Securing sex: morality and repression in the making of Cold War Brazil – COWAN (RTA)

COWAN, Benjamin A. Securing sex: morality and repression in the making of Cold War Brazil. Chapel Hill, NC: University of North Carolina Press, 2016. Resenha de: ZALUSKI, Jorge Luiz. Impressos, discursos e moralidade nos regimes autoritários instituídos no Brasil. Revista Tempo e Argumento, Florianópolis, v.12, n.29, e0501. jan./abr., 2020.

Atualmente, os regimes autoritários instituídos durante o século XX na América do Sul e na América Central constituem tema de muitas investigações científicas e, ainda, um profícuo campo de pesquisa na historiografia. No livro Securing sex: morality and repression in the making of Cold War Brazil, Benjamin A. Cowan apresenta uma interpretação sobre determinadas “facetas” dos regimes autoritários instituídos no Brasil, centrando o foco de sua análise na ditadura militar que governou o país entre 1964 e 1985. O autor é Doutor em História pela Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA) e realizou estudos sobre as temáticas relações de gênero, sexualidade, movimentos sociais da denominada direita e violências no século XX. Essa obra, que recebeu o prêmio da Associação de Estudos Latino-Americanos (Latino American Studies Association [LASA]) em 2017, ainda não tem tradução para o português.

Para a elaboração da narrativa histórica, o historiador analisou 35 impressos publicados no Brasil entre as décadas de 1930 e 1980. Dentre esses impressos se encontram os jornais O Estado de S. Paulo, Correio da Manhã e O Globo, que circulavam em diversos estados da federação. As revistas de informação, como Claudia, Veja, Manchete, e as revistas produzidas por instituições militares, com ênfase para A Defesa Nacional, Revista Militar Brasileira e Segurança e Desenvolvimento também fazem parte da documentação investigada. Tais impressos foram pesquisados pelo autor em várias instituições, com destaque para o Arquivo Nacional, o Arquivo Nacional do Exército, a Biblioteca da Academia Militar das Agulhas Negras e a Biblioteca do Exército.

A obra se divide em 7 capítulos, que têm como “fio condutor” as ações de diferentes naturezas adotadas por representantes do Estado brasileiro e pelos civis para combater o que foi considerado um “desvio moral” da população à época. O autor, no processo de construção da narrativa histórica, apoia-se no referencial conceitual relativo ao “pânico moral”, idealizado pelo sociólogo sul-africano Stanley Cohen na década de 1970. Benjamin A. Cowan afirma que as mudanças socioculturais ocorridas na sociedade brasileira na segunda metade do século XX geraram novas experiências que provocaram grande preocupação em grupos sociais identificados no campo da política como de direita.

O autor destaca que algumas premissas dos discursos autoritários e moralistas estão presentes na sociedade brasileira durante grande parte do século XX. No primeiro capítulo da obra, intitulado “Only for the cause of the pátria: the frustrations of interwar moralism” (tradução livre: Somente pela causa da pátria: as frustrações do moralismo no entreguerras), Cowan analisa como a política socioeconômica adotada no primeiro governo de Getúlio Vargas (1930-1945) contribuiu para instaurar em uma significativa parcela da população novas práticas e novos valores, que acabaram sendo alvo de questionamento por parte de intelectuais, religiosos, juristas e outros personagens identificados com a direita. Para Cowan, parte dos grupos sociais de direita, entre eles integrantes do Movimento Integralista e católicos, que associaram as novas práticas e os novos valores a 2 processos: a) ao comunismo; e b) a uma crise moral que colocava em xeque muitos dos “valores tradicionais da família brasileira” (aqui entendida como a configuração de família das elites), inclusive os relativos à masculinidade. Segundo o autor, o governo de Getúlio Vargas, especialmente durante a Ditadura do Estado Novo, como “resposta” ao referido quadro, optou por manter um estreito “diálogo” com os grupos sociais de direita, adotando políticas nos campos da educação escolar, da assistência social etc. que instituíam e/ou reforçavam uma configuração de família nuclear associada aos valores burgueses e com distinções de gênero Na década de 1960 e no início da década de 1970, a política socioeconômica implementada durante o “Milagre Econômico” pelos governantes da ditatura provocou novas mudanças no âmbito da família e das relações de gênero que foram alvo de questionamentos de grupos sociais de direita. No segundo capítulo da obra, intitulado “Sexual revolution? Contexts of countersubversive moralism” (tradução livre: Revolução sexual? Contextos do moralismo contrassubversivo), Cowan explora como se deu a aproximação entre os civis e os governantes militares, com o objetivo de combater os considerados subversivos. Por meio da análise das revistas Manchete e Realidade, o pesquisador observou que temas como juventude, sexualidade e moralismo estiveram no centro de debates públicos na década de 1960, muitas vezes associados aos discursos comunistas. O autor destaca que muitos jovens brasileiros das diferentes camadas sociais não estavam interessados nos debates públicos da época sobre família e sexualidade. Apesar desse fato, a produção de discursos para a “proteção” da família nuclear burguesa e de determinada perspectiva de sexualidade heteronormativa foi bastante grande. Esses discursos de cunho moralista incitaram a ampliação da vigilância sobre as escolas ginasiais e secundárias e as universidades, vistas como espaços privilegiados onde se propagavam ideais considerados subversivos.

No terceiro capítulo, intitulado “Sexual revolution! Moral panic and the repressive right” (tradução livre: Revolução sexual! Pânico moral e direita repressiva), Cowan enfoca as relações estabelecidas em nível transnacional entre grupos de direita do Brasil e do exterior. Para o autor, após as manifestações estudantis de maio de 1968 emergiu um discurso de crise cultural no Ocidente que contribuiu para a construção de muitas narrativas voltadas ao combate do comunismo e à defesa da família nuclear burguesa. No Brasil, tal discurso foi difundido por meio da ideia de “pânico moral”, que apresentava a resistência armada, a delinquência juvenil e a crítica às relações de gênero como sinônimos de uma crise moral que supostamente destruiria a juventude brasileira. Segundo o autor, integrantes de movimentos sociais, como Tradição, Família e Propriedade (TFP) e Rearmamento Moral do Brasil (RM), tinham por “missão” defender as práticas e os valores morais da família brasileira. Por meio da revista Doutrina de Segurança Nacional, o autor analisou os discursos de membros dos referidos movimentos sociais que foram utilizados para sustentar o moralismo instituído no período e proporcionar legitimidade às ações do Estado brasileiro de diferentes ordens contra aqueles que rompiam com práticas e valores relativos à família compartilhados pela direita.

No quarto capítulo, intitulado “Drugs, anarchism, and eroticism: moral technocracy and the military regime” (tradução livre: Drogas, anarquismo e erotismo: tecnocracia moral e o regime militar), Cowan aborda o papel desempenhado pelos tecnocratas durante a ditadura militar em relação às temáticas família e relações de gênero. Juristas, filósofos, educadores, médicos etc. publicavam artigos na Revista da Escola Superior de Guerra, considerada um dos principais “porta-vozes” do regime autoritário. Esses técnicos, que atuam em diferentes setores da burocracia, sobretudo da federal, partilhavam do ideário que atribuía aos comunistas a difusão de ideais sobre a “liberação das mulheres” que ocasionavam a “degeneração da família” e o “problema da juventude”. A juventude, nesse discurso, era considerada delinquente, usuária de drogas e portadora de práticas e valores relativos à sexualidade que necessitavam ser controlados. Para o autor, o discurso enunciado por esses burocratas se mostrou de fundamental importância na construção de leis e na implementação de políticas sociais no período. Dentre essas leis se destacam o Código de Menores, de 1979, e a Lei do Divórcio, aprovada em 19771.

No quinto capítulo, intitulado “Young ladies seduced and carried off by terrorists: secrets, spies, and anticommunist moral panic” (tradução livre: Moças seduzidas e levadas por terroristas: segredos, espiões e pânico moral anticomunista), o autor investiga os discursos que acusavam uma parcela das mulheres brasileiras de ser responsáveis pela divulgação de discursos de cunho subversivo. As revistas Ação Democrática e A Defesa Nacional dedicaram inúmeras páginas a esse ideário antifeminista e anticomunista. Segundo o historiador, essas duas concepções conjugadas favoreceram a perseguição e a tortura de muitas jovens que integraram os agrupamentos políticos contrários ao regime ditatorial. Em “Brazil counts on its sons for redemption moral, civic, and countersubversive education” (tradução livre: O Brasil conta com seus filhos para a redenção moral, cívica e a educação contrassubversiva), sexto capítulo do livro, Cowan analisa como a disciplina escolar Educação Moral e Cívica (EMC) foi utilizada como “instrumento” de combate ao comunismo. Para o historiador, a EMC articulou em seu conteúdo programático as preocupações construídas em torno do “pânico moral” anticomunista. Por meio da disciplina, esse discurso circulou em larga escala em materiais didáticos produzidos para o ensino ginasial da época. Na revista A Defesa Nacional, por exemplo, eram recorrentes os artigos que entendiam que a escola deveria difundir entre os alunos noções sobre uma masculinidade que subsidiasse a preparação para a carreira militar, bem como para a edificação de uma família nuclear.

No último capítulo do livro, intitulado “From pornography to the pill: bagunça and the limitations of moralist efficacy” (tradução livre: Da pornografia à pílula: bagunça e as limitações da eficácia moralista), Cowan analisa as “fissuras” presentes nos discursos sobre o uso de métodos contraceptivos pelas mulheres durante o processo de redemocratização, iniciado no final da década de 1970. Temas como controle da natalidade e pornografia ganharam destaque nos debates sobre saúde pública do país. Para o autor, os defensores do regime ditatorial teceram largas críticas às políticas sociais colocadas em prática na época, que distribuíam contraceptivos para a população e também passaram a associar o processo de redemocratização à ideia de retrocesso político.

É notável como o historiador mobilizou um grande número de fontes na obra Securing sex: morality and repression in the making of Cold War Brazil, que possibilitou a produção de reflexões inovadoras sobre as temáticas estudadas, muitas vezes de modo tangencial, em relação aos regimes autoritários instituídos no Brasil. Soma-se a esse trabalho de pesquisa das fontes o uso de um extenso e atual referencial bibliográfico sobre as ditaduras brasileiras (governo de Getúlio Vargas e ditadura militar) para além das publicadas em português. Esse fato, que permite que o(a) leitor(a) estabeleça conexões entre as produções nacionais e internacionais. Por fim, a obra contribui com os estudos da História do Tempo Presente seja em relação às temáticas estudadas, seja em relação à temporalidade dos discursos. Dados os recentes acontecimentos no Brasil, uma parte desse passado parece inseparável, como lembra Henry Rousso (2016, p. 302), “um passado que volta para assombrar o presente”.

Referências

ROUSSO, Henry. A última catástrofe: a história, o presente, o contemporâneo. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2016.

Jorge Luiz Zaluski – Doutorando no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Florianópolis, SC – BRASIL. E-mail: [email protected].

Entre a cruz e a foice: Dom Pedro Casaldáliga e a significação religiosa do Araguaia | Mairon Escorsi Valério

Dom Pedro Casaldáliga é, sem dúvida, uma das personagens mais importantes da história da Igreja Católica brasileira e do conflito entre a instituição e o regime autoritário que se instaurou no Brasil em abril de 1964. Adepto à Teologia da Libertação, o bispo catalão se tornou a personificação de um novo ideal de cristão católico; este assumiria um compromisso ético com a justiça social e com a promoção humana, visto que os dois objetivos seriam a antecipação do Reino de Deus na terra. Diante da radicalização vivida pelo país nas décadas de 1960-1970, o projeto político-pastoral da prelazia mato-grossense entrou em conflito com o plano de integração nacional fomentado pelo governo militar que buscava, através do desenvolvimento das grandes fazendas agropecuárias, colocar a região Centro-Oeste no mapa do capitalismo brasileiro.

Nascido no ano de 1928 em Balsareny, pequena cidade da província de Barcelona, o jovem religioso Claretiano chegou à São Félix do Araguaia em julho de 1968. Em pouco tempo, Casaldáliga se tornou a mais importante figura na defesa dos camponeses e indígenas contra os grandes latifundiários e o empreendedor da solidificação da presença do catolicismo na região. Após sua sagração episcopal, em 1971, ganhou ainda mais destaque pela radicalidade com que denunciava as injustiças e pelas inúmeras vezes em que esteve em risco iminente de ser expulso do país ou assassinado por pistoleiros da região a mando de grandes fazendeiros. Leia Mais

A construção social dos regimes autoritários – Brasil e América Latina; África e Ásia; e Europa – ROLLEMBERG; VIZ QUADRAT (CTP)

ROLLEMBERG, Denise; VIZ QUADRAT, Samantha (Org). A construção social dos regimes autoritários – Brasil e América Latina; África e Ásia; e Europa. [Rio de Janeiro]: Civilização Brasileira, 606 p. Resenha de TEIXEIRA DA SILVA, Francisco Carlos. A Construção Social dos Regimes Autoritários. Cadernos do Tempo Presente, São Cristóvão, n. 06 – 06 de janeiro de 2012.

A Civilização Brasileira e as pesquisadoras Denise Rollemberg e Samantha Viz Quadrat, ambas do Núcleo de Estudos Contemporâneos/NEC, da UFF, apresentam-nos uma volumosa e imprescindível coletânea de trabalhos sobre os chamados “regimes autoritários”. Trata-se de uma coleção II de amplíssima e necessária abrangência, composta de três volumes — “Brasil e América Latina”, “África e Ásia” e “Europa” —, todos acompanhados de um ensaio introdutório bastante informado e que já nos apresenta os pontos centrais do trabalho.

Para as organizadoras, cabe a superação de teses tradicionais de explicação das ditaduras, quase sempre centradas em conceitos fossilizados ou “combatentes” da Guerra Fria, tais como “populismo” e “totalitarismo”. Na crítica contra tais esquemas simplificadores, as autoras propõem-se a discutir uma nova abordagem composta por teses inovadoras: a ambivalência entre sociedade e Estado nas ditaduras; a busca do consenso por parte dos ditadores e de suas instituições; o papel dos intelectuais como ponte entre regimes autoritários e população.

No seu conjunto , em especial no volume sobre “Brasil e América Latina”, brotam análises de extrema riqueza e variedade, comprovando que, mesmo sob ditaduras, a maioria das pessoas busca projetos e estratégias de convívio, de realização pessoal e profissional, ao lado de mecanismos de sobrevivência que, no limite, implicam conviver, dialogar, colaborar ou fingir não ver “o rinoceronte no quarto ao lado”, como na expressão de Eugene Ionesco.

Neste sentido destacam-se os ensaios primorosos de Marcos Napolitano e das próprias Denise Rollemberg e Samantha Quadrat, além de Daniel Aarão Reis, que inovou nos estudos de regimes ditatoriais ao estudar o período de 1964-1985 no Brasil. Vários outros pontos são ainda de suma importância, incluindo aí — em tempos de debate sobre a nossa recém-criada Comissão da Verdade — a questão da pronta, e quase total, conversão de todos à democracia no imediato período pós-ditaduras. Trata-se, neste caso, da construção de memórias regeneradoras, capazes de promover “esquecimento”, “perdão” ou “passar currículos a limpo”. Neste sentido, o belo ensaio sobre o “pensar-duplo” na França pós-ocupação alemã,   no volume “Europa”, serviria de modelo para entender boa parte do processo de democratização no Brasil pós-1985 e da oposição em face da Comissão da Verdade.

Todo esse debate encontra-se exemplarmente discutido no ensaio introdutório, de ambas as autoras. Este é imprescindível para o projeto da coleção ao identificar e explicitar os principais eixos do debate historiográfico (e político, pela própria natureza do texto) que se apresentarão nos ensaios subsequentes. Lamento apenas que o mesmo ensaio seja repetido em cada volume. Mesmo imaginando que se possa comprar cada livro individualmente, caberia indubitavelmente assinalar as características e vicissitudes das ditaduras em cada um dos continentes, suas especificidades e os “espelhos” buscados.

A questão e a natureza dos regimes de “apartheid” — que atingiram a África do Sul, Zimbábue/Rodésia e Namíbia —, por exemplo, estão ausentes, não se discutindo suas possibilidades de construção enquanto ditaduras de forte conteúdo racialista e social, malgrado a imensa literatura sul-africana. Da mesma forma, a questão das classes sociais e de seus interesses — exagerada e de forma mecanicista — tratada na historiografia marxista dos anos de 1945-1980 ficam relegadas. Talvez fosse o caso de se retornar, agora sem a ganga de um marxismo oficial, ao debate sobre empresariado, burocracia de Estado e classes sociais nas ditaduras.

Temos ainda uma outra discordância quando, à pagina 13 do ensaio, as autoras descartam o estudo das ditaduras varguistas de 1930-1934 e de 1937-1945, em razão dos “estudos estarem bem desenvolvidos”. Não creio que seja este o caso. Há, isto sim, uma abundante literatura sobre o período. Contudo, na ótica inovadora proposta pelas organizadoras — expressa, por exemplo, nos textos de Angela Castro, do CPDOC/FGV, Jorge Ferreira, da UFF e Maria Helena Capelato, da USP — falta muito a ser feito numa história das instituições ditatoriais no Brasil.

A aplicação das riquíssimas hipóteses propostas no ensaio introdutório da coleção implicaria no (re)estudo de áreas fundamentais para a compreensão do varguismo ditatorial, como instituições políticas e constitucionais, os órgãos de governo, o processo de decisão política, a burocracia e sua construção profissional, clubes de futebol, associações carnavalescas, as igrejas e o Estado Novo, entre outros. Talvez seja esta uma nova tarefa.

No seu conjunto a coleção apresenta artigos de autores brasileiros e estrangeiros de pouco acesso ou mesmo desconhecidos do público brasileiro. Assim, a presença de grandes nomes Pierre Laborie, Robert Gellately e Francisco Sevillano Calero — só em relação com as ditaduras europeias — enriquece imensamente o trabalho e o torna imprescindível. Da mesma forma, estudiosos latino-americanos, africanos e árabes tornam a coleção um recurso de grande valor para os alunos dos mais diversos cursos das áreas de ciências humanas e sociais.

As temáticas apresentadas — e que devem servir de exemplo de abordagens para futuros trabalhos brasileiros — são inovadoras e comprovam a estreita relação entre sociedade e Estado em regimes ditatoriais. A visão heroicizada, pós-ditatorial, de uma sociedade civil vitimada pelo Estado, em que um grupo era constituído de “heróis da resistência”, enquanto outro era de “colaboradores”, não mais se sustenta. Eis aqui, ao meu alvitre, a principal contribuição da coleção. Da leitura inicial do ensaio emerge uma situação de ambivalência, de busca de condições de (bem)viver ou sobreviver sob as ditaduras. Daí emergem também a delação, a participação e o consentimento na aniquilação física, cívica ou mental do outro como um dado “normal” nos regimes ditatoriais. Em quase todos os casos a maioria poderia dizer, em sua defesa, que eram temas estranhos às suas vidas. Da mesma forma, a capacidade de sedução — e de sua resposta, o consentimento — é elemento central da análise proposta, de forma rigorosa e rica, pelas organizadoras. Em suma, as ditaduras, para nosso horror e reflexão, constroem-se, conforme Rollemberg e Quadrat, na naturalidade da sociedade humana. Creio que tais conclusões, por mais duras que sejam, são uma nova e fértil via de trabalho.

Aberto o caminho, podemos acreditar que novos trabalhos — como as inúmeras teses que ambas orientam — caminharão em direção a uma História mais nuançada, mais real e também mais humana.

Notas

2 A construção social dos regimes autoritários— Brasil e América Latina; África e Ásia; e Europa, coleção organizada por Denise Rollemberg e Samantha Viz Quadrat. Editora Civilização Brasileira, 606 páginas (“Brasil e América Latina”, R$ 69,90); 392 páginas (“África e Ásia”, R$ 59,90); e 309 páginas (“Europa”, R$ 49,90).

Francisco Carlos Teixeira da Silva – Nascido em 1954, Rio de Janeiro, bolsista de produtividade CNPq. Graduação e Licenciatura em História pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1976), Especialização em História (UFF, 1979), Mestrado em História do Brasil pela Universidade Federal Fluminense (1980), Magister in Geschichtewissenschaft (Freie Universität, Berlin, 1983), Doutorado em História Social pela Universidade de Berlin/UFF (1990) e Pós-doutorado pela Universidade Técnica de Berlin e USP (1999/2000) e pela Universidade Livre de Berlin, 2011/12; Professor Titular de História Moderna e Contemporânea, da Universidade do Brasil/UFRJ, de 1993 até 2012 ). Professor Emérito da ECEME, Professor de Estratégia e Relações Internacionais da EGN e |Professor Conferencista da ESG. Autor de vários trabalhos de História Social no Brasil, com foco no desenvolvimento agrário e nas origens da pobreza no país, e de relações internacionais, conflitos e negociações. Principais teses:Mestrado: A Formação Social da Miséria, 1980; Doutorado: A Morfologia da Escassez, 1990; Tese de Titular: O Concerto Europeu e o Pensamento Conservador, UFRJ, 1993. Alguns dos trabalhos publicados: História Geral do Brasil (Coord. de Maria Yedda Linhares); Domínios da História (Coord. de Ciro Cardoso e Ronaldo Vainfas); Mundo Rural e Política (com o CPDA/UFRRJ); História e Imagem (Tempo Presente, Rio, 1997); Mutações do Trabalho (SENAC, Rio, 2000-); História da Agricultura Brasileira (Brasiliense, São Paulo, 1985); Sociedade Feudal (Brasiliense, São Paulo, 1990); Terra Prometida (com Maria Yedda Linhares, Campus, Rio, 2001) e Memória Social dos Esportes (organizador, v. 1 e v. 2, Mauad, Rio, 2004 e 2006). Em História das Relações Internacionais destacam-se os seguintes trabalhos: Conflitos e das Guerras: O Século Sombrio (Elsevier, São Paulo, 2005), Enciclopédia de Guerras e Revoluções do Século XX (Mauad, Rio, 2005); História do Século XX (Record, sob coord. de Daniel Aarão Reis et alii); Corporativismo em Português (Coord. de Francisco Martinho, Lisboa/Rio, 2008); Ordens e Pacis (Coord. de Alexander Zhebit, Mauad, 2008); Os Impérios na História (obra coletiva sobre a crise dos grandes estados, São Paulo, Campus, 2009); Neoterrorismo (com Alexander Zhebit, Grama, Rio, 2009). Organizador de O Brasil na Segunda Guerra Mundial (Rio, Multifoco, 2011) e Terrorismo na América do Sul (Rio, Multifoco, 2011 ) e Relações Brasil-Estados Unidos (com Sidnei Munhoz, Maringá, EDUEM, 2011). É professor-conferencista da Escola Superior de Guerra na área de Segurança Internacional e da ECEME em Estratégia Internacional. Articulista do Jornal das Dez, Globo News e consultor de várias empresas na área de relações internacionais. Foi Assessor da Presidência da Finep (2008-2010) e Membro dos Comitês Pro-Sul e Pro-África do CNPq. É também Professor Emérito da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército brasileiro, detentor da Medalha do Pacificador, a Ordem de Tamandaré e do Medalha Amigo da Marinha e Cavaleiro da Ordem do Mérito Naval. Professor Convidado de “Ambientes e Cenários do Século XXI” da FDC.

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