectos das experiências vivenciadas por trabalhadores juridicamente livres; Endrica Geraldo com “Os prisioneiros do Benevente” discute a repercussão pública da deportação, no ano de 1919, de 23 imigrantes, incluindo o militante Everardo Dias, episódio que revela aspectos importantes da repressão contra o movimento operário no Brasil. Aldrin Armstrong Silva Castellucci com o texto “Agripino Nazareth e o movimento operário da Primeira República” analisa a atuação dessa liderança socialista no movimento operário brasileiro. Antonio Luigi Negro em “Não trabalhou porque não quis” examina como a Justiça do Trabalho tratou uma greve no ramo têxtil baiano em 1948, procurando aplacar temores e tensões do sistema político e sindical brasileiro. Clarice Gontarski Speranza em “Os mineiros de carvão, seus patrões e as leis sobre trabalho: conflitos e estratégias durante a Segunda Guerra Mundial” estuda uma série de conflitos ocorridos nas minas de carvão no Rio Grande do Sul em 1943, com foco nas lutas pelo cumprimento de leis trabalhistas. Cristiana Costa da Rocha com “Os Retornados: reflexões sobre condições sociais e sobrevivência de trabalhadores rurais migrantes escravizados no tempo presente” dedica-se ao estudo de trabalhadores rurais de Barras, Piauí, que migram repetidas vezes para os estados do Pará, Mato Grosso e Goiás e vivenciam formas de trabalho análogo à escravidão. Fechando o dossiê, Ângela de Castro Gomes no texto “Repressão e mudanças no trabalho análogo a de escravo no Brasil: tempo presente e usos do passado” analisa a ação dos Grupos de Fiscalização Móvel, do Ministério do Trabalho e Emprego, e da Igreja católica, pela Comissão Pastoral da Terra, na apuração e punição das denúncias da utilização do denominado trabalho escravo.

A seção de avulsos apresenta seis artigos. Carmen Teresa Gabriel Anhorn em “Teoria da História, Didática da História e narrativa: diálogos com Paul Ricoeur” tem por objetivo discutir a potencialidade analítica da categoria ‘narrativa’ na reflexão sobre produção, distribuição e consumo do conhecimento histórico. Muryatan Santana Barbosa com “A construção da perspectiva africana: uma história do projeto História Geral da África (Unesco)” analisa a construção dessa grande obra focando o período entre 1965 e 1979; Patricia Santos Hansen com o texto “Território em disputa: a escola na luta entre o republicanismo e a Igreja em Portugal (séculos XIX e XX)” discute conceitos centrais aos processos de secularização e laicização do ensino em Portugal desde a Monarquia Constitucional até o início da Primeira República. Luís Miguel Carolino em “Manoel Ferreira de Araújo Guimarães, a Academia Real Militar do Rio de Janeiro e a definição de um gênero científico no Brasil em inícios do século XIX” analisa a atuação de um professor de astronomia na Academia Real Militar do Rio de Janeiro que produziu um dos primeiros manuais de astronomia esférica, um gênero maior da literatura científica do século XIX. Luiz Alberto Grijó com “Soldados de Deus: religião e política na Faculdade de Direito de Porto Alegre na primeira metade do século XX” aborda as ideias e concepções filosóficas que predominaram nessa Faculdade, focalizando as disputas entre os católicos e os chamados positivistas. Mara Rúbia Sant’Anna em “De perfumes aos pós: a publicidade como objeto histórico” trata dos anúncios de cosméticos publicados na revista Fon-Fon! de 1911 a 1934, com o objetivo de destacar as rupturas e continuidades.

Este número apresenta ainda entrevistas com os historiadores franceses Christian Delacroix e François Dosse e publica quatro resenhas: Adriana Duarte Leon analisa Boletim Vida Escolar: uma fonte e múltiplas leituras sobre a educação no início do século XX, organizado por Ana Maria de Oliveira Galvão e Eliane Marta Teixeira Lopes; Iara Lis Franco Schiavinatto apresenta Viagem ao Cinema Silencioso do Brasil, organizado por Samuel Paiva e Scheila Schvarzman; Maria Filomena Pinto da Costa Coelho analisa Colunas de São Pedro: a política papal na Idade Média central, de Leandro Duarte Rust, e, por último, Wolney Vianna Malafaia resenha História e documentário, organizado por Eduardo Morettin, Mônica Kornis e Marcos Napolitano.

Mais uma vez convidamos nossos leitores a consultar o site da Anpuh e do SciELO e baixar nos computadores ou nos leitores digitais os artigos de seu interesse.

Marieta de Moraes Ferreira


FERREIRA, Marieta de Moraes. Apresentação. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.32, n.64, dez, 2012. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

Igreja e Estado / Revista Brasileira de História / 2012

Revista Brasileira de História, criada em 1981 com o objetivo de se constituir em um canal de divulgação da produção dos professores e historiadores brasileiros, está lançando seu 63º número. Com periodicidade semestral, a partir do número 59 a RBH iniciou uma nova etapa, passando a ser somente digital e a oferecer uma versão em inglês. Essas inovações visam ampliar o escopo de circulação do periódico, permitindo o acesso à nossa produção de um público não conhecedor da língua portuguesa, bem como agilizar a consulta dos volumes novos e antigos. Um balanço dos acessos aos dez últimos números da RBH na internet nos mostra a dimensão e a repercussão que nossa produção pode alcançar através da web. A quantidade de acessos por mês a esses dez números foi superior a 20 mil (mais de 240 mil / ano), uma abrangência impensável para os impressos, confirmando a grande importância da internet na disseminação dos conteúdos da Revista e fazendo da web um instrumento precioso para a divulgação da historiografia produzida no Brasil e sobre o Brasil.

Neste número o Conselho Editorial elegeu o tema “Igreja e Estado” para o dossiê, que está sendo ampliado de forma significativa. Usualmente, a RBH tem formado um dossiê com cerca de cinco ou seis artigos e selecionado para a seção de avulsos um número semelhante. No entanto, o interesse em publicar na Revista tem sido crescente pela comunidade de historiadores e cientistas sociais, e a cada número aumenta o volume de contribuições para avaliação. Nestes dois últimos números, recebemos mais de duzentos artigos, tendo sido aprovados por pareceristas um montante expressivo, o que nos levou a ampliar não só o dossiê, mas também a quantidade de avulsos. Essa nova demanda da produção historiográfica brasileira em busca de canais para internacionalização dos seus estudos é muito bem-vinda, mas coloca muitos desafios para a RBH e indica a necessidade não só de ampliarmos a extensão dos números, mas também de adotarmos uma maior periodicidade. Por esses motivos este número conta com 18 artigos.

Para este Dossiê foram selecionados dez artigos, sendo objeto principal de atenção as temáticas voltadas para as questões religiosas na América portuguesa. Foram apresentados também três artigos localizados no Brasil Independente (Império e República) e artigos centrados em discussões conceituais e historiográficas. Iniciamos com o texto de Vinicius Miranda Cardoso, “Cidade de São Sebastião: o Rio de Janeiro e a comemoração de seu santo patrono nos escritos e ritos jesuíticos”, que analisa os usos e discursos jesuíticos relacionados com o cerimonial de recebimento de uma relíquia de São Sebastião no Rio de Janeiro no contexto de uma visitação inaciana ocorrida entre 1584 e 1585. Com base em diferentes fontes também focalizou-se a rememoração coletiva e sacramental da proteção de São Sebastião aos fundadores do Rio de Janeiro e a consagração do santo flechado como padroeiro da cidade. Pollyanna Gouveia Mendonça Muniz em “Cruz e Coroa: Igreja, Estado e conflito de jurisdições no Maranhão colonial” trata dos conflitos entre as jurisdições da Igreja e do Estado, com foco no século XVIII, quando ascendeu ao poder o marquês de Pombal com sua política regalista que tentava cada dia mais secularizar o Estado português. A autora objetiva acompanhar os conflitos e os motivos dessa disputa de jurisdição e analisar o desrespeito às imunidades eclesiásticas no Maranhão. Fernando Lobo Lemes em “Na arena do sagrado: poder político e vida religiosa nas minas de Goiás” tem como objeto a análise os conflitos e embates entre o poder secular e as autoridades eclesiásticas naquela região. Eliane Cristina Deckmann Fleck e Mauro Dillmann no texto “‘A Vossa graça nos nossos sentimentos’: a devoção à Virgem como garantia da salvação das almas em um manual de devoção do século XVIII” analisam o manual Mestre da Vida que ensina a viver e morrer santamente, publicado na primeira metade do século XVIII. O eixo central é o estudo das representações da Virgem, das orientações que os fiéis deveriam seguir no culto e nas práticas devocionais. Tal análise insere-se nas recentes discussões historiográficas acerca das práticas de leitura, considerando as formas plurais de apropriação e de recepção de textos, inseridas em seus contextos de produção e circulação. Ana Rosa Cloclet da Silva em “Padres políticos e suas redes de solidariedade: uma análise da atuação sacerdotal no sertão de Minas Gerais (1822 e 1831)” estuda o perfil de clérigos brasileiros que aliaram de modo peculiar a formação pastoral e intelectual à atuação política, em favor de seus interesses privados, buscando usufruir de suas redes de sociabilidade para resistir às normatizações encaminhadas pelo Estado nacional, pós-Independência. O artigo seguinte, de Maurício de Aquino, “Modernidade republicana e diocesanização do catolicismo no Brasil: as relações entre Estado e Igreja na Primeira República”, trata dos reflexos da proclamação da Republica e do fim do regime do padroado, que levaram à implementação de um processo de reforma e reorganização eclesiástica cujo fulcro consistiu na criação de dioceses e jurisdições similares – ao qual se pode denominar diocesanização. Christiane Jalles de Paula no artigo “Gustavo Corção: apóstolo da ‘linha-dura'” tem como objetivo analisar a participação de setores do laicato católico na legitimação do golpe militar de 1964. Partindo da atuação de Gustavo Corção, a autora procura demonstrar como os argumentos desse personagem buscaram legitimar as bases antidemocráticas da chamada ‘democracia’ do regime militar defendida por esses setores.

O segundo bloco de artigos que integram o Dossiê “Igreja e Estado” apresenta reflexões sobre conceitos de santidade e de realeza cristã na Idade Média e um balanço das relações entre essas duas esferas. Igor Salomão Teixeira em “O tempo da santidade: reflexões sobre um conceito” apresenta e analisa o processo de canonização de Tomás de Aquino (1323-1274). A proposta do autor é destacar que o conceito de santidade, tal como apresentado, torna-se um fenômeno social construído coletivamente. André Luis Pereira Miatello no artigo “O rei e o reino sob o olhar do pregador: Vicente de Beauvais e o conceito de realeza no século XIII” discute, com base no De morali principis institutione, do religioso francês, os critérios, a instituição e a função social da realeza cristã no século XIII. O propósito é perscrutar a imagem antiga do pastorado régio por oposição à ideia de razão de Estado. Escrevendo para o rei capetíngio, Luís IX, Vicente de Beauvais contrapõe a situação ordinária em que o governo político se apresenta, no plano histórico, ao modelo social visível em uma realidade sobrenatural, chamada ecclesia. Finalmente, Olivier Abel em “Igrejas e Estado” fornece ao leitor um balanço bibliográfico que percorre diferentes conjunturas e diferentes autores acerca das relações entre esses dois poderes.

A seção de avulsos apresenta oito artigos. Clara Maria Laranjeira Sarmento e Santos em “A Correspondência Luso-Brasileira: narrativa de um trânsito intercultural” explora a experiência entre Portugal e o Brasil, no início do século XIX, de duas famílias oriundas da pequena nobreza rural do Norte de Portugal, com especial atenção ao percurso intercultural feminino. O trabalho articula os contextos concretos e situados do seu objeto de estudo, com o propósito de construir o conhecimento de diferentes momentos históricos, racionalidades e mundividências. Eduardo Munhoz Svartman em “Formação profissional e formação política na Escola Militar do Realengo” aborda a primeira etapa do processo de formação profissional de oficiais do Exército Brasileiro que iniciaram suas carreiras no decorrer da década de 1920. Com foco numa instituição que pretendia formar oficiais ‘apolíticos’, o autor chama atenção para a criação de um espaço de politização desenvolvido nessa escola. Fernando Vale Castro em “Um projeto de diplomacia cultural para a República: a Revista Americana e a construção de uma nova visão continental” tem como objetivo analisar esse periódico como um instrumento da estratégia do Itamaraty para pensar uma aproximação entre o Brasil e o restante da América do Sul, destacando o papel a ser exercido pela diplomacia na República recém-proclamada. Cleber Santos Vieira em “Civismo, República e manuais escolares” analisa aspectos do civismo no alvorecer da República brasileira, com ênfase na pesquisa sobre dois livros escolares: História do Brasil ensinada pela biografia de seus heróis, de Silvio Romero (1890), e A História de São Paulo pela biografia de seus nomes mais notáveis (1895), publicado por Tancredo Amaral. Por um lado, trata-se de apresentar nuanças da Historia Magistra Vitae presentes nesses objetos da cultura material; por outro, de destacar em que medida suas histórias foram pontuadas por divergências em torno da questão educação ou instrução cívica pela afirmação de um civismo de coloração regional, bem como palco de conflitos entre protagonistas do republicanismo paulista. Lucília Siqueira em “Os hotéis na cidade de São Paulo na primeira década do século XX: diversidade no tamanho, na localização e nos serviços” analisa três estabelecimentos de hospedagem de dimensões distintas, ressaltando sua heterogeneidade. Seguindo os inventários post mortem de proprietários de hotéis, o artigo possibilita apreender a variedade dos equipamentos e serviços existentes, bem como a diversidade dos grupos aos quais pertenciam os donos desses estabelecimentos. Maria Bernardete Ramos Flores no texto “Quando o dragão assume o lugar do cavalo: um caráter pós-colonialista na obra criolla de Xul Solar” analisa como esse artista, representante da vanguarda argentina, desenvolve a proposta de que a América, com seus sistemas de mitos e crenças, revelava um espaço espiritual no qual se desenvolveria a nova humanidade, e toma o dragão para subverter os fluxos da colonização do Mundo Novo. Antonio Maurício Dias da Costa em “Festa e espaço urbano: meios de sonorização e bailes dançantes na Belém dos anos 1950” discute o uso de referências simbólicas de origem memorialística e jornalística atribuídas ao contexto socioespacial dos bailes dançantes de orquestras e ‘sonoros’ em Belém, nos assim chamados ‘clubes sociais’ e ‘clubes suburbanos’. Raquel Varela em “‘Um, dois, três MFA’: o Movimento das Forças Armadas na Revolução dos Cravos – do prestígio à crise” analisa o golpe militar de 25 de abril de 1974 que põe fim aos 48 anos de ditadura do Estado Novo em Portugal. Busca explicar a ascensão e queda desse movimento de oficiais, a forma como ganhou apoio popular e as razões do seu desmoronamento.

Este número apresenta ainda quatro resenhas. Rodrigo Patto Sá Motta analisa João Goulart: uma biografia, de Jorge Ferreira; Livia Lopes Neves fala de Leituras, projetos e (re)vista(s) do Brasil (1916-1944), de Tania Regina de Luca; Cristina Ferreira resenha Cláudio Manuel da Costa: o letrado dividido, de Laura de Mello e Souza, e Luciana Fernandes Boeira analisa Présent, nation, mémoire, de Pierre Nora.

Mais uma vez convidamos nossos leitores a consultarem o site da Anpuh e do SciELO e baixar nos computadores ou nos leitores digitais os artigos do seu interesse.

Marieta de Moraes Ferreira


FERREIRA, Marieta de Moraes. Apresentação. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.32, n.63, 2012. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

Festas / Revista Brasileira de História / 2011

Neste ano de 2011 a Revista Brasileira de História completou 30 anos. Criada em 1981 com o objetivo de se constituir em um canal de divulgação da produção dos professores e historiadores brasileiros, teve o intuito inicial de suprir o vazio deixado pelo fim da publicação dos Anais dos Simpósios da Anpuh, em 1978, e veio ao encontro das conquistas no campo científico e da necessidade de sua divulgação. De acordo com a apresentação da professora Alice Canabrava, sua primeira editora, uma parte do periódico deveria dar publicidade a artigos originais sobre pesquisas de História ou de seu interesse. A atualização permanente com respeito à bibliografia histórica seria objeto de outra seção. Foi considerada, de início, especialmente a produção dos periódicos consagrados à História, nacionais e estrangeiros, no sentido de proporcionar aos professores e pesquisadores uma contribuição que viesse suprir a carência das bibliotecas universitárias. Essa informação bibliográfica deveria ser ampliada para divulgar também comentários de obras históricas. Finalmente, o “Noticiário” deveria tornar mais conhecida a atividade dos Núcleos Regionais, “dar maior publicidade aos conclaves de História realizados no país e no exterior e a outros assuntos de interesse para os que militam no campo da História” (RBH, v.1, n.1, 1981, p.9).

Com periodicidade semestral, a RBH já alcançou a publicação de 62 números. A partir do número 59, a Revista iniciou uma nova etapa, passando a ser somente digital e a oferecer uma versão em inglês. Essas inovações visam ampliar o escopo de circulação do periódico, permitindo o acesso à nossa produção de um público não conhecedor da língua portuguesa, bem como agilizar a consulta dos volumes novos e antigos. Um balanço dos acessos aos números mais recentes da RBH na internet nos mostra a dimensão e a repercussão que nossa produção pode alcançar através da web. Nos últimos dez números, a quantidade de acessos por mês foi superior a 20 mil (mais de 240 mil / ano), uma abrangência impensável para os impressos, confirmando a grande importância da internet na disseminação dos conteúdos da Revista e fazendo da web um instrumento precioso para a divulgação da historiografia produzida no Brasil e sobre o Brasil.

No segundo semestre de 2011 atingimos um novo marco importante. Com o objetivo de ampliar a internacionalização da produção acadêmica brasileira, a Capes decidiu apoiar dois periódicos por área, ao longo de cinco anos, com a intenção de convertê-los em referências. Em nossa área optou-se por edital interno em que poderiam concorrer todas as revistas classificadas entre Qualis A1 e B2. Responderam ao convite 12 revistas, então avaliadas por um comitê escolhido especificamente para esse fim. Entre as duas selecionadas, a Revista Brasileira de História foi escolhida por unanimidade. Essa aprovação não só representa o reconhecimento da importância do papel da RBH e da Anpuh, mas também nos permitirá alcançar um novo patamar, podendo ampliar o número de artigos publicados, produzir a edição trilíngue – em espanhol e inglês – e alcançar uma maior interação com a comunidade internacional de historiadores.

Neste número elegemos para o dossiê o tema “Festas”, que surgiu sem anúncio prévio e como resultado do grande interesse despertado para o número anterior, “Comemorações”. Em verdade, a grande oferta de mais de 110 textos focalizando celebrações, festejos e eventos vinculados à construção de memórias e identidades, já aprovados por pareceristas, nos levou a optar por abrir um novo dossiê. Como historiadores, sabemos que comemorar não é um ato sem maiores implicações, pois envolve escolhas e projetos e funciona para estabelecer laços identitários entre diferentes grupos sociais. E é exatamente porque permitem legitimar e atualizar identidades que as celebrações públicas ocupam um lugar central no universo contemporâneo.

Para este dossiê foram selecionados cinco artigos. Iniciamos com o texto de Petrônio José Domingues, “‘A redempção de nossa raça’: as comemorações da abolição da escravatura no Brasil”, que focaliza em São Paulo, nas primeiras décadas do século XX, como estratos da população negra saíam às ruas todo ano para comemorar o 13 de Maio – data da abolição –, por meio de romarias, missas, conferências cívicas, discursos solenes, festivais artístico-culturais, bailes, música, dança e teatro, quase sempre embalados por um clima de emoção e alegria. O segundo artigo, de Jocelito Zalla a Carla Menegat, trata da “História e Memória da Revolução Farroupilha” com o objetivo de apresentar um panorama das manifestações em torno dessa revolução, desde o próprio episódio até sua consolidação como mito fundador da identidade regional no Rio Grande do Sul. Isabel Bilhão, em “‘Trabalhadores do Brasil’: as comemorações do Primeiro de Maio em tempos de Estado Novo varguista”, analisa as mudanças e permanências em seus rituais comemorativos, bem como as estratégias de preparação, apresentação e legitimação de suas comemorações por parte do governo. Crislane Barbosa Azevedo no trabalho “Celebração do civismo e promoção da educação: o cotidiano ritualizado dos Grupos Escolares de Sergipe no início do século XX” busca compreender o funcionamento cotidiano de tais instituições por meio da identificação e análise dos diferentes eventos de caráter escolar e cívico. Lucileide Costa Cardoso em “Os discursos de celebração da ‘Revolução de 1964′” aborda aspectos desses discursos construídos pelos militares entre os anos de 1964 e 1999, através dos quais buscaram explicitar as motivações da articulação do Golpe de Estado, a estruturação do regime e o seu desfecho em 1985. O objetivo, portanto, é analisar as concepções de história, o sentido e o caráter das comemorações, estabelecendo regularidades que possam elucidar a estruturação do pensamento anticomunista e autoritário em disputa no campo da memória por uma determinada apropriação do passado.

A seção se avulsos apresenta sete artigos: Andre de Lemos Freixo, em “Um ‘arquiteto’ da historiografia brasileira: história e historiadores em José Honório Rodrigues”, analisa a história da historiografia brasileira segundo a perspectiva de José Honório Rodrigues (1913-1987), como parte dos esforços que na década de 1930 começaram a investir nos aspectos profissionais da História como disciplina no Brasil – enfatizando, por exemplo, a função central da metodologia histórica como diferencial frente às escritas amadoras. Juliana Pirola da Conceição e Maria de Fátima Sabino Dias no artigo “Ensino de História e consciência histórica latino-americana” apresentam a pesquisa desenvolvida sobre a contribuição dos conteúdos latino-americanos na grade curricular de ensino para a formação histórica dos jovens na escola. Letícia Borges Nedel em seu texto “Entre a beleza do morto e os excessos dos vivos: folclore e tradicionalismo no Brasil meridional” examina a participação gaúcha no autodenominado Movimento Folclórico Brasileiro, entre as décadas de 1940 e 1960. Cássia Rita Louro Palha em “Televisão e política: o mito Tancredo Neves entre a morte, o legado e a redenção” aborda a produção cultural da televisão brasileira, em especial da Rede Globo de Televisão e de seu telejornalístico Globo Repórter no desaguar da chamada ‘abertura política’, tendo como mote a veiculação da imagem política de Tancredo de Almeida Neves e os processos de construção simbólica que envolveram a sua mitificação. Carolina Amaral de Aguiar no artigo “Cinema e História: documentário de arquivo como lugar de memória” analisa o filme A espiral (1975), um documentário que focaliza a Unidade Popular no Chile com base em materiais pesquisados em arquivos. José Iran Ribeiro em “O fortalecimento do Estado Imperial através do recrutamento militar no contexto da Guerra dos Farrapos” analisa o significativo crescimento e atuação do Exército Imperial brasileiro e a capacidade das autoridades em recrutar efetivos necessários para o fortalecimento da autoridade imperial. Jorge Pimentel Cintra e Júnia Ferreira Furtado no texto “A Carte de l’Amérique Méridionale de Bourguignon d’Anville: eixo perspectivo de uma cartografia amazônica comparada” analisam do ponto de vista da cartografia alguns mapas da região amazônica de meados do século XVIII que visavam à produção de um documento que servisse de base para as negociações do Tratado de Madri.

Neste número publicamos também uma entrevista com Bartolomé Clavero, catedrático da Universidad de Sevilla com vasta obra na área de história do direito e das instituições. A entrevista foi coordenada por Ivan de Andrade Vellasco e realizada em abril de 2011.

Este número apresenta ainda duas resenhas. Tereza Maria Spyer Dulci escreve sobre o livro O dia em que adiaram o Carnaval: política externa e a construção do Brasil (Ed. Unesp, 2010), de Luís Cláudio Villafañe Santos, e Carlos Roberto Figueiredo Nogueira analisa Inventar a heresia? Discursos polêmicos e poderes antes da Inquisição (Ed. Unicamp, 2009), organizado por Monique Zerner.

Completam esta apresentação textos em homenagem a Maria Yedda Leite Linhares (titular da UFRJ) e Eni de Mesquita Samara (titular da USP), ambas destacadas professoras e historiadoras brasileiras, falecidas neste ano.

Mais uma vez convidamos nossos leitores a consultar o site da Anpuh e do SciELO e baixar nos computadores ou nos leitores digitais os artigos de seu interesse.

Marieta de Moraes Ferreira
dezembro de 2011


FERREIRA, Marieta de Moraes. Apresentação. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.31, n.62, dez., 2011. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

Comemorações / Revista Brasileira de História / 2011

Neste ano de 2011 a Anpuh está completando meio século, e a Revista Brasileira de História, 30 anos. Criada em 1961, por ocasião da realização do I Encontro de Professores Universitários de História, em Marília, com o objetivo de promover um intercâmbio entre os professores e as universidades, desde as sua origens a Anpuh se constituiu em um padrão para os seus congêneres nas demais faculdades de filosofia que estavam sendo criadas no país. Igualmente importantes para serem lembradas foram as lutas travadas no âmbito da Anpuh pela melhoria da qualidade do ensino e da pesquisa histórica, bem como pela defesa dos princípios democráticos e contra o arbítrio e a repressão ao longo das décadas de 1960 e 1970. A recuperação de sua trajetória é uma contribuição importante para a compreensão da formação do campo da História como disciplina universitária e para a própria história das instituições de ensino e pesquisa no Brasil.

Em 1981 foi lançado o primeiro número da Revista Brasileira de História, com o objetivo de se constituir em um canal de divulgação da produção dos professores e historiadores brasileiros. Criada com o intuito inicial de suprir o vazio deixado pelo fim da publicação dos Anais dos Simpósios da Anpuh, que até 1978 divulgaram os trabalhos ali apresentados, a Revista Brasileira de História veio ao encontro das conquistas no campo científico e da necessidade de sua divulgação. De acordo com a apresentação da professora Alice Canabrava, sua primeira editora, uma parte do periódico deveria dar publicidade a artigos originais sobre pesquisas de História ou de seu interesse. A atualização permanente com respeito à bibliografia histórica seria objeto de outra seção. Foi considerada, de início, especialmente a produção dos periódicos consagrados à História, nacionais e estrangeiros, no sentido de proporcionar aos professores e pesquisadores uma contribuição que viesse suprir a carência das bibliotecas universitárias. Essa informação bibliográfica deveria ser ampliada para divulgar também comentários de obras históricas. Finalmente, o “Noticiário” deveria tornar mais conhecida a atividade dos Núcleos Regionais, “dar maior publicidade aos conclaves de História realizados no país e no exterior e a outros assuntos de interesse para os que militavam no campo da História” (RBH, v.1, n.1, 1981, p.9).

Com periodicidade semestral, a RBH já publicou 61 números e um total de 764 textos, sendo 598 artigos e 166 demais contribuições (resenhas, entrevistas, apresentações etc.), atingindo mais de 4 milhões e 700 mil acessos no site SciELO (contabilizados de 1998 até a atualidade). Aproveitando a comemoração dos 30 anos da RBH, acompanha esta edição um índice completo dos textos publicados entre 1981 e 2010.

A partir do número 59, a RBH iniciou uma nova etapa, tornou-se somente digital e passou a oferecer uma versão completa em inglês. Essas inovações visam ampliar o escopo de circulação do periódico, permitindo o acesso à nossa produção de um público não conhecedor da língua portuguesa, bem como agilizar a consulta dos volumes novos e antigos. Um balanço dos acessos aos textos da RBH na internet nos mostra a dimensão e a repercussão que nossa produção pode alcançar através da web.

Nos últimos dez números, a quantidade de acessos por mês foi superior a 20 mil (mais de 240 mil / ano), uma abrangência impensável para os impressos, confirmando a grande importância da internet na disseminação dos conteúdos da RBH e fazendo da web um instrumento precioso para a divulgação da historiografia produzida no Brasil e sobre o Brasil. O sucesso desse empreendimento, resultado do esforço coletivo da comunidade dos profissionais de História, merece ser festejado, e por isso elegemos como tema deste dossiê as “Comemorações”.

Esse duplo aniversário, da Anpuh e da RBH, constitui um momento importante de comemoração. Como historiadores, sabemos que comemorar não é um ato sem maiores implicações, pois envolve escolhas e projetos. Comemoração é a cerimônia destinada a trazer de volta a lembrança de pessoas ou eventos, algo que indica a ideia de ligação entre os homens, fundada sobre a memória. Essa ligação também pode ser chamada de identidade. E é exatamente porque permitem legitimar e atualizar identidades que as comemorações públicas ocupam um lugar central no universo contemporâneo.

As sociedades contemporâneas, preocupadas com a aceleração do tempo e com o aumento da capacidade de esquecer, têm demonstrado grande interesse em retomar o estudo da memória e de sua própria história. Assim, emerge a necessidade permanente de constituir novas formas de preservação, de memorização, de arquivamento. As modalidades de comemorações assumem formas diversificadas de acordo com os objetivos a alcançar: o sentido de muitas delas é o de reforçar concepções e valores, promover o consenso, a harmonia entre os grupos ou atores sociais, mas podem também desencadear conflitos ou tensões. Nesta virada do milênio, grandes desafios se colocam para a sociedade brasileira, especialmente para nós, professores de História e historiadores. Olhar para trás parece ser útil para melhor descortinar o caminho à frente. Assim, ao recuperarmos aspectos da nossa história comemorando os aniversários da Anpuh e da RBH por meio deste número, temos como intenção transmitir para a comunidade de professores e historiadores um pouco do que fomos, o que somos e o que queremos ser.

Neste número, o dossiê “Comemorações” traz nove artigos: Hendrik Kraay em seu texto, “Alferes Gamboa e a Sociedade Comemorativa da Independência do Império, 1869-1889”, apresenta o estudo das festas da Independência brasileira promovidas por essa Sociedade no Rio de Janeiro e revela um significativo engajamento popular com o Estado imperial; Jaime de Almeida, em “Um lugar de memória e de esquecimento: Santa Librada, padroeira da Independência da Colômbia”, analisa como uma imagem religiosa de obscuras origens medievais tornou-se casualmente objeto de um culto cívico religioso voltado para a construção da memória da independência daquele país; Silvia Capanema Almeida, autora do texto “Do marinheiro João Cândido ao Almirante Negro: conflitos memoriais na construção do herói de uma revolta centenária”, discute a consolidação da Revolta da Chibata (Rio de Janeiro, 1910) como um tema da memória nacional brasileira, mediante a análise de diferentes momentos e tentativas de recuperação, apropriação e comemoração do levante; Sílvio Correa no artigo “História, memória e comemorações: em torno do genocídio e do passado colonial no sudoeste africano” trata de algumas formas de compartilhar a experiência, do dever da memória e do reescrever da História no que tange ao genocídio durante a guerra colonial (1904-1907) no sudoeste africano; Marcelo Abreu no trabalho “Luto e culto cívico dos mortos: as tensões da memória pública da Revolução Constitucionalista de 1932 (São Paulo, 1932-1937)” analisa as tensões da memória pública desse movimento, baseando-se no estudo da invenção do culto cívico dos mortos em combate; Douglas Marcelino em “Os funerais como liturgias cívicas: notas sobre um campo de pesquisas” apresenta o processo de constituição de funerais em liturgias cívicas, destacando sua relação com outros fenômenos históricos, como a conformação dos imaginários nacionais, o processo de individualização moderno e as mudanças nas formas de lidar com a morte; Rodrigo Christofoletti no texto “Rapsódia verde: as comemorações do jubileu de prata integralista e a manutenção de seu passado / presente (1957-1958)” apresenta a série de eventos promovida em comemoração à trajetória do movimento fundado em 1932; Angélica Müller em “‘Você me prende vivo, eu escapo morto’: a comemoração da morte de estudantes na resistência contra o regime militar” analisa os ‘usos políticos do passado’ feitos pelos militantes do movimento estudantil na década de 1970, no intuito de reforçar a identidade associativa e legitimar a resistência contra a ditadura militar; finalizando o Dossiê, Marta Mega de Andrade no texto “O espaço funerário: comemorações privadas e exposição pública das mulheres em Atenas (séculos VI-IV a.C.)” estuda a comemoração funerária das mulheres em Atenas a partir dos epigramas. Trata-se de explorar a hipótese de que os contextos funerários, como espaços de ‘publicização’ e de exposição, mostram uma relação positiva da comunidade políade com as mulheres, através da valorização de temas como o das relações de philia e da recorrência de elogios derivados da tradição épica, em épocas anteriores destinados apenas aos elogios fúnebres masculinos.

A seção de avulsos apresenta seis artigos: Alexander Von Plato em seu texto “Mídia e Memória: apresentação e ‘uso’ de testemunhos em som e imagem” trata do registro de testemunhos, bem como dos efeitos desse registro e das mídias, em geral, sobre as pessoas entrevistadas; Eduardo Morettin no artigo “As exposições universais e o cinema: história e cultura” tem por objetivo examinar a presença do cinema nessas exposições entre 1893 e 1939; integrante de uma cultura visual construída por esses espaços dedicados a celebrar o capitalismo, o cinema tem sua trajetória identificada à das diferentes feiras mundiais pela sua capacidade de entreter e, ao mesmo tempo, educar; Diego Santos Vieira de Jesus e Verônica Fernandes, em “Do ‘terror suicida’ ao ‘bárbaro’: mídia e exclusão na política externa brasileira – o 11 de setembro segundo O Globo e a Folha de S. Paulo“, examinam a cobertura dos atentados de 11 de setembro de 2001 pelos jornais impressos de maior circulação no Brasil, no dia seguinte aos ataques, mostrando que a atuação de tais meios de comunicação foi fundamental na definição de práticas de exclusão no nível internacional; Tania de Luca no texto “A produção do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) em acervos norte-americanos: estudo de caso” analisa a ação do DIP como editor e financiador de obras favoráveis ao regime, e a sua presença no exterior indicando os esforços do regime para atingir uma audiência internacional; Eugênio Rezende de Carvalho no texto “A dupla dimensão do movimento latino-americano de história das ideias” tem como propósito oferecer uma análise sobre a dupla dimensão do movimento intelectual de história das ideias, organizado na América Latina por volta da década de 1940, sob a liderança destacada do filósofo mexicano Leopoldo Zea (1912-2004); completando o conjunto, Alírio Carvalho Cardoso em “A conquista do Maranhão e as disputas atlânticas na geopolítica da União Ibérica (1596-1626)” discute os projetos existentes para a ocupação ou exploração econômica do antigo Maranhão, antes de 1625. Tais projetos – francês, inglês e holandês – concorrem com o plano luso-espanhol de ocupação da fronteira entre o Norte do Brasil e as Índias de Castela entre os séculos XVI e XVII.

Este número apresenta ainda quatro resenhas: Weder Ferreira da Silva analisa a obra Memórias e narrativas (auto)biográficas (organizada por Gomes & Schmidt); Diogo da Silva Roiz escreve sobre O alufá Rufino: tráfico, escravidão e liberdade no Atlântico negro (1822-1853) (Reis; Gomes & Carvalho); Maria de Fátima Fontes Piazza focaliza O Café de Portinari na Exposição do Mundo Português: modernidade e tradição na imagem do Estado Novo brasileiro (de Luciene Lehmkuhl), e Helenice Rodrigues da Silva escreve sobre Pierre Nora – homo historicus (de François Dosse).

Acreditamos que os escritos aqui divulgados podem ser um estímulo para novas pesquisas e debates com vistas a fortalecer o campo de trabalho do profissional de história. Assim, convidamos nossos leitores a consultar o site da Anpuh e do SciELO e baixar nos seus computadores ou nos leitores digitais os artigos de seu interesse. Ainda que a publicação em papel possa fazer falta para alguns (e eu me incluo entre eles), o mundo digital cada vez mais abre novas portas e possibilidades.

Marieta de Moraes Ferreira
julho de 2011


FERREIRA, Marieta de Moraes. Apresentação. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.31 n.61, 2011. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê