Nação, cidadania, insurgências e práticas políticas, 1817-1848 (II) / Clio – Revista de Pesquisa Histórica / 2015

Esta segunda parte do dossiê Nação, cidadania, insurgência e práticas políticas, 1817- 1848, mais uma vez, aborda a história social e política daquele momento-chave da formação da nacionalidade e da consolidação do império do Brasil, que costumava ser chamado pela historiografia tradicional de “Ciclo das Insurreições Liberais do Nordeste”. Mesmo tendo esse vínculo comum, os artigos abordam objetos diversos, enriquecendo assim nossa compreensão sobre o período e sobre a temática do dossiê. Nas páginas seguintes, estudaremos: a constituição de uma família que tinha um projeto de ascensão à elite política do Império; o conturbado processo de independência nas “províncias do norte”; a participação de índios aldeados nas lutas da Confederação do Equador; o jogo político das primeiras celebrações do Sete de Setembro, e, finalmente, os confrontos armados envolvendo as populações florestais nas matas de Jacuípe na primeira metade do dezenove.

Abre o dossiê o instigante artigo de Paulo Henrique Fontes Cadena, que desvenda a trajetória política e financeira dos Cavalcanti de Albuquerque desde 1801, quando os irmãos Francisco, Luís e José protagonizaram a trama conhecida como Conspiração dos Suassuna (nome do engenho da família). Em 1817, Francisco (o Coronel Suassuna), e seus filhos participaram da revolução que estourou no Nordeste. O autor analisa os problemas financeiros que rondavam o cotidiano dos Cavalcanti, levando-os a tomar posições opostas ao governo. Todos os seis filhos do Coronel envolveram-se na política brasileira. O mais destacado deles, Antonio Francisco de Paula e Hollanda Cavalcanti de Albuquerque, o Hollanda dos anais do parlamento brasileiro, quase foi regente em 1835 ao concorrer com Feijó. Depois dos arroubos de 1808 e 1817, a família trilhou um caminho mais conservador, apoiando Pedro I contra a Confederação do Equador (1824) e dali foram tecendo alianças e ocupando espaços políticos que, explica Paulo Cadena, tiveram correspondência direta com o sucesso econômico dos anos seguintes. Os Cavalcanti e seus aliados ocuparam imensos cargos e posições constituindo-se numa oligarquia sem par na história de Pernambuco.

A história de formação de potentados locais e da elite política no Brasil Império é fascinante, sobretudo quando associada a processos mais amplos, como a Independência do Brasil, que, nas províncias, não foi um processo homogêneo, unidirecional. No Piauí, o anochave foi 1823, quando as tropas leais a Portugal foram definitivamente expulsas por um exército patriota, articulado pelas elites locais, com intensa participação dos grupos populares. Gente que, em sua maioria, era motivada por um discurso de nacionalidade construído ali mesmo em meio aos acontecimentos. É isso que nos mostra em detalhe o artigo de Johny Santana de Araújo, ao fazer um estudo de caso sobre a Independência, no qual evidencia a posição estratégica do Piauí, como uma “região de fronteira” entre o novo Império do Brasil e a nova Colônia portuguesa no norte. Menos de um ano depois dos eventos de 1823, as lideranças políticas que haviam tomado parte no processo de independência no Piauí, estavam divididas entre jurar a nova Constituição, promulgada por Pedro I, ou aderir à “república pernambucana”: a Confederação do Equador.

Nesses processos, a violenta cisão entre as elites locais, abria espaço para que outros protagonistas atuassem de forma mais incisiva na cena política maior, esgarçando ou mesmo rompendo relações clientelistas consolidadas pelas contingências locais. Na Confederação do Equador estava em debate (e em conflito) projetos políticos divergentes, conferindo outras dimensões ao jogo político entre os potentados locias e as demais camadas e estratos da sociedade. Assim, em Pernambuco e Alagoas, os acontecimentos de 1824 atingiram e envolveram também a população indígena. É este o tema do artigo de Mariana Albuquerque Dantas, que analisa com precisão a participação dos aldeamentos de Barreiros e Cimbres (em Pernambuco) e Jacuípe (em Alagoas) nos conflitos armados daquele ano. A partir de suas próprias demandas – a defesa da terra das aldeias, a administração desses espaços e a oposição ao recrutamento – a população indígena posicionou-se diante dos debates sobre projetos políticos coevos. Mesmo que enleados nas malhas do clientelismo local, os índios aldeados foram protagonistas de sua própria história naquele momento crucial do processo de formação do Estado nacional brasileiro.

O artigo seguinte é de autoria de Lídia Rafaela Nascimento dos Santos que contempla o leitor com um estudo sobre as festas comemorativas do Sete de Setembro no Recife em 1829. Embora tenha sido uma tradição inventada em 1826 por uma lei que definiu as datas cívicas da nova nação, esta foi a primeira vez que aquela celebração foi registrada e debatida pela imprensa de Pernambuco. O texto apresenta um repertório de interpretações coevas sobre aquele momento, quando a cidade inteira viu-se envolvida nas solenidades que contou com cortejos, carros alegóricos, ruas e praças apinhadas de gente. Mas nada era linear, unívoco. Cada detalhe era significado à sua maneira pelos diferentes agentes enredados nas tramas das festas. As diferentes facções políticas manifestavam-se através da imprensa e participavam, ou não, dos diversos eventos programados, conforme seus poderes relativos, suas opiniões e lealdades. A cidade ainda vivia o rescaldo dos movimentos de 1817 e 1824. Eram muitas as discordâncias, veladas ou não, expressas nos periódicos, que posicionavam-se de forma crítica sobre o que ocorria na cidade. A festa não era apenas uma festa, era muito mais.

Maria Luiza Ferreira de Oliveira inova estudando as guerras nas matas entre Alagoas e Pernambuco na década de 1840, construindo uma nova periodização e uma narrativa singular daqueles eventos. Seu texto mostra que os cabanos não foram totalmente derrotados em 1835, pois a luta ainda iria continuar na década seguinte até a prisão final de Vicente de Paula e de Pedro Ivo, em 1850, e a fundação de duas colônias militares na região, uma em cada província. A gente das matas agia dentro de uma lógica própria. É preciso perscrutá-la para entender suas motivações, seu envolvimento numa guerra sem fim. Mas além dos combates corpo a corpo, das incontáveis mortes, a autora percebe uma outra luta na imprensa e no debate político partidário pela construção de uma memória daqueles acontecimentos e das pessoas envolvidas. Os conservadores tentaram despolitizar o debate público, mostra a autora, celebrando os “melhoramentos materiais” dos anos 1850 em confronto com o que seria um Brasil selvagem, incivilizado. Pedro Ivo desponta como o personagem mais disputado, apontado como herói ou bandido, como símbolo de um liberalismo purista ou um reles desertor das tropas imperiais. Essa luta pela memória foi, principalmente, política, indo além do que permite entender uma cronologia estática dos fatos. É essa a trama tecida nesse instigante texto.

Só resta aos organizadores deste dossiê agradecer aos autores que possibilitaram manter acesa a discussão sobre o tema Nação, cidadania, insurgência e práticas políticas, 1817-1848.

Marcus J. M. de Carvalho – UFPE.

Bruno Augusto Dornelas Câmara – UPE.


CARVALHO, Marcus J. M. de; CÂMARA, Bruno Augusto Dornelas. Apresentação. CLIO – Revista de pesquisa histórica, Recife, v.33, n.2, jul / dez, 2015. Acessar publicação original [DR]

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Nação, cidadania, insurgências e práticas políticas, 1817-1848-parte 2 / Clio – Revista de Pesquisa Histórica / 2015

Esta segunda parte do dossiê Nação, cidadania, insurgência e práticas políticas, 1817- 1848, mais uma vez, aborda a história social e política daquele momento-chave da formação da nacionalidade e da consolidação do império do Brasil, que costumava ser chamado pela historiografia tradicional de “Ciclo das Insurreições Liberais do Nordeste”. Mesmo tendo esse vínculo comum, os artigos abordam objetos diversos, enriquecendo assim nossa compreensão sobre o período e sobre a temática do dossiê. Nas páginas seguintes, estudaremos: a constituição de uma família que tinha um projeto de ascensão à elite política do Império; o conturbado processo de independência nas “províncias do norte”; a participação de índios aldeados nas lutas da Confederação do Equador; o jogo político das primeiras celebrações do Sete de Setembro, e, finalmente, os confrontos armados envolvendo as populações florestais nas matas de Jacuípe na primeira metade do dezenove.

Abre o dossiê o instigante artigo de Paulo Henrique Fontes Cadena, que desvenda a trajetória política e financeira dos Cavalcanti de Albuquerque desde 1801, quando os irmãos Francisco, Luís e José protagonizaram a trama conhecida como Conspiração dos Suassuna (nome do engenho da família). Em 1817, Francisco (o Coronel Suassuna), e seus filhos participaram da revolução que estourou no Nordeste. O autor analisa os problemas financeiros que rondavam o cotidiano dos Cavalcanti, levando-os a tomar posições opostas ao governo. Todos os seis filhos do Coronel envolveram-se na política brasileira. O mais destacado deles, Antonio Francisco de Paula e Hollanda Cavalcanti de Albuquerque, o Hollanda dos anais do parlamento brasileiro, quase foi regente em 1835 ao concorrer com Feijó. Depois dos arroubos de 1808 e 1817, a família trilhou um caminho mais conservador, apoiando Pedro I contra a Confederação do Equador (1824) e dali foram tecendo alianças e ocupando espaços políticos que, explica Paulo Cadena, tiveram correspondência direta com o sucesso econômico dos anos seguintes. Os Cavalcanti e seus aliados ocuparam imensos cargos e posições constituindo-se numa oligarquia sem par na história de Pernambuco.

A história de formação de potentados locais e da elite política no Brasil Império é fascinante, sobretudo quando associada a processos mais amplos, como a Independência do Brasil, que, nas províncias, não foi um processo homogêneo, unidirecional. No Piauí, o anochave foi 1823, quando as tropas leais a Portugal foram definitivamente expulsas por um exército patriota, articulado pelas elites locais, com intensa participação dos grupos populares. Gente que, em sua maioria, era motivada por um discurso de nacionalidade construído ali mesmo em meio aos acontecimentos. É isso que nos mostra em detalhe o artigo de Johny Santana de Araújo, ao fazer um estudo de caso sobre a Independência, no qual evidencia a posição estratégica do Piauí, como uma “região de fronteira” entre o novo Império do Brasil e a nova Colônia portuguesa no norte. Menos de um ano depois dos eventos de 1823, as lideranças políticas que haviam tomado parte no processo de independência no Piauí, estavam divididas entre jurar a nova Constituição, promulgada por Pedro I, ou aderir à “república pernambucana”: a Confederação do Equador.

Nesses processos, a violenta cisão entre as elites locais, abria espaço para que outros protagonistas atuassem de forma mais incisiva na cena política maior, esgarçando ou mesmo rompendo relações clientelistas consolidadas pelas contingências locais. Na Confederação do Equador estava em debate (e em conflito) projetos políticos divergentes, conferindo outras dimensões ao jogo político entre os potentados locias e as demais camadas e estratos da sociedade. Assim, em Pernambuco e Alagoas, os acontecimentos de 1824 atingiram e envolveram também a população indígena. É este o tema do artigo de Mariana Albuquerque Dantas, que analisa com precisão a participação dos aldeamentos de Barreiros e Cimbres (em Pernambuco) e Jacuípe (em Alagoas) nos conflitos armados daquele ano. A partir de suas próprias demandas – a defesa da terra das aldeias, a administração desses espaços e a oposição ao recrutamento – a população indígena posicionou-se diante dos debates sobre projetos políticos coevos. Mesmo que enleados nas malhas do clientelismo local, os índios aldeados foram protagonistas de sua própria história naquele momento crucial do processo de formação do Estado nacional brasileiro.

O artigo seguinte é de autoria de Lídia Rafaela Nascimento dos Santos que contempla o leitor com um estudo sobre as festas comemorativas do Sete de Setembro no Recife em 1829. Embora tenha sido uma tradição inventada em 1826 por uma lei que definiu as datas cívicas da nova nação, esta foi a primeira vez que aquela celebração foi registrada e debatida pela imprensa de Pernambuco. O texto apresenta um repertório de interpretações coevas sobre aquele momento, quando a cidade inteira viu-se envolvida nas solenidades que contou com cortejos, carros alegóricos, ruas e praças apinhadas de gente. Mas nada era linear, unívoco. Cada detalhe era significado à sua maneira pelos diferentes agentes enredados nas tramas das festas. As diferentes facções políticas manifestavam-se através da imprensa e participavam, ou não, dos diversos eventos programados, conforme seus poderes relativos, suas opiniões e lealdades. A cidade ainda vivia o rescaldo dos movimentos de 1817 e 1824. Eram muitas as discordâncias, veladas ou não, expressas nos periódicos, que posicionavam-se de forma crítica sobre o que ocorria na cidade. A festa não era apenas uma festa, era muito mais.

Maria Luiza Ferreira de Oliveira inova estudando as guerras nas matas entre Alagoas e Pernambuco na década de 1840, construindo uma nova periodização e uma narrativa singular daqueles eventos. Seu texto mostra que os cabanos não foram totalmente derrotados em 1835, pois a luta ainda iria continuar na década seguinte até a prisão final de Vicente de Paula e de Pedro Ivo, em 1850, e a fundação de duas colônias militares na região, uma em cada província. A gente das matas agia dentro de uma lógica própria. É preciso perscrutá-la para entender suas motivações, seu envolvimento numa guerra sem fim. Mas além dos combates corpo a corpo, das incontáveis mortes, a autora percebe uma outra luta na imprensa e no debate político partidário pela construção de uma memória daqueles acontecimentos e das pessoas envolvidas. Os conservadores tentaram despolitizar o debate público, mostra a autora, celebrando os “melhoramentos materiais” dos anos 1850 em confronto com o que seria um Brasil selvagem, incivilizado. Pedro Ivo desponta como o personagem mais disputado, apontado como herói ou bandido, como símbolo de um liberalismo purista ou um reles desertor das tropas imperiais. Essa luta pela memória foi, principalmente, política, indo além do que permite entender uma cronologia estática dos fatos. É essa a trama tecida nesse instigante texto.

Só resta aos organizadores deste dossiê agradecer aos autores que possibilitaram manter acesa a discussão sobre o tema Nação, cidadania, insurgência e práticas políticas, 1817-1848.

Marcus J. M. de Carvalho – UFPE.

Bruno Augusto Dornelas Câmara – UPE.


CARVALHO, Marcus J. M. de; CÂMARA, Bruno Augusto Dornelas. Apresentação. CLIO – Revista de pesquisa histórica, Recife, v.33, n.2, jul / dez, 2015. Acessar publicação original [DR]

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Nação, cidadania, insurgências e práticas políticas, 1817-1848 (I) / Clio – Revista de Pesquisa Histórica / 2015

Foi na primeira metade do dezenove que ocorreu uma série de eventos, que a historiografia tradicional costumava chamar de forma um tanto quanto acrítica de “Ciclo das Insurreições Liberais do Nordeste”. Longe de se limitar apenas a esse pedaço do Brasil, aquele foi um momento marcante para a formação política e social da Nação em seus primeiros e decisivos anos de construção. Anos esses de fundação (para não dizer também de descolonização), organização, afirmação e consolidação do Estado Nação. Aqueles acontecimentos em suas múltiplas articulações são ainda reveladores das noções de nacionalidade e cidadania que foram se constituindo entre a chegada da família real e a década de 1850, a melhor década de Pedro II, segundo o monarquista Joaquim Nabuco. Ficaram claros processos políticos e sociais complexos, que sem a explosão de violência, sem a panfletagem, sem a repressão brutal, talvez tivessem ficado abafados pelas paredes dos centros de decisão nas províncias e na corte.

Não surpreende, portanto, que esse período e temática tenham sempre atraído a atenção de tantos historiadores brasileiros e estrangeiros. Entender esse tal “Ciclo das Insurreições Liberais do Nordeste” – que nem sempre foi liberal e raramente tão limitado geograficamente – é uma boa chave para perscrutar processos mais amplos de formação de uma cultura política singular, moldada em meio a contradições e conflitos – tendo a escravidão como um pano de fundo que se espalhava por todo o palco da ação. Para além dos aspectos políticos e da violência desses movimentos insurrecionais que tanto chamaram a atenção dos observadores mais imediatistas, a historiografia vem se dedicando a outras nuances, a outros processos que ocorreram dentro ou de forma paralela aos grandes acontecimentos políticos da primeira metade do século XIX. As balizas cronológicas desse dossiê englobam, portanto, momentos cruciais da construção da nacionalidade, da consolidação da monarquia bragantina, do apogeu do contrabando de cativos da África, ao transitar e buscar entender vários movimentos contestatórios que envolveram distintas camadas sociais em turbilhões explicáveis, desde que admitido o debate, a discordância, a pesquisa sempre inconclusa porque está sempre a recomeçar.

Atualmente, a já anunciada efeméride dos 200 anos da Revolução de 1817 constitui-se um poderoso fator de aglutinação de pesquisas sobre esses acontecimentos, “momentos de perigo” como dizia a historiografia mais antiga, da primeira metade do século XIX. Longe das comemorações oficiais e dos discursos laudatórios que estão por vir, a intenção deste dossiê, intitulado Nação, cidadania, insurgências e práticas políticas, 1817-1848, é justamente abordar o que realmente interessa para a comunidade acadêmica e para a sociedade em geral: fazer público e acessível a todos os novos estudos sobre esse período. O que o leitor apreciará aqui é um panorama do estado da discussão, do avanço das pesquisas a partir da compreensão mais ampla da história das insurreições, da cultura política e da cidadania no Brasil Império. Esses trabalhos, frutos da consolidação dos programas de Pós-Graduação no país, contribuem para uma melhor compreensão da história política e social do Brasil e abrem janelas para outros estudos, sucessivamente, avançando o debate, como deve ocorrer na aventura da busca pelo conhecimento histórico.

Sendo muitos os artigos, foi decidido dividir o dossiê em dois volumes. Neste primeiro volume, abre o dossiê o artigo de um veterano historiador dos movimentos sociais e políticos da primeira metade do século XIX. Flávio Cabral levará o leitor a percorrer os caminhos da minuciosa atuação diplomática nos Estados Unidos do comerciante Antônio Gonçalves da Cruz, o Cabugá, como emissário do governo revolucionário de 1817. Contrariando a historiografia que diminuía a importância dessa e de outras missões diplomáticas promovidas pelo governo revolucionário, Flávio discute o legado dessa missão, que esteve longe de ser frustrada, insignificante ou sem uma visão política mais ampla. Segundo o autor, Cabugá teve trânsito livre entre políticos e autoridades norteamericanos: celebrou tratados de comércio, acordos diplomáticos, fez articulações com pessoas influentes e com militares franceses exilados naquele país que serviram a Napoleão Bonaparte, comprou armamentos, munições e alimentos. Fez ainda propaganda positiva da revolução e da jovem república instalada no Nordeste do Brasil. Como ressalta Flávio, mil oitocentos e dezessete diverge de outros movimentos brasileiros, pois talvez nenhum outro tenha tido tanta repercussão no exterior.

Se Flávio faz um retrato preciso da experiência diplomática de uma das figuras mais emblemáticas de 1817, este dossiê não ficaria completo sem um estudo da gente comum que se envolveu nas querelas políticas daqueles tempos. O artigo do jovem historiador Wanderson Édipo de França, fruto de sua recém-defendida dissertação de mestrado, busca entender a participação do povo na política nacional, tendo como pano de fundo os acontecimentos de 1817 e da Confederação do Equador, em 1824. A própria expressão “povo”, escrita entre aspas, é um conceito que o autor vai tentar delinear no contexto da época. São objeto de sua pesquisa as práticas políticas das pessoas mais simples, suas condutas, questionamentos e incertezas. Essas pessoas, que se constituíam no “povo de Pernambuco”, não se curvaram às convenções e lutaram à sua maneira para construir suas próprias noções de pátria e cidadania.

O processo de construção da Nação foi marcado por inúmeros embates entre autoridades locais e agentes do governo central. Em 1831, com a abdicação de Pedro I e a implantação da Regência, outros pontos e detalhes dessa relação foram se constituindo. Porém, longe de ser um processo pacífico e cordato, o que se viu foi o aumento das tensões. Entender esse processo é o que propõe Manoel Nunes Cavalcanti Junior, em um artigo em que revisita as Carneiradas, uma sucessão de motins orquestrados pelos irmãos Francisco Carneiro Machado Rios e Antônio Carneiro Machado Rios. Ocorrida nas ruas do Recife no tumultuado ano de 1835, as Carneiradas um reflexo da disputa entre as facções políticas que lutavam pelo poder local. Um processo bipolar que tinha ressonância na Corte do Rio de Janeiro e era influenciado pelo que ocorria lá. As intrínsecas relações entre poder local e política partidária ganhavam novos contornos naqueles embates.

Na década de 1840, liberais e conservadores vivenciaram suas divergências na imprensa que mobilizou inúmeros escritores públicos. Ariel Feldman analisa a imprensa que antecede a Insurreição Praieira (1848 / 49), estudando produção jornalística do Padre Lopes Gama, entre 1845 e 1846. Os jornais e pasquins serviam para mobilizar votantes e não votantes, atingindo até as paróquias do interior. Mas era no Recife que estava o maior colégio eleitoral, o palco de inúmeras disputas e onde a pena afinada de Lopes Gama atuava com mais precisão. Ariel destaca a grande dificuldade do partido que não era situação para chegar ao poder, já que a máquina eleitoral era controlada pela presidência da província e seus representantes nas localidades. Diante das dificuldades, a oposição usava várias estratégias para arregimentar votantes. A imprensa de caráter popular era uma delas. Em seus escritos, Lopes Gama conclama o povo a participar mais da vida política da província, assumindo um jornalismo mais popular visando atingir setores mais amplos da população. Uma de suas estratégias era o uso de versos rimados para discutir política. Versos que mexiam com os sentimentos e imaginário popular.

A primeira parte deste dossiê fecha com um artigo de Renata Saavedra sobre a Guerra dos Maribondos, uma série de revoltas populares contra o registro civil e o censo geral do Império, entre dezembro de 1851 e janeiro de 1852, envolvendo povoações do interior de Pernambuco, Paraíba, Sergipe, Alagoas e Ceará. O governo imperial não imaginou que a população rural pobre interpretasse aquelas medidas como uma tentativa de (re)escravizar a população não branca. Além da destruição dos papéis com esses editais, houve depredações nos povoados, engenhos foram atacados, autoridades presas e pelo menos um juiz de paz morreu nos conflitos. Para além da violência desses motins, a autora faz uma sucinta descrição do repertório de mobilização e luta dos homens livres pobres, discutindo as noções de justiça coevas, contrárias a uma cidadania imposta “de cima para baixo”, que não respeitava os costumes e os valores tradicionais daquela população. Rediscutindo a historiografia sobre a gente livre pobre no Brasil imperial, a autora busca entender as dimensões políticas dessa revolta popular.

Só resta aos organizadores deste dossiê agradecer aos autores que possibilitaram acender tantas discussões neste número da Clio.

Marcus J. M. de Carvalho – UFPE.

Bruno Augusto Dornelas Câmara – UPE.


CARVALHO, Marcus J. M. de; CÂMARA, Bruno Augusto Dornelas. Apresentação. CLIO – Revista de pesquisa histórica, Recife, v.33, n.1, jan / jun, 2015. Acessar publicação original [DR]

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Nação, cidadania, insurgências e práticas políticas, 1817-1848 (Parte 1) / Clio – Revista de Pesquisa Histórica / 2015

Foi na primeira metade do dezenove que ocorreu uma série de eventos, que a historiografia tradicional costumava chamar de forma um tanto quanto acrítica de “Ciclo das Insurreições Liberais do Nordeste”. Longe de se limitar apenas a esse pedaço do Brasil, aquele foi um momento marcante para a formação política e social da Nação em seus primeiros e decisivos anos de construção. Anos esses de fundação (para não dizer também de descolonização), organização, afirmação e consolidação do Estado Nação. Aqueles acontecimentos em suas múltiplas articulações são ainda reveladores das noções de nacionalidade e cidadania que foram se constituindo entre a chegada da família real e a década de 1850, a melhor década de Pedro II, segundo o monarquista Joaquim Nabuco. Ficaram claros processos políticos e sociais complexos, que sem a explosão de violência, sem a panfletagem, sem a repressão brutal, talvez tivessem ficado abafados pelas paredes dos centros de decisão nas províncias e na corte.

Não surpreende, portanto, que esse período e temática tenham sempre atraído a atenção de tantos historiadores brasileiros e estrangeiros. Entender esse tal “Ciclo das Insurreições Liberais do Nordeste” – que nem sempre foi liberal e raramente tão limitado geograficamente – é uma boa chave para perscrutar processos mais amplos de formação de uma cultura política singular, moldada em meio a contradições e conflitos – tendo a escravidão como um pano de fundo que se espalhava por todo o palco da ação. Para além dos aspectos políticos e da violência desses movimentos insurrecionais que tanto chamaram a atenção dos observadores mais imediatistas, a historiografia vem se dedicando a outras nuances, a outros processos que ocorreram dentro ou de forma paralela aos grandes acontecimentos políticos da primeira metade do século XIX. As balizas cronológicas desse dossiê englobam, portanto, momentos cruciais da construção da nacionalidade, da consolidação da monarquia bragantina, do apogeu do contrabando de cativos da África, ao transitar e buscar entender vários movimentos contestatórios que envolveram distintas camadas sociais em turbilhões explicáveis, desde que admitido o debate, a discordância, a pesquisa sempre inconclusa porque está sempre a recomeçar.

Atualmente, a já anunciada efeméride dos 200 anos da Revolução de 1817 constitui-se um poderoso fator de aglutinação de pesquisas sobre esses acontecimentos, “momentos de perigo” como dizia a historiografia mais antiga, da primeira metade do século XIX. Longe das comemorações oficiais e dos discursos laudatórios que estão por vir, a intenção deste dossiê, intitulado Nação, cidadania, insurgências e práticas políticas, 1817-1848, é justamente abordar o que realmente interessa para a comunidade acadêmica e para a sociedade em geral: fazer público e acessível a todos os novos estudos sobre esse período. O que o leitor apreciará aqui é um panorama do estado da discussão, do avanço das pesquisas a partir da compreensão mais ampla da história das insurreições, da cultura política e da cidadania no Brasil Império. Esses trabalhos, frutos da consolidação dos programas de Pós-Graduação no país, contribuem para uma melhor compreensão da história política e social do Brasil e abrem janelas para outros estudos, sucessivamente, avançando o debate, como deve ocorrer na aventura da busca pelo conhecimento histórico.

Sendo muitos os artigos, foi decidido dividir o dossiê em dois volumes.

Neste primeiro volume, abre o dossiê o artigo de um veterano historiador dos movimentos sociais e políticos da primeira metade do século XIX. Flávio Cabral levará o leitor a percorrer os caminhos da minuciosa atuação diplomática nos Estados Unidos do comerciante Antônio Gonçalves da Cruz, o Cabugá, como emissário do governo revolucionário de 1817. Contrariando a historiografia que diminuía a importância dessa e de outras missões diplomáticas promovidas pelo governo revolucionário, Flávio discute o legado dessa missão, que esteve longe de ser frustrada, insignificante ou sem uma visão política mais ampla. Segundo o autor, Cabugá teve trânsito livre entre políticos e autoridades norteamericanos: celebrou tratados de comércio, acordos diplomáticos, fez articulações com pessoas influentes e com militares franceses exilados naquele país que serviram a Napoleão Bonaparte, comprou armamentos, munições e alimentos. Fez ainda propaganda positiva da revolução e da jovem república instalada no Nordeste do Brasil. Como ressalta Flávio, mil oitocentos e dezessete diverge de outros movimentos brasileiros, pois talvez nenhum outro tenha tido tanta repercussão no exterior.

Se Flávio faz um retrato preciso da experiência diplomática de uma das figuras mais emblemáticas de 1817, este dossiê não ficaria completo sem um estudo da gente comum que se envolveu nas querelas políticas daqueles tempos. O artigo do jovem historiador Wanderson Édipo de França, fruto de sua recém-defendida dissertação de mestrado, busca entender a participação do povo na política nacional, tendo como pano de fundo os acontecimentos de 1817 e da Confederação do Equador, em 1824. A própria expressão “povo”, escrita entre aspas, é um conceito que o autor vai tentar delinear no contexto da época. São objeto de sua pesquisa as práticas políticas das pessoas mais simples, suas condutas, questionamentos e incertezas. Essas pessoas, que se constituíam no “povo de Pernambuco”, não se curvaram às convenções e lutaram à sua maneira para construir suas próprias noções de pátria e cidadania.

O processo de construção da Nação foi marcado por inúmeros embates entre autoridades locais e agentes do governo central. Em 1831, com a abdicação de Pedro I e a implantação da Regência, outros pontos e detalhes dessa relação foram se constituindo. Porém, longe de ser um processo pacífico e cordato, o que se viu foi o aumento das tensões. Entender esse processo é o que propõe Manoel Nunes Cavalcanti Junior, em um artigo em que revisita as Carneiradas, uma sucessão de motins orquestrados pelos irmãos Francisco Carneiro Machado Rios e Antônio Carneiro Machado Rios. Ocorrida nas ruas do Recife no tumultuado ano de 1835, as Carneiradas um reflexo da disputa entre as facções políticas que lutavam pelo poder local. Um processo bipolar que tinha ressonância na Corte do Rio de Janeiro e era influenciado pelo que ocorria lá. As intrínsecas relações entre poder local e política partidária ganhavam novos contornos naqueles embates.

Na década de 1840, liberais e conservadores vivenciaram suas divergências na imprensa que mobilizou inúmeros escritores públicos. Ariel Feldman analisa a imprensa que antecede a Insurreição Praieira (1848 / 49), estudando produção jornalística do Padre Lopes Gama, entre 1845 e 1846. Os jornais e pasquins serviam para mobilizar votantes e não votantes, atingindo até as paróquias do interior. Mas era no Recife que estava o maior colégio eleitoral, o palco de inúmeras disputas e onde a pena afinada de Lopes Gama atuava com mais precisão. Ariel destaca a grande dificuldade do partido que não era situação para chegar ao poder, já que a máquina eleitoral era controlada pela presidência da província e seus representantes nas localidades. Diante das dificuldades, a oposição usava várias estratégias para arregimentar votantes. A imprensa de caráter popular era uma delas. Em seus escritos, Lopes Gama conclama o povo a participar mais da vida política da província, assumindo um jornalismo mais popular visando atingir setores mais amplos da população. Uma de suas estratégias era o uso de versos rimados para discutir política. Versos que mexiam com os sentimentos e imaginário popular.

A primeira parte deste dossiê fecha com um artigo de Renata Saavedra sobre a Guerra dos Maribondos, uma série de revoltas populares contra o registro civil e o censo geral do Império, entre dezembro de 1851 e janeiro de 1852, envolvendo povoações do interior de Pernambuco, Paraíba, Sergipe, Alagoas e Ceará. O governo imperial não imaginou que a população rural pobre interpretasse aquelas medidas como uma tentativa de (re)escravizar a população não branca. Além da destruição dos papéis com esses editais, houve depredações nos povoados, engenhos foram atacados, autoridades presas e pelo menos um juiz de paz morreu nos conflitos. Para além da violência desses motins, a autora faz uma sucinta descrição do repertório de mobilização e luta dos homens livres pobres, discutindo as noções de justiça coevas, contrárias a uma cidadania imposta “de cima para baixo”, que não respeitava os costumes e os valores tradicionais daquela população. Rediscutindo a historiografia sobre a gente livre pobre no Brasil imperial, a autora busca entender as dimensões políticas dessa revolta popular.

Só resta aos organizadores deste dossiê agradecer aos autores que possibilitaram acender tantas discussões neste número da Clio.

Marcus J. M. de Carvalho – UFPE.

Bruno Augusto Dornelas Câmara – UPE.


CARVALHO, Marcus J. M. de; CÂMARA, Bruno Augusto Dornelas. Apresentação. CLIO – Revista de pesquisa histórica, Recife, v.33, n.1, jan / jun, 2015. Acessar publicação original [DR]

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Mulheres, práticas políticas e gênero: História(s), Vivência(s) e Experiência(s) do(s) feminino(s) / História Revista / 2014

A introdução dos estudos de gênero no Brasil encontrou campo fértil na história das mulheres, caracterizada como uma produção de saber interdisciplinar, que ganhou consistência nos anos de 1970. As pesquisas envolveram esforços de historiadoras, sociólogas e antropólogas, feministas que tiveram coragem de dar voz às mulheres, retirá-las do apagamento e do silêncio da História, destacando as “vivências comuns, os trabalhos, as lutas, as sobrevivências e as resistências das mulheres no passado” (PEDRO, 2005, p.85). Nesse avanço das lutas sociais e das críticas feministas, tem vazão a controvérsia em torno da história das mulheres, que parecia sinalizar a exaustão da categoria mulher, vista, muitas vezes, como generalizada e universal. Abria-se, então, o campo para os gender studies ou o estudo das relações de gênero, que ganharam relevância nos Estudos Unidos, no início dos anos 1990 (RAGO, 1998, p.89).

A partir disso, abriu-se um campo de pesquisa interdisciplinar que busca compreender como se constituem o masculino e o feminino cultural e historicamente, na perspectiva das relações de gênero. A introdução dessa categoria iluminou a análise ao incorporar à experiência a dimensão da sexualidade e das identidades construídas, contrapondo-se à tendência de se pensar a identidade sexual como algo biologicamente dado (NICOLSON, 2000, p.9).

Dentre as contribuições do conceito de gênero, destacam-se: a rejeição ao determinismo biológico implícito no uso de termos como sexo ou diferença sexual; a dimensão relacional entre as mulheres e os homens, indicando que nenhuma compreensão de qualquer um dos dois sexos poderia existir sem um estudo que os tomasse em separado; a ênfase no caráter social e cultural das distinções baseadas no sexo, que contribuiu para desnaturalizar o discurso biológico; a dimensão das relações de poder que perpassa as assimetrias e hierarquias nas relações entre homens e mulheres (SOIHET e COSTA, 2008, p.43). Como Jane Flax (1991, p.226) afirma, a problematização das relações de gênero consiste no mais importante avanço isolado da e na teoria feminista no final do século XX. Definitivamente, inaugura-se um novo paradigma para compreensão da História.

O presente dossiê representa e confirma a importância e a abundância de pesquisas em torno da temática das relações de Gênero na História. As pesquisas pretendem compreender como as vivências e experiências de mulheres e homens questionaram / conformaram / inventaram a profunda desigualdade nas relações de gêneros, e simultaneamente espaços e lugares públicos e privados interditados e repensados. As construções sociais, históricas e culturais em torno dessa rede simbólica é, muitas vezes, composta de silêncios ratificados em discursos que buscam naturalizar a diferença, significados criados politicamente e necessariamente imprecisos (SCOTT, 2012).

Alcileide Cabral do Nascimento e Alexandre Vieira da Silva Melo fazem uma profícua parceria no artigo “Melindrosas em revista: Gênero e sociabilidades do início do século XX (Recife, 1919-1929) ao analisar o corpo feminino e suas ressignificações através da figura da Melindrosa – personagem instigante e amendrontadora da ordem de gênero – na moderna Recife da Primeira República.

Ana Maria Colling e Losandro Tedeschi abordam as questões sobre “Os Direitos Humanos e as questões de Gênero” analisando a desigualdade de gênero como “uma afronta à igualização proposta pelos Direitos Humanos desde a sua fundação no século XVIII”. Violência, direito à cidadania e espaços conquistados por mulheres ultrapassam assim fronteiras políticas para tentarem realizar um espaço de vivências igualitárias e democráticas, que deveriam ser asseguradas às mulheres, mas as disputas de poder das relações de gênero nos mostram que a história é repleta de conflitos e exceções.

Maria Izilda de Santos Matos nos brindou com o trabalho “Maria Prestes Maia: trajetória, luta política e feminista na qual investiga a importância da esposa do prefeito e urbanista Francisco Prestes Maia em meados do século XX – Maria Prestes Maia, imigrante lusa – nas atividades políticas, sociais, sua atuação na Federação das Mulheres no Brasil e como sua influência pode ter tido relevância para o traçado urbano de São Paulo efetivado pelo “Plano Avenidas”.

No artigo “Mulher, casamento e trabalho: um triângulo que não fecha?” de Maria Beatriz Nader embarcamos para outra cidade brasileira: Vitória e suas transformações nas três últimas décadas do século XX. A participação das mulheres nesse desenfreado processo de implantação de grandes indústrias, aumento populacional e econômico, sofre intensas mudanças, pois o mercado de trabalho rompe, ou pelo menos esgarça a tessitura do bordado tradicional do destino feminino de casamento e família.

Gleidiane de Sousa Ferreira aponta que o debate sobre o feminismo não é apenas nacional, mas internacional. Sua contribuição ao apresentar elementos de atuação política do Mujeres creando, grupo de atuação feminista anarquista boliviano desde 1992, é literalmente um espaço de reflexão sobre o que significa pensar as práticas do feminismo nos dias contemporâneos. Seu artigo “Produzir conhecimento sobre si mesmas: uma reflexão histórica sobre práticas feministas autônomas na Bolívia”, aborda as diversas formas de comunicação estabelecidas por essas mulheres, tendo como ponto de partida a noção de “tomar la palabra”: escrita teórica, rádio independente, o jornal alternativo, arte de rua.

“Tomar la palabra!”. É o que queremos e esperamos. Aproveitem os textos sobre práticas políticas e gênero e que destes surjam outras e tantas mais História(s), Vivência(s) e Experiência(s) do(s) feminino(s)!

Referências

FLAX, Jane. Pós-moderno e relações de gênero na teoria feminista. In: BUARQUE DE HOLANDA, Heloísa (Org.). Pós-modernidade e política. Rio de Janeiro: Rocco, 1991. p.217-250.

NICOLSON, Linda. Interpretando o gênero. Estudos Feministas, Florianópolis, v.8, n.2, p.9-41, 2000.

SCOTT, JOAN W. Os usos e abusos do gênero. Tradução: Ana Carolina Eiras Coelho Soares. Projeto História, São Paulo, n. 45, pp. 327-351, Dez. 2012.

SOIHET, Rachel e COSTA, Suely Gomes. Interdisciplinaridade: história das mulheres e estudos de gênero. Gragoatá, Niterói, n.25, p.29-49, 2008.

Alcileide Cabral do Nascimento – Professora Doutora em História da Universidade Federal Rural de Pernambuco; Coordenadora Nacional do Gt de Gênero ANPUH; Coordenadora do Núcleo de Pesquisas e Estudos em Gênero / NUPEGE / UFRPE / CNPq.

Ana Carolina Eiras Coelho Soares – Professora Adjunta do Programa de Pós-Graduação em História e da Faculdade de História da Universidade Federal de Goiás; Coordenadora do GT regional de Gênero – Seção Goiás; Coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisas em Gênero / FH-UFG / CNPq.


NASCIMENTO, Alcileide Cabral do; SOARES, Ana Carolina Eiras Coelho. Apresentação. História Revista. Goiânia, v. 19, n. 3, 2014. Acessar publicação original [DR]

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Práticas jurídicas, políticas e literárias / Revista Mosaico / 2013

A relação entre os historiadores e suas fontes tem sido objeto de debate intenso no âmbito da historiografia atual. O objetivo do dossiê práticas jurídicas, políticas e literárias é estabelecer um mosaico de reflexões sobre tal questão, por meio de trabalhos que versam acerca dos múltiplos temas relacionados a essa problemática, e que tem por objeto de análise fontes sobre o mundo antigo e medieval. Este é constituído por textos de vários pesquisadores oriundos de diversas universidades brasileiras que trabalham com esta temática, usando fontes várias como hagiografias, discursos literários e jurídicos.

Na segunda parte deste número da Mosaico, encontramos dois artigos que compõe com a reflexão sobre o mundo medieval, apresentando formas diferenciadas de interelação entre Filosofia, Literatura e o Direito. Por fim indicamos duas resenhas de obras atuais e bastante pertinentes que versam sobre o mundo antigo, medieval e o limiar da Idade Média. Esperamos que este número da Revista Mosaico encontre abrigo também entre novos leitores.

Renata Cristina de Sousa Nascimento – PUC Goiás

Ivoni Richter Reimer – PUC Goiás

Editoras deste número


NASCIMENTO, Renata Cristina de Sousa; REIMER, Ivoni Richter. Editorial. Revista Mosaico. Goiânia, v.6, n.2, jul. / dez., 2013. Acessar publicação original [DR]

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Políticas – Práticas e representações / Escritas / 2008

É com satisfação que iniciamos uma grande aventura editorial com a publicação da Revista Escritas, publicação do curso de Historia (UFT) do campus de Araguaína. Publicar uma revista requer esforço, coragem e dedicação, com o objetivo de difundir e vulgarizar o conhecimento cientifico. Isto deve ser o fruto da diligencia e da dedicação de pesquisadores empenhados em resolver ou apontar alternativas aos problemas vividos pela humanidade, tanto na dimensão do passado quanto no presente.

A presente Edição cobre um campo fundamental de conhecimento e saberes para o entendimento do mundo moderno ou – como querem alguns – contemporâneo: o da teoria e prática políticas. Assim, organizamos o primeiro número da revista em um Dossiê com pluralidade temática e enfoques teóricos e metodológicos diversificados. Contudo, não houve pretensão de esgotar o tema; como todos sabem, uma revista opera através de seleções, depuramentos e escolhas. Nesta primeira Edição, contemplamos também uma seção com artigos livres, ou melhor, que se vinculam indiretamente à temática do Dossiê. Nesta seção há também uma pluralidade temática, de objetos e de aspectos teórico-metodológicos.

Os autores e autoras utilizam como aporte de suas pesquisas a literatura, o romance, os dados de pesquisas e propagandas eleitorais, documentos sobre a lei de terras no Brasil; analisaram, também, os aspectos teóricos das correntes marxianas e da Nova Historia. Enfim, vagaram pela historia das ideias e das práticas políticas, discutiram os grupos sociais que influenciam e / ou influenciaram a sociedade na Idade Média, no Brasil Império e no transcurso da República; procuraram interpretar a história política a partir de processos e personagens. O Dossiê apresenta-se enriquecido sob diversos matizes, como o artigo de Flavia Aparecida Amaral Linhagem, território e memoria na Idade Media: o exemplo do Romance Mellusina ou então o texto de Charles Sidarta Machado Domingos A politica externa independente do governo João Goulart onde o autor procura demonstrar que a política empreendida pelo então presidente Joao Goulart acirrou as tensões existentes no Brasil nos anos 1960, no contexto da Guerra Fria.

Estes são dois exemplos da heterogeneidade e pluralismo que marcaram o primeiro Dossiê; porém, há um forte vínculo que unifica esses trabalhos, a saber: todos se orientam no sentido de aprofundar uma discussão sobre o poder político. O material utilizado pelos autores apresenta-se também variado e complexo: registros de jornais, romances históricos, obras historiográficas como aquelas analisadas no artigo instigante e filosófico de Marcos Baccega que trata de perscrutar os contornos do imaginário e do fetiche na obra de Karl Marx, O Capital. Ou, brilhante ensaio – quase autobiográfico – de Jose D’Assunção Barros “Historia Política: dos objetos tradicionais ao estudo dos micropoderes, do discurso e do imaginário” que procura discutir a relação entre o discurso e imagem e suas potencialidades inerentes ao poder. Não poderíamos deixar de destacar a análise feita por Cristiano Luís Christillino sobre as lutas das facções políticas de elite da Província de São Pedro do Rio Grande do Sul em torno da famosa Lei de Terras de 1850 no Brasil. Heterogêneos e plurais esses artigos expressam a variedade da produção historiográfica sobre o tema do Dossiê.

Os artigos livres revelam essa heterogeneidade e pluralismo de ideias, de temas, objetos e fontes. Os temas variam de aspectos religiosos como o tratado no artigo de Regina Célia Lima Caleiro e Frederico Alves Mota, como o tratado no texto de Alessandro de Almeida e Girlânio Gomes Corrêa sobre o romance e filme “Revolução dos Bichos” que discute a produção e circulação midiática desses produtos culturais; temos uma forte reflexão feita por Arilson dos Santos Gomes sobre o Primeiro Congresso Nacional do Negro ocorrido em Porto Alegre em 1958. Tal tema mostra o engajamento dos movimentos sociais negros no Brasil e, particularmente, no sul do país na primeira metade do século XX, tema sumamente importante para compreender assuntos como as ações afirmativas do movimento negro atual e, diversas temáticas relacionadas às lutas por igualdade política e social no país.

O tema da identidade retorna na Seção Livre da revista Escritas no artigo da professora Imgart Grützmann “A mágica flor azul: canções, romantismo, nostalgia e continuidade no germanismo” onde a autora se vale da literatura e de todo um aparato cultural para compreender a construção e consolidação dos laços étnico-culturais com a Alemanha. Ainda neste artigo, a autora procura mostrar aspectos de continuidade cultural entre o Brasil e a nação de origem dos germânicos residentes no Rio Grande do Sul, especialmente a partir da análise de jornais. Acultura romana desponta no excelente e novíssimo tema trabalhado por Daniel Barbo “O Homoerotismo e a cultura política falocêntrica na Atenas Clássica.”, em que o autor discute os processos de dominação da cultura masculina, levanta as principais características de uma cultura política no mundo clássico, sobretudo, analisa aspectos pouco destacados na tradição acadêmica que se debruça sobre história política da Grécia antiga.

O que se nota nessa primeira Edição da revista Escritas é que a política e seus desdobramentos foram amplamente inquiridos pelos autores a partir de um espectro vasto no tempo e no espaço. O ecletismo que essa Edição apresenta é marca do vigor da produção acadêmica e historiográfica sobre o tema. Outro lado importante que a publicação revela é que há muitos mitos, preconceitos e caminhos que precisam ser trilhados para superar uma visão uniforme e monolítica da política. Os artigos apontam para a necessidade de mais investigações e novas abordagens do universo da política superando uma visão institucionalizada e centralizada nas instituições e órgãos do Estado, e mesmo de instituições e grupos políticos partidários e sindicais da sociedade civil, ou seja, a política possui várias facetas e dimensões ainda passiveis de explorações e fascinantes descobertas. Boa leitura.

O Editor

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