História e mundos do trabalho no Brasil: desenvolvimento, paradoxos e desafios | Ars Historica | 2019

“O século XX foi a era da classe trabalhadora”, lembrou recentemente o sociólogo sueco e professor da Universidade de Cambridge, Goran Therborn. Para ele, foi nesse período que, em escala global, “pela primeira vez, as pessoas que trabalham e que não têm propriedade tornaram-se uma força política fundamental”.1 Também foi assim no Brasil. Se os legados seculares da escravidão e os impactos das imensas assimetrias econômicas e exclusão política marcaram a “questão social”, também é possível dizer que os embates contra essas desigualdades foram decisivos para a construção de uma linguagem de classe e de valorização do mundo do trabalho que colocaria os setores populares no centro da arena política ao longo daquele século. Leia Mais

História e mundos do trabalho no Brasil: desenvolvimento, paradoxos e desafios | Ars Historica | 2019

“O século XX foi a era da classe trabalhadora”, lembrou recentemente o sociólogo sueco e professor da Universidade de Cambridge, Goran Therborn. Para ele, foi nesse período que, em escala global, “pela primeira vez, as pessoas que trabalham e que não têm propriedade tornaram-se uma força política fundamental”.1 Também foi assim no Brasil. Se os legados seculares da escravidão e os impactos das imensas assimetrias econômicas e exclusão política marcaram a “questão social”, também é possível dizer que os embates contra essas desigualdades foram decisivos para a construção de uma linguagem de classe e de valorização do mundo do trabalho que colocaria os setores populares no centro da arena política ao longo daquele século.

É verdade que os sindicatos e as movimentações coletivas dos trabalhadores e das trabalhadoras têm sido, desde há muito, objeto de escrutínio e análise acadêmica. Embalada pelas ideias de modernização — entendida como urbanização e industrialização —, a pioneira sociologia paulista dos anos 1950 e 1960, por exemplo, teve no sindicalismo e na formação social da classe operária alguns dos seus principais objetos de estudo.2 O impacto do golpe de 1964, articulado segundo muitos de seus perpetradores, contra uma suposta “República Sindicalista” que dominaria o país, estimulou uma série de avaliações de estudiosos, em particular cientistas políticos, interessados nos potenciais limites e deficiências dos chamados sindicatos “populistas” instaurados na “Era Vargas”.3 Por sua vez, a eclosão de uma onda grevista e do chamado “novo sindicalismo” que marcaria a redemocratização do país no final dos anos 1970 geraria uma enorme onda de interesse e estudos sobre os trabalhadores e movimentos sociais, onda essa bastante influente nas ciências sociais brasileiras ao longo dos anos 1980.4 Leia Mais

Corporativismo e neocorporativismo / Estudos Históricos / 2018

Surgido em meio à ampliação da participação dos setores sociais subalternos na política e à consolidação do capitalismo industrial, o corporativismo foi apresentado por seus defensores como uma modalidade de representação de interesses e de organização societal e estatal alternativa tanto à democracia liberal quanto ao socialismo. Propondo-se garantir estabilidade social pela conciliação de classes, o corporativismo irradiou-se da Europa para o restante do mundo (e a América Latina foi-lhe um terreno fértil) nas primeiras décadas do século passado. Tema prestigiado pela historiografia e pela ciência política, tem conhecido, no último decênio, um interesse renovado, que tem gerado livros, artigos e eventos acadêmicos no Brasil e no exterior. Um dos traços marcantes da nova produção sobre o corporativismo é o debate sobre sua relação com regimes autoritários e democráticos. Arriscaríamos a afirmar que a posição dominante, atualmente, entre os estudiosos é de recusa de uma associação necessária entre corporativismo e autoritarismo. Entre os argumentos mobilizados pelos acadêmicos que comungam de tal posição está o exemplo escandinavo, que adotou formas corporativas para implementar, em um ambiente político democrático, Estados de bem-estar social.

O presente número de Estudos Históricos dispõe-se, assim, a contribuir para aprofundar a reflexão em torno das experiências do corporativismo histórico (anterior à Segunda Guerra) e do neocorporativismo (posterior à Segunda Guerra) no Brasil e na Europa. No primeiro artigo da edição, Miguel Ángel Martínez investiga a introdução, por meio da Assembleia Nacional Consultiva, da representação política de inspiração corporativa na Espanha da década de 1920, durante a ditadura de Primo de Rivera. O segundo artigo, de autoria de Valerio Torreggiani, estuda a presença da modalidade corporativa de representação de interesses no repertório político britânico da primeira metade do século XX. Em seguida, Paula Borges dos Santos ilumina o debate em torno de soluções corporativas, nos âmbitos econômico e social, durante a elaboração da Constituição portuguesa de 1933. Álvaro Garrido também trata do corporativismo português, examinando o (frágil) aparato de seguridade social instaurado pela ditadura salazarista. Por sua vez, Irene Stolzi acompanha o corporativismo no ordenamento jurídico italiano, tanto no contexto fascista quanto no democrático dos anos 1980 e 1990.

Na seção Ensaio bibliográfico, Cláudia Viscardi recenseia a produção contemporânea sobre corporativismo, em diálogo com a literatura clássica sobre o tema. Na seção Colaboração especial, Péter Zachar explora a elaboração de um projeto, informado parcialmente pelo ideário corporativo, de reforma social, econômica e política na Hungria do entreguerras. E Miguel Ángel Perfecto traça uma genealogia das propostas corporativas na Espanha, ao mesmo tempo que investiga sua implementação no país a partir da década de 1920.

O número encerra-se com uma entrevista concedida a Estudos Históricos por Renato Boschi, um dos mais importantes estudiosos do corporativismo no Brasil.

Referências

SCHMITTER, Philippe. Still the century of corporatism?. The Review of Politics, v. 36, n. 1, 1974.

Angela Moreira Domingues da Silva – Professora da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV). Editora da Revista Estudos Históricos. E-mail: [email protected]

Marco Aurélio Vannucchi Leme de Mattos – Professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV). Editor da Revista Estudos Históricos. E-mail: [email protected]

Paulo Fontes – Professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV). Editor da Revista Estudos Históricos. E-mail: [email protected]

Os editores.


SILVA, Angela Moreira Domingues da; MATTOS, Marco Aurélio Vannucchi Leme de; FONTES, Paulo. Editorial. Estudos Históricos. Rio de Janeiro, v.31, n.64, maio / ago.2018. Acessar publicação original [DR]

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História, democracia e instituições / Estudos Históricos / 2018

As atuais discussões a respeito do funcionamento das instituições nacionais e da qualidade da democracia brasileira motivaram a definição do presente tema da Revista Estudos Históricos, que se dedica a reflexões sobre História, democracia e instituições. A abrangência e importância do tema fez com que recebêssemos artigos refletindo sobre os mais variados temas, a partir de perspectivas bem distintas. Assim, neste número, contamos com textos sobre feminismo e participação das mulheres nas instituições, sobre distintas concepções de democracia na primeira metade do século XX, a partir do ponto de vista de juristas, sobre o processo de redemocratização brasileira na década de 1980 e as disputas em torno da noção de democracia, além de texto sobre o funcionamento do sistema de Justiça criminal brasileiro. Dessa forma, publicamos artigos que cobrem diferentes épocas da histórica republicana brasileira.

O artigo que abre este número da Revista trata de uma Uma história social do feminismo: diálogos de um campo político brasileiro (1917-1937), no qual Glaucia Cristina Candian Fraccaro contribui para reflexões sobre o feminismo – campo de disputas internacionais –, a partir da ótica do mundo do trabalho. Ao longo do artigo, Fraccaro enfatiza a luta das mulheres trabalhadoras por direitos e sua pouca representatividade nas instituições governamentais. O segundo artigo, A democracia em debate: juristas baianos e a resistência ao regime varguista (1930-1945), de Diego Rafael Ambrosini, busca analisar diferentes noções em circulação a respeito da ideia de democracia nas décadas de 1930 e 1940, especialmente a partir da perspectiva da produção intelectual de juristas que atuavam no Instituto dos Advogados da Bahia.

O texto que segue, de Daniel Barbosa Andrade de Faria, analisa o incidente acontecido logo após a manifestação contra o Plano Cruzado II, conhecido como “badernaço”, refletindo sobre as disputas em torno da noção de democracia, fundamentado na documentação do acervo da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal. Pesquisando sobre a mesma época, Fernando Roque Fernandes analisa o debate parlamentar em torno da Constituição de 1988, no que concerne à pauta da cidadania indígena, quando democracia, cidadania e direitos humanos estavam na agenda de discussões para pensar a “nova democracia” brasileira. Por fim, o artigo de Flávia Cristina Soares e Ludmila Ribeiro que oferece um balanço bibliográfico sobre o funcionamento do sistema criminal brasileiro, registrando o descompasso entre os ideais da democracia e o pragmatismo do funcionamento das instituições de Justiça.

Fechando o dossiê, o número apresenta a entrevista realizada com o cientista político João Roberto Martins Filho, professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), sobre a história e a atuação política das Forças Armadas brasileiras. Além de narrar sua trajetória acadêmica, com início na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Martins Filho registra o percurso de suas pesquisas sobre a instituição militar, tendo início na atuação política do Exército durante o período ditatorial brasileiro.

Este número é dedicado a Dulce Pandolfi, Luciana Heymann, Monica Kornis e Verena Alberti, acadêmicas fundamentais na história do CPDOC e da Revista Estudos Históricos.

Angela Moreira Domingues da Silva – Professora da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV). Editora da Revista Estudos Históricos.

Marco Aurélio Vannucchi Leme de Mattos – Professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV). Editor da Revista Estudos Históricos.

Paulo Fontes – Professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV). Editor da Revista Estudos Históricos.

Os editores.


SILVA, Angela Moreira Domingues da; MATTOS, Marco Aurélio Vannucchi Leme de; FONTES, Paulo. Editorial. Estudos Históricos. Rio de Janeiro, v.31, n.63, jan. / abr. 2018. Acessar publicação original [DR]

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Revoluções e Revoltas / Estudos Históricos / 2017

As celebrações do centenário da Revolução Russa inspiram Estudos Históricos a lançar este número intitulado Revoluções e revoltas. O assalto ao céu, as esperanças utópicas, as desilusões revolucionárias, bem como as múltiplas reações globais à tomada do poder pelos bolcheviques marcaram fundamentalmente a história do século XX e redefiniram o próprio conceito de revolução e o significado das revoltas sociais. O número inspira-se na Revolução Russa, mas não se resume a ela ou à sua influência. As análises percorrem um longo caminho de estudos sobre rebeliões, revoltas e processos revolucionários em diferentes períodos e lugares, fornecendo um rico e diversificado mosaico de pesquisas sobre essas temáticas.

O número inicia-se com o artigo “Modelos de rebelião rural e as revoltas rurais do Império Romano Tardio”, no qual Uiran Gebara da Silva testa a validade de modelos explicativos elaborados pelas Ciências Sociais para a compreensão de revoltas ocorridas na Gália e na África romanas. No segundo artigo, “As letras de uma Revolução: a implantação da República em Portugal a 5 de outubro de 1910”, Ana Paula Pires estuda o processo que levou à derrubada da monarquia e sua substituição pelo regime republicano naquele país. Em seguida, Denise Rollemberg, em “Revoluções de direita na Europa do entre-guerras: o fascismo e o nazismo”, debruça-se sobre a Alemanha nazista e a Itália fascista para refletir sobre a aplicabilidade do conceito “revolução” para regimes e movimentos liderados pelas direitas.

Os dois artigos subsequentes concentram-se na história do Brasil. José Manuel Flores, em “Sob o credo vermelho: índios, comunistas e revolta no sul de Mato Grosso em meados do século XX”, articula a insurgência dos índios Kaiowá contra a autoridade do Serviço de Proteção aos Índios (SPI) e a atuação do Partido Comunista do Brasil (PCB). E Rodrigo Nabuco Araujo, em “A voz da Argélia. A propaganda revolucionária da Frente de Libertação Nacional argelina no Brasil. Independência nacional e revolução socialista (1954-1962)”, examina a recepção da guerra de independência argelina pela intelectualidade brasileira de esquerda nos anos 1950 e 1960.

Já Berthold Unfried e Claudia Martínez, em “El internacionalismo, la solidaridad y el interés mutuo. Encuentros entre cubanos, africanos y alemanes de la RDA”, desenvolvem um estudo comparativo entre as ações de solidariedade de Cuba e da Alemanha Oriental em relação aos movimentos e regimes socialistas e nacionalistas em países recém-independentes na África. Em “A new revolutionary practice: operaisti and the ‘refusal of work’ in 1970s Italy”, Nicola Pizzolato analisa a práxis e a elaboração teórica dos grupos “obreiristas” no contexto de radicalização política da Itália dos anos 1970. Em particular, é analisado o conceito de “recusa do trabalho” e seu impacto nas intensas lutas e mobilizações operárias do período.

Na seção Ensaio bibliográfico, Francisco Palomanes Martinho recenseia a literatura recente sobre a transição portuguesa para a democracia, privilegiando os temas do papel do marcelismo e do caráter da revolução que derrubou o salazarismo em 1974.

Finalmente, a seção Colaborações especiais conta com os artigos “Karl Marx e a Revolução Russa” e “Um ano extraordinário: greves, revoltas e circulação de ideias no Brasil em 1917”. No primeiro, Angelo Segrillo acompanha a reflexão de Marx acerca das possibilidades de eclosão de uma revolução comunista na Rússia. No segundo, Edilene Toledo trata dos movimentos contestatórios que tiveram lugar em várias partes do país no ano de 1917 e destaca a repercussão da Revolução Russa sobre as organizações de trabalhadores.

Marco Aurélio Vannucchi Leme de Mattos – Professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV).

Paulo Fontes – Professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV).

Os editores.


MATTOS, Marco Aurélio Vannucchi Leme de; FONTES, Paulo. Editorial. Estudos Históricos. Rio de Janeiro, v.30, n.61, maio / ago. 2017. Acessar publicação original [DR]

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Mundos do Trabalho / Estudos Históricos / 2016

Chega a ser surpreendente que Estudos Históricos não tenha tido, até este momento, um número específico dedicado aos mundos do trabalho. Temática cara à tradição acadêmica do CPDOC / FGV, os estudos sobre o trabalho e os(as) trabalhadores(as) foram centrais para algumas das obras e pesquisas mais importantes da instituição. Por outro lado, no entanto, esta edição chega em um momento particularmente rico para os estudos dos mundos do trabalho no Brasil em uma perspectiva histórica e interdisciplinar. O campo da história social do trabalho no Brasil vive, já há alguns anos, um período de criatividade, renovação e diversificação. Gerações recentes de historiadores, historiadoras e cientistas sociais em geral têm expandido o escopo da área, incluindo novas e pouco exploradas temáticas, como gênero, etnicidade, trabalho informal, bem como as conexões entre trabalho escravo, forçado e o chamado “trabalho livre”. Mesmo temas considerados clássicos, como sindicalismo, conflitos sociais, participação política dos trabalhadores e a relação entre os mundos do trabalho e o Estado e empresários têm sido abordados de formas inovadoras e inventivas, ampliando em muito o entendimento sobre o papel dos setores subalternos nos processos de desenvolvimento econômico e social e na construção da cidadania e da democracia na história do país.

Além disso, a produção historiográfica nesta área teve uma evidente ampliação geográfica, ultrapassando em muito as análises antes bastante confinadas ao eixo Rio-São Paulo. A multiplicação de estudos sobre outras regiões, sobre o mundo urbano e rural e sobre os mundos do trabalho em pequenas, médias e grandes cidades permite hoje uma visão muito mais complexa, sofisticada e “nacional” dos processos de formação de classe e das relações sociais brasileiras. Por outro lado, a produção no campo tem se internacionalizado crescentemente. Ao lado de suas congêneres indiana e sul-africana, a historiografia do trabalho brasileira tem sido amplamente reconhecida como um dos polos de renovação e dinamismo da chamada “História Global do Trabalho”.

Este número de Estudos Históricos dialoga diretamente com esse momento de vitalidade da história social do trabalho no Brasil. De um lado, apresenta vários estudos de grande qualidade sobre os mundos do trabalho no país em diferentes períodos, regiões e situações. De outro, também aponta os limites e desafios colocados para este campo de estudos. É o caso dos dois artigos que abrem a revista. Alexandre Fortes, em O processo histórico de formação da classe trabalhadora: algumas considerações, revisita a obra de E. P. Thompson procurando demonstrar como ela, a partir dos desafios atuais e confrontada com outros autores mais contemporâneos, ainda pode inspirar uma necessária atualização conceitual sobre o processo de formação de classe no Brasil. Já Álvaro Pereira Nascimento, em seu provocativo artigo Trabalhadores negros e o “paradigma da ausência”: contribuições à história social do trabalho no Brasil, faz um balanço da (in)visibilidade dos sujeitos negros na produção historiográfica dos mundos do trabalho. O autor aponta os vários problemas trazidos pela ausência desses sujeitos históricos nos estudos da história social do trabalho e sugere alguns caminhos metodológicos para superá-los.

Exemplo da ampliação que vem ocorrendo com o conceito de trabalho e trabalhadores(as), o artigo de André Rosemberg, A pena como arma: trabalho, intimidade e rotina nas cartas dos policiais paulistas (1870-1915), surpreende ao abordar os policiais como trabalhadores, utilizando uma fonte pessoal e íntima como a correspondência trocada por esses personagens. Já Fabiane Popinigis, em “Todas as liberdades são irmãs”: os caixeiros e as lutas dos trabalhadores por direitos entre o Império e a República, retoma temas clássicos como o da “transição” do trabalho escravo para o trabalho livre e a construção da cidadania, a partir das experiências dos empregados do comércio carioca.

A regulação do trabalho feminino em um sistema político masculino, Brasil: 1932-1943, de Teresa Cristina Novaes Marques, inova ao abordar o polêmico processo de regulação do trabalho dos anos 1930 e 40 a partir de uma perspectiva de gênero, procurando compreender como a questão do trabalho feminino foi abordada por diferentes atores e movimentos políticos e sociais. Uma outra abordagem inédita sobre os mundos do trabalho durante a Era Vargas é feita por Adriano Duarte em Pedro Maneta e o concurso literário promovido pelo Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio em 1942. Nesse artigo, ao analisar o romance Pedro Maneta, premiado em concurso promovido pelo Ministério do Trabalho, o autor reflete sobre as intricadas relações entre história, literatura e sociedade. Assim, a partir de novas perspectivas, rediscute a centralidade adquirida pelos mundos do trabalho durante o Estado Novo.

Tanto o papel das biografias e trajetórias de ativistas quanto as relações entre o universo do trabalho e da moradia são abordados no texto de Mauro Amoroso e Rafael Soares Gonçalves. O advogado e os “trabalhadores favelados”: Antonie de Magarinos Torres e a prática política nas favelas cariocas dos anos 1950 e 1960 analisa a ação do famoso advogado Magarinos, em particular na favela do Borel, e seu papel de estímulo ao associativismo de seus moradores. Temas clássicos da história do trabalho, como o cotidiano fabril e os processos de dominação nos locais de trabalho são abordados por Cristiana Ferreira a partir das experiências de mulheres e jovens em Códigos de solidariedade na experiência de jovens e mulheres na indústria têxtil de Blumenau (1958-1968).

A mobilização dos trabalhadores rurais na crucial conjuntura do pré-1964 em um estado nordestino é o tema de Pablo Francisco de Andrade Porfírio em O tal de natal: reivindicação por direito trabalhista e assassinatos de camponeses. Pernambuco, 1963. O artigo analisa como, além do uso da violência, articulou-se uma narrativa visual e escrita para classificar, qualificar e construir significados para a ação reivindicatória dos camponeses. Por fim, O lobby dos trabalhadores no Processo Constituinte de 1987-88: um estudo sobre a atuação do DIAP, de Lucas Nascimento Ferraz Costa, mostra as diferentes estratégias e alianças políticas articuladas pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP) para defender os interesses dos trabalhadores na Constituinte na segunda metade da década de 1980.

A seção Contribuição Especial apresenta o texto da palestra promovida pelo Laboratório de Estudos dos Mundos do Trabalho e Movimentos Sociais (LEMT) do CPDOC / FGV, proferida pelo historiador alemão Bernhard H. Bayerlein em julho de 2016. O artigo traça um panorama da situação e possibilidades de pesquisa nos arquivos mais importantes para os estudos históricos sobre o comunismo em diversas partes do globo. O arquivo da Internacional Comunista na Rússia e o projeto Comitern Online são analisados em particular. Por fim, o autor aborda o impacto que a abertura de novos acervos teve para a historiografia sobre comunismo, para as políticas de memória e para a história do século XX em geral.

Finalmente, este número traz uma rara entrevista com Michael Hall, um dos decanos da história do trabalho no Brasil. Professor do Departamento de História da Unicamp por mais de 30 anos, Michael Hall foi orientador de diversas gerações de historiadores. Foi um dos fundadores do Arquivo Edgard Leuenroth (AEL), o maior arquivo especializado em história do trabalho na América Latina. Nesta entrevista, concedida a Paulo Fontes e Francisco Macedo, Michael Hall fala sobre sua trajetória profissional e sua produção intelectual, analisa o desenvolvimento da historiografia do trabalho brasileira desde os anos 1960 e opina sobre os desafios contemporâneos desse campo de estudos.

Angela Moreira Domingues da Silva – Professora da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV).

Marco Aurélio Vannucchi Leme de Mattos – Professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV).

Paulo Fontes – Professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV).

Os editores.

SILVA, Angela Moreira Domingues da; MATTOS, Marco Aurélio Vannucchi Leme de; FONTES, Paulo. Editorial. Estudos Históricos. Rio de Janeiro, v.29, n.59, set. / dez.2016. Acessar publicação original [DR]

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Perspectivas Globais e Transnacionais / Estudos Históricos / 2017


MORELI Alexandre (Org d), Perspectivas Globais – Transnacionais / Estudos Históricos / 2017, Global (d), Transnacional (d), Estudos Históricos (EHd) MORELI, Alexandre. Editorial. Estudos Históricos. Rio de Janeiro, v.30, n.60, jan. / abr. 2017. Acesso apenas pelo link original [DR]

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Direito, História e Ciências Sociais / Estudos Históricos / 2016

Os estudos sobre o campo do Direito consolidaram-se no Brasil nas últimas décadas. Pode-se sugerir que a ampliação do interesse da História e das Ciências Sociais em relação à temática se vincule ao crescente protagonismo do Judiciário na vida pública do país no pós-ditadura militar. O vigor dessa área de estudos evidencia-se na existência de simpósios e grupos de trabalhos especializados organizados no interior das principais entidades de História e Ciências Sociais brasileiras.

A produção acadêmica sobre o Direito, com forte traço interdisciplinar, desdobra-se em análises sobre ideias, práticas, instituições e agentes jurídicos. Além disso, proporciona reflexões sobre as fontes documentais e as metodologias utilizadas, e estimula o aprofundamento da reflexão teórica sobre o tema.

Assim, este número de Estudos Históricos pretende exprimir, ainda que parcialmente, a diversidade temática e de perspectivas que distinguem a produção atual sobre o campo do Direito.

O primeiro artigo, O procedimento de manutenção de liberdade no Brasil oitocentista, de Mariana Paes, examina as bases jurídicas da posse da liberdade no quadro da sociedade escravista do século XIX. O segundo artigo, A organização da justiça militar no Brasil: Império e República, de Adriana Barreto e Angela Moreira, oferece um panorama da estruturação e atuação deste ramo da Justiça no período imperial e republicano.

Os três artigos seguintes tratam da Primeira República. Em Vadiagem e prisões correcionais em São Paulo, Alessandra Teixeira, Fernando Salla e Maria Gabriela Marinho problematizam o controle e a repressão à vadiagem. Pedro Cantisano, em Direito, propriedade e reformas urbanas, aborda as reformas urbanas realizadas no Rio de Janeiro no início do século XX sob o prisma dos debates jurídicos por elas gerados em torno do direito à propriedade. Já o artigo A atuação do Supremo Tribunal Federal na crise da Política dos Estados na Primeira República, de Leonardo Sato e Priscila Gonçalves, versa sobre o periodismo jurídico, pelo estudo da revista O Direito.

Mariana Silveira, em Direito, ciência do social, articula a participação política dos bacharéis com a produção intelectual que veiculavam em periódicos especializados no primeiro governo Vargas. O artigo posterior, O sentido democrático e corporativo da não-Constituição de 1937, de Luciano Abreu, analisa a questão da legitimidade da carta constitucional em questão. Ainda no âmbito da Era Vargas, Walter Guandalini Jr. e Adriano Codato, em O Código Administrativo do Estado Novo, refletem sobre a estrutura político-administrativa do regime instaurado em 1937.

O último artigo, Constitucionalismo e batalhas políticas na Argentina, de Fabiano Engelmann e Luciana Rodrigues Penna, investiga as relações entre o constitucionalismo e a política naquele país.

O dossiê Direito, História e Ciências Sociais completa-se com o texto Sobre a história constitucional, de Andrei Koerner. Com ele, Estudos Históricos inaugura a seção Ensaio bibliográfico, destinada a publicar balanços da literatura nacional e estrangeira recente relacionada à temática do número.

Encerram a presente edição da revista os três textos lidos na cerimônia de outorga dos títulos de professoras eméritas da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV / CPDOC) a Angela de Castro Gomes e Lucia Lippi Oliveira. Os títulos foram concedidos pela Congregação do CPDOC, e a cerimônia ocorreu no dia 14 de março deste ano. Em Pioneiras e construtoras, Luciana Heymann destaca a contribuição institucional ao CPDOC das professoras homenageadas pela Congregação. Bernardo Buarque, em Socióloga com olhar histórico ou historiadora com perspectiva sociológica?, percorre a produção intelectual de Lucia, enquanto Paulo Fontes, em Sensei Angela de Castro Gomes, assinala aspectos fundamentais da obra de Angela.

Luciana Heymann Quillet – Professora da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV).

Marco Aurélio Vannucchi Leme de Mattos – Professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV).

Paulo Fontes – Professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV).

Os editores


HEYMANN, Luciana Quillet; MATTOS, Marco Aurélio Vannucchi Leme de; FONTES, Paulo. Editorial. Estudos Históricos. Rio de Janeiro, v.29, n.58, maio / ago. 2016. Acessar publicação original [DR]

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Patrimônios / Estudos Históricos / 2016

É surpreendente que Estudos Históricos não tivesse até hoje um número dedicado ao tema do patrimônio. Ainda que nos números dedicados aos Bens Culturais (38) e à Cultura Material (48) os debates sobre o patrimônio pudessem encontrar abrigo, faltava um número consagrado especificamente a esse campo de estudos marcadamente interdisciplinar, cada vez mais vasto e polifônico.

O texto de José Reginaldo Santos Gonçalves, O mal estar no patrimônio: identidade, tempo e destruição, publicado como colaboração especial no número 55, problematiza a “obsessão preservacionista” do nosso tempo e aponta para os “diferentes perfis semânticos” que a categoria patrimônio tem assumido em suas apropriações contemporâneas por movimentos sociais e grupos populares; pela indústria cultural e do turismo. Sem que essa articulação tenha sido planejada, a Aula Inaugural proferida por Gonçalves no Programa de Pós-Graduação em História, Política e Bens Culturais do CPDOC / FGV em 2015, que deu origem ao artigo, pode ser lida como a abertura de um debate que, sem nunca se fechar, encontra ressonância nos artigos que compõem o número 57.

Nosso objetivo ao propor os Patrimônios como tema foi, portanto, captar artigos que contemplassem discussões sobre políticas patrimoniais tanto no campo dos bens associados ao patrimônio histórico e artístico como no do chamado – não sem controvérsias – patrimônio imaterial ou intangível, bem como artigos que explorassem situações contemporâneas que articulam e agenciam discursos e práticas do campo patrimonial. Consideramos que os 13 artigos que integram o número correspondem plenamente a essa diretriz, compondo um mosaico de estudos extremamente vigoroso e sugestivo.

O artigo de Paulo Cesar Marins abre a revista com uma discussão acerca das políticas patrimoniais das últimas décadas, na qual são investigadas as tensões que cruzam o campo do patrimônio imaterial, os impasses colocados pelo instrumento de salvaguarda e os usos políticos da gramática instituída por essas novas políticas. A natureza inovadora dessas políticas contemporâneas é colocada em xeque no texto provocador de Marins.

O segundo artigo, de autoria de Márcia Chuva, explora de maneira original gestos que produziram, por meio de seleções e classificações, conjuntos de bens instituídos como patrimônio cultural. Enfrentando o desafio de aproximar contextos de espaço-tempo distintos, sem nunca borrar as diferenças, Chuva sugere que o olhar se desloque dos processos clássicos de consagração para o momento inaugural da viagem, entendida aqui como prática estruturante dos atributos que arquitetos e antropólogos pretenderam descobrir ou revelar.

O Rio de Janeiro, cidade que historicamente foi palco de disputas e embates que têm no discurso do patrimônio seu eixo articulador, é o cenário no qual se desenrolam as tramas de quatro artigos. O texto de Nina Bitar explora os mercados de abastecimento como objetos privilegiados sobre os quais se projetam concepções e discursos urbanísticos que, embasados por distintas visões do patrimônio, tanto os condenam como os consagram. As disputas de memória pelos significados atribuídos ao Cais do Valongo, opondo ou justapondo o poder público municipal e o movimento negro, são tema do artigo de Márcia Leitão Pinheiro e Sandra Sá Carneiro. As conexões entre o campo de disputas que se articula no espaço urbano e o mercado do turismo não escapam às autoras, e também estão presentes no artigo de Roberta Guimarães dedicado às Áreas de Proteção do Ambiente Cultural do Rio de Janeiro. Ambos os textos analisam, cada qual à sua maneira, o apelo à identidade cultural como categoria articuladora tanto para gestores urbanos como para movimentos sociais. Por fim, o artigo de Fernando Atique, que analisa a trajetória do Solar Monjope, construído nos anos 1920 no Jardim Botânico, desloca o olhar para os embates que nos anos 1970 cercaram sua demolição. A sociedade civil, aqui também, se contrapôs aos órgãos de preservação do patrimônio, deixando entrever – como no artigo de Nina Bitar – como preservação e destruição são linhas de força constantemente imbricadas e em permanente tensão.

Os museus também foram contemplados no número, sob duas perspectivas distintas. Clovis Carvalho Britto se detém na análise do discurso museológico acerca do cangaço e do lugar reservado às mulheres nessa narrativa. Dialogando com os estudos que têm se dedicado a problematizar os sentidos produzidos pelos itinerários museais, conecta esse debate ao campo do patrimônio e da história. No caso do artigo de Lucília Santos Siqueira, o olhar se detém sobre as edificações que abrigam museus, deslocando-se o foco para os processos de tombamento, para as conexões entre os espaços e as coleções que eles abrigam e para a recepção desses bens.

O patrimônio material, a “pedra e cal”, como ficou conhecido todo um campo de políticas no âmbito do patrimônio e de seus técnicos, não poderia estar melhor representado: Ouro Preto, espaço por excelência de expressão dessas políticas, é objeto do artigo de Leila Bianchi Aguiar, que problematiza os impasses colocados pela mudança, vale dizer pelo próprio tempo, na gestão de um bem tão complexo como paradigmático. Em outro contexto nacional, e remetendo a outro tempo histórico, Olanda Vilaça analisa a casa minhota como patrimônio cultural do universo rural português a partir do exame de inventários, testamentos e fotografias.

A dimensão edificada é ainda objeto do artigo de Verônica Pereira dedicado à creche Condessa Marina Crespi. Nesse caso, porém, não está em jogo a singularidade ou a antiguidade do bem. Muito ao contrário, a categoria patrimônio cultural industrial, articulada pelos agentes que se mobilizam em disputas que têm a cidade de São Paulo como cenário, subverte o discurso da excepcionalidade para apostar no das identidades sociais.

A natureza tampouco escapou ao discurso patrimonial e aos dilemas associados à preservação, como nos convida a refletir o artigo de Annelise Fernandez sobre a criação do Parque Estadual da Pedra Branca, no Rio de Janeiro. Sob nova perspectiva, o embate entre natureza e cultura se atualiza nos meandros que envolvem a patrimonialização dos dois termos dessa equação.

Por fim, o artigo de Joana Passos, Tânia Nascimento e João Carlos Nogueira discute, a partir de um estudo de caso, a ressonância dos patrimônios da cultura afro-brasileria em um município do estado de Santa Catarina. O artigo aborda como as representações do poder público e da sociedade acerca do patrimônio estão imbricadas nas dinâmicas de auto-representação, permitindo perscrutar posições relativas de diferentes atores sociais sob a ótica das relações raciais.

O número 57 conta ainda com dois textos que enriquecem sobremaneira a publicação. O artigo do filósofo alemão Hermann Lübbe, pela primeira vez traduzido para o português, incide sobre as dinâmicas da memória a partir da discussão acerca da consciência histórica do nosso tempo, repercutindo amplamente os debates sobre o patrimônio tratados pelos artigos.

A entrevista com Luiz Felipe de Alencastro fecha a revista com chave de ouro: um convite para conhecer novas abordagens da historiografia pelas mãos de um historiador e cientista político que atravessou fronteiras.

Luciana Heymann Quillet – Professora da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV).

Marco Aurélio Vannucchi Leme de Mattos – Professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV).

Paulo Fontes – Professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV).

Os editores


HEYMANN, Luciana Quillet; MATTOS, Marco Aurélio Vannucchi Leme de; FONTES, Paulo. Editorial. Estudos Históricos. Rio de Janeiro, v.29, n.57, jan. / abr. 2016. Acessar publicação original [DR]

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Trabalhadores e Ditadura | Mundos do Trabalho | 2014

Os cinquenta anos do golpe de 1964 têm assistido a um verdadeiro boom de publicações e estudos acadêmicos sobre a Ditadura Civil-Militar. Surpreendentemente, no entanto, os trabalhadores, personagens decisivos naquela conjuntura, têm sido razoavelmente negligenciados nas análises sobre o período. Nos numerosos eventos e atividades sobre o cinquentenário do golpe esta ausência é notável. Contudo, a presença pública e a luta por direitos, crescentes desde o final do Estado Novo, atingiriam um ápice justamente no início da década de 1960, mobilizando sindicatos, partidos, associações de moradores e outras formas de associação, como clubes de bairros e grêmios culturais. No campo e na cidade, os trabalhadores estavam no centro do cenário político.

A derrubada de João Goulart pelos militares representou a interrupção deste processo de ascensão da mobilização da classe trabalhadora brasileira. A elaboração de uma nova política trabalhista encetada pelo governo de Castello Branco (1964-1967), aplicada em conjunto com as medidas repressoras, assim como as intervenções nos sindicatos, possibilitou uma verdadeira revanche patronal. A aliança entre empresários e a polícia tornou-se ainda mais sólida e disseminada. Um clima de medo e perseguições passaria a dominar o interior das empresas. No campo, um número ainda não calculado de trabalhadores rurais foi expulso de suas terras e muitos foram mortos. Uma política econômica antitrabalhista proibiu greves, comprimiu salários, acabou com a estabilidade no emprego, facilitando demissões e a rotatividade da mão de obra. O deliberado enfraquecimento dos sindicatos facilitou em muito a superexploração dos trabalhadores, uma das marcas do regime autoritário, elevando o número de acidentes e mortes nos locais de trabalho. Leia Mais

Mundo Rural / Estudos Históricos / 2015

Este número de Estudos Históricos consagra-se à temática do mundo rural. Os artigos destacam o processo histórico brasileiro, ainda que a realidade paraguaia seja examinada por um dos textos publicados.

Pode-se dizer que a História e as Ciências Sociais surgiram no país tomando o mundo rural como um de seus objetos centrais. Lugar no qual viveu a maioria da população brasileira na maior parte da história, o campo converteu-se em tema de reflexão acadêmica associado ao atraso. Suas supostas expressões religiosas (como o messianismo), formas políticas (como o coronelismo) e conformação econômica (guardando semelhanças com o feudalismo) atestavam o arcaísmo que intelectuais de variadas colorações ideológicas desejavam fosse superado como condição para o desenvolvimento do Brasil. Ao longo do tempo, essa perspectiva foi se atenuando, abrindo espaço para a análise de fenômenos recentes, compreendidos não necessariamente na chave do atraso, tais como a consolidação de movimentos sociais vigorosos e de um capitalismo sustentado pelo agronegócio. O presente número de Estudos Históricos pretende contribuir para o esforço de uma compreensão matizada e mais abrangente do mundo rural, sem deixar, contudo, de jogar luz sobre suas mazelas e contradições.

O primeiro artigo, “Transformações na legislação sesmarial, processos de demarcação e manutenção de privilégios nas terras das Capitanias do Norte do Estado do Brasil”, analisa as vicissitudes do instituto da sesmaria na colônia, especificamente, entre fins do século XVII até meados do seguinte.

O segundo artigo, “O colonato na região serrana fluminense: conflitos rurais, direitos e resistências cotidianas”, acompanha o desenvolvimento desse regime de trabalho na cafeicultura e seu impacto sobre os trabalhadores a ele submetidos. “Quem é mais útil ao país: aquele que planta ou o que fica na cidade só comendo?: os trabalhadores rurais fluminenses e a luta por desapropriação de terras (1962-1963)”, debruça-se igualmente sobre o mundo do trabalho no campo, ao examinar a mobilização de posseiros de Magé (Rio de Janeiro). Os trabalhadores rurais, mais particularmente os canavieiros, também são estudados em “Cultura, política e direitos no canavial da ditadura militar brasileira”.

Por sua vez, em “O pobre solo do celeiro do mundo: desenvolvimento florestal e combate à fome na Amazônia”, a problemática tratada é a atuação de duas agências internacionais, a UNICEF e a FAO, na Amazônia nos anos 1950 e 1960. “As transformações socioambientais da paisagem rural a partir de um desastre ambiental (Paraná, 1963)” concentra-se num incêndio de grandes proporções ocorrido em 1963 para refletir sobre as mudanças experimentadas pela paisagem rural paranaense no período.

O artigo “Estado e mercado na reforma agrária brasileira (1988-2002)” tem como tema a política de reforma agrária no período posterior à promulgação da atual Constituição, privilegiando a interação entre Estado e mercado na elaboração dessa política. Finalmente, “Capitalismo agrário e os movimentos campesinos no Paraguai” analisa a formação e o desenvolvimento de uma economia agrária nesse país baseada na grande propriedade e voltada ao mercado externo, a partir da ditadura Stroessner.

Luciana Heymann Quillet – Professora da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV).

Marco Aurélio Vannucchi Leme de Mattos – Professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV).

Paulo Fontes – Professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV).

Os editores


HEYMANN, Luciana Quillet; MATTOS, Marco Aurélio Vannucchi Leme de; FONTES, Paulo. Editorial. Estudos Históricos. Rio de Janeiro, v.28, n.56, jul. / dez. 2015. Acessar publicação original [DR]

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Religião / Estudos Históricos / 2015

Esta edição de Estudos Históricos preenche uma lacuna. Nos 27 anos de publicação da revista, o tema Religião, interdisciplinar por excelência, nunca foi tratado. Campo de investimento intelectual de historiadores, antropólogos e sociólogos – para não citar os teólogos –, religião e religiosidade são áreas de pesquisa que se impõem em contextos nacionais marcados pela colonização, diversidade e sincretismo. No caso do Brasil, um dos caminhos investigativos mais férteis por meio dos quais é possível aceder ao debate sobre identidade e nação passa pela religião – das relações entre Igreja e Estado às distintas matrizes religiosas que conformam nossa identidade cultural, o tema tem sido explorado e revisitado a partir de diversas perspectivas.

O presente número reúne historiadores e cientistas sociais que se debruçaram sobre diferentes objetos, compondo um panorama de análises vasto e multifacetado. A ordem dos artigos revela uma lógica histórica, que vai da Colônia à devoção popular contemporânea, tema do artigo “No sertão e na capital, salve Aparecida: peregrinações em Sergipe do tempo presente”. Em termos geográficos, a maioria dos artigos aborda a realidade nacional, com exceção de duas contribuições – “‘Morta de amor por Deus’: a vida exemplar de Dona Thomázia, uma mulher letrada e devota, que morreu em Lisboa, no ano do terremoto (1755)”, que analisa a produção literária de um frei beneditino lisboeta, e “Disputando a moral pública: a Ação Católica durante o primeiro governo Perón (Tucamán, Argentina, 1946-1955)”.

O tema das missões religiosas é tratado em dois artigos, “Os apóstolos dos sertões brasileiros: uma análise sobre os métodos e os resultados das missões religiosas dos capuchinhos italianos no século XIX” e “Uma Igreja distante de Roma: circulação internacional e gerações de missionários no Maranhão”, enquanto outros dois se dedicam ao vasto campo das religiões afro-brasileiras, ainda que suas abordagens em nada se assemelhem: “A religião dos bantos: leituras sobre o calundu no Brasil Colonial” e “Macumba surrealista: observações de Benjamin Péret em terreiros cariocas nos anos 1930”.

“Cultura confessional e luta por direitos no mundo do trabalho: Belo Horizonte, 1909- 1921” adota a perspectiva de uma história social do trabalho, enquanto “Pensando o Brasil: discurso religioso e prática social segundo Zilda Arns” pode ser lido na chave das análises históricas que tomam a biografia como fio condutor por meio do qual se desvelam práticas e representações sociais. Por fim, “Da tolerância à caridade: sobre religião, laicidade e pluralismo na atualidade” propõe uma discussão conceitual à luz das reflexões do filósofo Gianni Vattimo. Longe de esgotar as possibilidades abertas pelo tema Religião, os dez artigos que ora publicamos nos parecem representativos tanto da tradição desse campo de estudos como de suas fronteiras.

Uma última palavra para apresentar aos leitores duas novidades. Esta edição traz pela primeira vez a seção Colaboração Especial, inaugurada de forma primorosa pelo artigo de José Reginaldo Santos Gonçalves, “O mal-estar no patrimônio: identidade, tempo e destruição”, tema da aula inaugural proferida no Programa de Pós-Graduação em História, Política e Bens Culturais do CPDOC. Por fim, apresentamos o novo layout da revista, viabilizado por recursos do Edital de Apoio à Publicação de Periódicos Científicos e Tecnológicos Institucionais, da Faperj. É a segunda vez, desde que foi lançada, que Estudos Históricos passa por uma renovação gráfica. Sem abrir mão da sua identidade visual, o objetivo foi tornar a leitura mais agradável e estimulante. Esperamos que apreciem as novidades!

Luciana Heymann Quillet – Professora da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV).

Marco Aurélio Vannucchi Leme de Mattos – Professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV).

Paulo Fontes – Professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV).

Os editores


HEYMANN, Luciana Quillet; MATTOS, Marco Aurélio Vannucchi Leme de; FONTES, Paulo. Editorial. Estudos Históricos. Rio de Janeiro, v.28, n.55, jan. / jun. 2015. Acessar publicação original [DR]

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História Pública / Estudos Históricos / 2014

Os debates sobre a chama da história pública têm ganhado grande visibilidade entre os historiadores brasileiros nos últimos anos. Seminários, simpósios, cursos, publicações e, inclusive, a formação de uma Rede Brasileira de História Pública demonstram o crescente interesse e a repercussão dessas discussões em nosso país.

De origem anglo-saxã, o termo história pública procura dar conta, de uma forma ampla, das relações e do diálogo entre a produção acadêmica e não acadêmica do conhecimento histórico. De um lado, os lugares de produção de saber histórico se multiplicaram, indo além dos departamentos e centros universitários. De outro, as numerosas contendas sobre a memória coletiva e o dever de memória têm frequentemente colocado a disciplina histórica no centro de debates públicos com amplas repercussões políticas e sociais. Tais fenômenos refle tem-se na vasta produção editorial, audiovisual, museológica, entre outras, que mobiliza saberes históricos, articulando demandas por esse tipo de conhecimento vindas de diversos setores da sociedade civil e do Estado. Leia Mais

História & Culturas de Classe | ArtCultura | 2009

Edward Palmer Thompson já assinalou que, com sua confortável evocação da idéia de consenso e compartilhamento, a noção de cultura, tal como freqüentemente foi e/ou é utilizada, pode nos conduzir a perder de vista as fraturas, os conflitos, enfim, as contradições que se manifestam no interior de um determinado conjunto social ou cultural. Percebê-la como algo que no move dentro de um campo de forças é, por isso mesmo, o propósito do dossiê que a ArtCultura 19 oferece aos seus leitores.

Para tanto, é necessário revolver as múltiplas camadas de sentido que, historicamente, se colaram ao conceito de cultura e, cavando mais fundo, remover as crostas que o aprisionaram a uma bitola estreita. Ao quebrar a rigidez de uma visão de corte elitista, o dossiê História & Culturas de Classe — organizado por Paulo Fontes, professor e pesquisador do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da Fundação Getúlio Vargas (CPDoc/FGV-RJ) — trabalha, à la Raymond Williams, com uma concepção distendida de cultura como modo de vida, ao qual se incorporam, como sujeitos culturais, integrantes das classes trabalhadoras. Se os trabalhadores, como acentuou Gramsci, são, igualmente, intelectuais e filósofos, à sua moda, aqui eles despontam como portadores de práticas reveladoras de culturas de classe, concebidas no plural e entrecortadas pelas relações de gênero. Trata-se, pois, numa palavra, de promover o desencapsulamento de uma dada noção de cultura. Nessa trilha, este número de ArtCultura tem o orgulho de ser aberto, na seção Tradução, por ninguém menos que E. P. Thompson, sem favor algum um dos mais importantes historiadores do planeta, referência e influência marcante nos estudos na área de Ciências Humanas a partir da segunda metade do século XX. Leia Mais