Africanos livres: a abolição do tráfico de escravos no Brasil | Beatriz Mamigonian

A historiografia brasileira vem há décadas tendo a escravidão e o tráfico como um dos seus principais temas. Novas interpretações e análises surgiram nos últimos anos para demonstrar que ainda se trata de um tema muito atual para a escrita da história nacional. Entre as novas reflexões desenvolvidas nos últimos anos, está a obra Africanos Livres: a abolição do tráfico de escravos no Brasil, da historiadora Beatriz Mamigonian, publicado em 2017 pela Editora Companhia das Letras.

O livro se divide em introdução, epílogo e mais dez capítulos. Como o próprio prefácio, escrito brilhantemente por João José Reis, “este é um livro há muito esperado”. A historiadora amplia uma pesquisa, originalmente desenvolvida no doutorado, através da inserção de novas fontes e análises. Sua linha de raciocínio se debruça nas questões dos escravizados ilegalmente. Vale constar que a historiadora, ao longo da obra, mostra o papel dos sujeitos históricos, no caso aqui os africanos livres, dentro das dinâmicas políticas, sociais, culturais e jurídicas do Brasil oitocentista. Leia Mais

Marx e a dialética da sociedade civil | Marcos Del Roio

Diante da crise mundial, nos últimos anos, os estudos sobre a obra de Marx voltaram a ganhar força no meio acadêmico. É neste cenário que foi produzida a obra Marx e a dialética da sociedade civil. O livro é resultado do “V Seminário Internacional de Teoria Política do Socialismo”, evento realizado na Faculdade de Filosofia e Ciências de Marília (UNESP/Marília) com apoio do Grupo de Pesquisa Cultura e Política do Mundo do Trabalho e do Instituto Astrojildo Pereira.

O livro é organizado por Marcos Del Roio, professor titular de Teoria Política da UNESP de Marília, e possui quinze capítulos distribuídos em cinco unidades. É um livro interdisciplinar, pois seus autores são pesquisadores das mais diversas áreas das humanidades, como História, Ciência Política, Filosofia, Ciências Sociais e Educação. Leia Mais

Impérios em Guerra (1911-1923) – GERWARH (RTF)

GERWARH, Robert; MANELA, Erez. Impérios em Guerra (1911-1923). Lisboa: Dom Quixote, 2014. Resenha de: SAMPAIO, Thiago Henrique. Colonialismo e conflitos: a Primeira Guerra revisitada. Revista Territórios & Fronteiras, Cuiabá, v. 10, n. 2, ago.-dez., 2017.

Ao se pensar Primeira Guerra Mundial, em contrapartida acaba-se por lembrar das consequências do conflito na Europa, mas a participação de outros continentes e as áreas coloniais neste conflito é normalmente esquecida. Estas inquietações motivaram a presente obra Impérios em Guerra (1911-1923), na qual buscou-se um panorama da guerra a partir da perspectiva de Impérios em disputas e não de Estados-Nações.

Essa obra é resultado de duas conferências temáticas sobre o assunto ocorrida em Dublin em 2010 e 2012, a sua elaboração contou com auxílio financeiro do Conselho Europeu de Investigação (CEI). A publicação ocorreu no ano do centenário do início da Primeira Guerra Mundial.

Na introdução, os organizadores apresentaram que a guerra será estudada em um quadro temporal e espacial maior do que o convencional, pois a desmobilização das tropas dos exércitos coloniais, na Ásia e da Europa Centro-Leste não se encerraram ao final do Conflito Mundial. Desta forma, é mostrada a Primeira Guerra como um enfretamento de Impérios globais e multiétnicos e não entre Estados-Nações. Os organizadores definem que Império seria uma entidade política cujas populações e territórios estão dispostos e são administrados de forma hierarquizada em relação ao centro imperial. Assim, “a Grande Guerra foi uma guerra de impérios, travada principalmente por impérios e pela sobrevivência ou expansão de impérios” (p. 50).

No primeiro capítulo, O Império Otomano, Mustafa Aksakal afirmou que o processo de declínio deste território vinha muito antes do conflito mundial. Ao longo dos séculos, os otomanos eram uma experiência de sucesso como instituição multiétnica que foi acabada com a Primeira Guerra Mundial.

Em suas análises, é mostrando o anacronismo existente na administração imperial. Pois era um Estado cheio de dívidas e agrediam as populações não muçulmanas, no que causou nestas o desejo de independência. Na construção deste capítulo, o autor baseou-se em relatos diplomáticos europeus, na qual mostram uma má gestão otomana, e fontes otomanas em que o Império é vítima do imperialismo europeu. A Primeira Guerra Mundial foi tratada pela administração otomana como um conflito ideológico e militar. No primeiro caso, o sultão otomano buscou trata-la como uma Guerra Santa, apelou para os súditos muçulmanos e residentes islâmicos fora do império para participarem da causa em favor da Tríplice Aliança. Na segunda questão, tentou a recuperação de territórios perdidos anteriormente com países europeus.

O Estado Otomano tomou medidas preventivas contra populações cuja lealdade desconfiava, como os armênios e os árabes. No caso armênio, aconteceu o episódio conhecido como Holocausto Armênio que é até hoje denunciado internacional e a Turquia atual não o reconhece. No caso árabe, as privações sofridas por esta população causaram a Revolta Árabe de 1917 que enfraqueceu o Império Otomano nessas localidades. Ao final do conflito, diversas regiões do império são ocupadas e fragmentadas entre as potenciais vencedoras, o processo de substituição do Império Otomano pelo Estado-Nação Turco não foi rápido e nem simples como demonstrado pelo autor ao final do capítulo.

No segundo capítulo, O Império Italiano, Richard Bosworth e Giuseppe Finaldi mostraram como a Itália, um país recém unificado, se fez ou tentou se fazer presente na Primeira Guerra Mundial. O Estado Italiano construiu a ideia em sua população de uma Terceira Itália, na qual apropriou-se do tempo e da tradição imperial daquele território, rememorando os grandes feitos do Império Romano e dos Estados Italianos que lideraram a cultural ocidental durante o Renascimento.

A ocupação de áreas do Império Otomano, como a Líbia, foi tratada pela sua administração como uma forma de mandar a população mais pobre para terras férteis e estancar a emigração para o continente americano. A invasão a essa localidade sofreu severas críticas tanto por liberais e socialista na Itália.

Em outras colônias italianas, como a Eritreia não houve nenhum indício de rebelião durante a Primeira Guerra Mundial que questionasse a dominação da Itália.

Essa colônia era para os italianos a porta de entrada para a Etiópia região cobiçada pelo país desde o século XIX. No caso da Somália Italiana, a ocupação era precária e dava margens aos potentados locais a participarem da administração.

No capítulo seguinte, O Império Alemão, Heather Jones declarou que no caso da Alemanha existia uma relação complexa que desafia a compreensão cronológica e espacial tradicional do Imperialismo. A ideia de império se baseou em três componentes imperiais distintos que foram: o formado após a unificação da Alemanha em 1871; o território alemão mais os Estados satélites ocupados por ele ao longo da Primeira Guerra; e o os territórios alemães de além-mar.

O projeto de colonização alemã na África foi algo recente, começou na última década de Oitocentos e as primeiras do século XX. Segundo Heather Jones, a crise do Marrocos (1911) foi um ensaio alemão para a Primeira Guerra Mundial. A Alemanha ansiava por colônias desde a década de 1880 para se transformar em um modelo contemporâneo de Estado-Nação/Império.

A Alemanha expandiu-se na Europa ao longo da disputa. A Primeira Guerra foi usada pelos alemães para defender, expandir e consolidar as fronteiras do Império na Europa. A sua radicalização beligerante ao longo do conflito mundial baseou em suas táticas de repressão aos povos africanos.

Até 1916, todas os seus territórios coloniais foram capturados pelos adversário.

Ao final da guerra, os três componentes imperiais que baseavam seu Império caíram e a Alemanha sofreu consequências graves no período posterior.

No quarto capítulo, A Áustria-Hungria, Peter Haslinger mostrou que o Estado austro-húngaro existia uma solidariedade entre os povos que o compunham, mas era um império debilitado a décadas. A noção de irmandade entre seus povos, sofreu seu primeiro revés no século anterior, em 1867, quando ocorreu o Compromisso Austro- Húngaro despertou o desejo e sentimento de outros povos pela emancipação.

Ao longo da história do império, ele nunca adotou uma política de discriminação para nenhum de seus povos. No entanto, ao longo da Primeira Guerra Mundial, duas medidas causaram efeitos nacionalistas em seu território: Quatorze Pontos de Woodrow Wilson (8 de janeiro de 1918) e a Declaração do Direitos dos Povos da Rússia (15 de novembro de 1917).

Ao final do conflito mundial e com o desmantelamento gradual do Império, aumentasse a responsabilidade das administrações regionais frente a Viena. Entre os dias 8 a 11 de abril de 1918, ocorreu em Roma, o Congresso das Nacionalidades Oprimidas formada pelos diferentes povos que compunham o território que desejavam uma autonomia completa. Em agosto de 1918, a Tchecoslováquia tem reconhecida sua independência, o mesmo passo é seguido por demais áreas do Império entre os meses de outubro e novembro de 1918.

Os meses finais de 1918 confirmaram o fim da monarquia dual existente na Áustria-Hungria. Após a sua dissolução, o problema dos Balcãs, que desencadearam o conflito mundial, continuaram.

No quinto capítulo, O Império Russo, Joshua Sanborn mostrou que ao longo da história do Império Russo ocorreram conquistas modestas e fracassos que ajudaram no desenvolvimento do seu poderio militar. Desde 1881, o império passou por um processo de russificação iniciado pelo czar Alexandre III, após essa medida os movimentos nacionalistas separatistas nunca foram uma ameaça real ao território. Ao iniciar a Primeira Guerra Mundial, os povos que o compunham sofreram tratamento militar diferente conforme a assimilação que as populações haviam passado pela russificação. A administração imperial mudou, o sistema de governança foi substituído por um sistema de governança militar entre os generais que ocuparam territórios no conflito.

Essa transformação desencadeou falhas para o Império, ocorrendo resistências locais, crises econômicas, aumento da inflação e falta de alimentos.

Em 1915, os russos sofreram fortes baixas como parte dos territórios polacos e a Ucrânia. No ano seguinte, ocorreu vitórias irregulares e inconclusivas. O sistema econômico, que já estava debilitado anteriormente, começou a ruir pela escassez de mão de obra. Uma solução encontrada para cobrir essa demanda foi o uso de prisioneiros de guerra em campos de trabalho forçado.

Em junho de 1916, o tratamento militar distinto entre as minorias étnicas foi cancelado, o Conselho de Ministros incorporou populações que eram isentas ao serviço militar para as frentes de conflito. Em finais daquele ano, as fronteiras ocidentais estavam sob ocupação estrangeira ou debaixo de administrações militares incapazes.

Com o início da Revolução Russa, em 1917, o país retirou-se do conflito mundial, para tentar resolver seus problemas internos. A primeira fase da Revolução, iniciada em fevereiro, mostrou uma política liberal fracassada que despertou o nacionalismo em diversas regiões do Império, como a Finlândia, Geórgia e a Ucrânia. Com a passagem do poder para as mãos dos sovietes, em outubro, a possibilidade de independência de outras regiões do império alterou-se, pois a independência de qualquer território transformaria aquela região dependente do Império Alemão.

Ao final da Primeira Guerra, ocorreu o colapso absoluto do Império Russo que adentrava em um conflito civil. Ao final da Guerra Civil Russa, o Kremlin transformouse em um novo centro imperial com novas perspectivas de expansão.

No capítulo seguinte, O Império Francês, Richard S. Fogarty apresentou a visão de uma Grande França que entrou no conflito, essa entidade seria a união da metrópole com as colônias. Nesta perspectiva, os territórios ultramarinos ajudaram a travar uma guerra total, pois foi arrecado 650 milhões de franco de assistência econômica proveniente das áreas do ultramar, 500 mil súditos soldados e 200 mil trabalhadores provindo do além-mar para a indústria da guerra foram mobilizados.

A Primeira Guerra tornou o império rentável para a França, tratando-o como uma entidade única. No decorrer do conflito, o Império era mais importante psicologicamente do que materialmente, pois causava na população que era empregada no conflito um sentimento de unidade para uma causa maior.

Nos últimos dois anos de guerra, ocorreram uma resistência ao recrutamento no ultramar, desta forma empregou-se o trabalho forçado para a indústria de guerra e o convocação obrigatória de soldados. Essa mudança de perspectiva da população deveuse o conflito estar associada a morte ou a perda de capacidade física para os que entraram nela. No período posterior, o significado do Império Francês alterou-se, ganhou importância para a defesa e a vida da nação.

No sétimo capítulo, A África Imperial Britânica, Bill Nasson demonstrou como o Império Britânico se fragmentou em três frentes de conflito: Europa, Ultramar e Oriente Médio e a importância das colônias para defender os interesses da metrópole.

Desta forma, a guerra travada pelo Império Britânico em África era para aumentar seu poderio colonial no continente e legitimar seu domínio do mar.

Para a população colonial em África, ocorreu um atrativo no alistamento militar para a guerra pois era associada a autoridade patriarcal e a identidade guerreira de certas tribos, além da remuneração compensar para os jovens que não tinham nenhum ofício. A Primeira Guerra na África Britânica foi heterogênea em seus territórios: a África do Sul buscou expandir com a incorporação do Sudoeste Alemão; no Sudão houve uma cautela no recrutamento de soldados devido aos chefes locais e medo de insurreições muçulmanas; na Rodésia ocorria interações tensas entre os soldados britânicos e a população local.

No oitavo capítulo, Os domínios, a Irlanda e a Índia, Stephen Garton apresentou as demais entidade políticas que compunham o Império Britânico: a Nova Zelândia, a Austrália, a Índia e a Irlanda. Por ser uma entidade polimórfica, o Império Britânico desenvolveu estratégias distintas para suas diversas regiões que participaram do conflito mundial.

Mesmo sendo uma entidade heterogênea, algumas consequências foram comuns em diversas localidades do império como greve de trabalhadores cansados dos fardos da guerra e medo de rebeliões internas devido minorias alemãs em suas áreas.

Após a Primeira Guerra Mundial, ocorreu maior independência nas entidades políticas que compunham o Império e aconteceu sua expansão, através da incorporação de territórios da Alemanha e do Império Otomano. Desta forma, o conflito mundial não foi apenas da Grã-Bretanha, mas de todo um grupo de entidades soberanas que se consideravam parte de um mesmo ser: o Império Britânico.

No nono capítulo, O Império Português, Filipe Ribeiro Meneses apresentou a importância do peso do colonialismo na história portuguesa diferente dos demais impérios europeus. Desta forma, a República Portuguesa, que foi instaurada em 1910, via necessidade na manutenção do país como uma potência colonial. No entanto, a falta de investimento do Estado e recursos humanos para trabalharem no ultramar causavam um colonialismo fraco comparado com os demais países.

Ao longo da Primeira Guerra Mundial, Portugal mobilizou tropas em suas colônias para garantir a continuidade do seu Império. Ao final do conflito, na Conferência de Paz de Paris as potências europeias tiveram interesses em partes dos territórios lusitanos, mas com um forte apelo diplomático e histórico, Portugal conseguiu manter seus territórios.

Em, O Japão Imperial e a Grande Guerra, Frederick Dickinson evidenciou a importância da Ásia Oriental como local crucial para as disputas imperiais. Até a Primeira Guerra Mundial, ele aumentou seu território imperial através de exploração de áreas do território chinês (1895) e a Guerra contra o Império Russo (1905). Entre os anos de 1914 a 1919, o Japão não aumentou suas áreas, mas manteve uma ação na Sibéria para conter a Revolução Russa.

Após a Primeira Guerra Mundial, os japoneses passaram ao cenário internacional como potência mundial, devido sua atuação no conflito. No entanto, a guerra na Ásia não terminou com o Tratado de Versalhes, lá ela terá sua temporalidade própria diferente da Europa. O estado de beligerância acabou na Ásia após a Conferência de Washington em 1921.

No capítulo, A China e o Império, Xu Guoqi assinalou que durante o conflito libertaram-se os fantasmas da época imperial chinesa. Após a Guerra Sino-Japonesa (1894-1895), os chineses começaram a repensar o papel de sua civilização mundialmente dando início a várias iniciativas nacionalistas em seu território para fortalecimento contra potências rivais. Ao final desse conflito, o Japão tornou-se a potência principal da Ásia Oriental.

Durante a Primeira Guerra Mundial, o Japão buscou garantir o controle da China e lançou um manifesto conhecido como 21 exigências, na qual o presidente chinês cedeu. Essas medidas tiravam a soberania chinesa em várias localidades de seu território e os concedia aos japoneses. Em 1917, a China entrou oficialmente na Primeira Guerra contra os alemães. Buscou-se uma base constitucional de uma política de guerra antes da entrada no conflito, isso ocasionou disputas governamentais internas.

O país contribuiu fortemente com o envio de trabalhadores para o Ocidente para as indústrias da guerra, baseando em seus novos princípios de internacionalização e renovação nacional.

Ao final da guerra, a China via com grandes expectativa a Sociedade das Nações. No entanto, o Tratado de Versalhes foi visto com desapontamento pela população chinesa, essa angústia com o acordou permitiu que durante as décadas de 1920 e 1930 ocorressem uma aproximação da China com a Alemanha. Esse contato possibilitou o Tratado Sino-Germânico, 1921, o primeiro tratado assinado com um país europeu que os chineses foram considerados como iguais. Após o conflito mundial, a China buscou um novo modelo de construção de sua nação, tal possibilidade foi vista na Revolução Bolchevique.

No penúltimo capítulo, O Império dos Estados Unidos, Christopher Capozzola discorreu sobre o período de 1914 a 1924 de como os EUA administraram forças militares de territórios dependentes e soberanos. Os norte-americanos buscaram reafirmar seu poder na América Latina e seus domínios coloniais foram dados maiores autonomia, como o caso da Filipinas.

Com a criação da Força de Patrulha da Esquadra do Atlântico, em 1917, ocorreu a concretização da Doutrina Monroe, ideologia defendida no século anterior. Após a Primeira Guerra Mundial houve um aumento estratégico dos EUA no mundo, na qual buscou uma reorientação em sua política externa.

No último capítulo, Os Impérios na Conferência de Paz de Paris, o autor Leonard V. Smith defendeu que ela legitimou a normalização do Estado-Nação como instituição que sucedeu os impérios multinacionais ao final da guerra. Além disso, é revisitado o papel dos mandatos concedidos pela Liga das Nações a França e a Inglaterra, o ódio alemão pelas cláusulas do Tratado de Versalhes e o bolchevismo como alternativa a alguns lugares no pós-guerra.

A obra crítica a historiografia tradicional da Primeira Guerra Mundial que deixou de lado o Leste Europeu, a Região do Pacífico, as colônias e a América, tratando-os apenas como atores secundários na beligerância. Muitas vezes é esquecida a participação dos súditos imperiais que serviram nas frentes europeias e seus efeitos no mundo colonial como as dificuldade econômicas, as ocupações e os alistamentos forçados.

O final do conflito mundial foi turbulento tanto para os vitoriosos quanto para os derrotados. Ao mesmo tempo, ocorreu um processo de declínio imperial que conduziu ao fim da ordem global vigente e sua substituição por uma ordem assentada no Estado-Nação.

A obra Impérios em Guerra é uma alternativa ímpar a historiografia padrão do conflito mundial, possibilitando aos leitores refletirem sobre alternativas de análises sobre a Primeira Guerra Mundial. Para aqueles que não sabem muito sobre essa beligerância, é uma ótima leitura para ser realizada nestes anos que se aproximam do centenário do final da Grande Guerra.

Thiago Henrique Sampaio – 1 Mestrando pelo Programa de Pós-Graduação em História pela Faculdade de Ciências e Letras (UNESP/Assis). Endereço: Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Estadual Paulista, Av. Dom Antônio, 2100 – Parque Universitário, Assis – SP. E-mail: [email protected].

Tenho algo a dizer: memórias da UNESP na ditadura civil militar (1964-1985) | Maria R. Valle, Clodoaldo M. Cardoso, Antonio C. Ferreira e Ana Maria M. Corrêa

A obra Tenho algo a dizer faz parte de um projeto desenvolvido pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP) buscou rememorar a sua fundação, as conjunturas políticas e sociais dos anos da Ditadura Civil Militar.

O livro foi lançado no ano de 2014, ano em que se completou 50 anos do Golpe Civil-Militar no Brasil. Através de sua leitura, o leitor é apresentado como o sistema universitário foi burocratizado e perseguido ao longo dos anos do regime de exceção instaurados a partir de 1964. Ao mesmo tempo que eram vítimas deste sistema, as universidades buscaram fazer sua resistência a partir das lutas pela redemocratização dentro da sua comunidade acadêmica. Leia Mais

rajetória educacional dos imigrantes alemães no interior do Estado de São Paulo – VAROLO (HE)

VAROLO, Flávia Renata da Silva; RIBEIRO, Arilda Ines Miranda; FELIX, José Luís. Trajetória educacional dos imigrantes alemães no interior do Estado de São Paulo. Uma escola alemã na colônia Riograndense: 1922-1938 (Maracaí/Cruzália-SP). Jundiaí: Paco Editorial, 2015. Resenha de: SAMPAIO, Thiago Henrique. Terra, educação e imigração: uma escola na colônia de alemães no interior do Estado de São Paulo. História & Ensino, Londrina, v. 23, n. 2, p. 243-247, jul./dez. 2017.

VAROLO Flávia Renata da Silva (Aut), RIBEIRO Arilda Ines Miranda ([Apres]), FELIX José Luís (Apres), Trajetória educacional dos imigrantes alemães no interior do Estado de São Paulo (T), Imigrantes alemães, SAMPAIO Thiago Henrique (Res), Colônia alemã riograndense, Escola alemã, Paco Editorial (E)

Quando estudamos movimentos migratórios, temos que entender as tentativas de implantação de uma cultura de imigrantes, em seus novos espaços de convívio, como uma forma de continuação das experiências de sua terra de origem. Dentro dessa perspectiva, a obra Trajetória educacional dos imigrantes alemães no interior do Estado de São Paulo apresentou um panorama da colônia Riograndense e sua escola alemã.

Na apresentação José Luís Felix, professor da Faculdade de Ciências e Letras (UNESP/Assis), salientou a importância do papel de um sistema escolar dentro da comunidade de imigrantes alemães no Brasil. Dessa forma, a história da escola da colônia Riograndense confunde-se com a trajetória da própria localidade. O recorte temporal apresentado na obra é de 1922 a 1938, na região dos municípios de Cruzália e Maracaí. O ano final da escolha da pesquisa deve-se à deterioração da Escola Alemã, durante o Estado Novo com suas medidas educacionais.

Na introdução, Flavia Renata da Silva Varolo, apresentou suas motivações ao escrever a obra e seu contato com a cultura e língua alemã durante sua trajetória de formação. Seu livro usou como metodologia a História Oral, articulando-se com a História Cultural, durante toda a obra. Suas fontes são fotografias, textos, e narrativas, dos moradores da colônia e pessoas que passaram pela Escola Alemã.

O livro é resultado de sua dissertação de Mestrado em Educação, A educação alemã na colônia Riograndense: 1922-1938 (Maracaí/Cruzália-SP) defendida, em 2010, no Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Ciências e Tecnologia de Presidente Prudente (UNESP/Presidente Prudente).

No primeiro capítulo, O imigrante alemão no solo brasileiro, a autora mostrou o início da vinda dos alemães em território nacional. Isso era desencadeado por motivos como má distribuição de terras, problemas econômicos, e altos impostos, em suas localidades. Para a pesquisadora, o início do movimento migratório alemão para o Brasil começou com a vinda da família real portuguesa, em 1808, que trouxe alguns alemães em sua comitiva.

O aumento do fluxo da população alemã ao Brasil iniciou-se em 1820, com um decreto de D. João VI para incentivar a entrada de indivíduos europeus, com a finalidade de gerar o branqueamento da população do território. Entre 1822 a 1826, a vinda de alemães ganhou força com a Imperatriz Leopoldina, filha do imperador da Áustria, Francisco I.

No caso do Estado de São Paulo, a imigração alemã pode ser dividida em quatro fases: a primeira, de 1827 a 1849, devido a políticas imperiais adotadas no país; a segunda, de 1850 a 1870, acarretado às agitações sociais nos territórios alemães; a terceira, de 1870 a 1945, motivada por parcerias entre as administrações do estado com companhias; e a quarta, de 1945 aos dias de hoje. Na década de 1930, o fluxo de alemães se intensificou para o Estado devido a política de branqueamento adotado durante o Estado Novo.

Nas décadas de 1920 a 1930, a educação brasileira não penetrava nas grandes camadas populares, isso incluiu os imigrantes em território nacional. A educação pública era essencialmente aristocrática e patriarcal. Com o movimento da Escola Nova, buscou-se uma renovação escolar através do discurso progressista e liberal.

Durante a Era Vargas, aconteceram mudanças formais e substanciais na educação através de algumas medidas como a criação do Ministério da Educação e Saúde (1930), a Reforma Francisco Campos (1931), e a Reforma Gustavo Capanema (1942). Com uma pasta própria para assuntos educacionais, ocorreram a formação do Conselho Nacional de Educação, que buscou a organização do ensino superior, secundário e comercial; a organização da Universidade do Rio de Janeiro, e a adoção de medidas no regime universitário.

No capítulo seguinte, Uma colônia de alemães no interior do Estado de São Paulo, a autora tratou da formação da Colônia Riograndense, em 1922. A população da localidade era originária da Alemanha, Áustria, Suíça e de alemães que já estavam no Brasil e se mudaram para a região. Para escrever sobre a história da colônia foi utilizada documentação oficial, depoimentos e diários de habitantes. O nome da região origina-se da influência de colonos do Rio Grande do Sul.

Durante o início da colônia aconteceu propaganda para a vinda de alemães a área. Esse marketing era enganoso, pois divulgava terras planas e próprias para a agricultura. Ao chegarem na localidade, os colonos deveriam abrir matas para a construção de casas e cultivos. Além disso, a viagem da Alemanha para o Brasil era extremamente cansativa e penosa, principalmente para crianças e idosos. Muitos, que tentaram vir, morreram devido a problemas na viagem e causadas por tifo.

A colônia Riograndense passou por três núcleos de colonização: em 1922, na região central da localidade; em 1924, começou um segundo núcleo, formado por habitantes de maioria católica e com grandes propriedades; e em 1929, uma região de população majoritária de gaúchos em torno da Fazenda Galvão.

As mulheres e crianças ajudavam na derrubada de matas para a criação de áreas cultiváveis e habitacionais na colônia. A agricultura era de produtos de subsistência: mandioca, milho e feijão. Entretanto, a economia da colônia ganhou força com a comercialização de alfafa, produto ficou em alta até a década de 1950. Na década de 1960, a alfafa foi substituída pelo cultivo de trigo e soja. A localização da área colonial era de fácil acesso à estrada de ferro (Sorocabana), possibilitando um rápido escoamento de sua produção.

Católicos e luteranos conviviam na localidade. Desde o início do processo de colonização as igrejas eram construídas. Desta forma, fé e religião eram uma força para os colonos superarem as dificuldades das mudanças.

No último capítulo, A educação alemã na colônia rio-grandense: escolas, clubes e práticas culturais, a autora buscou demonstrar o papel primordial desempenhado pela educação no processo de inserção dos imigrantes alemães. A educação nas colônias, na maioria das vezes, era responsabilidade dos seus próprios moradores, que construíram escolas e contratavam professores devido à ausência de investimentos do Estado nas localidades. Na colônia Riograndense não foi diferente.

A Escola Alemã da colônia Riograndense era no meio rural e mista (meninos e meninas frequentavam). A primeira escola foi construída em madeira e após um incêndio, em 1926, uma nova escola foi inaugurada. No currículo escolar estavam presentes o catecismo, a bíblia, a escrita e a aritmética. O material didático era de língua alemã adaptada à realidade brasileira. Seu programa curricular era flexível e diversificado para o momento.

O professor possuía responsabilidades além da escola, como o desenvolvimento de atividades culturais e religiosas, além da importância econômica para a localidade. A manutenção do colégio ficou a cargo dos colonos (prédio e salário de professor).

Os espaços educacionais não se restringiram apenas à escola, pois os autores do livro demonstram que outros espaços sociais, como os clubes e igrejas, tinham importância na formação educacional das crianças e jovens, principalmente após a perseguição e preconceito a alemães, desencadeados após a Segunda Guerra Mundial.

Com a Reforma de Gustavo Capanema teve início o fim da escola, pois houve a implementação de escolas públicas na colônia Riograndense. Esta reforma colocou como obrigatória o ensino do português nas escolas públicas. O número de alunos da Escola Alemã diminuiu com o início das reformas educacionais do período do Estado Novo

Durante a Segunda Guerra Mundial, os habitantes da colônia sofreram com associação ao nazismo. Muitos imigrantes alemães foram perseguidos pela polícia, tiveram suas casas invadidas e alguns bens confiscados.

Com o passar do tempo, aprender alemão perdeu importância entre os colonos, pois começaram a se considerar integrados à sociedade brasileira. Este processo de aculturação da colônia foi movido por vários fatores, entre eles a Segunda Guerra Mundial, nacionalização do ensino e casamento de seus habitantes com pessoas de fora da colônia. Entretanto, micro-resistências dos habitantes se mantinham, como a preservação da língua dentro dos espaços do lar.

Em suas considerações finais, a autora salientou a relação construída dos imigrantes com a sociedade brasileira, como eram vistos por nós e como entendiam o Brasil. A colônia alicerceava-se na escola e na igreja, sendo o colégio um lugar de construção da cultura, da língua e cidadania.

Com a mudança de hábitos na colônia, ocorreram alterações também na Escola Alemã. Ela ficou responsável pela formação dos filhos dos colonos para a obtenção de postos de trabalho melhores que de seus pais. Entretanto, na medida em que se exportou mão de obra qualificada, se impôs um fim lento e gradual da colônia e, com isso, de sua escola.

A obra Trajetória educacional dos imigrantes alemães no Estado de São Paulo é ímpar ao mostrar o papel da educação como sinônimo de oportunidades a imigrantes em uma localidade nova. O livro aborda a coesão de um povo para a manutenção da sua cultura e de suas práticas sociais, distantes de sua pátria mãe. Com uma escrita agradável e esclarecedora, a autora faz o leitor analisar o papel da educação como algo fortalecedor de uma comunidade em prol da prosperidade coletiva e manutenção de suas raízes histórico-culturais.

Thiago Henrique Sampaio – Mestrando pelo Programa de Pós-Graduação em História pela Faculdade de Ciências e Letras (UNESP/Assis).

Marcha contra o saber: o golpe militar de 1964 e o AI-5 na Universidade de São Paulo | C. Giannazi

RC Destaque post 2 11 Golpe Militar de 1964

Marcha contra o saber, título mais eloquente não poderia ser dado para uma obra cujo foco é entender os impactos causados pelo regime militar no sistema universitário brasileiro. O livro é resultado da dissertação de mestrado1 de Carlos Giannazi, defendida em 1995 na Faculdade de Educação da USP. Sua motivação ao realizar a pesquisa foi a de levar à compreensão de como a ditadura transformou os setores da educação em inimigos privilegiados. A obra está dividida em prefácio (escrito por Vladimir Safatle), introdução, dois capítulos e conclusões. Algo que merece atenção é que os capítulos não possuem títulos definidos e carregam uma variedade de subtítulos sobre os casos que aconteceram durante o período abordado.

Giannazi reflete sobre os efeitos das arbitrariedades do regime para que não caiam no esquecimento e que suas consequências não continuem se prologando em silêncio na sociedade brasileira. Lançado em 2014, ano de 50 anos do Golpe de Militar, a obra permite que o leitor entenda que o saber se configura como um elemento de poder. Demonstra que não apenas as Ciências Humanas tinham sido constituídas como inimigas da ação da Ditadura, mas que o espectro das atitudes desta era muito maior, atingindo diversas áreas e setores educacionais. Leia Mais