América entre revoluciones: construcción de sujetos e identidades en el ideario popular revolucionario latino-americano |  Revista chilena de historia social popular | 2021

El presente dossier pretende abrir paso a la reinterpretación de un conjunto de procesos históricos que tuvieron a las clases trabajadoras y masas populares latinoamericanas en el centro de la acción política. Adicionalmente, busca comprender la complejidad de dichos procesos abordados desde la construcción de sujetos e identidades. Lo anterior, más allá del análisis de las colectividades políticas revolucionarias y reformistas, sus proyectos políticos y su confrontación con el Estado. En líneas generales, los estudios que comprenden este dossier se enfocan en la construcción de las identidades populares desde expresiones artísticas y acciones de protesta vinculadas al compromiso de cambio social.

Desde fines de la década de 1950, la música popular fue un vehículo de expresión cultural para la revolución en América Latina. El arte ha funcionado como espejo de contextos históricos específicos y, por ello, la música ha sido una forma de manifestación cada vez más estudiada desde diversos puntos de vista. En el escenario chileno, la Nueva Canción Chilena (NCCh) ha sido una vía para comprender la construcción de la identidad cultural popular chilena ya que expone las problemáticas sociales y la búsqueda de la justicia social de una época. Leia Mais

Revoluções no Atlântico: Brasil e Portugal na década de 20 do Oitocentos | Revista Ágora | 2020

No ano do bicentenário da Revolução de 1820, organizamos junto à Revista Ágora o dossiê “Revoluções no Atlântico: Brasil e Portugal na década de 20 do Oitocentos”. O decênio de 1820 foi marcado por diversos movimentos revolucionários em Portugal e no Brasil. A Revolução do Porto inaugurou a agenda de sublevações no mundo português, configurando-se acontecimento que influenciaria nos rumos políticos nos dois lados do Atlântico.

Inspirada em princípios liberais, o movimento iniciado na cidade de Porto, em poucas semanas alcançaria Lisboa e não tardaria a ser notícia também no Brasil. Verdadeira guerra literária fora travada na imprensa no Brasil e em Portugal. Periódicos e folhetos difundiam nova pauta política, ressignificando conceitos e divulgando novo vocabulário constitucional. Leia Mais

Revoluções no Atlântico: Brasil e Portugal na década de 20 do Oitocentos | Revista Ágora | 2020

No ano do bicentenário da Revolução de 1820, organizamos junto à Revista Ágora o dossiê “Revoluções no Atlântico: Brasil e Portugal na década de 20 do Oitocentos”. O decênio de 1820 foi marcado por diversos movimentos revolucionários em Portugal e no Brasil. A Revolução do Porto inaugurou a agenda de sublevações no mundo português, configurando-se acontecimento que influenciaria nos rumos políticos nos dois lados do Atlântico.

Inspirada em princípios liberais, o movimento iniciado na cidade de Porto, em poucas semanas alcançaria Lisboa e não tardaria a ser notícia também no Brasil. Verdadeira guerra literária fora travada na imprensa no Brasil e em Portugal. Periódicos e folhetos difundiam nova pauta política, ressignificando conceitos e divulgando novo vocabulário constitucional. Leia Mais

Ideas, Visualidades Y Revoluciones | Intus-Legere Historia | 2020

El presente dossier reúne trabajos presentados en las XI Jornadas de historia del arte – ideas, visualidad y revoluciones, realizado en el Museo Histórico Nacional, en Santiago de Chile, entre el 2 y 3 de octubre de 2018, con organización y apoyo del propio Museo junto a Crea (Centro de Conservación, restauración y estudios artísticos), y el esfuerzo conjunto de las universidades Federal de São Paulo y Adolfo Ibáñez. En esta oportunidad el Encuentro propició la reflexión de un grupo de investigadores de diferentes lugares de Iberoamérica, sobre los procesos revolucionarios ocurridos desde fines del siglo XVIII, hasta las primeras décadas del XIX.

La reflexión ofrecida por estos trabajos nos lleva a volver a pensar en un período turbulento, de conjuras y rebeliones, en el que la representación visual del poder fue cuestionada y los debates por las soberanías territoriales dieron espacio al surgimiento de las naciones americanas. No obstante, la visión acá presentada no se propone solamente aproximarse a las conmemoraciones de eventos ocurridos hace poco más de dos siglos. Las representaciones del poder, o sus cuestionamientos, nos llevan de una orilla a la otra del Atlántico para actualizar las ideas que les dieron forma, desde una perspectiva que se nutre de la visión de la historia del arte, la cultura visual y la curaduría. De esta manera la reflexión histórica cobra una dimensión de actualidad, en un momento en el cual se presentan en Iberoamérica múltiples debates políticos sobre el rumbo de sus naciones, las necesidades de la celebración de los bicentenarios de sus independencias, o de los sueños truncos de revolución. Por ello la noción de representación es el eje sobre el que se proponen las miradas de los artículos del dossier, pues ese mecanismo en el que reside el poder de las imágenes, el juego de sus opacidades y transparencias es el terreno en el que puede pensarse en los procesos político/culturales cuya emergencia marcó la vida de nuestros países. No es un secreto que en los últimos años nuestro continente se ha vuelto a sacudir, entre debates políticos cuya fuerza confluye en el deseo de hacer posibles lo sueños fundacionales de las revoluciones bicentenarias, así como en la crítica hacia el nacionalismo de postín, de los desfiles, la manipulación de propaganda electoral y el festejo. Leia Mais

Intelectuais, revoluções e independências em um mundo em transição (séculos XIX-XX) / Intellèctus / 2020

Apesar da acepção da palavra intelectual ser relativamente recente na história mundial, ter surgido após meados do século XIX na Rússia, e cerca de cinquenta anos mais tarde aparecer na França com o termo intellectuelles, a existência de sujeitos que discutem ideias ou analisam criticamente a sociedade ultrapassa a época contemporânea e se estende por vários séculos.

Como afirmou Bobbio (1997), ainda que anteriormente tenham sido denominados sábios, filósofos, homens de letras, doutos ou literatos, os objetos por eles debatidos sempre existiram; por isso, a problemática dos intelectuais, e suas relações / atuações na sociedade, se trata de um tema antigo e perene. Utilizando-se ainda desse autor poderíamos defini-los de uma forma geral como “sujeitos a quem se atribui de fato ou de direito a tarefa específica de elaborar e transmitir conhecimentos, teorias, doutrinas, ideologias, concepções do mundo ou simples opiniões, que acabam por constituir as ideias ou os sistemas de ideias de uma determinada época e de uma determinada sociedade.” (BOBBIO, 1997: 110) Leia Mais

Monarquia, Império e Política Popular na Era Atlântica das Revoluções / Varia História / 2019

É sabido que em diferentes cenários de todo o mundo atlântico as classes populares se mobilizaram em defesa da monarquia durante a chamada “era das revoluções”. Sua presença foi generalizada e influente nos intensos confrontos na Europa e nas Américas, quando as bases do poder dos monarcas europeus foram contestadas por meio de guerras internas e externas. Falando coloquialmente, os monarquistas, tanto populares quanto da elite, eram os bandidos que personificavam os obstáculos sociais e ideológicos na história universal da revolução e da modernidade.

Nas últimas duas décadas, historiadores da América Latina, Europa e Estados Unidos redescobriram esse fenômeno e o reexaminaram sob as lentes da nova história política. Mais recentemente, os estudiosos começaram a criar comunidades em torno do tema do realismo popular , às vezes com base em profundas tradições historiográficas e outras vezes experimentalmente. Por profundas tradições historiográficas, refiro-me particularmente aos estudos de contra-revolução e restauração na Europa que abundam e constituem um dos pilares das histórias nacionais em lugares como a Espanha ou a França. Mais experimental na abordagem foi a conferência que co-organizei com Clément Thibaud em 2016 na Universidade de Yale sobre o tema do Realismo Popular no Mundo Atlântico Revolucionário. De fato, foi sem precedentes (que eu saiba) que estudiosos com foco na história da África, Europa e Américas se reuniram para compartilhar e debater seu trabalho, o que ilustrou a gama de opções e escolhas políticas disponíveis para setores populares no Atlântico revolucionário, como povos nativos e afrodescendentes, camponeses e artesãos. Nesse diálogo produtivo, investigamos as maneiras pelas quais conceitos como liberdade e cidadania foram centrais para o engajamento popular com as instituições monárquicas e a política durante o século XIX. [1] Os sete artigos incluídos neste dossiê evoluíram a partir de apresentações naquela conferência e ilustram as abordagens variadas, bem como os múltiplos casos, que enriquecem nossa compreensão atual do realismo popularem um quadro atlântico. O dossiê, portanto, é uma porta de entrada para o emergente campo de estudos sobre o monarquismo popular e um reflexo do potencial do tema quando explorado em uma perspectiva comparada.

Histórica e historiograficamente falando, é claro, o assunto do monarquismo não é novo. Como personagens nas histórias nacionais, e na história da revolução mais amplamente, os monarquistas das elites foram naturalmente entendidos como representantes de setores conservadores cujos interesses se alinhavam claramente com o regime sob ataque. Além disso, é inquestionável que as elites monarquistas contavam com o apoio de grupos populares, que se mobilizavam formalmente em milícias ou como guerrilheiros que agiam em prol e em nome do rei. Tanto na Europa quanto nas Américas, essa mobilização popular tem sido amplamente explicada como um produto da manipulação ou como reflexo da essência extremamente reacionária das classes populares. Em outras palavras, o realismo popular tem sido, até recentemente,Hamnett, 1978 ; Landavazo, 2001 ; Lynch, 1986 ; 2006; Restrepo, 1827 ; Tilly, 1964 ).

À medida que a história social ganhava força no século XX, os historiadores procuravam dar corpo a uma explicação desse fenômeno histórico do ponto de vista marxista, mas sempre entendendo-o como um paradoxo ( Bonilla; Spalding, 1981 ; Bonilla, 2005 ; Carrera Damas, 1972 ; Craton, 1982 ; Izard, 1979) Essa interpretação foi fundamentada na expectativa de que a ação política popular deve ser associada a seu apelo histórico à revolução. Nesse quadro estrutural, as identidades sociais populares – definidas por uma posição de marginalidade – corresponderiam e deveriam corresponder a interesses políticos revolucionários, anticoloniais ou liberais. Em alguns casos, os historiadores resolveram essa inconsistência argumentando que as alianças monarquistas expressavam uma falsa consciência, a ignorância dos setores populares ou, novamente, suas visões de mundo tradicionalistas inerentes. Ao mesmo tempo, seja a partir dos paradigmas liberais ou marxistas, os historiadores da modernidade produziram interpretações condescendentes dos monarquistas populares. Também aqui, além de ver a lealdade dos setores populares à monarquia como um problema que revelava sua irracionalidade,Domínguez, 1980 ; Hobsbawm, 1973 ; Torras, 1976 ).

Isso explica por que, na historiografia europeia, a relevância das histórias do monarquismo popular reside em sua conexão com os estudos sobre as origens do conservadorismo. Ou seja, entende-se que os monarquistas populares foram subsumidos em causas reacionárias, principalmente lideradas por elites conservadoras, apegadas a princípios retrógrados e, consequentemente, prejudiciais às causas liberais e democráticas ( Beneyto, 2001 ; Bianchi; Dupuy, 2006 ; Canal, 2005 ; Comellas , 1953 ; Herrero, 1988 ; Lousada, 1987 ; Martin, 2001 ; Menéndez y Pelayo, 1965-1967 ; Ramón Solans; Rújula López, 2017 ; Rienzo, 2004 ;Rújula López, 1998 ; Solé i Sabaté, 1993 ; Suárez Verdeguer, 1955 ; 1956 ). É também a causa da produção de análises inconsistentes da mobilização popular durante a guerra de independência hispano-americana que associavam o que eram grupos formalmente monarquistas com rebeliões anticoloniais. Isso pode ser visto, por exemplo, nas obras de René D. Arze e José L. Roca que, escrevendo no final dos anos 1980, interpretaram os grupos indígenas que defendiam a monarquia no altiplano andino como precursores da identidade nacional boliviana. Arze e Roca buscavam e viam a emancipação na política das classes dominadas e entendiam a emancipação em termos de política revolucionária ou nacionalista ( Arze, 1987 ; Roca, 1988) Essa associação sugere ainda que, quando os historiadores deram o passo de descobrir a participação popular nas guerras de independência, eles preferiram enfatizar o antagonismo de classe entre as elites e as classes mais baixas, ao mesmo tempo que ignoraram a existência de alianças verticais essenciais para o surgimento de facções monarquistas no século XIX.

Nas últimas três décadas, historiadores do mundo atlântico revisaram as histórias nacionalistas e reformularam a era revolucionária, expandindo os limites geográficos e cronológicos do paradigma palmeriano original, que se concentrava exclusivamente nas revoluções americana e francesa ( Hobsbawm, 1962 ; Klooster, 2009 ; Palmer, 1965) O campo cresceu e evoluiu em várias direções, sendo uma delas a reavaliação da participação dos setores populares nas revoluções e sua relação com a ascensão do republicanismo na Europa e nas Américas. Se a narrativa dominante durante a maior parte do século XX excluiu as classes populares das histórias da revolução, ou independência nos casos americanos, a pesquisa agora levanta questões sobre representações centradas na elite da revolução, independência e formação do Estado. Além disso, ao vincular as mudanças mais amplas resultantes dos processos revolucionários atlânticos à Revolução Haitiana, estudiosos da América Latina demonstraram especialmente que o republicanismo popular era uma opção que refletia o compromisso revolucionário dos setores populares ( Alda, 2002 ;Blanchard, 2008 ; Di Meglio, 2006 ; Guardino, 1996 ; Guarisco, 2003 ; Helg, 2004 ; Lasso, 2007 ; Soux, 2010 ; Thibaud, 2003 ; Townsend, 1998 ; Tutino, 1989 ; Walker, 1999 ).

Mas a questão do apoio popular à monarquia permaneceu inexplorada ou confinada a interpretações esquemáticas duradouras e francamente simplistas ( Earle, 2000 ; Craton, 1982 ; Van Young, 1989 , 2001 ). Nas últimas três décadas, os estudiosos desafiaram a ênfase na irracionalidade intrínseca dos monarquistas populares. Focar em interpretações inovadoras da experiência do monarquismo popular e oferecer um contraponto a esse retrato dos setores monarquistas populares na Era das Revoluções, implica ainda questionar a teleologia revolucionária ( Echeverri, 2016 ; Gutiérrez, 2007 ; Méndez, 2005 ; Saether, 2005 ;Sartorius, 2013 ).

No trabalho sobre o Atlântico Britânico e a Revolução Americana, os estudiosos recuperaram a presença leal e delinearam a interseção vibrante do império e da política na era revolucionária ( Blackstock; O’Gorman, 2014 ; Calloway, 1995 ; Chopra, 2011 ; Frey, 1991 ; Jasanoff, 2008 ; 2010 ; 2011 ; McConville, 2006 ; Nash, 2006 ; Nelson, 2014 ; Norton, 1972 ; O’Shaughnessy, 2013 ; Pybus, 2006 ; Schama, 2006) A Revolução Haitiana tornou-se o foco de muitas pesquisas, porque é um caso que une a França e sua colônia caribenha de São Domingos em uma única revolução atlântica, trazendo também para o primeiro plano questões de escravidão e raça que eram centrais para as mais amplamente definidas. dinâmica revolucionária ( Childs, 2006 ; Dubois, 2004 ; Ferrer, 2012 ; Fischer, 2004) É claro, entretanto, que a Revolução Haitiana exemplifica a impossibilidade de pensar a revolução como um processo linear. Alguns autores descobriram a importância das lealdades monarquistas e dos interesses políticos que as sustentam. Ou seja, os afrodescendentes no Caribe receberam concessões em troca de sua lealdade e, em muitos casos, identificados com estruturas sociais corporativas monárquicas que reconheciam seus interesses coletivos ( Landers, 2010 ; Ogle, 2009 ; Thornton, 1993) Da mesma forma, os estudos radicais emergentes da Espanha, França e América Latina no campo das Revoluções Ibéricas desafiam as histórias nacionalistas, enquanto o constitucionalismo passou a ocupar o primeiro plano nos estudos sobre monarquia e império, rompendo com sua definição como antagônico à revolução, liberalismo, e modernidade ( Adelman, 2010 ; Bellingeri, 2000 ; Berruezo, 1986 ; Breña, 2006 ; Chust, 1999 ; Dym, 2005 ; Echeverri, 2011 ; 2015 ; 2016 ; Guerra, 2000 ; Lorente; Portillo, 2011 ; Morelli, 1997 ; Paquette , 20132015 ; Portillo, 2006 ; Rodríguez, 1999 ; 2006 ). [2]

Esse dossiê fornece mais evidências da transformação no estudo do realismo popular na última década, por meio de sete estudos de casos que abrangem a Europa, o Atlântico britânico, o Brasil e a América espanhola. Como estudos sobre essas regiões, constituem contrapontos e acréscimos importantes a trabalhos sobre o republicanismo popular que se concentraram principalmente no Caribe. Os historiadores da área cujos trabalhos são aqui apresentados acessam o tema por meio de diferentes aspectos – ou portais – e oferecem interpretações variadas. Ainda assim, os distintos cenários, além das diferenças regionais, conceituais e temáticas, evidentemente fornecem elementos fundamentais para comparações. Em primeiro lugar, eles revelam que, embora o monarquismo popular representasse consistentemente uma opção generalizada de ação política, também era diverso e particular, vinculado a aspectos jurídicos, militares, e contextos políticos. Em segundo lugar, tomados em conjunto, os artigos sugerem que a fertilização cruzada entre a história social, cultural e política da Era das Revoluções permitiu aos historiadores da política popular reconhecer que, como uma subjetividade política, o apoio à monarquia é complexo e deve ser analisado cuidadosamente em relação a contextos históricos específicos para dar conta de sua profundidade e características conjunturais. Terceiro, os artigos apresentados aqui também questionam o entendimento de que, ao defender os regimes monárquicos, os monarquistas populares foram marginais a dinâmicas e processos mais amplos de revolução, modernização e formação do Estado na Europa, África, América do Norte e América do Sul. Em vez disso, enquadrando suas ações no contexto das profundas transformações da paisagem política atlântica,Echeverri, 2011 ; 2016 ; Kraay, 2001 ; Paquette, 2013 ; Straka, 2000 ; Schultz, 2001 ).

No primeiro estudo do dossiê que enfoca o período mais antigo, Sergio Serulnikov trata dos usos políticos da figura do monarca na mobilização política dos índios andinos antes da independência (do final do século XVIII a 1809). Para Serulnikov, as prisões conceituais e historiográficas que vinculam o monarquismo ao atraso podem ser questionadas pensando-se criticamente sobre os pressupostos por trás delas. No artigo, ele delineia os entendimentos mais comuns do monarquismo popular na teoria social para, reflexiva e diretamente, abrir uma nova maneira de abordar as relações políticas entre os índios e a coroa na América do Sul. Em vez de estudar esta questão de uma perspectiva materialista, que recorreria ao entendimento estrutural de que as posições sociais devem produzir interesses políticos específicos, sua ênfase em símbolos políticos e dinâmicas políticas mais profundas sugere que o rei era um “significante vazio”. Em vez de ver o monarquismo como um reflexo da ingenuidade dos camponeses indígenas, Serulnikov afirma que suas práticas – reconstruindo essas práticas em seu desenvolvimento contextual dentro da esfera pública – são mais significativas do que declarações formais de lealdade. Seu artigo mostra como a profunda história do engajamento dos índios com a lei (que estava ligada a questões de justiça e direitos) politizou as relações sociais no contexto colonial andino. Serulnikov afirma que suas práticas – reconstruindo essas práticas em seu desenvolvimento contextual dentro da esfera pública – são mais significativas do que declarações formais de lealdade. Seu artigo mostra como a profunda história do engajamento dos índios com a lei (que estava ligada a questões de justiça e direitos) politizou as relações sociais no contexto colonial andino. Serulnikov afirma que suas práticas – reconstruindo essas práticas em seu desenvolvimento contextual dentro da esfera pública – são mais significativas do que declarações formais de lealdade. Seu artigo mostra como a profunda história do engajamento dos índios com a lei (que estava ligada a questões de justiça e direitos) politizou as relações sociais no contexto colonial andino.

O caso fascinante do monarquismo quando os súditos populares se moviam através do Atlântico aparece no artigo de Ruma Chopra no dossiê, onde ela traça a origem da lealdade entre os quilombolas jamaicanos e suas mudanças em diferentes contextos geográficos ao longo do final do século XVIII. O estudo de Chopra analisa o Atlântico britânico e como a busca por liberdade legal estava ligada às estratégias políticas de pessoas que escaparam da escravidão na Jamaica. Os quilombolas da cidade de Trelawney que viviam na parte norte da ilha fizeram alianças com a coroa britânica, ganhando autonomia em troca de sua lealdade e defesa militar do poder colonial e de suas instituições econômicas. Chopra desenvolve esse caso bem conhecido seguindo esses quilombolas da Jamaica à Nova Escócia e depois à Serra Leoa.Jasanoff, 2008 ; 2010 ; 2011 ; Pybus, 2006) Depois que a comunidade quilombola viajou para fora da Jamaica, ela contrasta os interesses e a tomada de decisões dos quilombolas aos dos legalistas negros que defenderam a coroa naquela revolução. Como uma comunidade pré-existente dentro do império, os quilombolas usavam a lealdade ao rei como uma ferramenta política “elástica” para defender seus privilégios em diferentes cenários políticos. No entanto, essa história também envolve uma transformação na linguagem que os quilombolas usavam para reivindicar seus interesses. Quando sua posição como súditos imperiais mudou, eles continuaram a definir sua identidade em relação à sua lealdade. Não que os objetivos dos quilombolas tenham mudado em sua transição da Jamaica para a Nova Escócia e Serra Leoa. Foi a mudança de contexto que disponibilizou novos quadros políticos e institucionais, que deu um novo sentido às suas lutas por autonomia e inclusão. A ênfase analítica de Chopra no artigo está em como os quilombolas instrumentalizaram sua longa história de reconhecimento pela coroa e seu serviço a ela.

Ao longo da costa caribenha de Nova Granada estão duas regiões representativas – Santa Marta e Venezuela – onde indígenas, escravos e afrodescendentes foram decididos defensores da coroa espanhola durante as guerras de independência na América do Sul entre 1809 e 1823. Ambos são ricos casos de compreensão do realismo popular que Steinar Saether e Tomás Straka, respectivamente, tratam neste dossiê. Saether se concentra em uma cidade em Santa Marta onde a coroa recompensou uma autoridade indígena, o cacique Antonio Nuñez, por sua defesa dos territórios contestados sob controle monárquico por meio de ações militares heróicas. Saether interroga os dois lados desse noivado. Em primeiro lugar, ele explora a estrutura da criação de sistemas de recompensas, mostrando que ela estava inserida em uma tradição militar europeia mais profunda. Segundo, ele investiga a interpretação que o próprio cacique Nuñez – e seus seguidores – fizeram das condecorações. Como Serulnikov, Saether sugere ainda que não é possível tirar conclusões de um monarquismo sincero subjacente à ação política e militar entre monarquistas indígenas. Colocando as decorações em um contexto mais amplo de confronto entre as forças republicanas e monarquistas, ele chama esse sistema de recompensas de “uma guerra de símbolos”. Saether mostra até que ponto as decorações buscavam não apenas recompensar a lealdade, mas também garantir a lealdade futura e garantir a obediência. Sua interpretação da perspectiva dos índios é que, para eles, esta foi principalmente uma aliança estratégica. Além disso, ele diz que,

Embora focados em diferentes casos e fontes, Straka e Saether comentam sobre a pouca evidência disponível para obter uma noção exata do que o monarquismo significava para os índios ou afrodescendentes na América do Sul. De fato, Saether afirma que não é possível saber como Nuñez “realmente concebeu o título”. Straka enfrenta o problema metodológico de encontrar referências claras ao entendimento que os grupos monarquistas tinham de conceitos cruciais que evidentemente se engajaram, como coroa, igualdade ou liberdade. Como em Santa Marta, na Venezuela, estudo de caso de Straka, os atores populares reagiram contra a organização experimental entre as elites crioulas que rejeitavam o domínio espanhol. No entanto, a abordagem de Straka ao tema do realismo popular é diferente. Primeiro, em vez de discutir o contexto atlântico de lealdade e recompensas, ele situa seu estudo no contexto local. Ele aponta para o fenômeno massivo do monarquismo popular na Venezuela, um lugar que exemplifica o significado sustentado do apoio popular à monarquia durante as guerras de independência na América espanhola. Em segundo lugar, Straka, como Chopra, também lida com a questão fascinante de como as lealdades das classes populares mudaram com o tempo. O que Straka mostra é que uma questão importante para os historiadores do monarquismo popular no caso venezuelano é a continuidade entre o monarquismo e o liberalismo após a independência ( também trata da questão fascinante de como as lealdades das classes populares mudaram ao longo do tempo. O que Straka mostra é que uma questão importante para os historiadores do monarquismo popular no caso venezuelano é a continuidade entre o monarquismo e o liberalismo após a independência ( também trata da questão fascinante de como as lealdades das classes populares mudaram ao longo do tempo. O que Straka mostra é que uma questão importante para os historiadores do realismo popular no caso venezuelano é a continuidade entre o monarquismo e o liberalismo após a independência (Zahler, 2013 ). Outra contribuição de Straka é sua observação sobre como é preocupante ter tão pouco conhecimento do realismo popular na Venezuela, dada a falta de trabalhos sobre o assunto, apesar de sua inegável importância histórica. [3] E sua interpretação ressoa com o que Serulnikov e Saether sugerem, que os monarquistas populares tinham uma compreensão diferente da monarquia e de sua lealdade do que a institucional. Além disso, destacando a interseção entre a luta pela independência e raça – uma questão que atravessa caracteristicamente a política nas Américas – ele descobre que os objetivos por trás das rebeliões anti-republicanas na Venezuela realmente revelam uma conexão entre democracia e realismo. [4]

Simon Sarlin oferece uma estrutura analítica completa para estudar e comparar diferentes mobilizações monarquistas na Europa durante o período de restaurações monárquicas. Seu trabalho concentra-se em casos de recrutamento voluntário na França, Espanha, Portugal, Estados Papais e Nápoles entre 1815 e 1848. Seu estudo orienta nossas lentes comparativas para novos temas, metodologias e contextos geográficos. Para começar, ao nos levar ao espaço europeu, ele ilustra a existência de uma sólida tradição nos estudos do monarquismo popular, da revolução e da construção do Estado, especialmente na Espanha. Sarlin se propõe a desemaranhar os mecanismos de mobilização que eram elementos processuais ligados ao maciço apoio popular às monarquias. Para traçar os processos que caracterizam cada caso, ele estabelece quatro categorias de análise baseadas em sua perspectiva sociológica: processo de criação, modelos de referência, conexão da constituição sociológica com o compromisso e efeito na estabilidade política. Os regimes que os setores populares defenderam nesses casos são historicamente entendidos como conservadores. A questão então é como desassociar essa categoria generalizante de acordo com a multiplicidade de casos e dinâmicas. Ao contrastar seu estudo com outros que tratam de casos no Caribe e nas Américas espanholas e portuguesas, aliás, fica claro o que está em jogo quando se pensa comparativamente o realismo popular. A relação entre monarquia e sociedade – tanto a elite quanto os setores populares – não é a mesma nos contextos europeu e americano. De certa forma, a natureza dos regimes imperiais refrata a questão da lealdade com implicações distintas. No último, é claro, a revolução está ligada ao anticolonialismo, assim como o realismo. Por outro lado, como Lisly, Kraay e Straka apontam em seus artigos, as distinções raciais e de classe estruturam alianças e interesses monarquistas de maneira diferente.

A perspectiva comparativa embutida no estudo de Sarlin para o contexto europeu também está presente no artigo de Andrea Lisly, no qual ela expande o quadro analítico para o Atlântico português. Lisly reúne os casos de Portugal e do Brasil em sua obra para ilustrar os múltiplos significados do monarquismo para as classes populares naqueles dois ambientes onde, mesmo se dentro de um Atlântico português fortemente conectado, a monarquia representava coisas diferentes no final da década de 1820 e início da década de 1830. De um lado do Atlântico – o Brasil – era uma monarquia constitucional e do outro – Portugal – era uma monarquia absolutista. Ao mostrar que havia uma diferença fundamental (geralmente mal compreendida ou apagada nas fontes primárias e na historiografia) entre a defesa de Pedro I no Brasil como liberal e o realismo associado à figura de Miguel em Portugal, Lisly abraça o realismo popular em todas as suas complexidade. Como é óbvio, também do lado brasileiro a questão era ainda mais complexa na medida em que implicava a opção de defender os laços com o monarca em Portugal, Miguel, como alternativa à monarquia liberal defendida por Pedro I. Lisly enquadra a sua análise aliás, num cuidadoso paralelo com estudos anteriores do “Miguelismo”, cuja abordagem de classe enfatizava os fatores econômicos associados ao apoio popular ao rei português. Esses estudos, ela argumenta, implicavam ainda que por trás dessa participação havia processos de recrutamento forçado.

Somando-se à discussão sobre o importante elemento de múltiplas perspectivas sobre o monarquismo a partir de pontos de vista culturais contrastantes, o artigo de Hendrik Kraay analisa três episódios em que afrodescendentes manifestaram identificação monárquica no Brasil, entre 1832 e 1889. Na leitura de Kraay, os três casos ilustram como os entendimentos populares da monarquia eram radicais e não conservadores como foram, em todos os três casos, geralmente retratados. Kraay estuda as definições afro-brasileiras populares do regime imperial, e sua análise representa um importante contraponto regional aos casos estudados por Saether, Serulnikov e Chopra. Ou seja, é significativo que Kraay não encontre no Brasil as bases institucionais que explicam o realismo indígena nos Andes ou o realismo quilombola no Atlântico britânico. No entanto, as evidências sugerem que o monarquismo constituiu uma opção para os afro-brasileiros expressarem suas demandas políticas. Curiosamente, também, Kraay faz uma abordagem diferente para Serulnikov quando diz que “a compreensão popular da monarquia brasileira … vai além do pragmatismo”. Mostra, aliás, que mais do que subsumir aos interesses das elites monarquistas, no Brasil setores populares “de várias cores” se mobilizaram de forma autônoma. O estudo de Kraay acrescenta outro elemento fascinante a este dossiê: o imaginário popular sobre a monarquia que além de se expressar em rituais cívicos tinha ligações com as eleições de rainhas e reis negros nas irmandades afro-brasileiras. Essas práticas e as relações sociais que elas personificaram e recriaram também estavam ligadas ao catolicismo congolês (Kiddy, 2002 ; Thornton, 1993 ). É importante, também, que no estudo de Kraay vemos um assunto que é igualmente relevante para os outros casos apresentados por todos os autores – especialmente Sarlin – a tensão entre a mobilização autônoma dos grupos populares e o medo das elites de que eles pudessem se expandir em manifestações mais potentes. de poder popular que poderia ser incontrolável e ameaçador. Em outras palavras, o estudo de caso de Kraay enfatiza até que ponto, além de ser um objetivo implícito ou explícito dos monarquistas populares, a autonomia estava em jogo e, com o empoderamento, em muitos casos ela se tornou uma conquista.

Uma visão sintética do trabalho dos autores deste dossiê produz pelo menos quatro conclusões sobre o estado atual do debate. Em primeiro lugar, os estudos continuam a fornecer evidências irrefutáveis ​​sobre a importância da política popular, e especificamente do monarquismo popular, no mundo atlântico durante a Era das Revoluções. Mas eles mostram mais importante que não é suficiente inserir os monarquistas na narrativa da revolução ou independência; esse é apenas o primeiro passo. Na verdade, como já foi mencionado, geralmente há um espaço claro e uma representação dos monarquistas nas narrativas tradicionais que os enquadram como obstáculos anormais, pré-políticos ou reais à modernização. Abordar o “problema” do monarquismo popular requer uma abordagem que busque sua explicação como um tema histórico e, tratado desta forma, é uma lente que transforma a história da revolução e do mundo atlântico. Em segundo lugar, o ponto de partida de todos os artigos do dossiê é que a associação entre adesão à monarquia e contra-revolução – entendida como inerentemente conservadora – precisa ser questionada. Como resposta, esses estudiosos ilustram por que também é relevante reconstruir a compreensão dos monarquistas populares sobre a monarquia ao lado do estudo de seus interesses específicos. Ao mesmo tempo, eles destacam a natureza estratégica da política popular monárquica, especialmente porque ela respondeu ao conflito visível entre as elites. Em outras palavras, eles analisam o monarquismo popular em relação a oportunidades e recompensas. Terceiro, em todos os casos, os autores veem impulsos e consequências radicais – em vez de raciocínio ingênuo e retrógrado.

Em quarto e último lugar, a partir desses diferentes casos e abordagens, podemos ver que um tema tão variado é um ponto de vista particularmente criativo a partir do qual refletir não apenas sobre a especificidade da lealdade popular à monarquia, mas também sobre temas mais amplos, como política popular, revolução e contra-revolução, alianças verticais, religião, colonialismo e história atlântica. A contribuição mais rica deste dossiê é justamente colocar esses artigos lado a lado e, ao fazê-lo, ilustrar por que sob a categoria do realismo reside uma multiplicidade de fenômenos históricos. Na verdade, ao mesmo tempo que o monarquismo popular precisa ser definido para além das categorias maniqueístas, como tradicional / moderno ou liberal / conservador, ele também deve ser explorado em sua multiplicidade social. Os atores sociais que estão englobados no termopopulares são tudo menos homogêneos. As particularidades que os separam principalmente em relação às diferentes localidades, África, América e Europa, são uma dimensão dessa diversidade. O outro associado a ele – especialmente em ambientes coloniais – é a raça, que também permeia as características definidoras de interesses particulares que estão por trás do realismo popular. O dossiê está expandindo os limites do campo, explorando essas complexidades e exibindo a análise do monarquismo em várias camadas: conceitual, geográfica, social e política. Uma mudança de perspectiva que é bem-vinda e que certamente produzirá muitos estudos e percepções mais valiosos.

Notas

  1. A conferência ocorreu de 28 a 29 de outubro de 2016 na Universidade de Yale, financiada pela STARACO, Université de Nantes, Fundo Kempf do Centro MacMillan de Yale e Departamento de História de Yale. Desejo reiterar a atualidade deste dossiê como reflexo da situação de um campo em franca expansão. Prova desse dinamismo é outra conferência recente da qual participei em outubro deste ano (2018) na Universidade del País Vasco em Vitória (Espanha). Esta experiência merece um comentário porque me revelou a existência de uma comunidade profunda e coesa de estudiosos dedicados ao estudo do realismo popular no contexto europeu. As apresentações ilustraram a importância que a história do monarquismo teve e ainda tem para as tradições historiográficas nacionais da França, Espanha e Portugal. Essas histórias são baseadas em experiências que começaram com a Revolução Francesa, se expandiram para a Península Ibérica em 1808 e ganharam novos significados durante a ascensão contenciosa do liberalismo nas décadas de 1830 e 1840. Um tema indubitavelmente significativo do ponto de vista europeu pode ser transformado produtivamente e desvinculado do quadro nacionalista, uma vez que é colocado em conversação comparativa com as histórias do monarquismo popular nas Américas, como vemos neste dossiê.
  2. O capítulo de Andrea Lisly neste dossiê ilustra essa compreensão complexa das monarquias atlânticas e do liberalismo.
  3. Uma exceção é CARRERA DAMAS, 1972.
  4. Straka não se refere à história do liberalismo no império espanhol e na Venezuela, nem durante a crise monárquica (a constituição de Cádiz) nem durante o Triênio Liberal(1820-1823), mas ele olha para o período de formação republicana e pergunta por quê os setores populares monarquistas durante a guerra da independência se voltaram para o liberalismo como uma ideologia que representava seus interesses.

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Revoluções e Revoltas no século XX / Manduarisawa / 2018

O dossiê “Revoluções e Revoltas no século XX” traz artigos que analisam momentos importantes da História contemporânea. A Revolução Russa que completou seu centenário em 2017, marcou a trajetória dos trabalhadores do mundo todo, tendo um grande significado para o século XX. É imprescindível num momento em que o mundo novamente passa por uma grande transformação social, política e cultural, convulsionada pela globalização, migrações e novas relações de trabalho, tenhamos abordagens que nos possibilitem revisitarmos o passado onde as lutas sociais foram imprescindíveis para organizar, promover e fortalecer os trabalhadores, seus movimentos, suas reivindicações.

Os artigos presentes no dossiê desse número da Revista Madwarisawa, foram apresentados durante a X Semana de História, da Universidade Federal do Amazonas em 2017, que teve como tema “Os 100 anos da Revolução Russa e o ensino de História”.

O artigo intitulado “Aliancistas e integralistas: disputas políticas e ideológicas no Amazonas”, de Davi Monteiro Abreu, aborda através da historiografia os impactos da Ação Integralista Brasileira (AIB) e a Aliança Nacional Libertadora (ANL) no Brasil e especialmente no estado do Amazonas. Dois movimentos que tiveram impacto no Brasil nos anos 30 e que acabou por influenciar as políticas regionais de outros estados brasileiros, inclusive o Amazonas.

Já no artigo Instituições de ensino com inspiração anarquista no início do século XX, Patrícia Cristina dos Santos apresenta o papel que instituições de ensino anarquistas tiveram no processo educativo no Brasil. Um tema bastante instigante e importante sobre a educação brasileira e sua expansão e a influência de determinados movimentos políticos no final do século XIX e início do XX.

Os trabalhos aqui apresentados trazem temas diversos, mas possuem um único eixo que é a importância da agência dos trabalhadores como protagonistas históricos de eventos de grande impacto social no século XX. Portanto, são trabalhos resultantes de pesquisas monográficas, PIBIC’S ou artigos para disciplinas que refletem sobre as inquietações de seus autores (as), permitindo um diálogo rico sobre sujeitos, protagonismo, política e revolução.

Espero que seja uma ótima leitura para todos (as)!!!

Professora Doutora Kátia Cilene Couto e Equipe Editorial.


COUTO, Kátia Cilene. Revoluções e revoltas no século XX. Manduarisawa, Manaus, v.2, n.2, 2018. Acessar publicação original [DR].

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Centenário 1917: Grande Guerra, greves e revoluções / Revista Brasileira de História / 2017

Neste ano do centenário das grandes greves e revoluções ocorridas no contexto da Primeira Guerra Mundial e que, com ela, transformaram a face do mundo a tal ponto de inaugurarem o que alguns historiadores consideram um novo período histórico – o breve século XX, na expressão de Hobsbawm -, a Revista Brasileira de História não poderia deixar de apresentar ao público um conjunto de análises profundas e inovadoras sobre esses importantes eventos.

À data do centenário da Primeira Guerra Mundial, jay Winter, responsável por coordenar a importante Cambridge History of the First World War (Winter, 2014a), apresenta-nos quatro gerações de historiadores que se dedicaram e se dedicam ao estudo da Primeira Guerra Mundial (Winter, 2014b). Em 2004, o mesmo autor, em colaboração com Antoine Prost – autor de referência no estudo da guerra em França -, publicou Penser la Grande Guerre. Un essai d’historiographie.[1] Na obra declararam a existência de três gerações: “a primeira configuração explica a história pelas decisões dos atores; a segunda pelo jogo das forças sociais; a última faz da cultura o motor da história e encontra nela as suas explicações. As representações determinam os atos” (Winter; Prost, 2004, p.47-48).[2] Trata-se de um conjunto de movimentos que se seguem, coexistem e se entrecruzam. Um processo sempre em devir a que os contextos de produção de conhecimento não são inalienáveis. Atualmente, as “vanguardas” assumem um cunho transnacional, isto é, o foco é global na forma como atravessa as fronteiras nacionais, analisando experiências que, não obstante serem condicionadas por elas, se tornam globais (Winter, 2014b). Vejamos como Prost e Winter apresentam essas gerações historiográficas. A geração da Grande Guerra, contemporânea ao conflito e às suas consequências mais imediatas, foca sua atenção na ação do Estado. Numa análise de cima para baixo, procura apurar responsabilidades pela eclosão do conflito, entender as condições da sua origem e possíveis lições a serem aprendidas no sentido de evitar que se repita. Entre os anos 1960 e 1970, mudanças mais amplas da prática histórica irão influir na forma de entender a guerra, seja pela integração dos protagonistas na narrativa, seja pela adoção de novas perspectivas. A afirmação do paradigma marxista permite uma valorização política dos movimentos sociais e do seu lugar no fenômeno da guerra. Muda, definitivamente, a compreensão da natureza e a dimensão do conflito, entendido como consequência do imperialismo. Emerge, então, um segundo eixo de compreensão dedicado a uma história do social (Winter, 2009, p.2-4). Nesse ambiente instala-se, entre os anos 1970 e 1980, aquilo que Winter e Prost denominaram de Vietnam generation (geração Vietnã). Uma terceira geração que, profundamente afetada pelas consequências da Guerra do Vietnã, e de forma mais ampla pela Guerra Fria, não mais considera a just war como algo plausível, apresentando a Primeira Guerra Mundial como desastrosa para vencedores e vencidos (Winter, 2014a).

Os trabalhos que neste Dossiê se debruçam sobre a Primeira Guerra Mundial, mais especificamente sobre seus impactos na retaguarda e para além do conflito, integram fórmulas de compreensão da guerra propostas nos anos 1980 no âmbito de uma história cultural da guerra. Trata-se de olhar para “um conjunto de práticas, de representações, de atitudes, de criações dos anos de 1914-1918. E também dos anos seguintes, tanto é verdade que este tipo de história [cultural] dá um largo espaço à recordação e à comemoração do pós-guerra”.[3] Assim, uma série de temas em torno das representações da experiência no e além do tempo e espaço da guerra passam a corporizar essa guinada cultural.

A Grande Guerra impactou fortemente as vidas de todas as classes e grupos sociais do mundo de então. O segundo tema do Dossiê buscou contemplar essas relações. As greves e revoltas ocorridas nos anos finais da Primeira Guerra Mundial e nos anos iniciais do pós-guerra, especialmente no ano de 1917, configuraram um ciclo de agitação social global, como o define a historiadora portuguesa joana dias Pereira (2014). Esses são, portanto, eventos e processos históricos particularmente importantes para serem analisados na perspectiva do que o historiador holandês Marcel Van der Linden chamou de História Global do Trabalho, inserindo as lutas de cada país em contextos geográficos mais amplos, construindo uma história transnacional dos movimentos sociais trabalhistas, com comparações entre os países e análises das conexões entre eles (Van der Linden, 2013).

As condições de trabalho, a insuficiência dos salários e a repressão foram fatores que estimularam os conflitos e protestos daqueles anos, criando um clima de tensão permanente, às vezes explosivo, como os que ocorreram em São Paulo, Nova York, Turim, São Petersburgo, Sydney e tantas outras cidades. As experiências e as elaborações feitas a partir das greves daquele período foram tão marcantes que configuram para a historiografia o início de um novo ciclo de lutas trabalhistas e até mesmo de formação de uma nova classe operária (Procacci, 2013). A economia de guerra contribuiu para intensificar a solidariedade entre os trabalhadores ao evidenciar as contradições do capitalismo e da economia de mercado.

O centro do debate historiográfico sobre as greves de 1917 no Brasil, assim como em outros países, acabou sendo o grau de espontaneidade dos movimentos, polêmica que implicava a explicação das relações existentes entre a multidão de grevistas e os militantes anarquistas, socialistas e sindicalistas que participaram como lideranças dos movimentos. Hoje podemos falar de certo consenso em relação à ideia de que esses movimentos foram caracterizados por impulsos diversos, tanto espontâneos quanto organizados, que coexistiam e que constituíram o pano de fundo dessas agitações, cuja característica mais marcante foi a passagem da greve à revolta (Biondi, 2011). A tendência atual da historiografia sobre esses movimentos é a de analisar as diferentes redes formais e informais na mobilização dos trabalhadores e as mediações entre diferentes repertórios de ação coletiva, destacando, por exemplo, a relevância do papel das mulheres.

O terceiro tema central do Dossiê está centrado na história das revoluções russas de 1917, contada e recontada inúmeras vezes e sob as mais diversas perspectivas, mas sempre aberta a novas investigações. Em termos gerais, o processo revolucionário na Rússia de 1917 foi invariavelmente conectado à Primeira Guerra Mundial (1914-1918), da mesma forma que o “Ensaio Geral” ocorrido 12 anos antes no Império dos Czares foi associado à Guerra Russo-Japonesa (1904-1905). As revoluções, assim como a Guerra Civil e a formação da União Soviética, despertaram paixões políticas profundas e alimentaram debates teóricos acalorados, tanto no movimento operário dos mais diversos matizes, como nas instituições universitárias. Não foi sem razão que tantos intelectuais se engajaram na produção de suas versões sobre os acontecimentos de 1917 na Rússia. Ao longo de seu centenário, esses eventos serviram de exemplo e inspiração para incontáveis partidos e movimentos políticos ao redor do mundo. Não cabe fazer aqui uma longa e minuciosa exposição sobre tudo quanto já se escreveu sobre o assunto ao longo desses cem anos. Também não faremos referências às “histórias oficiais soviéticas” ou aos escritos dos “emigrados”. Mas é interessante lembrar algumas obras e momentos marcantes a respeito do tema e sua recepção no Brasil. Os primeiros relatos foram produzidos por intelectuais diretamente envolvidos nos acontecimentos, o que não chega a ser uma surpresa.

Nesse sentido, o primeiro título a ser mencionado é Ten days that shook the world, do jornalista estadunidense john Reed, escrito em perspectiva engajada no calor dos acontecimentos e publicado nos Estados Unidos em 1919, 2 anos depois da queda do czarismo e da ascensão dos bolcheviques. Trata-se, como dito pelo próprio autor, de uma crônica do que ele observou e viveu. Reed retornou ao país dos sovietes ainda em 1919, vinculado à Internacional Comunista, e faleceu em 1920, vítima de tifo. No Brasil, Dez dias que abalaram o mundo foi publicado com uma defasagem de mais de quatro décadas pelas editoras Fulgor (Rio de Janeiro, 1963), Record (Rio de Janeiro, 1967) e Global (São Paulo, 1978), entre outras (Reed, 2010).

Victor Serge foi outro “estrangeiro” que produziu uma memória sobre os acontecimentos que vivenciou no país dos sovietes. Serge era um jornalista anarquista de origem francesa, filho de exilados russos. Chegou à Rússia em fevereiro de 1919, passando a trabalhar para a Internacional Comunista, da mesma forma que john Reed. Seu L’an 1 de la révolution russe foi escrito na Rússia entre 1925 e 1928, quando já sofria as perseguições do stalinismo, e foi publicado na França em 1930. Serge integrou, por um tempo, as fileiras da Oposição de Esquerda, liderada por Trotsky, mas também rompeu com ela, morrendo isolado no México em 1947. A publicação de O ano I da Revolução Russa ocorreu no Brasil apenas em 1993, pela Editora Ensaio, e em 2007, pela Boitempo (Serge, 2007).

O terceiro testemunho feito por um partícipe dos acontecimentos de 1917 foi dado por Leon Trotsky, The History of the Russian Revolution, escrito em 1930, traduzido para o inglês por Max Eastman e publicado em 1932 pela The University of Michigan Press em três volumes. Como se sabe, o autor teve papel protagonista não apenas na chamada Revolução de Outubro, como também no comando do Exército Vermelho, durante a Guerra Civil, e na construção do Estado Soviético. Portanto, a escolha dos “fatos” e a forma de narrá-los também foram fortemente condicionadas pelo papel que o autor-ator desempenhou em 1917 e depois, apesar das declarações de que sua obra primava pela “objetividade histórica”, sendo baseada em “documentos rigorosamente controlados” e não em “recordações pessoais”. A primeira edição brasileira foi feita pela Saga (Rio de Janeiro, 1967), ao passo que a Paz e Terra fez a segunda e a terceira (Rio de Janeiro, 1977 e 1978-1980).[4]

O bloco dos escritos legados pelos intelectuais vinculados ao movimento revolucionário pode ser fechado com uma referência à obra de Volin ou Voline, codinome de Vsevolod Mikhailovich Eichenbaum. de acordo com o pequeno esboço biográfico escrito por Rudolf Rocker em 1953, Volin era filho de médicos russos, fluente em francês e alemão tanto quanto em russo. Enviado a São Petersburgo para estudar direito, engajou-se no movimento operário desde a virada do século XIX para o XX, vinculando-se ao Partido Socialista Revolucionário. Foi preso por envolvimento na Revolução de 1905 e sentenciado ao exílio em 1907, escapando para a França, onde rompeu com os SRs em 1911 e se ligou ao anarquismo. Suas atividades antibeligerantes o indispuseram com o governo francês, forçando-o a uma fuga para os Estados Unidos, onde participou das atividades da União dos Trabalhadores Russos nos EUA e Canadá, uma organização inspirada na CGT francesa. Em 1917, quando a Revolução teve início na Rússia, ele voltou a sua terra natal, tomando parte ativa nas atividades dos libertários daquele país. Em 1919, quando começaram os conflitos entre libertários e bolcheviques, Volin foi preso e deportado em 1921, estabelecendo-se na Alemanha por 2 anos e, em seguida, indo para a França, onde morreu de tuberculose em 1945. Sua obra foi publicada postumamente em francês sob o título La Révolution inconnue, em 1947 e 1969, em três volumes. Edições em inglês foram publicadas em 1954 e 1955 sob o título de The unknown revolution 1917-1921. No Brasil, até onde se sabe, publicou-se apenas o primeiro volume de A Revolução Desconhecida, em 1980 (Volin, 1980).

O ano de 1950 foi um divisor de águas na historiografia sobre o tema, já que foi então que se produziu a primeira grande obra escrita por um historiador de ofício. Trata-se de The Bolshevik Revolution, 1917-1923, de autoria do britânico Edward Hallett Carr. Ela foi publicada na Inglaterra em três grandes volumes pela editora Macmillan em 1950, 1951 e 1952, respectivamente. E. H. Carr destacou-se pela capacidade analítica e pela vasta pesquisa que realizou para escrever sua obra. A edição inglesa foi traduzida para o português e publicada pela Editora Afrontamento, do Porto, com o título A Revolução Bolchevique. Os três volumes foram dados ao público em 1977, 1979 e 1984. A História da Rússia Soviética de Carr se completava com outros volumes dedicados ao “Interregno 1923-1924”, de 1954, “Socialismo num só país, 19241926”, publicado em três volumes em 1958, 1959 e 1964, e a última parte, “As origens duma economia planificada, 1926-1929”, cujo primeiro volume foi publicado em 1969 em coautoria com R. W. Davies.[5]

Ainda nas décadas de 1960 e 1970, outros historiadores publicaram obras específicas sobre as revoluções de 1917, a exemplo da síntese feita por Marc Ferro em 1967 (Ferro, 1967) ou da pesquisa de William G. Rosenberg, de 1974, sobre os liberais aglutinados no Partido Constitucional democrático durante o processo revolucionário (Rosenberg, 1974).

Contudo, foi na década de 1980 que surgiram os trabalhos mais inovadores no sentido de deslocarem o foco dos grandes atos e atores (individuais e institucionais) e centrarem atenção no envolvimento direto dos trabalhadores nas revoluções russas de 1917. Essas obras superaram as narrativas tradicionais, mais preocupadas em destacar o papel das grandes lideranças dos partidos bolchevique, menchevique e socialista revolucionário, e investiram na análise detida do protagonismo operário na derrubada da autocracia e na ascensão dos revolucionários em fevereiro e outubro de 1917. A partir do uso intensivo de uma quantidade e variedade maiores de fontes e sob a influência da história social, essas obras deram grande contribuição à história da classe operária, suas condições de trabalho e de vida, organizações, greves e interfaces com a tomada do poder em 1917. Nesse sentido, podemos citar as contribuições de diane P. Koenker, Moskow Workers and the 1917 Revolution, de 1981 (Koenker, 1981); Diane P. Koenker e William G. Rosenberg, Strikes and Revolution in Russia, 1917, de 1989 (Koenker; Rosenberg, 1989), e de S. A. Smith, Red Petrograd: revolution in the factories, 1917-1918, de 1983 (Smith, 1983).

A partir da década de 1990 houve uma ampliação dos temas estudados para além das revoluções de 1917 stricto sensu. de acordo com Smith, isso foi possível graças à abertura dos arquivos da antiga União Soviética, o que possibilitou o estudo de aspectos e períodos pouco conhecidos até então, como a era stalinista. Em artigo recente, o autor passou em revista as pesquisas preocupadas em aprofundar o conhecimento sobre as conexões entre a Primeira Guerra Mundial e as Revoluções Russas de 1917, o papel dos boatos na erosão da autoridade sagrada da família real, o conteúdo emocional e moral da linguagem popular, o recrutamento e as experiências de soldados e oficiais russos como prisioneiros na Alemanha e durante a Guerra Civil, as relações entre nacionalidades e império, variações do processo revolucionário nas províncias e nas pequenas cidades e o comportamento dos camponeses e da nobreza em face da revolução, entre outros.[6] O próprio Smith investiu em um estudo comparativo entre as revoluções russas e chinesa, com particular atenção para os camponeses de ambos os países que migraram do campo para Petrogrado e Xangai (Smith, 2008). já Silvio Pons, autor de um dos artigos do presente Dossiê, publicou, em 2014, um amplo painel sobre as relações entre a União Soviética e os partidos comunistas ao redor do mundo ao longo do século XX, até o colapso de 1991 (Pons, 2014).

Em diálogo com essa historiografia, os textos aqui reunidos tratam de modo complementar de diferentes aspectos do contexto da Grande Guerra e dos movimentos sociais do período. Os textos “Música e guerra: impactos da Primeira Guerra Mundial no cenário musical carioca”, de Luciana Fagundes, e “Uma facada pelas costas: paranoia e Teoria da Conspiração entre conservadores no refluxo das Greves de 1917 na Alemanha”, de Vinicius Liebel, vão ao encontro da compreensão da experiência do conflito como Guerra Total[7] na forma como imaginários, sua transmissão e apreensão, são mobilizados além da frente de batalha e do tempo da guerra. Luciana Fagundes procura mostrar como a guerra se lutou para além das trincheiras pela mobilização político-diplomática de ideias numa propaganda que mediaria fórmulas e embates culturais do cenário musical do Rio de Janeiro. Vinicius Liebel ensaia mostrar de que forma a guerra e seus efeitos imediatos foram capitalizados nas lutas ideológicas do entre guerras instalando uma paranoia a que não se pode alienar a Segunda Guerra Mundial.

O artigo de Glaucia Fraccaro, “Mulheres, sindicato e organização política nas greves de 1917 em São Paulo”, analisa uma dimensão ainda pouco explorada no estudo das greves no Brasil, isto é, a participação das mulheres nas ligas operárias de bairro e nos sindicatos. Ela procura localizar as trabalhadoras examinando os pontos de pauta que interessavam diretamente as mulheres por ocasião das greves deflagradas em São Paulo no ano de 1917. Sua pesquisa dá relevo às dificuldades enfrentadas pelas operárias para encontrar colocação no mercado de trabalho e assegurar igualdade salarial em relação aos trabalhadores do sexo masculino que exerciam as mesmas atividades.

O artigo de Silvio Pons, “Antonio Gramsci e a Revolução russa: uma reconsideração (1917-1935)”, apresenta-nos uma análise política aprofundada e inovadora do pensamento do intelectual italiano. Na análise de seus escritos sobre a Revolução russa e a construção de uma nova estatalidade, Pons nos mostra o processo de formação das principais categorias do pensamento político de Gramsci e sua originalidade no panorama do comunismo de sua época. Pons nos mostra também como, longe das visões deterministas, Gramsci inscreve as próprias considerações no campo das possibilidades históricas.

Notas

  1. Esta análise tem por orientação fundamental o trabalho de WINTER & PROST, 2004.
  2. Citado por CORREIA, 2014.
  3. Citado por LEMOINE, 2006, p.136.
  4.  TROTSKY, 1978-1980. Observe-se que em 1909 Trotsky já havia escrito sobre outra revolução russa, a de 1905. A obra foi originalmente publicada na Alemanha, em 1909, depois na Rússia, em 1922. Para a edição brasileira, cf. TROTSKY, 1975 e 1987.
  5. CARR, 1977-1984. Não deve ser simples coincidência que essa edição tenha sido publicada apenas 3 anos depois da queda da ditadura do Estado Novo em Portugal (1933-1974).
  6. Para um balanço abrangente sobre a historiografia a respeito do tema a partir dos anos 1990, cf. SMITH, 2015.
  7. Aproveitamos o termo de CHICKERING & FORSTER, 2008. Para compreensão da ampla controvérsia que envolve seu uso, ver SEGESSER, 2014.

Referências

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Os organizadores do Dossiê desejam a todos uma boa leitura!

Aldrin Castellucci – Universidade do Estado da Bahia (Uneb). Alagoinhas, BA, Brasil. E-mail: [email protected] 

Edilene Toledo – Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Guarulhos, SP, Brasil. E-mail: [email protected] 

Silvia Adriana Barbosa Correia – Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: [email protected]


CASTELLUCCI, Aldrin; TOLEDO, Edilene; CORREIA, Silvia Adriana Barbosa. Apresentação. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.37, n.76, set / dez, 2017. Acessar publicação original [DR]

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Revoluções e movimento operário no século XX | Escrita da História | 2017

O ano de 2017 apresenta importantes efemérides para a compreensão do século XX no que se refere ao protagonismo dos trabalhadores, acentuando a necessidade da História como ciência fundamental para a análise do desenvolvimento objetivo dos fatos.

Neste sentido, a miríade de congressos, colóquios e cursos promovidos intensamente no âmbito da academia e de livros e revistas que se propuseram a elucidar os meandros dos acontecimentos de 1917, contribuiu não para uma simples e rasa comemoração centenária, mas para uma árdua discussão historiográfica. É nesta engrenagem que se insere a Revista Escrita da História com o dossiê Revoluções e movimento operário no século XX, destacando em seu número oito o centenário da Revolução Russa de 1917, da Revolução Mexicana (considerando a enorme polêmica em torno de sua data, 1910, 1917 ou ainda o seu período tardio, durante a década de 1930) e da Greve Geral de 1917 no Brasil. Leia Mais

Revoluções e Revoltas / Estudos Históricos / 2017

As celebrações do centenário da Revolução Russa inspiram Estudos Históricos a lançar este número intitulado Revoluções e revoltas. O assalto ao céu, as esperanças utópicas, as desilusões revolucionárias, bem como as múltiplas reações globais à tomada do poder pelos bolcheviques marcaram fundamentalmente a história do século XX e redefiniram o próprio conceito de revolução e o significado das revoltas sociais. O número inspira-se na Revolução Russa, mas não se resume a ela ou à sua influência. As análises percorrem um longo caminho de estudos sobre rebeliões, revoltas e processos revolucionários em diferentes períodos e lugares, fornecendo um rico e diversificado mosaico de pesquisas sobre essas temáticas.

O número inicia-se com o artigo “Modelos de rebelião rural e as revoltas rurais do Império Romano Tardio”, no qual Uiran Gebara da Silva testa a validade de modelos explicativos elaborados pelas Ciências Sociais para a compreensão de revoltas ocorridas na Gália e na África romanas. No segundo artigo, “As letras de uma Revolução: a implantação da República em Portugal a 5 de outubro de 1910”, Ana Paula Pires estuda o processo que levou à derrubada da monarquia e sua substituição pelo regime republicano naquele país. Em seguida, Denise Rollemberg, em “Revoluções de direita na Europa do entre-guerras: o fascismo e o nazismo”, debruça-se sobre a Alemanha nazista e a Itália fascista para refletir sobre a aplicabilidade do conceito “revolução” para regimes e movimentos liderados pelas direitas.

Os dois artigos subsequentes concentram-se na história do Brasil. José Manuel Flores, em “Sob o credo vermelho: índios, comunistas e revolta no sul de Mato Grosso em meados do século XX”, articula a insurgência dos índios Kaiowá contra a autoridade do Serviço de Proteção aos Índios (SPI) e a atuação do Partido Comunista do Brasil (PCB). E Rodrigo Nabuco Araujo, em “A voz da Argélia. A propaganda revolucionária da Frente de Libertação Nacional argelina no Brasil. Independência nacional e revolução socialista (1954-1962)”, examina a recepção da guerra de independência argelina pela intelectualidade brasileira de esquerda nos anos 1950 e 1960.

Já Berthold Unfried e Claudia Martínez, em “El internacionalismo, la solidaridad y el interés mutuo. Encuentros entre cubanos, africanos y alemanes de la RDA”, desenvolvem um estudo comparativo entre as ações de solidariedade de Cuba e da Alemanha Oriental em relação aos movimentos e regimes socialistas e nacionalistas em países recém-independentes na África. Em “A new revolutionary practice: operaisti and the ‘refusal of work’ in 1970s Italy”, Nicola Pizzolato analisa a práxis e a elaboração teórica dos grupos “obreiristas” no contexto de radicalização política da Itália dos anos 1970. Em particular, é analisado o conceito de “recusa do trabalho” e seu impacto nas intensas lutas e mobilizações operárias do período.

Na seção Ensaio bibliográfico, Francisco Palomanes Martinho recenseia a literatura recente sobre a transição portuguesa para a democracia, privilegiando os temas do papel do marcelismo e do caráter da revolução que derrubou o salazarismo em 1974.

Finalmente, a seção Colaborações especiais conta com os artigos “Karl Marx e a Revolução Russa” e “Um ano extraordinário: greves, revoltas e circulação de ideias no Brasil em 1917”. No primeiro, Angelo Segrillo acompanha a reflexão de Marx acerca das possibilidades de eclosão de uma revolução comunista na Rússia. No segundo, Edilene Toledo trata dos movimentos contestatórios que tiveram lugar em várias partes do país no ano de 1917 e destaca a repercussão da Revolução Russa sobre as organizações de trabalhadores.

Marco Aurélio Vannucchi Leme de Mattos – Professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV).

Paulo Fontes – Professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV).

Os editores.


MATTOS, Marco Aurélio Vannucchi Leme de; FONTES, Paulo. Editorial. Estudos Históricos. Rio de Janeiro, v.30, n.61, maio / ago. 2017. Acessar publicação original [DR]

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Revoltas e Revoluções no Século XX | Temporalidades | 2017

“– Senhor, o povo tomou a Bastilha.

– É uma revolta? – Não, Senhor, é uma revolução.”

O diálogo entre o Duque de Liancourt e Luís XVI, na manhã do dia 15 de julho de 1789, nos remete diretamente às questões do presente dossiê: Revolta e Revolução. Ao longo dos últimos dois séculos, ambas foram constantes. Os séculos XIX e XX podem ser descritos como os séculos das revoltas e revoluções.

A ideia da revolta sofreu poucas modificações ao longo deste período. Grosso modo, pode ser descrita como ação de contestação de um estado de coisas ou autoridade, uma insurreição, um levante. Suas marcas seriam a contestação que, mesmo quando vitoriosa, não objetiva organizar uma nova ordem social ou sistema político pelo recurso da violência. Neste sentido, marcaria mais um descontentamento, uma recusa de uma situação dada e menos uma proposta de transformação ou de futuro. O que não nos autoriza a considerá-las como irracionais ou como não informadas por uma lógica de ação. Em “A economia moral da multidão”, Thompson demonstra a existência de noções legitimadoras nos motins de subsistência na Inglaterra do século XVIII.[1] A suposição e o resgate das convicções e concepções que informavam as revoltas também se fazem presentes nos estudos de Rudé e Hobsbawm [2] e são constitutivos da chamada História social.[3] Leia Mais

Revoluções, Revoltas, Resistências / Projeto História / 2017

Cem anos após o acontecimento mais marcante na história social do trabalho, a Revolução Russa, a Projeto História assume o compromisso de levar ao leitor um volume inteiramente dedicado à temática Revoluções, revoltas e resistências. Este é, acima de tudo, um compromisso com a totalidade objetiva da história neste momento decisivo das lutas sociais diante da mais aviltante ofensiva do capital contra o trabalho. Revoluções, revoltas e resistências alude à temática do trabalho e ao seu filósofo mais substantivo, Marx, nas vésperas de se completar duzentos anos de seu nascimento. Vale notar todas as séries de adulterações do pensamento marxiano que desde a época contemporânea ao próprio filósofo já ocorriam. Marx era e continua a ser objeto de um conjunto de interpretações e leituras sumariamente equivocadas, cujo âmbito de gradações tem a envergadura do mais baixo reducionismo stalinista ao mais complexo debate gnosiológico, sem deixar de passar pela detração consciente originada na apologética do capital. Desfigurações desta monta são notadas especialmente nos momentos de crise estrutural do capital, transformando o filósofo do trabalho num monstro quasimodesco, uma foz delta na qual todos os ódios deságuam.

István Mészáros, o mais importante filósofo marxista desde György Lukács, teve protagonismo na análise da ordem sociometabólica do capital, nas questões da ideologia e, especialmente, na definição da particularidade do mundo pós-capitalista que se ergueu na União Soviética e que, agora, urge à problemática da emancipação a remoção deste pesado entulho. Mészáros morreu no outubro em que se completou o centenário da Revolução Russa e deixou uma obra inacabada, o que desnuda o seu vigor: aos 86 anos, Mészáros escrevia Para além do Leviatã, que, segundo ele próprio, tratava-se do seu mais ambicioso projeto intelectual, uma monumental crítica do estado que seria composta em três partes: o desafio histórico; a dura realidade; e a alternativa necessária. Por seus materiais preparatórios, sabemos que o desafio histórico de superar o capital é uma montanha do tamanho do Everest, que a dura realidade é tentativa de elaborar uma alternativa sociometabólica viável cuja tônica é a criação de um modo de produção inteiramente novo, com instrumental produtivo igualmente inédito e superior ao do capital, evitando, deste modo, sua recalcitrância e transcendendo radicalmente em sua essência a hierárquica divisão social do trabalho1.

Um dos méritos de Mészáros é apresentar a alternativa sociometabólica viável não como um postulado ético abstrato ou uma utopia revolucionária idílica, mas como uma possibilidade concreta. Muita vez reduzido a sonho bucólico ou comunismo primitivo, o desenvolvimento técnico-produtivo potencializa o próximo salto da humanidade em seus complexos organizativos. Esta é a verve que anima o artigo inicial do dossiê deste volume da Projeto História, composto pelo pesquisador Claudinei Cássio de Rezende. Neste artigo, intitulado A regência do capital sem capitalismo nas sociedades pós-capitalistas, o debate é em torno de István Mészáros e sobre o ineditismo da experiência socialista, verificado na análise do conjunto das sociedades pós-capitalistas, e apresentando a teorização de José Chasin sobre a barbárie do socialismo de acumulação. Luiz Antonio Dias, por sua vez, traz Notícias do outubro vermelho, de co-autoria de Rafael Lopes de Sousa, apresentando-nos os limites da imprensa brasileira – ainda muito dependente de agências internacionais – a partir da cobertura do Jornal Estado de S. Paulo logo após a sucessão revolucionária de 1917. Nesta ponte entre a revolução internacional e a questão nacional temos a análise de Yuri Martins Fontes sobre A Revolução Russa e a revolução latino-americana, tratando com especial atenção da recepção teórica no nosso continente da ideia de revolução a partir dos anos 1920. Recomposição importante que acentua a necessidade de se entender as estratégias revolucionárias dos processos de 1905 e de 1917, matéria tratada por Alessandro de Moura em O movimento operário russo e suas revoluções: as estratégias de 1905 e 1917. Marly Vianna, autora que é referência nacional sobre a Insurreição de 19352, trata da Importância da revolução socialista de outubro para o PCB. José Arbex Jr., autor premiado com um Jabuti3, junto a Danilo Nakamura escrevem sobre Os camponeses russos sob o olhar da intelligentsia revolucionária dos séculos XIX e XX. Neste artigo, os autores traçam o itinerário da organização populista (narodniki). O último artigo do dossiê trata das Cidades e tensões: movimentos sociais urbanos em São Paulo e a retomada dos territórios de luta em tempos de mundialização do capital, de Fabiana Scoleso.

Na seção de artigos livres, temos Denise Simões Rodrigues abordando Política, memória e educação na Amazônia paraense nos períodos colonial e imperial à luz da teoria de Cornelius Castoriadis, que é seguido por Damián Andrés Bil que aborda, em espanhol, A crise mundial do setor automotivo (1978-1982) e os efeitos sobre o complexo na Argentina. Elizangela Barbosa Cardoso escreve sobre Infância, Médicos e Mulheres em Teresina nas Décadas de 1930 e 1940, encerrando esta parte. As resenhas de Iago Augusto Martinez de Toledo e de Paulo Fernando Souza Campos apresentam novidades editoriais sobre o revisionismo histórico e a liquidação do pensamento revolucionário – perspicaz análise deste jovem pesquisador em tom de ensaio –, no primeiro, e sobre feminismo, etnia e classe, no segundo.

Em outubro realizamos na PUC-SP, coordenado por Antonio Rago Filho e seu núcleo, um grandioso seminário internacional sobre os 100 anos da Revolução Russa, contando com a presença de Michael Löwy, Tariq Ali, Tamás Krausz4, Miguel Vedda, Alan Woods, Sean Purdy, Osvaldo Coggiola e dezenas de outros estudiosos mundialmente reconhecidos por esta área de atuação intelectual.

Notas

1 Cf. o prefácio de Claudinei Cássio de Rezende na obra SANTOS, Antonio Carlos dos. Eric Hobsbawm e a Revolução Russa. Curitiba: Editora Prismas, 2017

2 VIANNA, Marly. Revolucionários de 1935. São Paulo: Expressão Popular, 2007.

3 Prêmio Jabuti de melhor livro de reportagem por ARBEX, José. O século do Crime. São Paulo: Boitempo, 1998.

4 Destacamos a publicação da biografia de Lenin por Tamás Krausz pela Boitempo Editorial, intitulada Reconstruindo Lenin, fruto de mais de quatro décadas de trabalho deste historiador húngaro.

Antonio Rago Filho

Carlos Gustavo Nobrega de Jesus


RAGO FILHO, Antonio; JESUS, Carlos Gustavo Nobrega de. Apresentação. Projeto História, São Paulo, v.60, 2017. Acessar publicação original [DR]

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Revoluções, Insurreições e Resistências / Tempos históricos / 2017

O ano de 2017 foi um importante marco comemorativo da história mundial: a Revolução Soviética de 1917. Este fato foi relembrado mundo afora, acompanhado de lembranças sobre outros momentos importantes do movimento internacional dos trabalhadores. No caso brasileiro, a Greve de 1917, e vários outros momentos da luta da classe que se inspiraram de alguma forma na Revolução. Tivemos nesse ano uma profusão de publicações sobre aspectos distintos da Revolução: a experiência soviética; o papel das mulheres; a questão sexual; a produção revisionista, são apenas alguns deles. Noutros pontos do mundo, e especialmente na Europa, o discurso revisionista, que desde há décadas tem procurado, como se fizera já no período de entre guerras mundiais, demonizar a Revolução de Outubro e, por consequência, apresentar os processos revolucionários como “excrescências” da história, teve que se enfrentar com a renovação do interesse na investigação sobre os processos de participação política de massas e os novos movimentos sociais à luz das releituras empenhadas da revolução de 1917.

Embora durante muito tempo a revolução tenha sido tratada apenas pelo viés do Partido Bolchevique, as questões que foram mobilizadas por ela vão além do partido, e remetem a distintas questões da classe trabalhadora organizada. Se a revolução terá sido, como sublinhou Eric Hobsbawm no seu A era dos extremos, “o acontecimento central da história do séc. XX, da mesma forma como a Revolução francesa o foi do séc. XIX”, o conjunto do século foi marcado sem qualquer sombra de dúvidas pela experiência soviética, seja do ponto de vista da classe, como da burguesia que se organiza contra ela. “A Revolução de Outubro suscitou o maior, de longe, movimento revolucionário organizado da história moderna”, fazendo com que “ao fim de apenas 30 ou 40 anos da chegada de Lénine à Estação da Finlândia em Petrogrado”, em abril de 1917, um terço da humanidade vivesse sob regimes que decorriam diretamente dos ‘Dez das que abalaram o mundo'”, como lhes chamou John Reed. De uma forma ou doutra, todos os movimentos emancipatórios do séc. XX se inspiraram nos bolcheviques na sua luta contra o imperialismo como modelo de dominação no mundo industrial e pós-industrial. Em consequência, a partir de então, as estratégias de resistência e de recuperação do imperialismo ao longo do século XX estiveram diretamente vinculadas aos avanços concretos do anticomunismo, e após a II Guerra Mundial, pela Guerra Fria.

O final do século XX trouxe as ideologias do “fim do comunismo” e dos fins “da ideologia”, com a implantação da doutrina do “pensamento único”. Tudo isso nos fez imaginar que esse centenário passaria em branco e que o máximo que nos proporcionaria seriam discursos saudosistas ou textos revisionistas fragmentários. Felizmente, não foi isso que vimos. A Revolução foi retomada como problema histórico, novos personagens vieram à luz da pesquisa histórica, novos problemas foram colocados. Somente no Brasil foram dezenas de eventos alusivos à Revolução Russa. Os mesmos geraram e ainda vão gerar discussões, artigos e livros sobre distintos aspectos da revolução.

Ao mesmo tempo, experiências como nosso dossiê também se inserem nas distintas propostas que buscaram pautar os movimentos revolucionários do século XX, seus sujeitos, seus problemas, seus limites e possibilidades. O dossiê reúne um conjunto de oito artigos que tratam de distintos momentos de processos revolucionários, ou de discussões que se inseriam em posições, sejam anarquistas, socialistas ou comunistas sobre formas de combater o capitalismo ao longo do século XX. Essa história inconclusa chega ao século XXI, com as novas esquerdas e direitas e com os movimentos sendo retomados, e são esses os temas abordados no dossiê.

O movimento operário carioca em perspectiva nas páginas da Revista Gil Blas (1919-1920), de Carlos Gustavo Nóbrega de Jesus é o primeiro artigo do dossiê. Revistas podiam ser porta-vozes de projetos, como neste caso, portadora de um projeto liberal, mas não podendo abrir mão de pautar as questões concernentes à classe operária, efervescente no período analisado. Mesmo com posição liberal, a revista não abriu mão completamente de dar voz aos próprios operários, conforme apresenta o autor, que busca contextualizar as posições do anarquista José Oititica na revista Gil Blas. Entretanto, outras posições operárias também eram trazidas, apontando para uma diversidade de posições apresentadas, pela revista no período analisado, endossando a tese da falta de clareza ideológica daquele período por parte da classe trabalhadora.

Socialismo e Revolução nas páginas do Clarté, de Michel Goulart da Silva também trata de um grupo que se organiza, a partir de uma perspectiva inspirada na Revolução Russa, por um viés socialista reformista. Um grupo sediado em Paris, passa a constituir no Brasil um grupo com o mesmo nome, publicando igualmente uma revista no Brasil, com contatos com outros grupos na Argentina. Divulgadores da Revolução Soviética, não eram totalmente identificados com o comunismo, não havendo identificação significativa com o PCB. Este é um dos temas explorados com detalhes pelo autor do artigo.

O artigo Bandeiras negras contra camisas verdes: anarquismo e antifascismo nos jornais A Plebe e A Lanterna (1932-1935), de André Rodrigues enfatiza a posição dos jornais anarquistas para um problema social concreto, a emergência do fascismo e as disputas acirradas entre as divergentes posições ideológicas. Os jornais fizeram parte da ampla militância antifascista de seus diretores, em um momento em que o movimento integralista tinha grande força mobilizadora junto a parcelas das camadas baixas da sociedade. Da mesma forma, destaca-se que o estudo busca o movimento anarquista não nos reconhecidos anos 1910 ou 20, mas mostra que nos anos 1930 o movimento também existiu, não tendo acabado quando a classe teria descoberto o comunismo como única alternativa. Ademais, a sua atuação pode ser vista no sentido amplo de uma imprensa que era parte organizativa de grupos que também faziam a luta de rua, lutando abertamente contra o fascismo daquela época.

Os movimentos feminista e comunista no Brasil: história, memória e política, de Iracélli da Cruz Alves contribui para desmistificar um tema recorrente, o tratamento dado ao feminismo pelos comunistas no Brasil. Mas essa posição era divergente no próprio âmbito comunista, em que parte das militantes preferiam ser chamadas de “militantes femininas” a “militantes feministas”. Há ainda uma discussão histórica acerca do problema, que tem desdobramentos na historiografia. Já que o tema passa a comparecer na historiografia a partir do período de redemocratização, há uma forte tendência a situar o feminismo apenas a partir da experiência das militantes exiladas durante a ditadura e que teriam vivenciado as experiências do maio francês. A autora mostra, a partir da pesquisa, os erros dessa posição.

Perspectivas teóricas, trajetória e o projeto político dos comunistas cubanos durante a década de 1940, de Ana Paula Cecon Calegari traz a questão do comunismo antes da Revolução Cubana, através do projeto político do Partido Socialista Popular (PSP). A Revolução não foi um “raio em céu azul”, embora não estivesse escrita nos anos 1940, foi a existência de movimentos políticos comunistas anteriores que ajuda a compreender o seu sucesso. Utilizando elementos de análise de discurso, a autora busca perceber elementos políticos os discursos presentes na imprensa dos comunistas.

“Rompendo com a natureza artesanal de nosso funcionamento”: ações armadas do PCBR na Bahia e seu pragmatismo revolucionário durante a década de 1980, de Lucas Porto Marchesini Torres traz uma experiência pouco conhecida do público leitor. Trata-se de um estudo sobre um grupo que realizava ações armadas de expropriação de bancos, já na década de 1980, e ligados ao Partido dos Trabalhadores. De forma problematizadora, o autor indaga a versões correntes sobre o fato e apresenta a complexidade dos elementos envolvidos, sobretudo no assalto malogrado na Bahia, em 1986. Mostra que a democratização do final dos anos 1980 foi muito mais conflituosa e complexa para a classe trabalhadora do que a história oficial até hoje busca demarcar sobre aquele período de “odes à democracia”.

Nuevas izquierdas y nuevas derechas: debates em torno a la conceptualización de los processos políticos latino-americanos recientes, de Hugo Daniel Ramos, traz o tema para o tempo presente e para as “novas esquerdas”, relacionadas com as “novas direitas” na América Latina. Faz um apanhado as características principais do material proposto para análise, um conjunto de textos do que chama de “nova esquerda” e uma pequena amostra de textos de direita. Em segundo momento, busca sintetizar a bibliografia sobre os governos considerados de “nova esquerda” na América Latina. Por fim estabelece conclusões provisórias, entre as quais, a ineficácia do par antitético esquerda x direita” para qualificar os grupos sociais da atualidade.

A esfinge da esquerda brasileira: decifrando junho a partir de Porto Alegre e de um novo ciclo de greves e lutas sociais, de Carlos Fernando de Quadros; Frederico Duarte Bartz; Guilherme Machado Nunes discute as Jornadas de Junho de 2013 no Brasil, estudando o caso de Porto Alegre. Mostra o efetivo aumento de manifestações de rua de caráter rebelde e não centralizado. Discute as leituras feitas pela esquerda hegemônica no Partido dos Trabalhadores que busca vincular o Golpe de 2016 à emergência dessas manifestações de 2013.

Manuel Loff – Professor Associado no Departamento de História e de Estudos Políticos e Internacionais (área de História Contemporânea) da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Portugal.

Carla Luciana Silva – Professora Associada da Universidade Estadual do Oeste do Paraná, campus de Marechal Candido Rondon.


LOFF, Manuel; SILVA, Carla Luciana. Introdução. Tempos Históricos, Paraná, v.21, n.2, 2017. Acessar publicação original [DR]

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Revoluções, insurreições e resistências/Tempos Históricos/2017

O ano de 2017 foi um importante marco comemorativo da história mundial: a Revolução Soviética de 1917. Este fato foi relembrado mundo afora, acompanhado de lembranças sobre outros momentos importantes do movimento internacional dos trabalhadores. No caso brasileiro, a Greve de 1917, e vários outros momentos da luta da classe que se inspiraram de alguma forma na Revolução. Tivemos nesse ano uma profusão de publicações sobre aspectos distintos da Revolução: a experiência soviética; o papel das mulheres; a questão sexual; a produção revisionista, são apenas alguns deles. Noutros pontos do mundo, e especialmente na Europa, o discurso revisionista, que desde há décadas tem procurado, como se fizera já no período de entre guerras mundiais, demonizar a Revolução de Outubro e, por consequência, apresentar os processos revolucionários como “excrescências” da história, teve que se enfrentar com a renovação do interesse na investigação sobre os processos de participação política de massas e os novos movimentos sociais à luz das releituras empenhadas da revolução de 1917. Leia Mais

Revoluções, cultura e política na América Latina / Cordis – Revista Eletrônica de História Social da Cidade / 2013

A Cordis: Revista Eletrônica de História Social da Cidade contempla em seu número 11 uma temática já bastante consolidada nos estudos acadêmicos no Brasil. Contudo, tal consolidação, fruto do trabalho de inúmeros pesquisadores no decorrer de décadas, não a torna menos atual e nem livre de debates acalorados, revisões e análises bastante inovadoras à sociedade. Referimo-nos aqui à temática Revoluções, cultura e política na América Latina.

Este número 11 da Cordis é composto por 12 trabalhos, sendo 9 artigos e 3 pesquisas. Dora Eloisa Bordegaray, no artigo intitulado Padre “Pichi” Meisegeier y la Villa 31. Una “opción por la fe y la justicia” entre dos dictaduras, problematiza “la acción de la Iglesia Católica con los pobres de la sociedad”, focalizando “la opción de sacerdotes y laicos en la década de las dictaduras militares de Onganía y Videla.” Camila Bueno Grejo, no texto Nuestra América: pensamento racial e construção da identidade nacional argentina, desenvolve “uma análise da obra Nuestra América. Ensayo de psicologia social, escrita em 1903 por Carlos Octavio Bunge”.

Genilder Gonçalves da Silva e Marcelo de Mello, em A Revolução de 1930 e o discurso da ruptura: Goiânia e a Marcha para o Oeste, concentram suas atenções para externar “a relação travada entre Goiânia e a Marcha para o Oeste”, ao passo que apresentam “elementos registrados no tempo e no espaço que possibilitam distingui-las, como produtos de processos históricos que se aproximam e se distanciam”. Marcos Antonio da Silva, no artigo denominado Revolução e política externa: os fundamentos e tensões da política externa de Cuba, analisa “a política externa cubana após a Revolução (1959) que conduziu ao poder os revolucionários liderados por Fidel Castro.”

Wanderlene Cardozo Ferreira Reis, no trabalho intitulado Duras memórias: resiliência e resistência feminina à repressão civil-militar no Brasil, que teve como base os “depoimentos de algumas mulheres que sobreviveram à repressão política Civil-Militar, no período de 1970 a 1974”, centra a sua análise em discutir “o papel da resiliência como um fenômeno psicológico”. Eduardo Scheidt, em “Revolução Bolivariana” nos discursos de Hugo Chávez, “analisa as representações de “Revolução Bolivariana” nos discursos do recentemente falecido presidente da Venezuela Hugo Chávez.”

Carlos Alexandre Barros Trubiliano e Márcia Pereira da Silva, no artigo Os Códigos de Posturas de Campo Grande (1905): questões de ordenamento e o controle do espaço social, externam como os Códigos de Posturas procuraram “disciplinar e racionalizar a ocupação do território” da cidade de Campo Grande, “buscando orientar as relações sociais entre os moradores e as relações deles com o espaço em que habitavam”.

Jussaramar da Silva, no trabalho denominado A ação das Assessorias Especiais de Segurança e Informações da Usina Binacional de Itaipu no contexto das atividades de cooperação extrajudiciais no Cone Sul, apresenta e analisa “a função que as Assessorias Especiais de Segurança e Informações (AESI’s), sediadas na Usina de Itaipu, cumpriram no imbricado sistema de troca de informações no Cone Sul num expediente que, a partir de 1975, foi denominado de Operação Condor.” Carmélia Aparecida Silva Miranda, em Comunidades quilombolas do Brasil: desafios e perspectivas, discute “a trajetória das lutas empreendidas pelos remanescentes das comunidades quilombolas do Brasil, considerando a incorporação do artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), da Constituição Federal de 1988, o Decreto 4887 / 2003, a convenção 169 / OIT e o Estatuto da Desigualdade Racial.”

O item Pesquisas, composto por trabalhos tão oportunos à reflexão do nosso presente quanto os artigos, é iniciado pelo escrito de Pedro Henrique Soares Santos e do seu orientador Thiago Tremonte de Lemos. Em Reflexões sobre uma epochal war: o Brasil e seus vizinhos platinos (1825-1870), os autores afirmam que “as relações entre Brasil e seus vizinhos da região platina não é algo novo: desde os tempos do Império o tema é revisto, discutido, reinterpretado. É a partir deste entendimento tentaremos explicar as guerras entre o Brasil e seus vizinhos.”

Assis Daniel Gomes e Jane Derarovele Semeão e Silva, que orientou a pesquisa intitulada A “Cidade do Progresso”: do transporte público aos dilemas com o abastecimento de água e luz em Juazeiro do Norte (1950-1980), analisam “os problemas urbanos que assolaram Juazeiro do Norte entre 1950 e 1980 e que foram denunciados por alguns jornais e discutidos nas Atas da Câmara Municipal de Juazeiro do Norte (ACMJN)”.

Por fim, Ana Cristina Feitoza e o seu orientador Marcelo Flório, em A educação como código de exclusão na cidade de Embu das Artes: as representações do educando na fase final do ensino fundamental, realizaram uma pesquisa com o intuito de “entender como funciona a mente do jovem contemporâneo, sua visão sobre a escola e seus educadores, o sistema de ensino e quais as propostas que o mesmo traz para adequar a educação às suas necessidades de forma a reinseri-lo de fato socialmente, colocando-o em condições justas e com oportunidades reais para uma vida digna e igualitária.”

Oferecemos agora aos leitores deste número da Cordis reflexões intensas e gratificantes tanto quanto é para nós a satisfação de disponibilizarmos este volume, dando visibilidade para os textos e não menos ao empenho dos autores em analisar questões e problematizar realidades das mais diversas. Todas versam sobre um ponto que é central: a América Latina, suas sociedades e culturas.

São Paulo (SP), dezembro de 2013

Yvone Dias Avelino

Nataniél Dal Moro

Editores Científicos


AVELINO, Yvone Dias; MORO, Nataniél Dal. Apresentação. Cordis – Revista Eletrônica de História Social da Cidade, São Paulo, n. 11, jul. / dez., 2013. Acessar publicação original [DR]

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Teoria, Política e História: Motins e Revoluções / Projeto História / 2013

Há que começar por um agradecimento. Graças à Pinacoteca do Estado de São Paulo, abrimos esse número da revista Projeto História com a imagem de “Campo de Batalha n.º 13”, de 1974. Esta obra compõe a impactante série de pinturas do artista brasileiro Antonio Henrique Amaral (1935), tendo como nucleação e tematização uma fruta exuberante de coloração verdejante, amarelada e também que se transmuta em tons marrons, que “engorda e faz crescer” e que adquire vários significados nas pinturas intituladas “Campo de Batalha”. Dessa maneira, as bananas com suas formas e conteúdos se diversificam, se deslocam, dando conotações a essa fruta que em nosso cotidiano pode significar desde o símbolo fálico ou uma pessoa amedrontada e retraída, uma ameaça racista ou uma “República das Bananas”, ou algo muito barato, vendido no mercado “a preço de banana”. Contudo, não é assim que o artista plasma nossa fruta tropical em suas pinturas. Ao evocar os seus vários tempos e mutações que se traduzem em formas e cores, acompanhamos a sua potência, o seu verdejar, assim como seu amadurecimento com o amarelo ouro combinados com tons marrons, de nossa energética “fruta nacional”. A obra “O primeiro de N…” (1973) já está trançada com os elementos compositivos que Antonio Amaral soube como ninguém extrair símbolos e representações. As cordas, as várias formas e recortes da fruta, de lado, de frente, no cacho, em rodela… Desde a “Boa vizinhança”, de 1968, lá está ela como representação do enlace cultural e do “imperialismo sedutor”: uma banana se estende entre as duas bandeiras, a estadunidense e a brasileira. Em “Detalhe com corda” (1972), a banana figura sob um fundo amarelo, com o cacho cortado e pendurado sob uma corda com seus vários nós que a deixam flutuar, a banana suspensa. A partir de outros quadros, como “As duas suspensas” (1972), a fruta aparece em seu amordaçamento… Na série “Campo de Batalha” transparece o confronto entre uma peça bela, mas frágil, que pode ser despedaçada por objetos cortantes. A arma bruta que não pode florescer é uma força que se impõe a qualquer resistência da fruta. Como o corpo humano que algemado, amarrado, torturado e vilipendiado, é silenciado pelos aríetes cortantes das tiranias.

“A morte no sábado – Tributo a Vladimir Herzog (1975)” é a apresentação radical do terrorismo oficial, do dilaceramento total da carne e do espírito humano, sob a indigna tortura usada por torturadores treinados para o “mal radical”, filhos da autocracia burguesa que se valeram de todos os meios para reprimir e aniquilar seus “inimigos internos” numa “guerra prolongada” da autocracia do capital. Carnes, pedaços, vísceras, espetadas com garfos e facas, tais como as frutas frágeis e doces, que empreiteiros da tortura só podem combater, às escondidas, de modo covarde, o seu algoz sempre enjaulado e que tem de se apresentar amordaçado, assim com seus instrumentos, estiletes cortantes, furam sangram, despedaçam a carne e o espírito que irradiam a liberdade.

A Pinacoteca, a partir de 7 de dezembro de 2013 até 23 de fevereiro de 2014, nos brindará com as exuberantes obras desse artista generoso, para alguns um “tropicalista radical”, que expôs em várias cidades da América Central e Latina, como Buenos Aires, Bogotá, Santiago do Chile, La Paz, entre outras e, também, em Otawa, Washington e Nova York.

Acolhendo vários artigos que tratam de manifestações sociais, sublevações e revoluções, há que registrar em nossa história política recente a irrupção dos mobilizações sociais de junho, que adentraram nas praças públicas, inicialmente com a bandeira da redução das tarifas dos transportes públicos e que foram simplesmente criminalizados com rajadas de bombas lacrimogêneas e balas de borracha, com outros tantos de instrumentos de repressão, como o cerco, as trauletadas com choque elétricos e as prisões. Com isso, propiciaram o agigantamento das ações populares que também partiram para o enfrentamento. Na multidão ressaíam a coragem e o vigor dos jovens, mas também de trabalhadores assalariados, precarizados, desempregados, vindos de vários sítios, com forte adensamento das periferias, que conscientes dos destratos em sua vida cotidiana, saíram a somar as reivindicações pela melhoria do trânsito, conforto e mobilidade urbana, mas, também os antigos temas como moradia, educação, saúde, segurança, entre outros. Com sua criatividade e espontaneidade, a movimentação se alastrou para todo o país, dando nova qualidade às intervenções políticas, resistindo à brutalidade policial e encurralando os principais dispositivos políticos, colocando-os na defensiva. Tomados de susto, os partidos de esquerda se viram obrigados a, inicialmente, entender esse fenômeno histórico-social. Reconhecendo que as organizações operárias ficaram à margem dessas mobilizações sociais. As principais centrais como a CUT e a Força Sindical estando atreladas ao antigo cupulismo e concluio com o governo, ficaram desarmadas e sem condições de disputar a hegemonia do movimento. Se a crise estrutural do capital aberta em 2008 e atingindo a acumulação nos pólos centrais do sistema, como os EUA e a Comunidade Europeia, aparentemente “poupou” as economias subalternas como as formações venezuelana, argentina e a brasileira, todavia, por conta da própria retração econômica e dos rearranjos das economias centrais, com o crescente processo inflacionário e declínio da produção interna, trouxe a possibilidade da radicalização da classe trabalhadora, dos setores alinhados à esquerda, anticapitalistas, mas também de grupos de extrema-direita, com sua reacionária “marcha da família”, contra o “comunismo” e a criminosa bandeira de “volta da ditadura militar”.

No artigo de Gilberto Calil temos uma consistente reflexão sobre as mobilizações inaugurados em junho de 2013. O autor revela o caráter pluriclassista, a riqueza das reivindicações, a inexperiência dos novos militantes e a concomitante disputa de bandeiras e espaços nas praças públicas, identificando três posições principais, a saber, a oposição de esquerda, a conservadora em suas diferentes tendências e o paredão em torno da defesa do governo petista. Além disso, o historiador se debruça sobre a atuação da imprensa que classificando os manifestantes como “vândalos”, passa a querer ditar rumos “pacíficos” ao movimento. Desse modo, a imprensa, assim como os governantes dos Estados e municípios, acreditavam em tipificar as manifestações como sendo ações depredatórias, criminosas e que atentavam à ordem social e seu direito de ir-e-vir. Todavia, começam a reagir a seus próprios enunciados com o agigantamento do movimento. Perdendo credibilidade com a divulgação instantânea de vídeos, a força policial em ato bruto, começaram a “suavizar” o discurso direcionando-o ao combate à corrupção. “Já era possível perceber que a radicalização repressiva gerava efeitos contrários, como fermento para o crescimento das manifestações.”, escreve Calil. As manifestações foram se multiplicando e no seio delas, o autor identifica a irrisória participação da extrema-direita. Do lado das centrais, reconhece que houve um “fiasco histórico” no Dia Nacional de Lutas, do 11 de julho, com os sindicatos atrelados à concepção de “conciliação de classes” em torno do governo Dilma Rousseff.

Questionando a doutrina aceita por reconhecidos teóricos sobre a existência de uma “diferença qualitativa a distanciar a autoridade da força violenta de um poder político não legítimo”, o texto teórico que referencia este volume, de autoria de Savio Vaccaro, da Università degli Studi di Palermo, analisa a intrínseca relação que as configura, justificada por uma modernidade que se contrapõe ás tradições, divulgada por vias de comunicação cada vez mais complexas e simples e que, entre outros aspectos, citando Kojève, encontra respaldo na inversão: “a justiça, (que) deveria ser o pressuposto fundante do Estado, (…) é, pelo contrário, um efeito contingente deste”.

A pertinência de tal discussão se explicita nos estudos de especialistas que compõem este volume nº 47 da Projeto Historia, cujo título Motins e Rebeliões nos remete ás diferentes expressões das lutas de classes teorizadas por autores como Carlo Ginzburg, Keith Thomas, Robert Mandrou, Roger Chartier, George Rudé, entre muitos outros. Em que pesem as diferenças entre tais autores, encontra-se unanimidade na percepção de que, ao longo da historia da humanidade, para os segmentos dominantes, tais manifestações nada mais eram do que a expressão de turbas, ralés ou desclassificados, precipitando-se em “condená-los a uma abstração desmaterializada”. A importância da historiografia analítica que repõe a instrumentalidade de tais levantes na dinâmica social, justificadas tanto em nome da fé, no dizer de Mandrou e / ou Ginsburg, quanto impelidos pela fome, conforme E. P. Thompson, ou mesmo na que se revela nas análises que a Projeto Historia selecionou para a composição deste número. Conforme se constatará de sua leitura, a dimensão que se pode atribuir a rebeliões chega até o reconhecimento destas em organizações culturais contra o fascismo, nas associações de imigrantes para fazer frente á empecilhos legais até as processualidades históricas como as lutas retratadas no conjunto da obra de Che Guevara, por exemplo. Lutas que se contrapuseram a Estados ditatoriais, como nos casos chileno ou na articulação da direita na Argentina aqui retratados. A retrospectiva contida nos textos que apresentam, desde a leitura marxiana sobre a Revolução de 1848, a Revolução dos Cravos em Portugal, a Revolução Francesa e o anarcossindicalismo italiano, articulam os aspectos teóricos que respaldam a conotação acima aludida.

A expressão da relação entre autoritarismo e violência encontra-se o texto de María Inés Tato, da Universidade de Buenos Aires, a qual analisa como conservadores e nacionalistas, respaldados na bandeira da Constituição Nacional e na defesa das tradições, usaram o recurso extremo da interrupção do governo democrático por meio de golpes de estado. Frente á tradição politica liberal as ações destes segmentos autocratas demonstram seu desapego pela democracia de massas e o conseguinte autoritarismo político que perduraram ao longo do século XX naquele país, perpetrando golpes de Estado desde 1930 e compartilhando posições em gabinetes e administrações militares.

Que as rebeliões têm muitas formas, se comprova com a leitura do artigo de Angela Meireles de Oliveira a qual traça um panorama das “associações de intelectuais que lutaram contra o fascismo no Brasil, Argentina e Uruguai entre 1933 e 1939”, as quais, apesar de suas diferenças e características próprias, tiveram em comum uma importante atuação no âmbito da cultura e no mundo artístico, além do proposito de contrapor-se á ideia de que o antifascismo seria fruto da ação exclusiva dos partidos comunistas ou da coordenação da Internacional Comunista (IC). Resgata a autora o surgimento de tais associações desde Paris, onde fora criado em 1934 o Comitê de Vigilância de Intelectuais Antifascistas (CVIA), onde ocorrera o Congresso de Escritores pela Defesa da Cultura (Paris, 1935 e Espanha, 1937), a Associação de Escritores e Artistas Revolucionários (AEAR) e a Associação Internacional pela Defesa da Cultura (AIDC), que se contrapuseram ao projeto de Stalin de extinção da União Internacional de Escritores (UIER ou MOPR, em russo). No mesmo diapasão, conforme a autora, no momento de ebulição da luta antifascista no Brasil, em torno da Aliança Nacional Libertadora (ANL) “cabia ao Centro de Defesa da Cultura Popular (CDCP), também chamado de Liga de Defesa da Cultura Popular e ao Clube de Cultura Moderna (CCM) as propostas e ações naquele campo”. No mesmo momento, a partir de 1935, no cone sul, “as lutas antifascistas passaram a ocorrer em sincronia, a partir da criação, por exemplo, na Argentina, da Agrupación de Intelectuales, Artistas, Periodistas y Escritores (AIAPE) e do Comitê de Vigilância dos Intelectuais Antifascistas (CVIA) e da criação da Confederação dos Trabalhadores Intelectuais do Uruguai (CTIU), que deu origem à AIAPE no país.

Carine Dalmás, em “Frentismo cultural dos comunistas no Brasil e no Chile: literatura, escritores e virada aliancista (1935-1936) aborda a constituição desse movimento intelectual, cuja denominação procura sintetizar as intervenções dos comunistas brasileiros e chilenos nos debates artísticos e literários de seus países com o propósito de tornar o terreno da produção cultural um local de articulação e difusão social das suas propostas políticas. Comparativamente, Dalmás salienta que a partir da ampla tendência de stalinização dos partidos comunistas, seus autores, tanto no Brasil como no Chile, orientaram os debates e produções literárias a partir da influência da União Soviética. Entretanto, diante das diferenças entre as trajetórias dos dois partidos e também de seus quadros intelectualizados, ocorreram impasses que diferenciaram esse processo. Elisa de Campos Borges, em “O Governo de Salvador Allende no Chile: atuação dos trabalhadores e a organização de novas relações de trabalho”, destaca as conexões entre a implementação de parte da linha programática da coalisão de esquerda Unidade Popular (UP), com a alteração das relações entre trabalhadores e a direção das indústrias a partir do processo de estatização do setor produtivo, e as expectativas geradas para o proletariado chileno, sobretudo no que tange às mudanças no cotidiano do trabalho. Se, por um lado, a criação de um sistema participativo no interior das fábricas possibilitou a melhoria das condições dos trabalhadores e a mobilização de classe, como destaca a autora, por outro tal espaço gerou conflitos e disputas na implantação do programa do governo popular.

As alternâncias das condições dos imigrantes bolivianos na Argentina é o tema principal deste estudo da pesquisadora da Universidade Nacional de Buenos Aires, Carolina Crisório. A este título, a autora, respaldada na diferenciação entre imigrantes ilegais e clandestinos, analisa como o Estado argentino oscilou, desde a formação da nação até os dias do MERCOSUL, entre sua aceitação ou rejeição de bolivianos, chilenos, paraguaios e mesmo brasileiros, através de leis e regulamentos que se foram superpondo contraditoriamente ao longo do século XX. Segundo ela, tal alternância de conduta por parte do Estado e, inclusive as reações xenófobas e condutas discriminatórias da população argentina esteve diretamente vinculada ás oscilações entre desenvolvimento e crises do capitalismo e das ondas ditatoriais vivenciadas naquele país. Assim controlados, estes imigrantes tendem a criar associações, superando rivalidades e competições no mercado de trabalho e suas diferenças culturais.

A título de refletir sobre a importância do conjunto dos diários de Che Guevara para o entendimento de todo o processo revolucionário cubano e sul americano entre o período de 1945 a 1967, Luiz Bernardo Pericás nos traz uma erudita e pertinente reflexão sobre o reconhecimento dos diários como fonte documental essencial para a analítica historiográfica. A partir do próprio Che, o autor rememora desde diaristas ingleses do século XVIII, perpassando por escritos de pioneiros e imigrantes norte americanos do século XIX e XX, e por conhecidas obras derivadas de anotações como as de um Dostoievsky, Camus, Lord Byron, Kafka, Flaubert, Graham Greene, Virginia Woolf e André Gide. Segundo Pericás, Che mantinha consigo, ao longo de suas jornadas, os escritos do californiano Jack London cujos diários, escritos em fins do século XIX, retrataram “em cores fortes os medos, as angústias, as alegrias e as esperanças de toda uma geração naquele final de século XIX”. Demonstra assim, além de uma densa analise do conjunto dos escritos de Che Guevara, como a literatura se apropria de “forma ‘diário’” e sua importância historiográfica.

No artigo “O Nacionalismo em Bolívar e Martí”, Mônica Dias Martins e Manuel Domingos Neto analisam as fundamentações do discurso com forte conotação nacionalista de dois líderes mais notórios no processo de Independência latino-americano. A rigor, os conceitos e formato de nação, nacionalidade e estado nacional estavam em formatação e ebulição no século XIX e a construção da identidade nacional na América Latina, continente com uma população multifacetada, foi um enorme desafio. Os autores deste trabalho identificaram as proximidades entre o discurso nacionalista dos libertadores da América e a ideia de internacionalidade.

No trabalho “Errico Malatesta e o Fascismo”, Nildo Avelino aborda a análise crítica deste anarcossindicalista italiano acerca da escalada do regime de Mussolini, através de seu jornal Volontà, publicado em Ancona. Tendo como foco os microfascismos ao invés do macro, as reflexões de Malatesta permitem compreender um viés do Estado Liberal, cuja utopia do self-government se aproxima da vontade de governo dos estados totalitários. E a legitimidade deste discurso repousa numa pretensa antítese do autoritarismo, cujo imaginário projeta para as cenas de “…arames farpados cortando os céus e da luz dos holofotes projetada sobre corpos esquálidos.” Avelino demonstra, através de Malatesta, portanto, a genealogia desse “canto da sereia” do Estado democrático contemporâneo.

Em “Novamente, a Revolução Francesa”, Oswaldo Coggiola atualiza alguns aspectos centrais que circundaram esse processo histórico mais abordado pela historiografia. Cada geração renova as discussões acerca dos acontecimentos do passado, seja pelo acúmulo de conhecimentos e descoberta de novas fontes, mas, sobretudo, pelas novas visões decorrentes das questões políticas e ideológicas dos anos mais recentes.

Os interesses e celebrações em torno da Revolução Francesa, uma vez institucionalizada, são geralmente circunscritos ao ano de 1789, na aliança de um amplo leque de setores políticos e sociais – povo, burguesia e monarquia constitucional -, entretanto ocorre a tendência de negação do caráter contraditório e instável desse compromisso político. “Não é só a revolução quem devora seus filhos: os filhos da revolução também devoram sua mãe, quando necessário”, enfatiza Coggiola. No trabalho “A Revolução dos Cravos, a dinâmica militar”, Lincoln Secco reflete acerca do processo revolucionário português de 1974 a 1975 a partir de seu impacto sobre as forças militares através do estudo das disputas políticas na longa duração. O chamado Movimento das Forças Armadas – MFA -, denominação dada pelos capitães do exército português foi fundamental nesse contexto, e Lincoln Secco sintetiza as motivações e reivindicações dos militares em três Ds: “Descolonização, Desenvolvimento e Democracia”.

Em “A Revolução Alemã de 1848 nos artigos da Nova Gazeta Renana”, Lívia Cotrim, aborda o decurso do movimento na Alemanha acompanhado das análises marxianas expostas nos textos do jornal fundado por Marx e Engels, incluindo os vínculos e contrapontos com as insurreições de fevereiro e junho na França, determinado pelo caráter burguês das relações de produção e também da monarquia francesa, “em contraste com a conservação, na Alemanha, de condições econômicas e políticas ainda semifeudais, estando a burguesia alijada do poder”.

Se na França, a derrota do proletariado nas jornadas de junho foi a vitória dos setores mais conservadores da burguesia, na Alemanha o processo terminou com a derrota tanto dos setores populares como da própria burguesia, com a manutenção da combinação das formas capitalistas e pré-capitalistas de exploração do trabalho, bem como a “fragmentação e uma forma de estado autocrático que exclui o exercício direto do poder por aquela classe”.

Em síntese, o conjunto das leituras deste volume da Projeto Historia remete á conotação de que, quaisquer que sejam as mobilizações sociais contra as dominações que se apresentam das mais diversas formas, tempos e espaços, observa-se, em comum, a reação desqualificadora e a violenta repressão.

Antônio Rago Filho

Vera Lucia Vieira


VIEIRA, Vera Lúcia; FILHO RAGO, Antonio. Apresentação. Projeto História, São Paulo, v. 47, 2013. Acessar publicação original [DR]

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Revoluções no Século XX / História Social / 2009

A permanente “Era das Revoluções”

(..) Deve-se aderir ou não? Esta questão não

se punha para mim, nem para os outros (…)

Era a MINHA revolução…(…)

(Vladímir Maiakóvski – Autobiografia)

O breve século XX, sintetizado por Eric Hobsbawm em A era dos extremos, na verdade não foi tão breve. Talvez fosse tão apropriado, a partir das divisões feitas pelo grande historiador britânico, nascido na Alexandria no mesmo ano da Revolução Soviética, compreender também o século XX como A era das revoluções. Mas este alargamento pode ser apropriado para tantos outros séculos passados. Para nós, que utopicamente lutamos contra todas as distopias, o século XXI é o nosso momento da Revolução.

Se o século XVIII foi marcado pela revolução burguesa clássica, no caso francês, bem como pela revolução anticolonial, o exemplo das treze colônias norte-americanas, esgotamento do feudalismo e ante-sala da consolidação capitalista, o século XX foi o da encruzilhada entre o capitalismo e o socialismo.

Certamente 1917 significou um alfa-ômega de esperança pelo fim da exploração humana. Era o divisor de águas ensaiado na Comuna de Paris e teorizado no Manifesto de Karl Marx e Friedrich Engels, a pedido da Liga dos Comunistas. Seguiu-se a ela, em 1949, a Revolução Chinesa, em 1959, a Revolução Cubana, em 1979, a Revolução Sandinista e tantas outras que não chegaram a se consolidar.

Já disse em outro artigo (Anticomunismo, Revolução Russa, Guevara e Guerra Fria) que um dos maiores discursos inventados do Século 20 é o de que a chamada “Guerra Fria” iniciou após o final da 2ª Guerra Mundial. Seu significado traduz o que muitos têm reproduzido até os dias atuais, ou seja, a de que uma espécie de guerra suja acontecia entre os Estados Unidos e a União Soviética em torno da partilha do mundo pós-1945. Raramente a “Guerra Fria” aparece como a síntese ideológica da luta de classes do capital contra o trabalho, expressão pós-consolidação da União Soviética.

Na verdade, o que a visão conservadora e despolitizada, traduzida como “Guerra Fria” sempre escondeu foi uma estratégia sutil de anticomunismo presente desde o Século 19, após o surgimento do marxismo, aprofundada depois da Comuna de Paris e absolutizada com a vitória da Revolução Soviética. A burguesia mundial nunca pôde e não pode tolerar o proletariado e os trabalhadores no poder.

A direita liberal e conservadora, desde então, não mede esforços para desqualificar, atacar e fazer a luta contra a tradição marxista. Após o fim da União Soviética, em 1991, então, diferentemente do que se apregoa ela se aprofundou.

Todos os símbolos e as conquistas do socialismo no século XX continuam a ser negados ou ignorados. As derrotas conjunturais das primeiras experiências socialistas foram superlativizadas e seus erros transformados em aporte para a condenação de uma sociedade para além do capital.

Logo após a Revolução de Outubro, ainda em 1917, as grandes agências de notícias divulgavam comunicados uníssonos para o mundo sobre “o que se passava na Rússia Soviética”. No Brasil, a imprensa liberal divulgava ou abordava-os no mesmo tom em seus editoriais, baseados em falsidades e mentiras.

Nelas, as barricadas de Viborg, o bairro proletário de Petrogrado, as greves e as manifestações de rua, bem como a do Dia Internacional da Mulher, não inauguravam a Revolução de Fevereiro e a derrubada de Nicolau II. Na versão das agencias internacionais, o czar abdicava do trono em nome de seu irmão Miguel ou de seu filho Aléxis. Estrategicamente, tirava-se o papel político da luta de classes naquele processo, apagava-se da História a aliança de operários e soldados, eliminava-se a liderança dos bolcheviques.

Em várias notícias que visavam cizânia e descrédito sobre o que acontecia na Rússia, o escritor Máximo Gorki era apresentado como o verdadeiro líder do movimento e inimigo de Lênin. Este era colocado como um agente e espião do imperialismo alemão (após 1920 passou a ser chamado de ditador russo), enquanto que os bolcheviques estavam a serviço da Alemanha beligerante. Ao mesmo tempo, ao menos enquanto durou a guerra civil e o cerco dos exércitos brancos ao poder soviético, a derrota dos bolcheviques, ao menos na grande imprensa, era iminente a cada dia. Enquanto a Rússia era qualificada como o reino do terror e da anarquia, pois o Conselho dos Operários e Soldados, os sovietes, uma “ideia diabólica” de Lênin, destruía a disciplina e desorganizava a sociedade; as medidas socialistas, as reformas do novo governo proletário e as conquistas como a reforma agrária e a redistribuição de terras, o trabalho de oito horas, a paz na guerra e as vitórias contra o cerco das potências imperialistas, etc., eram desqualificadas ou identificadas como um ataque à família e à propriedade privada.

No Brasil, os apoiadores locais eram os mais visados do discurso de direita. Os anarquistas e os maximalistas, simpáticos ao que acontecia na Rússia, eram denunciados como agentes estrangeiros que queriam fazer do país uma Rússia bolchevista. O perigo vermelho ganhava espaço no imaginário conservador. Após 1917, os reflexos da crise econômico-social da I Guerra nas grandes greves não eram considerados e os impactos positivos da Revolução Soviética no movimento operário brasileiro eram vistos como “uma ameaça à civilização”, dirigida “por uma das mais terríveis associações revolucionárias de Moscou”. O caráter de classe e burguês do contra-ataque à Rússia Soviética era evidente, identificando a libertação do proletariado do jugo czarista e burguês, desde o primeiro momento, como uma das “maiores tragédias da história”. As lideranças locais, os anarquistas e socialistas e, sobretudo, os comunistas no pós-1922, eram identificados como “maus elementos” ou “extremistas”.

Mesmo com o papel fundamental da União Soviética na derrota do nazi-fascismo juntamente com os aliados, o anticomunismo não deu tréguas. Aliás, aumentou. Entre o final da Segunda Guerra Mundial e o fim da União Soviética, registrado pela historiografia oficial como período da “Guerra Fria”, nunca o comunismo teve um combate tão intenso, um aprofundamento das práticas anteriores a 1945.

Com a expansão das experiências socialistas para além da URSS, sob a direção dos Estados Unidos e seu instrumento primordial, a CIA, o combate ao comunismo foi aprofundado no Ocidente e em nosso País. Mais ainda após a Revolução Chinesa, em 1949 e, especialmente, com a Revolução Cubana, em 1959. Aí sim, a ameaça vermelha passou a ser um concreto problema continental.

A preparação do Golpe de 1964, através do IPES e do IBAD, através de intensa propaganda político-ideológica reafirmou o perigo comunista e o caminho da “comunização” do Brasil pelo governo João Goulart. A consolidação da Ditadura Civil-Militar e a escalada de violência do terrorismo de Estado contra todas as correntes de esquerda do País, só fizeram aprofundar esta característica anticomunista, mesmo que 1964 tenha se qualificado como uma “Revolução” pelos seus vencedores.

O período de lutas políticas e ideológicas intensas durante a Queda do Muro de Berlim, em 1989, a derrocada do socialismo no Leste Europeu e o fim da União Soviética, em 1991, foi outro momento de intensidade político-ideológica. Até com o anúncio apressado do fim da História, quando o neoliberalismo chega ao seu auge, enquanto que a reflexão relativista ganhou força na academia e na mídia. Depois disso, nada de conteúdo parecer ter mudado, especialmente depois da Revolução Bolivariana na Venezuela e as vitórias, mesmo que no plano institucional, do boliviano Evo Morales, do equatoriano Rafael Corrêa e do nicaraguense Daniel Ortega, entre outros.

Para muitos de nós historiadores que vivemos e praticamos a ideia de Revolução nos últimos tempos, a escolha do Dossiê Revoluções do Século XX é extremamente simbólica. 2009 foi um ano de efemérides, várias delas relacionada à questão da revolução. A decisão da História Social pela temática é um marco da própria Revista dos Pós-Graduandos da UNICAMP. 2009 iniciou com o debate sobre os 50 Anos da Revolução Cubana, em um contexto de graves reflexos da crise do capitalismo iniciada no ano anterior.

2009 também foi o ano da rememoração dos 20 anos da Queda do Muro de Berlim, dos 30 anos da Revolução Sandinista na Nicarágua, dos 60 Anos da Revolução Chinesa e dos 70 Anos do fim da Guerra Civil Espanhola.

Pois partes destes momentos foram pensadas na presente edição da História Social, demonstrando que a academia, assim como a vida, ainda se importa com o tema da Revolução.

Um evento “reputado pela historiografia oitocentista como sendo uma anomalia social e manifestação da barbárie habilmente abortada pelas autoridades régias” é apresentado no artigo “Combates pela História da Conjuração Baiana de 1798: ideias de crise e revolução no século XX”, de Patrícia Valim. O tema é tratado perante convocação da população de Salvador que foi instigada “pelos pasquins sediciosos, afixados em locais públicos da cidade, para uma “revolução” que instituiria o que os partícipes do evento qualificaram de “República Bahinense”. Para Valim, a historiografia brasileira oscilou, tratando a Conjuração como evento regional e nacional, qualificada por alguns no debate político-ideológico em torno da revolução brasileira, como Affonso Ruy, como a “Primeira Revolução Social Brasileira”. Por isso, a compreensão sobre as revoltas coloniais em uma perspectiva mais ampla, tradição tão cara a parte da historiografia brasileira, tem neste ensaio uma contribuição atualizada ao debate, incluindo o Brasil e seus movimentos sócio-políticos com projetos de Revolução para os séculos XX e XXI, herdeiros das lutas sociais de séculos anteriores.

A reação conservadora que se deu com a Queda do Muro de Berlim, reforçou o esquecimento sobre o processo histórico da Alemanha pós-I Guerra. Porém, não foi o que fez George Araújo em “Uma revolução que não deve ser esquecida: Alemanha, 1918-1923”. Seu artigo, com variada análise historiográfica, demonstra que não esteve tão longe a previsão de Karl Marx sobre o início da vaga revolucionária contra o capital em países da linha de frente imperialista e que “apesar de derrotada, a Revolução Alemã figura como um dos momentos mais importantes do movimento proletário internacional”. Assim, mesmo que fracassadas as tentativas “de grupos de esquerda de tomar o poder e promover uma revolução socialista”, o autor afirma que aquele momento tem importância histórica para se entender a crise capitalista atual, pois naquela época “muitos enxergavam a época em que viviam como uma oportunidade de se repensar as estruturas socioeconômicas às quais estavam submetidos”, situação mantida na atualidade. Para Araújo, “o desenlace da Revolução Alemã seria, em certa medida, determinante para as histórias europeia e mundial”, na esteira da Revolução bolchevique. Afinal, a Alemanha da década de 1920 e suas contradições sociais e econômicas, entre o primeiro conflito mundial e a ascensão do nazismo, foi entrecortada pela República de Weimar, quando a Alemanha este efetivamente às portas da revolução. Sua derrota, por outro lado, foi outro momento histórico para a III Internacional Comunista, afinal, naquele momento, a defesa do socialismo na União Soviética passou a preponderar sobre a ideia de revolução mundial.

A Espanha revolucionária, no “ensaio” da Segunda Guerra Mundial, entre 1936 e 1939, foi o objeto do artigo “O discurso anticomunista católico e as imagens da guerra civil na Espanha: ordem x desordem”, quando aborda o periódico católico O Santuário. Para Marco Antônio Pereira, citando Pierre Vilar, o conflito representava para os conservadores fascistas um “complô bolchevique-judeu-maçônico” tendo atrás “os inimigos de Deus organizando a Revolução”, assim como para os republicanos, os socialistas, os anarquistas e os comunistas, vencer “o exército abria caminho para uma revolução”. Assim, à direita e à esquerda o tema da revolução estava presente no conflito que levou brigadistas de todo o mundo para defender a Espanha republicana, bem como movimentou o eixo nazi-fascista, sobretudo com o apoio da Alemanha hitlerista e da Itália de Mussolini ao projeto político liderado por Francisco Franco.

Pesquisando o processo revolucionário da China e seus três momentos, o artigo “Chen Bilan” de Bárbara Funes nos mostra a classe operária chinesa em luta, em 1925, apresentando parte da história desta mulher da Oposição de Esquerda e sua luta contra a opressão milenar das chinesas. Nesse sentido, aparecem como pano de fundo a independência nacional chinesa e a revolução agrária, desde a Revolução de 1911, bem como o movimento de emancipação das mulheres que se combinava com os ideais socialistas influenciados pela Revolução Russa, resultando na criação do Partido Comunista Chinês, em 1920. Por fim, o artigo avança para a dissidência internacional em torno da continuidade da Revolução Russa. Contrapõe os apoiadores de Stalin e de Trotsky em perspectivas diferenciadas de revolução, abordando as influências soviéticas sobre a China, num primeiro momento, bem como a via chinesa para o socialismo e a oposição a ela pelos trotskistas, na ação da militante Chen Bilan.

Também pesquisando o processo revolucionário da chinês, Cristiane Santana, em “Notas sobre a História da Revolução Cultural Chinesa (1966- 1976)”, nos trás o tema da Revolução Chinesa e seu desdobramento na enigmática conjuntura daquele país entre as décadas de 1960 e 70. Para a autora, no contexto do cisma sino-soviético surgiu a elaboração maoísta que refletia os caminhos que a Revolução na China seguiria em um momento de crescente burocratização do Partido Comunista Chinês. Assim, a “revolução tinha como objetivo identificar e destituir os elementos que seguiam a ‘linha capitalista’ e aqueles que difundissem a ideologia burguesa na academia e na cultura”. Aquela fase da Revolução Chinesa, assim como a Guerra Popular influenciou o PCdoB e a luta contra a Ditadura Pós-1964, através da Guerrilha do Araguaia, incentivaria correntes de esquerda e a ideia de Revolução no Brasil. Como em outros lugares do mundo, estudantes e trabalhadores se organizaram na Ação Popular, no Partido Comunista do Brasil (Ala Vermelha) e no Partido Comunista Revolucionário, visando “efetuar o cerco das cidades a partir dos campos”. Todo esse quadro é bem composto por Santana, demonstrando os limites das concepções e as contradições de classe que permeavam este momento da Revolução Chinesa.

Bruno Durães e Iacy Mata estudam vários elementos históricos da luta cubana contra o domínio espanhol, bem como a questão dos afro-cubanos naquele país do Caribe, assim como as saídas do governo para enfrentar o pós-89, no chamado “Período Especial”. O artigo “Cuba, os afro-cubanos e a revolução: passado e presente” traz para a análise o passado e o presente da Ilha que desafiou o marco do imperialismo mundial no século XX, os EUA, rompendo com o etapismo proposto pelo marxismo da III Internacional para os países da América Latina e Caribe. Mas não deixou de apresentar contradições em sua via para o socialismo, como a complexa permanência das desigualdades raciais, sobrepostas aos problemas sociais, problemas desafiadores para a continuidade da Revolução iniciada em 1959.

A Nicarágua é pauta de dois artigos. No primeiro deles, “Sob o signo do imperialismo “yankee”: aspectos da repercussão da intervenção norte-americana na Nicarágua na imprensa brasileira (1926-1927)”, Rafhael Sebrian estuda quatro periódicos brasileiros, Correio da Manhã, O Estado de São Paulo, Folha da Manhã e Folha da Noite, procurando entender debate acerca da contradição do imperialismo e do pan-americanismo. Sebrian mostra a resistência armada liderada por Augusto Sandino, a fim de combater as tropas de intervenção norte-americana que, como diz o autor, citando um dos jornais, “ao primeiro sinal de ‘revolução’, envia-se um cruzador de guerra para ‘proteger os interesses americanos’”. O autor conclui pela majoritária e extemporânea condenação dos órgãos de imprensa estudados á ocupação norte-americana na Nicarágua da década de 1920. Para os EUA, sua histórica ação intervencionista não foi diferente diante da Revolução Cubana, no apoio aos Contras em 1979, assim como na atualidade, na movimentação da sua Quarta Frota. Entender o processo revolucionário do século XX deixando de lado o papel intervencionista dos Estados unidos é ver a História pela metade.

Cinquenta anos depois, a Revolução Sandinista na Nicarágua voltou a produzir debates entre “os intelectuais latino-americanos em relação às possibilidades da esquerda armada conquistar o poder e estabelecer um sistema político democrático”. No segundo artigo sobre a Nicarágua, “Octavio Paz, mídia e Revolução Sandinista”, de Priscila Dorella, é investigada a posição do poeta e ensaísta Octavio Paz, em torno da Revolução de 1979. Indica a importância do debate revolucionário no país que teve na sua História a Revolução Mexicana e tem a Revolução de Chiapas como fonte inspiradora de outros movimentos na América Latina. A autora procura buscar no pensador mexicano um dos dilemas do século XX, a contraposição / relação entre a democracia, a justiça e a igualdade social nos projetos revolucionários. A defesa dos valores democráticos na América Latina “o fez um escritor dissonante em relação ao contexto latino-americano de Guerra Fria, em que os intelectuais se aproximavam, em grande medida, das concepções de esquerda (trotskistas, maoístas, leninistas etc)”, afirma Dorella, citando Castañeda. O artigo mostra o contraponto liberaldemocrático de Octávio Paz às perspectivas marxistas e revolucionárias que estiveram presentes na esquerda mundial e latino-americana, evidenciando sua crítica e impertinente comparação da Nicarágua com Cuba, deixando em segundo plano a participação do Governo Ronald Reagan no apoio direito e indireto aos Contras. A autora aponta bem este contraponto, sem de deixar dominar pela posição conservadora de Paz, ao afirmar que a “Revolução Sandinista teve, inicialmente, um caráter pluralista reunindo marxistas, social-democratas, democratas cristãos e conservadores pró-empresariais”.

O artigo “FARC-EP: o mais longo processo de luta revolucionária da América Latina”, de Diego Ceará, apresenta o processo histórico de formação e desenvolvimento das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia – Exército Popular e seus 45 anos de luta do movimento guerrilheiro em busca do poder. A Colômbia das FARC é o objeto deste corajoso ensaio que apresenta a guerrilha colombiana e “suas raízes na guerra civil que dilacerou o país a partir do final dos anos 1940”. Para o autor, o movimento revolucionário na Colômbia foi produzido na Guerra Fria que, no contexto de enfrentamento entre socialistas e capitalistas e da Revolução Cubana (1959), inspirando o surgimento das FARC-EP e a defesa da “revolução patriótica, popular e antiimperialista para a construção da “Nova Colômbia”. Posteriormente, citando Leongómez, Ceará, afirma que a Revolução Nicaraguense (1979) “revitalizou o mito da ação guerrilheira como instrumento de conquista do poder na América Latina” e na Colômbia, razão direta para a ofensiva militarista dos EUA, fortalecida com os governos de George W. Bush e Álvaro Uribe que passam “desqualificar politicamente o movimento insurgente”, quando “os guerrilheiros passaram a ser chamados de ‘narcoguerrilha’”.

Por fim, dois artigos especulam sobre a perspectiva de revolução e / ou transformação social para o futuro, a grande utopia do século XX. No primeiro deles, “Ainda existe a possibilidade de uma ruptura progressista?”, de Gilberto Maringoni procura recolocar o debate sobre uma estratégia socialista tendo como centro dessa disputa o Brasil atual e a contraposição entre a ortodoxia liberal e os desenvolvimentistas. Assim, ao lado destes, os socialistas e revolucionários, “pautados na luta de classes e tendo como núcleo fundamental a classe operária, os trabalhadores, os setores pobres da cidade e do campo e parcelas da pequena burguesia”, buscando outras frações de classe, devem se inserir “na real disputa de forças na sociedade”. Como tática e estratégia devem “estabelecer metas de curto, médio e longo prazo, examinar quem são aliados e inimigos e traçar um programa mínimo e um programa máximo de ação”. A partir de Caio Prado Júnior (revolução como reformas e modificações econômicas, sociais e políticas sucessivas que, concentradas em período histórico relativamente curto, dão em transformações estruturais da sociedade), Maringoni afirma que, após a ofensiva neoliberal, revolução e socialismo, banidos da agenda política por vários anos, voltam à ordem do dia. Em relação ao Brasil, o rompimento deve se dar com o rompimento das amarras financeiro-especulativas desta fase do capitalismo”, sendo que o desenvolvimento deve entrar na agenda de luta, a qual “passa por uma ruptura revolucionária, pressupõe a supremacia da política, com sociedade organizada, instituições democráticas e Estado forte”, além da “mobilização organizada, principalmente em partidos, por parte da população”.

O neoliberalismo, “ao destruir as instituições intermediadoras dos conflitos sociais, prepara uma nova vaga de lutas muito violentas”. Esta é a tese provocadora apresentada em “Epílogo e prefácio (um testemunho presencial)” de João Bernardo, o qual compara a década de 1960 com a atualidade. No texto, Bernardo argumenta que a luta contra o capitalismo não tem sido mais dos operários qualificados, mas de trabalhadores precários. Muito menos de estudantes letrados, mas de analfabetos funcionais, de jovens dos subúrbios “enquadrados por mais ninguém senão por eles próprios e capazes do furor destrutivo necessário para abalar as instituições em que vivem”. Apostando no “confronto generalizado” bem como na crítica ácida e autonomista aos sindicatos e partidos, Bernardo se junta a todos nós que pensamos sobre “os sonhos e os objectivos que não foram realizados” que nos foram tirados, realizamos as catarses que, como afirma o autor, “hoje restituíram-nos a utopia”.

Esta edição de História Social também nos brinda com ótimos artigos em sua secção livre. Kátia Michelan, que aborda os “Cronistas medievais: ajuntadores de histórias”, mostrando “como se davam as escolhas de textos para compor as crônicas” e “como se desenvolveu o processo de acesso à leitura”, buscando também refletir sobre os “tipos de textos eram comumente lidos” naquele período histórico. No artigo, mesmo que estude os cronistas (reprodutores do que encontram em outros livros), a questão da revolução não é deixada de lado. Pelo contrário, citando Elizabeth Eisenstein, a autora chama as transformações decorrentes da invenção técnica da imprensa como “revolução cultural”, mesmo que relativize com Roger Chartier, para quem a invenção de Gutemberg não resultou necessariamente na “criação de um grande conjunto de leitores”, pois, embora ela seja de “fundamental importância, não é a única técnica capaz de assegurar a disseminação em grande escala de textos impressos”, vistas pelo historiador francês, também, como “revoluções da leitura no Ocidente”.

As Minas Gerais colonial são apresentadas no artigo de Marco Antonio Silveira. Em “Narrativas de contestação: os Capítulos do crioulo José Inácio Marçal Coutinho (Minas Gerais, 1755-1765)”, são indicadas as “formas de organização política por parte dos libertos da Capitania de Minas Gerais”, articulando uma narrativa histórica dos mesmos que busca “ratificar seu papel na constituição local da Res publica”, centrada numa “contestação frente à falta do reconhecimento merecido por parte dos brancos e das autoridades”. Na linha argumentativa do autor, pode-se depreender que as questões étnicas e de classe contornam as experiências históricas no tão longe e tão perto século XVIII, tendo sido marca das revoluções ou tentativas de formação histórica brasileira.

Eloisa Dezen-Kempter, em “Uma nova revolução urbana: reinterpretando territórios no final do século 20” procura entender a passagem do modelo capitalista industrial para o terciário avançado, o qual deixou cidades com vazios urbanos e áreas de produção obsoletas. A autora argumenta que “a reestruturação produtiva e a recessão econômica ao final dos anos 1970”, provocou “uma crise urbana sem precedentes”, construindo a “adoção de programas de reconversão de áreas portuárias e industriais abandonadas ou degradadas”. Este contexto gerou “a necessidade de proteção da história e memória destes espaços”, catalisando “a renovação e revitalização destas paisagens industriais”. O artigo de Eloisa trata de uma “revolução silenciosa” no interior do modo de produção. Alerta ser “fundamental investir numa perspectiva de análise e intervenção mais aprofundada das diversas questões relacionadas com o patrimônio industrial, de modo a ser possível conhecer melhor a sua complexidade, as relações entre preservação e reabilitação urbana, imagem e identidade, manutenção e projeto, conservação e mudança”.

Por fim, para quem herda um pouco da formação do Programa de Pós-Graduação em História da UNICAMP, apresentar este Dossiê é um retorno a casa que pariu parte da minha formação acadêmica. Também é uma volta a História Social e uma zapeada nas revoluções do século XX, herdeiras das lutas anteriores e faróis das mudanças que vivenciamos e acompanharemos no século XXI. Viva a Revolução!!!!!

Diorge Alceno Konrad – Universidade Federal de Santa Maria.

KONRAD, Diorge Alceno. Apresentação. História Social. Campinas, n.17, 2009. Acessar publicação original [DR]

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