A imprenta y tírese. 80 años de la editorial CSIC | José María López Sánchez e Aba Fernández Gallego

La Editorial CSIC celebra su 75o aniversario Imagens CSIC
La Editorial CSIC celebra su 75º aniversario | Imagens: CSIC

El segundo número de la flamante colección “Historia del CSIC” de la editorial del Consejo es un voluminoso libro editado en tapa dura que aborda, en esta ocasión, no tanto la historia administrativa e institucional del Consejo Superior de Investigaciones Científicas (CSIC) (que también), sino, más concretamente, la historia de su Oficina o Departamento de Publicaciones. En otras palabras, el lector o lectora que se acerque a este libro encontrará en él una exhaustiva historia -fundamentada, principalmente, en un intenso y riguroso trabajo de investigación en fondos archivísticos- de los orígenes y el desarrollo de lo que hoy es la Editorial CSIC.

Una historia, por tanto, que hunde sus raíces necesariamente en los albores de la dictadura del general Francisco Franco (1892-1975) y en las entrañas del arbor scientiae del CSIC, la “joya de la corona” -dirán los autores- del ministro José Ibáñez Martín (1896-1969), su fundador y primer presidente. Así, navegando entre órdenes ministeriales, informes y demás documentos oficiales, los lectores conocerán cómo al tiempo que se articulaba normativamente al Consejo se creaba también, en abril de 1940, el cargo de Vicesecretario General del CSIC que ocuparía Alfredo Sánchez Bella (1916-1999). Él será el principal encargado de dar forma al embrión de la Oficina de Publicaciones del CSIC gestada entonces, paradójicamente, a partir del depósito de publicaciones de la extinta Junta para Ampliación de Estudios (JAE) y de los contratos de edición recibidos del Instituto de España. No obstante, pronto se pondría en funcionamiento un verdadero servicio editorial propio que encontró en la figura de Rafael de Balbín Lucas (1910-1978) al hombre que orientaría su política de publicaciones durante más de treinta años.

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Historia de la prensa escrita en San Juan. Publicaciones sanjuaninas en tiempos de la Organización Constitucional (1852-1858) | María Gnecco, Fabiana Puebla, Carlos Moreno, Gema Contreras, Inés Rueda, Yemina Chiefalá, Silvia Sánchez, Guillermo Pereira, Enrique Rodríguez, Diego Heredia e Verónica Robles

La importancia de la prensa como fuente y objeto de estudio conforma una de las principales variantes de la renovación historiográfica experimentada en las últimas décadas. Esa concepción es la que toman y profundizan las y los investigadores en Historia de la prensa escrita en San Juan. Publicaciones sanjuaninas en tiempos de la Organización Constitucional (1852-1858). 1 Dicha publicación, si bien escrudiña en los aspectos generales apuntados en la primera línea, a través de los diferentes capítulos propone y desarrolla diversos objetivos atinentes a la historia provincial y nacional, incluso, incurre en ciertas propuestas metodológicas.

La investigación centra su atención en los avatares políticos del convulsionado territorio de San Juan de mediados del siglo XIX, donde el traspaso hacia nuevos tiempos llevó a implementar a nivel local inéditas experiencias institucionales –como la sanción de la primera constitución– acompañadas, al mismo tiempo, de la acrecentada violencia ejercida en manos de grupos en disputa por el poder en la escena política sanjuanina. La particularidad del mentado espacio cuyano trascendió notablemente al nivel de la Confederación Argentina, producto de distintos magnicidios –por ejemplo, el asesinato del exgobernador Nazario Benavides– que contribuyeron a la inestabilidad del proyecto nacional inaugurado por Justo J. de Urquiza a comienzos de la década de 1850. Esta vorágine es abordada mediante el prólogo y diez capítulos donde pueden identificarse tres tipos de trabajos –no presentados en forma consecutiva– caracterizados por la indagación de cuestiones teóricas, un periódico en particular o estudios de caso dentro de la prensa. Leia Mais

Imprensa italiana no Brasil, séculos XIX-XX – TRENTO (RBH)

TRENTO, Angelo. Imprensa italiana no Brasil, séculos XIX-XX. São Carlos: Ed. UFScar, 2013. Zaidan, Roberto. 276p. Resenha de: BIONDI, Luigi. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.35, n.70, jul./dez. 2015.

Décadas de pesquisa sobre o tema da imigração italiana, que renderam algumas das obras mais referenciais nesse âmbito historiográfico, levaram Angelo Trento, da Universidade de Nápoles “Istituto Orientale”, a aprofundar um dos aspectos centrais para a compreensão do mundo dos imigrantes no Brasil no livro Imprensa Italiana no Brasil, séculos XIX-XX, tradução para o português da edição italiana La costruzione di un’identità collettiva. Storia del giornalismo in lingua italiana in Brasile (Viterbo: Archivio Storico dell’Emigrazione Italiana, 2011).

Na sua obra La dov’è la raccolta del caffè, publicada no Brasil com o título Do outro lado do Atlântico (São Paulo: Studio Nobel, 1989), ainda hoje a obra mais completa sobre a história dos italianos no Brasil, na qual a imprensa produzida por eles tomava um espaço temático próprio em alguns capítulos embora atravessasse o livro inteiro como fonte principal, Trento inseriu um apêndice com mais de quatrocentos periódicos italianos publicados no país. Esses foram o ponto de partida para pesquisas sucessivas que levaram Trento, nos últimos anos, a centrar a análise sobre a história dos impressos periódicos em língua italiana no Brasil, durante o século XIX e até a década de 1960. Aquela antiga lista se enriqueceu de mais títulos, encontrados nos arquivos do Brasil, Itália, Holanda e França, e se tornou o corpus documental que fundamenta agora, no seu livro Imprensa italiana no Brasil, uma história exaustiva da expressão escrita, em jornais, pelos imigrantes italianos.

Trento não se limita a tratar essa imprensa como formadora de representações de uma coletividade de imigrantes, indaga sobre os fundamentos sociais dos impressos periódicos e de seus grupos editores e sobre a relação destes com as redes de assinantes, os leitores e a comunidade italiana imigrada em geral. O jornal, além de ser o veículo intencional de transmissão de informações, configura-se como porta-voz e ao mesmo tempo articulador de grupos específicos, utilizando e forjando redes de imigrantes, polo agregador de sua intervenção na nova sociedade. A imprensa étnica como mediadora da transnacionalidade, na qual Trento enfatiza, na melhor tradição historiográfica italiana, suas dinâmicas políticas.

Essa imprensa é estudada também como construtora e expressão de identidades: a nacional – a italianidade – e as regionais, políticas e de classe, todas em suas diferentes e muitas vezes conflitantes versões, todas passando pela via da comum origem num Estado-nação de recente formação. O ser e sentir-se italiano numa experiência de migração por meio da imprensa, declinado em uma miríade de identificações complementares, parece ser o fio condutor de uma trajetória que o autor concentra entre o período da “grande imigração” (1885-1915 aproximadamente) e meados dos anos 1960, quando o longo processo de integração e os fluxos migratórios dos italianos terminam.

Trento dedica mais de metade da obra ao período entre 1880 e a Primeira Guerra Mundial, com dois capítulos iniciais: o primeiro para a imprensa como um todo e o segundo para a imprensa operária. É nessa época que o periódico impresso se configura não somente como órgão de informação, mas também como polo agregador dos próprios imigrantes italianos que chegam em massa ao Brasil. É o período do protagonismo político, comercial e industrial do Brasil urbano, quando o diário em língua italiana Fanfulla, a “joia da coroa” da então colônia ítalo-paulista, narra as vicissitudes da experiência migratória de cerca de um milhão de italianos – e não somente os de São Paulo, pois esse diário, assim como outros periódicos étnicos, era lido para além das fronteiras estaduais. Trento não se limita a estudar o fenômeno migratório nas suas amplas dimensões paulistas, também lança um olhar para as coletividades nos outros estados, para a imprensa italiana desde o Pará até os centros gaúchos e sulinos em geral, nestes bastante difusa.

Nesses dois capítulos, Trento explica a difusão extraordinária de alguns jornais, como os diários Fanfulla e La Tribuna Italiana, e das publicações explicitamente políticas como La Battaglia (anarquista) e Avanti! (socialista), e ao mesmo tempo analisa os vários periódicos que tiveram uma vida difícil, mas que, tomados em conjunto, tornam a expressão escrita da imprensa dos ítalo-brasileiros nesse período importante e significativa, a par de outras como as da Argentina ou dos Estados Unidos.

A separação dessa fase da “grande imigração” em duas esferas temáticas, ao longo de dois capítulos, pretende destacar o papel político da imprensa. No capítulo 1, a grande imprensa e os periódicos culturais, de notícias e multitemáticos, são analisados não somente nos seus aspectos gerais estruturais e representativos, supostamente neutros, mas também nas suas atenções ao mundo da grande massa dos imigrantes, incluindo o surgimento de um jornalismo investigativo étnico, que indaga sobre as condições materiais da coletividade, seus anseios e suas expressões políticas. O subcapítulo final introduz uma pesquisa pioneira sobre a imprensa de língua italiana durante a Primeira Guerra Mundial, num momento em que o nacionalismo italiano e a construção da identidade nacional no exterior vivenciam, por causa da guerra, uma intensificação extraordinária, enquanto os imigrantes experimentam novas tensões derivadas da radicalização das lutas operárias.

A “Outra Itália” de esquerda é o tema do capítulo 2, onde o foco é completamente voltado para entender a vida da imprensa em língua italiana que foi expressão de tendências e grupos políticos específicos, ligados ao mundo do trabalho urbano. Sobretudo em São Paulo, mas não somente ali, essa imprensa conseguiu frequentemente se tornar o polo agregador de anarquistas, socialistas, republicanos, radicais e sindicalistas, bem como de trabalhadores em geral. Um protagonismo conhecido na historiografia da história social e política dos trabalhadores no Brasil, que Trento, pela primeira vez após muitos anos, analisa num único capítulo de forma conjunta, coerente e renovada, incorporando as novas pesquisas suas e de outros colegas sobre o tema.

Temos um olhar completo para essa história, sem privilegiar a análise de uma ou de outra tendência, mas as conexões entre elas e o panorama dessa trajetória em sua complexidade, desde as origens, passando pelo auge dos anos 1900-1917, até o declínio no período posterior à Primeira Guerra Mundial, quando a imprensa reflete a diluição dos elementos étnicos da classe operária. Por isso, o autor dedica parte importante desse capítulo ao debate “identidade étnica versus identidade de classe” na imprensa política de língua italiana, tema ainda central nos estudos migratórios e da formação da classe trabalhadora nas Américas.

Na segunda parte do livro, o autor enfrenta a questão da penetração do fascismo na imprensa italiana, sua gradual conquista das redações, sua eliminação em outras, o surgimento e declínio, nas décadas de 1920 e 1930, da imprensa antifascista que viu no Brasil o episódio interessante e multipartidário do jornal La Difesa, enquanto o diário Fanfulla se dobrava aos interesses do governo italiano e ao mesmo tempo continuava se propondo como o porta-voz da italianidade no país. Trento se dedica ao exame de uma imprensa étnica ainda consistente, mas cada vez menor, não comparável em número, qualidade e variedade com a dos primeiros 30 anos republicanos. Uma imprensa que progressivamente se fecha em torno das questões ligadas à colônia, mediadora cultural de uma Itália cada vez mais distante e menos frequentada.

A imprensa é estudada para entender a capacidade de adaptação à nova situação brasileira, o equilíbrio entre as influências do fascismo italiano e as tensões derivadas desse posicionamento frente à política nacionalista do Estado Novo e à guerra.

A nova fase que se abre com o pós-guerra se ressente dessa história, de um passado não falado que Angelo Trento analisa no último capítulo, no contexto migratório mais recente, da segunda metade do século XX.

Entre a retomada no Brasil de posições políticas proibidas na nova Itália republicana (o neofascismo no exílio) e a narração da experiência migratória dos anos 1950 e 1960 (até 1965, quando o Fanfulla encerra sua publicação diária), o autor examina o conjunto muito menor de uma imprensa étnica testemunha de uma coletividade italiana imigrada, renovada sim pelos fluxos migratórios do pós-guerra, mas excepcionalmente reduzida.

Trento interpreta a função histórica da imprensa italiana no exterior como expressão viva do mundo dos imigrantes. Ao desaparecer a condição de migrantes, ao sumir gradualmente a operatividade das relações, das redes e das circularidades transnacionais, também essa imprensa deixa de existir. Apesar das dificuldades objetivas na prática da leitura de uma massa imigrante mediamente iletrada, o trabalho de Angelo Trento destaca que foi no período áureo da “grande imigração” que a imprensa étnica italiana mais se desenvolveu, âncora de uma transnacionalidade em ação.

Finalmente, é importante sinalizar que, além do valor da obra como o mais recente e mais aprofundado estudo sobre a história da imprensa italiana no Brasil, o livro se constitui como um recurso de pesquisa fundamental, terminando com um inventário cronológico completo e classificado por estado de mais de oitocentos periódicos em língua italiana publicados no país, onde se indica também a colocação arquivística de cada jornal.

Luigi Biondi – Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (EFLCH), Departamento de História. Guarulhos, SP, Brasil. E-mail: [email protected]

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História Cultural da Imprensa – Brasil 1800-1900 | Marialva Barbosa

Marialva Barbosa faz um passeio investigativo minucioso e criterioso, em sua obra “História Cultural da Imprensa – 1800-1900”(2010), partindo da chegada da família real em território nacional, que em fuga à eminente invasão de Napoleão de Portugal, inaugura no Brasil a imprensa, com mais de trezentos anos de atraso, já que Gutenberg criou a prensa de tipos móveis, em meados do século XV, na Mogúncia, Alemanha, sendo rapidamente expandida por toda Europa e chegando, inclusive, ao México poucos anos depois. (GIOVANINNI, 1987).

Com a fundação da Impressão Régia em terras brasileiras, é também criado o primeiro jornal oficial brasileiro “Gazeta do Rio”, em 10 de setembro de 1808, ressaltando que a imprensa no Brasil chega em meio à polêmica, uma vez que dois meses antes já circulava em terras brasileiras um jornal, clandestino e opositor à Coroa, produzido em Londres por Hipólito da Costa chamado Gazeta Braziliense. Leia Mais

Leituras, projetos e (Re)vista(s) do Brasil (1916-1944) – De LUCA (RBH)

De LUCA, Tania R. Leituras, projetos e (Re)vista(s) do Brasil (1916-1944). São Paulo: Ed. Unesp, 2011. 357p. Resenha de: NEVES, Livia Lopes. Revista Brasileira de História. São Paulo, v.32, no.63, 2012.

A autora Tania Regina de Luca, que é pesquisadora reconhecida no campo intelectual nacional e internacional, graduou-se em História na Universidade de São Paulo, instituição na qual obteve o título de mestre e doutora em História Social. Sua trajetória afina-se com as discussões relativas à História do Brasil República, e sua atuação profissional envolve principalmente os seguintes temas: Historiografia, História da Imprensa, História Social da Cultura e História dos Intelectuais. A imprensa na Era Vargas tem sido seu foco de pesquisa atualmente, tema esse contemplado em parte por seu livro recém-lançado e objeto da presente resenha. Se seus estudos muitas vezes fizeram referência à Revista do Brasil, como em Leituras, projetos e (Re)vista(s) do Brasil, a autora não deixou de dar continuidade a seus trabalhos anteriores de forte teor metodológico acerca do trato com o periodismo cultural brasileiro, e o que de fato se agregou ao debate foi o estudo de outras publicações de cunho cultural, o que proporcionou uma visão ampla acerca da produção intelectual do período veiculada por esse suporte. Tal acréscimo permite também a discussão sobre as leituras e os projetos do e para o Brasil, tanto políticos como culturais, que agregaram parte dessa intelectualidade envolvida com tais empreendimentos editoriais.

Ao longo do texto a autora frisa a importância de atentarmos para o percurso metodológico que orientou sua análise, o qual, segundo ela, representa uma colaboração para a construção de uma forma específica de abordagem dos impressos. As contribuições, dessa maneira, seriam dadas por conta de alguns aportes metodológicos, como por exemplo, atentar para a dinâmica dos grupos intelectuais, para os aspectos relativos ao suporte, e também para as apresentações de ordem material e tipográfica (capa, papel, ilustração, propaganda, paginação). Todos esses elementos, de maneira geral, já haviam sido objeto de reflexão da autora, figurando entre as importantes contribuições para estudos dessa natureza no campo da história. Além dos citados, ganharam destaque em sua análise fontes que colaboraram para a apreensão das relações e atuações dos editores e mentores das publicações: as correspondências, as memórias e as produções autobiográficas.

A soma dessas frentes de pesquisa, anunciada na introdução do livro, demonstra de antemão a amplitude da proposta da autora, que estabeleceu diálogo profícuo com autores que se propuseram a discutir as sociabilidades intelectuais, o campo intelectual (brasileiro ou não) e as relações que aproximaram ou distanciaram os intelectuais e o Estado, como Sirinelli (1990), Pluet-Despatin (1992), Bomeny (2001), Miceli (2001) e Candido (2001), ou com autores que, assim como ela, ofereceram aportes para a análise de jornais e revistas, como Doyle (1976), Prado e Capelato (1980), e mesmo com os que se debruçaram sobre publicações específicas, como Boaventura (1975), Caccese (1971), Guelfi (1987), Lara (1972), Leonel (1976), Napoli (1970) e Romanelli (1981), entre outros.

Estruturado em quatro capítulos que seguem cronologicamente as fases mais expressivas de sua publicação o livro confronta a Revista do Brasil às demais revistas coetâneas. Pareceu ser essa uma boa forma de se aproximar de um panorama editorial – ainda que sobremaneira calcado na retomada das mais destacadas revistas da época, certamente as mais estudadas atualmente – que consistiu em uma grande revisão bibliográfica sobre cada uma dessas publicações e na consulta a diversas fontes periódicas orientada por um olhar mergulhado em novas preocupações. Ao somar os estudos das fontes aqui citadas, De Luca nos apresenta uma obra enriquecida e madura, que evidencia a importância de se atentar para as redes de sociabilidade intelectuais e para a fluidez do campo intelectual, bem como para o impacto de um elemento sobre o outro.

No primeiro capítulo, “A Revista do Brasil (primeira e segunda fases) e os periódicos modernistas”, a autora procurou articular as fases iniciais da revista com as publicações modernistas fundadas a partir de Klaxon, realizando a análise com dupla perspectiva: da sincronia e da diacronia, sendo a primeira responsável por dar conta do momento da publicação de cada fase da Revista do Brasil e do diálogo com as congêneres contemporâneas. A segunda perspectiva ocupou-se das diferentes fases e de suas possíveis articulações. Para tanto, a autora elaborou um gráfico (reproduzido no livro entre as páginas 69 e 70), no qual apresenta uma seleção das revistas literárias e culturais em circulação entre o lançamento da Revista do Brasil, em janeiro de 1916, e meados da década de 1940, quando do encerramento de sua quarta fase. Nesse capítulo ganham destaque: NovíssimaEstéticaA Revista Terra Roxa e outras terras.

Já no segundo capítulo, nomeado “Revistas literárias e culturais (1927-1938)”, a autora nos traz uma visão panorâmica percebendo que em termos de longevidade, até o início da década de 1930 continuaram a ser fundadas revistas de breve duração – à exceção da Revista Nova, que circulou durante mais de um ano –, VerdeFestaRevista da AntropofagiaMovimento BrasileiroBoletim de ArielRevista AcadêmicaLanterna Verde, Dom CasmurroDiretrizes, Cultura Política e Movimento Brasileiro recebem uma análise não muito minuciosa, conforme previamente anunciado pela autora ainda no título. Nesse capítulo foram discutidos, do mesmo modo, aspectos como o alinhamento de projetos editoriais a tendências políticas e a elementos do mundo editorial na conjuntura do pós-1930, encerrando discussões sobre as condições do exercício da atividade intelectual e a proliferação de editoras no Brasil. A autora promove, de forma bastante pertinente, o debate sobre a censura à imprensa e o alinhamento de periódicos à plataforma governista durante o Estado Novo e defende uma análise historiográfica que priorize a dinâmica de posicionamentos em detrimento de rótulos unidimensionais, o que, via de regra, anula uma série de complexidades que envolvem os empreendimentos editoriais.

Revista do Brasil (3ª fase): inserção no mundo letrado, objetivos, características e conteúdo” é o título do terceiro capítulo, que trata da retomada da publicação da Revista do Brasil em julho de 1938, com sua diversidade de assuntos e a preocupação com problemas nacionais, ainda que se explicitasse como um projeto cultural de corte elitista.

No quarto e último capítulo, intitulado “A Revista do Brasil e a defesa do espírito”, é retratado o momento em que a publicação voltou a circular, período marcado pela ascensão das forças autoritárias na Europa e do Estado Novo no Brasil, o que gerou limitações impostas à liberdade de expressão por parte do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP). Ao atentar para o fato de que as práticas liberais, o individualismo e a democracia eram aspectos defendidos por vários articulistas da revista, De Luca destaca a especificidade da publicação em questão frente a algumas coetâneas, quadro que se alterou após 1942 com a adesão brasileira à política pan-americana.

O que se apresenta em Leituras, projetos e (Re)vista(s) do Brasil é um método de análise novo e frutífero, capaz de esclarecer o lugar ocupado pela publicação na história da imprensa, especialmente com base em alguns diálogos com as congêneres contemporâneas, o que demandou, segundo De Luca, que se aliassem sistemáticas consultas às coleções citadas à leitura e ao estudo de outras fontes, sobretudo as advindas do que se convencionou chamar de ‘escritas de si’.

Sentiu-se certamente a ausência de imagens relacionadas ao tema e aos periódicos recorrentemente citados, o que enriqueceria a obra e poderia angariar, talvez, um público leitor mais amplo que o acadêmico. A iniciativa de dinamizar a leitura disponibilizando no site da Editora uma série de tabelas produzidas ao longo da pesquisa, conforme consta na nota dos editores presente no livro, mostrou-se pouco eficiente tendo em vista a dificuldade em encontrá-las de fato. Mais interessante seria que essas tabelas constassem na obra e acompanhassem a linha de pensamento desenvolvida, clarificando muitos dos nós relacionados ao objeto de estudo do livro.

Destarte, a contribuição que pode ser apreendida a partir desse trabalho reside, a meu ver, na aplicação metodológica plural que propôs a agregação de aportes que tratam do estudo de periódicos como objeto e fonte, desde os primeiros estudos gerais sobre periódicos – empreendidos sob a coordenação do professor José Aderaldo Castello, que estribou sua pesquisa preferencialmente nos acervos do Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo (IEB-USP) – aos obtidos a partir da renovação das práticas historiográficas, que vislumbram a importância do estudo do periodismo cultural cotejado com outras fontes, como as iconográficas, epistolares, os relatos memorialísticos e autobiográficos.

NEVES, Livia Lopes.-  Mestranda do Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Bolsista CNPq. [endereço] [email protected].

Livros e impressos: retratos do Setecentos e do Oitocentos – NEVES (HH)

NEVES, Lúcia Maria P. das (org.). Livros e impressos: retratos do Setecentos e do Oitocentos. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2009, 333 p. Resenha de: Resenha de: CAMPOS, Adriana Pereira. Crítica e opinião na imprensa brasileira dos Setecentos e Oitocentos. História da Historiografia. Ouro Preto, n. 7, p. p.350-356, nov./dez. 2011.

Com o fenômeno da expansão das pós-graduações no Brasil, as coletâneas registraram crescimento conjunto. Essa feliz combinação permite que hoje se produzam no país livros temáticos em diversos campos de pesquisa, com enriquecedora contribuição de distintos autores. Esse é o caso da obra Livros e impressos, organizada pela historiadora carioca Lúcia Maria Pereira das Neves, professora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro. O objeto central de análise do livro compreende a constituição histórica da imprensa e do mercado editorial no país, abordados a partir da visão particular dos autores-colaboradores.

A diversidade de abordagens reunidas no volume em questão, contudo, só fez realçar a unidade temática que uma obra do gênero deve perseguir, deixando ao largo o risco, sempre presente, de o empreendimento não ultrapassar os limites de uma simples compilação. Os leitores poderão observar, assim, a recorrente preocupação dos autores em examinar a construção de uma esfera pública de crítica, bem como a constituição da opinião pública no Brasil na passagem do Setecentos para o Oitocentos. A imprensa e o mercado editorial convertem-se em objeto das inquietações dos autores, assim como, a formação da cultura política nacional. Não se estranha, portanto, que dos dez capítulos da coletânea, seis façam referência explícita a Jürgen Habermas (1984), formulador do conceito de esfera pública, foco de análise do livro. Outra preocupação recorrente da obra consiste na constituição dos espaços de formulação das linguagens políticas. Com efeito, o leitor confronta-se com o fato de a imprensa possuir papel fundamental na formação do Estado brasileiro, enquanto lugar da crítica e da autonomia. O livro dedica-se, portanto, ao ambicioso projeto que inclui objeto e instrumental teórico da história cultural para decifrar problemas da história intelectual (do livro e dos impressos) e da história política.

A coletânea examina também algumas noções fundamentais para a compreensão do surgimento da imprensa no Brasil. Mais precisamente, como a formação da esfera pública no país se processou por meio da transição entre periódicos mais típicos do Antigo Regime, submetidos ao escrutínio do monarca, para outros de conteúdo mais crítico e de opinião. Os primeiros compreendiam as gazetas e, os segundos, os jornais. Essa delimitação fica mais claramente demarcada na Parte I da coletânea intitulada Imprensa, livros e representações.

No capítulo de abertura desta parte, Maria Beatriz Nizza da Silva elabora um quadro dos primeiros anos de desenvolvimento da imprensa no Brasil, quando se criou a Impressão Régia em 13 de maio de 1808. A autora explora a Gazeta do Rio de Janeiro e a Idade d’ouro do Brasil (Bahia), que seguiam rigidamente o modelo das gazetas, cujo objetivo resumia-se a divulgar notícias recolhidas das grandes metrópoles europeias. De igual modo, houve a tentativa de reproduzir no Rio de Janeiro e na Bahia o sistema dos almanaques, periódico de divulgação de informações dos calendários solar, lunar, religioso, histórico etc. A iniciativa não logrou êxito, talvez porque os brasileiros já dispusessem de notícias da Corte no Rio do Janeiro por meio do Almanaque de Lisboa, que circulava amplamente no Brasil. O experimento mais crítico da época constituir-se-ia nos jornais literários, que versavam sobre história, literatura, mineralogia, entre outros assuntos, e pretendiam despertar o interesse do leitor nas artes, na literatura e na ciência. Além disso, durante a década de 1820, começavam a circular no Brasil os primeiros periódicos de divulgação do saber político, tais como o Seminário cívico, O bem da ordem, O amigo do rei e da nação e o Conciliador do Reino Unido. Obedecendo ao formato dos jornais, essas folhas já revelam a necessidade de liberdade da imprensa e a recusa em obedecer às limitações do rígido modelo das gazetas.

No segundo capítulo da primeira parte, Neil Safier discute a contribuição de um editor em particular à formação da opinião pública emancipacionista no Brasil. O autor examina a adesão de Hipólito da Costa à causa da emancipação dos escravos e da erradicação do tráfico por meio de seus artigos publicados no Correio braziliense. Debate ainda, amplamente, a posição de Hipólito da Costa em relação a sua defesa da extinção gradual da escravidão, que previa como fase preliminar a abolição do comércio de escravos, após o que se perseguiria, prudentemente, a extinção total da escravatura. Neil Safier julga a posição de Hipólito da Costa como ambivalente e ambígua, desconsiderando, porém, ser essa a posição de diversos defensores da emancipação dos escravos prevalecente no exterior. O juízo parece mais uma cobrança anacrônica do que uma apreciação balanceada do posicionamento político do editor, que escrevia do exílio na Inglaterra. Hipólito, cumpre notar também, reproduzia a ideia predominante à época na Europa, justamente a de emancipação gradual, o que não era pouco ao se considerar tratar-se de um membro da elite brasileira. À parte essa ressalva pontual, a contribuição de Neil Safier é importante por colocar Hipólito como editor e formador de certa opinião pública no país, propugnando teses emancipacionistas em pleno alvorecer do século XIX.

Empalmando a polêmica da emancipação escrava, o jornal de opinião editado por Hipólito inaugurava a sua trajetória preocupado com a divulgação de ideias novas no Brasil, reverberando as noções de liberdade numa terra marcada pelo cativeiro.

Lúcia Maria Bastos encerra a parte primeira do livro com a discussão da imprensa como espaço de crítica e de consagração servindo-se das resenhas de livros publicadas em folhas científicas e literárias no Oitocentos. A divulgação das obras convertia-se, segundo a autora, em ponto de interesse comum para uma elite intelectual em formação à época. As livrarias e as tipografias transformavam-se em espaços de socialização dos integrantes dessa elite, despertando em tais indivíduos o interesse por novidades políticas veiculadas nas obras debatidas. A historiadora, ademais, conclui que as reuniões conferiam prestígio aos participantes que, assim, alcançavam destaque na boa sociedade do Rio de Janeiro.

Na segunda parte do livro, constituída de quatro capítulos, verifica-se clara preocupação com a análise do papel dos impressos nas práticas políticas do período. No primeiro capítulo, Roger Chatier introduz a discussão conceitual a respeito da revolução da leitura operada no século XVIII. Do inventário de suas pesquisas, Roger Chatier afirma que essa transformação no século do Iluminismo foi apenas uma das revoluções da leitura, pois outras a precederam “ligadas à invenção do códex, às conquistas da leitura silenciosa, à passagem do modelo monástico da escrita para o escolástico da leitura” (NEVES 2009, p. 101). Outras ainda a sucederiam no século XIX, como “a democratização do público do impresso, e, hoje, com o aparecimento do texto eletrônico” (NEVES 2009, p. 102). Ele discorda das teorias que opõem uma leitura tradicional (intensiva) a uma leitura moderna (extensiva), esta última como a característica revolucionária única no século XVIII. Na primeira, o leitor encontrar-se-ia limitado a um corpus tradicional de textos lidos, relidos e memorizados. Na segunda, consumiria avidamente impressos novos e efêmeros, submetendo-os à crítica. O autor alerta, porém, que os romances e a literatura de cordel eram lidos, relidos e memorizados em pleno Setecentos. Subsistia, portanto, nessas novas formas de impressos, certa leitura intensiva. Desse fato, conclui Chartier ter havido, sim, certa multiplicidade das leituras à época. Com efeito, a variedade da produção impressa e a criação de novos tipos de jornais contribuíram não apenas para a formação de uma esfera pública de opinião, mas também para o estabelecimento dos pilares de uma sociabilidade política que colocou os negócios do Estado sob o escrutínio da crítica. A revolução ocorrida no século XVIII residiu, por conseguinte, na capacidade de multiplicar a leitura dos impressos.

Ainda na segunda parte do livro, José Augusto dos Santos Alves destaca a oralidade como um dos elementos constitutivos da opinião pública na passagem do século XVIII para o XIX. O autor evidencia a associação entre a oralidade e a escrita na divulgação da notícia e da informação, bem como na constituição do sujeito político e da opinião pública. A ocorrência do espaço público liberal firma- -se não apenas no encontro de leitores cultivados, esclarece o autor, como também no de leitores populares, tanto alfabetizados quanto iletrados, instaurando o debate mais amplo dos acontecimentos, anteriormente restrito aos grupos dominantes. As notícias transmitidas em voz alta, a leitura em círculos e outros encontros de divulgação oral das informações escritas configuram o transbordamento da crítica para grupos mais extensos, convertendo a palavra em “coisa pública” (NEVES 2009, p. 10).

Marco Morel, de sua parte, aborda a mudança no modelo de imprensa regular do Oitocentos, quando as chamadas gazetas, periódicos tradicionais das monarquias cederam lugar aos jornais, que se pretendiam formadores de povos e nações. A imprensa do Antigo Regime, como as gazetas, experimentou mudanças importantes e assimiladas posteriormente. Marco Morel expõe as transformações na Gazeta do Rio de Janeiro, órgão oficioso da Corte recém- -chegada à América portuguesa. Atribui a ampliação no tamanho das folhas do periódico à afluência de notícias e à liberdade de imprensa após a adesão de D.

João ao moderno constitucionalismo. Incluíam-se em suas páginas, por solicitação da própria gazeta, cartas dos leitores interessados em divulgar as luzes. Introduziam-se, paulatinamente, comentários do editor aos textos e documentos transcritos, assim como se noticiavam proclamações políticas de diversas localidades do Brasil. O movimento de autonomia do país provocaria a ampliação das opiniões e a redução das transcrições, demarcando a transição da Gazeta para um jornal, que se consolidaria em maio de 1824 com a nova denominação de Diário fluminense. Semelhante trajetória, como mostra Marco Morel, percorreu a Gazeta pernambucana, cuja conversão operou-se entre os anos de 1822 e 1824. Da trajetória descrita, portanto, observa-se que a mudança de um periódico do tipo do Antigo Regime para um mais crítico e de opinião pode ter se operado ainda no interior mesmo das gazetas, cujos redatores transformavam sua intervenção “na busca de se formular um ideário que se tornasse hegemônico, das tentativas de imposição de determinadas linhas políticas e de campos de interesse” (NEVES 2009, p. 179).

O último capítulo da segunda parte, de autoria de Marcello Basile, trata da questão federalista, cuja faceta ficou mais conhecida na historiografia como a descentralização promovida pela reforma constitucional concretizada pelo Ato Adicional. Segundo o autor, o assunto adentrou o Parlamento a partir da emergência do grupo de liberais exaltados que, por meio da imprensa e de suas associações, tiveram amplo êxito na repercussão do tema junto à sociedade.

Desse capítulo, depreende-se a importância da imprensa na mobilização política durante o período, que impunha certa pauta de assuntos no legislativo do Império. Verifica-se, igualmente, aquilo que Marco Morel e outros autores da coletânea chamam de imprensa de opinião, pois se nota os jornais dos liberais exaltados propalando a federação como princípio de participação política, enquanto a imprensa moderada e, sobretudo, áulica, rejeitava a ideia. O autor explora a imprensa como fonte, pois em sua narrativa a respeito das inúmeras votações da matéria, ele se deparou com diversos intervalos temporais sem registro nos anais. A solução empregada foi o recurso a jornais como o Aurora fluminense e o Jornal do commercio, solucionando, assim, tais omissões e resgatando importantes pronunciamentos que forneceram a sucessão quase diária das votações da questão federal no parlamento brasileiro.

A terceira parte do livro, intitulada “Livros, cultura e poder”, adentra os meandros da produção e da mercantilização dos livros. O primeiro capítulo, de lavra de Luiz Carlos Villalta, discute a vigilância do Antigo Regime sobre os livreiros, os livros proibidos e as livrarias em Portugal. Essa interessante investigação desvenda os caminhos, ou melhor, os descaminhos dos livros interditos e os expedientes empregados pelos livreiros para satisfazer o mercado.

O autor utiliza os documentos da Intendência Geral de Polícia e da Inquisição, responsáveis pela censura literária em fins do Setecentos e inícios do Oitocentos. De tais fontes, o autor identificou, por exemplo, as artimanhas dos importadores em encomendar os livros em folhas, deixando para encaderná-los em Portugal.

Outro recurso para contornar os censores consistia na alteração dos títulos para o correspondente em latim, despistando o conteúdo interdito dos livros.

Um estratagema adicional residia no envio de listas truncadas aos fiscais, omitindo-se, convenientemente, autores das obras ou mencionando-se vagamente o seu título. Eventualmente, recorria-se à autorização expressa de algumas pessoas poderem receber livros defesos como professores e membros do clero. A vigilância, no entanto, recaía sobre a troca desses livros com pessoas não autorizadas. Certos livreiros, assim, obtinham licenciamento para realizar o comércio de obras proibidas, mas os censores se incomodavam com os desvios que esse comércio autorizado assumia depois do ingresso das obras em Portugal.

Inclusive, os próprios comerciantes participavam dos esquemas para o contrabando dos títulos cujo destino deveria ser estrito às pessoas autorizadas pelo governo português. Outro ponto que o capítulo colabora para a reflexão geral da coletânea é a formação de certo ambiente de discussão e crítica, de onde germinaria uma esfera pública, conforme definição de Habermas. As livrarias convertiam-se em espaços de acesso à leitura de livros defesos e, amiúde, cediam lugar a discussões sobre o próprio conteúdo apreendido. Os indivíduos podiam dar voz à razão pública por meio do debate e da reflexão coletiva das obras lidas. O autor sugere em suas conclusões que as obras que ultrapassaram o bloqueio da censura contribuíram, de certa forma, para minar as representações e a fidelidade ao soberano, na medida em que seus leitores terminaram por instaurar um ambiente de crítica e de recepção de novas ideias.

O penúltimo capítulo do livro (segundo da terceira parte), de Ana Carolina Galante Delmas, recorre também a uma abordagem criativa e cuja interpretação parece muito sugestiva dos modos particulares de as pessoas lidarem com o poder. As dedicatórias às autoridades constantes nos impressos, para a autora, não revelam simplesmente um gesto de subserviência ao poder. Em sua opinião, significam importante expressão textual da interdependência na política. Mais uma vez, neste capítulo, verifica-se a preocupação com a formação da esfera pública pelo debate que se veiculava nos periódicos e livros em circulação. No início do Oitocentos, no entanto, a impressão constituía-se em privilégio concedido ao livreiro que se dispunha a ingressar na tarefa de editoração. As obras, por consequência, possuíam significado semelhante, uma vez que as bibliotecas tornavam-se a personificação de prestígio, avaliadas pela qualidade e raridade de seus volumes. A biblioteca real, portanto, deveria corresponder ao prestígio do soberano. Por outro lado, a obra que constasse nas prateleiras da realeza ganhava em prestígio e a homenagem postada no livro podia garantir o ingresso nesse templo dignitário. O autor, ao dedicar seus escritos ao monarca, por exemplo, podia garantir sua exclusão no rol dos defesos, o que representava grande vantagem. Além disso, a dedicatória poderia contribuir para o estreitamento dos laços com o rei e denotar, por outro lado, como bem observou Ana Carolina, os impulsos políticos de uma época. No Brasil, por exemplo, as homenagens postadas nos livros demarcaram, nos anos iniciais do Oitocentos, o desejo de permanência de D. João, o desejo de melhorar a sorte do Brasil com a presença da Corte nos trópicos. O levantamento das obras, elevadas à posição de reverência às autoridades, mostra que circulavam no período colonial, inclusive nos dois lados do Atlântico, volumes portadores de ideias ilustradas, em parte porque seus respectivos autores logravam alcançar a graça real por meio do galanteio registrado nas páginas iniciais.

Tania Maria Bessone encerra a coletânea com a história do rico e numeroso acervo da biblioteca de Rui Barbosa, conservado por toda a família após a morte de seu proprietário. Mantida na íntegra, fato raro na história das bibliotecas particulares, o conjunto desses livros demonstra, consoante a autora, a ambição consciente de Rui Barbosa em causar impacto com suas aquisições. Mais uma vez o livro, ou melhor, a sua coleção, conferia marca distintiva de prestígio a um cidadão. Tânia Bessoni evidencia em seu texto que poucas bibliotecas com essa natureza sobreviveram aos seus donos e isso, talvez, constitua-se numa das características mais preciosas da Biblioteca de Rui Barbosa. Nela é possível não apenas encontrar valioso acervo, mas também contabilizar obras que podiam granjear distinção ao colecionador. A preservação do mobiliário, bem como da organização dos livros, demonstra a dedicação de homens como Rui Barbosa para com suas bibliotecas. Ademais, trata-se da prova como os impressos adquiriram prestígio no Brasil e passaram a ocupar lugar de destaque na residência dos homens cultos do país.

Como última palavra, é mister louvar a iniciativa de Lúcia Maria Pereira Neves, que com o livro em tela não apenas nos remonta à história dos impressos e dos livros no Brasil, como também esclarece ao leitor os meandros da formação da opinião pública no Brasil imperial. Os diferentes textos, ao cobrirem o fenômeno da construção da imprensa e do mercado editorial, bem como da formação da opinião pública no país, revelam, em suas diferentes abordagens e temas, aspectos essenciais da política na passagem dos Setecentos para o Oitocentos, além de apontar aos interessados fecundas linhas de investigação futura.

Referências

 HABERMAS, Jürgen. Mudança estrutural da esfera pública: investigação quanto a uma categoria da sociedade burguesa. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984.

NEVES, Lúcia Maria P. das (org.). Livros e impressos: retratos do Setecentos e do Oitocentos. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2009.

Adriana Pereira Campos – Professora associada Universidade Federal do Espírito Santo. E-mail: [email protected] Avenida Fernando Ferrari, 514 29075-910 – Vitória – ES Brasil.

O impresso como estratégia de formação: Revista do Ensino de Minas Gerais (1925-1940) – BICCAS (RBHE)

BICCAS, Maurilane de Souza. O impresso como estratégia de formação: Revista do Ensino de Minas Gerais (1925-1940). Belo Horizonte: Argvmentvm, 2008, 216 p. Resenha de: GUIMARÃES, Paula Cristina David. Revista Brasileira de História da Educação, Campinas, n. 24, p. 193-219, set./dez. 2010.

O impresso como estratégia de formação: Revista do Ensino de Minas Gerais (1925-1940), livro publicado em 2008 pela editora Argvmentvm, é resultante da pesquisa de doutoramento empreen­dida por Maurilane de Souza Biccas, pós-doutora em Educação e professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, onde integra a coordenação do Núcleo Interdisciplinar de Estudos e Pesquisas em História da Educação (Niephe).

Com sólida experiência em trabalhos sobre impressos peda­gógicos que, recentemente, vem crescendo no Brasil e muito tem contribuído para os estudos em história da educação, Biccas realiza, neste trabalho, uma investigação sistemática sobre o impresso pe­dagógico mais representativo na história de Minas Gerais, a Revista do Ensino. A autora não se restringe somente à Revista; utiliza outras fontes documentais como jornais, decretos e leis da época pesquisada no intuito de complementar e esclarecer as informações obtidas da fonte principal de sua investigação.

Composto de seis capítulos, o trabalho destaca aspectos re­lacionados à materialidade, produção, circulação e distribuição da Revista do Ensino, “impresso pedagógico oficial de educação direcionado aos professores, diretores e técnicos da rede pública de ensino do estado de Minas Gerais” (p. 15), entre os anos de 1925 e 1940. A obra tem por objetivo “descrever e analisar os aspectos relacionados à materialidade da Revista aos conteúdos nela vei­culados, às mudanças ocorridas nos seus primeiros dezesseis anos de circulação e à produção de sentidos desencadeada por essas transformações editoriais” (p. 15). Para a realização do trabalho, autora fundamenta-se no campo de análise da “nova história cultural”, campo que vem impactando a produção historiográfica contemporânea e, de modo particular, a história da educação.

Quanto à materialidade da Revista, Biccas dispensa aten­ção especial à análise de capas, versos de capas, contracapas e quartas-capas dos números publicados. Como Marta Maria Chagas de Carvalho chama a atenção na apresentação do livro, a Revista do Ensino “não foi tratada como um veículo neutro para a comuni­cação dos conteúdos dos textos que edita, mas como performidade da ordenação da significação deles na materialidade mesma das diversas formas aplicadas à sua edição” (p. 13). Nesse sentido, Biccas recorre a autores que investem nesse mesmo pensamento quanto à importância da análise da materialidade dos impressos, tais como Roger Chartier e Michel de Certeau.

No primeiro capítulo do livro, “Ciclo de vida de um impresso oficial: Revista do Ensino 1925-1940”, a Revista é analisada dentro do seu momento histórico de constituição e circulação. A autora retorna ao momento de criação da Revista do Ensino, 1892, des­tacando que, após a publicação de apenas três números, a Revista foi desativada. Seu relançamento aconteceria em março de 1925, sendo interrompida entre os anos de 1940-1946 devido à Segunda Guerra Mundial, voltando a circular até 1971.

A Revista também é analisada como parte integrante e depo­sitária das mudanças educacionais ocorridas em Minas Gerais, como a Reforma Francisco Campos (1927). Na ocasião, o go­verno mineiro fez das páginas da publicação um valioso meio de apresentação, discussão, avaliação e estímulo à utilização das ideias pedagógicas renovadoras pretendidas por essa reforma. Esse impresso pedagógico também se revela como arena de disputas e acordos de diferentes interesses políticos e educacionais travados, por exemplo, entre católicos e “liberais”. Desse modo, e com as conexões que a autora realiza do momento histórico pesquisado, é possível perceber as relações de força que compunham o projeto editorial da Revista do Ensino.

Já no segundo capítulo, “Processos de produção e circulação”, a autora observa as formas de produção e as condições de circulação do periódico. Para tanto, faz uma descrição material e apresenta, de maneira detalhada e organizada, informações acerca de cada um dos 16 primeiros anos de circulação da Revista, relacionando: publicações, páginas por publicação, seções utilizadas, fotografias e ilustrações veiculadas, formato, presença ou não de propagandas, sumário e índice. Além disso, tendo em vista as diferentes formas de manipulação da Revista, a autora também analisa aspectos da dinâmica de apropriação que os professores faziam do periódico.

No capítulo três, “A dinâmica das formas e dos sentidos”, a pes­quisadora analisa as capas, versos de capas, quartas-capas e páginas finais que compõem a Revista do Ensino, a fim de explicitar como “conformam e se articulam os procedimentos de composição e de textualização” do periódico (p. 95). Nessa análise, Biccas percebe a capa como item de suma importância na composição da Revista, na medida em que atuava como um chamariz para a leitura. Para a autora, a capa representa um “espelho” dos diferentes projetos políticos e educacionais pelos quais a Revista passou, refletindo tensões, contradições e ambiguidades de tais projetos. Os diversos suportes que o periódico recebeu também foram objetos de análise para Biccas. Assim ela foi analisada, primeiramente, como anexo do Jornal Minas Gerais, depois como suplemento do mesmo Jornal e, finalmente, como Revista autônoma ao se desvincular do referido jornal. Oobjetivo dessa análise foi perceber como o suporte que veiculou a Revista marcava o modo como esta se apresentava para seus leitores.

No quarto capítulo, “Propaganda, publicidade e informação”, são analisadas a forma, o lugar e a intenção dos editores da Revista ao destinar um espaço para esse tipo de divulgação em um impresso educacional. Segundo a pesquisadora, 1929 foi o primeiro ano em que se veicularam propagandas na Revista de Ensino, além de ter sido o período de maior incidência propagandística. Nesse mesmo ano percebe-se que a maior parte dos anúncios de publicidade eram direcionados ao público-alvo da Revista do Ensino, os professores e diretores de escola. Os espaços destinados pelos editores a esses e outros tipos de anúncios foram as quartas-capas e, em alguns números, as páginas internas da Revista.

No capítulo cinco, “A Revista dada a ver: fotografias e ilustra­ções”, Biccas analisa as imagens veiculadas pelo periódico, para compreender a relação construída pelos editores ao apresentar fotografias e ilustrações como textos e também observar a atuação destes como elementos constitutivos do próprio periódico. Uma vez que a Revista do Ensino de Minas Gerais era um periódico oficial, os traços das políticas educacionais mineiras são evidentes em suas páginas. Por conseguinte, as imagens não são tratadas de forma periférica, mas analisadas como estratégias de transmissão de “mensagens que se pretende divulgar e inculcar” (p. 149). As fotografias e ilustrações utilizadas buscavam exprimir uma “men­sagem”, produzir um significado e um efeito junto aos leitores, chamando-lhes a atenção para uma nova concepção de educação que estava sendo forjada e deveria ser assimilada por eles. Nesse sentido, as imagens foram responsáveis pela divulgação de festas, prédios escolares, métodos pedagógicos e atividades escolares de crianças.

No sexto e último capítulo, “A síntese e difusão de modelos: esquadrinhando as seções”, a autora apresenta e analisa as seções que compõem os números da Revista, e observa que as seções sofreram processos importantes de constituição, permanências e rupturas dentro do projeto editorial. Para essa análise, Biccas apresenta dados sobre as seções, evidenciando o período em que elas foram criadas, o tempo de permanência e a que tipo de temá­tica se referiam. As seções também são analisadas tendo em vista a “política editorial adotada no período, procurando perceber que representação de professor-leitor os editores tinham e que propostas de formação foram traçadas a partir dessa concepção”.

Ao final da obra, Biccas conclui que os principais enfoques que guiaram a análise em sua pesquisa permitem considerar a Revista do Ensino “como um dispositivo de normatização pedagógica e de ampliação da cultura educacional dos professores” (p. 197). A Revista, ao mesmo tempo em que difundiu ideias e preceitos, promoveu determinados hábitos de leitura, modelados por suas indicações, configuração e forma como dispôs e organizou seus textos. Assim, a autora destaca que “ao mesmo tempo em que a Revista foi sendo produzida, também produziu e foi construindo o próprio campo educacional mineiro” (p. 200).

O livro resenhado expressa seu valor pela riqueza de detalhes, tais como a veiculação de gráficos e tabelas de informações, bem como pelos cruzamentos e comparações dos dados obtidos. Oolhar que a autora lança sobre seu objeto de pesquisa é, simultaneamente, singular e plural, ou seja, ao mesmo tempo em que isola os dados da Revista, Biccas os confronta e os articula, percebendo, assim, novos indícios de informações para suas análises.

No sentido empregado por Foucault (2002), a Revista do Ensino pode ser analisada como uma “tecnologia de poder”, na medida em que atuou como objeto de ação e de controle do gover­no mineiro sobre a atuação docente, sendo um suporte para leis, normas e recomendações das diretrizes educacionais durante seu período de circulação.

O impresso como estratégia de formação: Revista do Ensino de Minas Gerais (1925-1940) é tema relevante para a história da educação na medida em que nos leva a uma reflexão sobre as diferentes possibilidades de pesquisa oferecidas pelo impresso pedagógico, principalmente no que tange às ideias em formação no campo educacional de um determinado período.

É possível perceber, ainda, o processo em que se deu a pesquisa com a materialidade do objeto quando a autora expõe, de forma clara e objetiva, a forma como lidou com os processos de orga­nização da Revista para a realização do trabalho. Demonstrando sua posição sobre a importância de análise do material impresso, Biccas apresenta, durante sua obra, análises meticulosas da Revista do Ensino, evidenciando sua riqueza de indícios dos aspectos pe­dagógicos no contexto histórico do período analisado. Por isso, ao ler a obra, é possível perceber que, ao voltarmos nosso olhar para um objeto de pesquisa como o impresso pedagógico, acabamos por decifrar complexos processos educativos que permearam a educação brasileira em determinado tempo e espaço.

Com uma multiplicidade de dados, análises minuciosas e com um convite para novas pesquisas, o livro resenhado constitui um rico material de referência para historiadores da educação que pesquisam ou desejam pesquisar acerca de im­pressos pedagógicos.

Referências

Foucault, Michel. Os anormais: curso no Collège de France (1974-1975). São Paulo: Martins Fontes, 2002.

Paula Cristina David Guimarães – Mestranda em Educação pela Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ). E-mail: [email protected]

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História da imprensa no Brasil / Ana L. Martins e Tania R. de Luca

O livro “História da imprensa no Brasil”, lançado em 23 de julho de 2008, é organizado pelas doutoras em História Social Ana Luiza Martins e Tania Regina de Luca, ambas da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. Editado pela Contexto, a obra tem 304 páginas e reúne 11 pesquisas. Cada organizadora escreveu um texto, ao lado de mais nove convidados especialistas, entre eles, jornalistas, professores, sociólogos e historiadores. Os textos estão distribuídos em três grandes partes intitulados: “Primórdios da imprensa no Brasil”, “Tempos eufóricos da Imprensa Republicana” e “De 1950 aos nossos dias”. Todos fazem uma reflexão sobre “o singular e rico fazer histórico da imprensa brasileira2” e buscam “o elaborar uma história sistemática e abrangente do fazer jornalístico no Brasil3”, afirmam as historiadoras já na Introdução: pelos caminhos da imprensa no Brasil.

A diversidade do conteúdo prometida pelas organizadoras é cumprida à risca desde a primeira até a última página. A narrativa da obra cativa o leitor. As histórias relatadas são uma viagem ao longo dos 200 anos de imprensa no Brasil, começando lá nos idos de 1808, quando a corte portuguesa chegou ao Brasil. A partir deste fato histórico o primeiro jornal, o rádio, a televisão, as revistas e o surgimento das novas tecnologias como a internet são contextualizadas com os diferentes momentos políticos, sociais, econômicos e culturais ao quais os brasileiros vivenciaram.

O tempo não precisa estar explícito para se entender a narração. Cada página traz informações contadas de maneiras diferentes para quem já conhece alguns fatos ou para quem desconhece completamente. São detalhes de uma história observada por uma outra perspectiva. Trata-se de uma obra historiográfica para quem deseja conhecer a imprensa no Brasil.

A obra relata a história a partir de registros em documentos e de memórias dos bastidores da imprensa – escrita e falada –, dos personagens poderosos, da promiscuidade dos governos e do poder público com a imprensa, da censura e das relações ambíguas ou coniventes entre os meios de comunicação e os políticos. São muitas informações interessantes e curiosas, não reveladas naquela época e agora nesta obra divulgadas.

A Parte I que leva o título de “Primórdios da imprensa no Brasil” reúne dois textos. O doutor em História, professor do departamento de História da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e jornalista, Marco Morel, escreve “O surgimento da imprensa periódica: ordenar um espaço complexo”, onde relata sobre o surgimento da imprensa no Brasil em 1808 e a influência da Corte portuguesa para que ocorresse a instalação da tipografia da Impressão Régia. O que não significa que a imprensa tenha surgido de repente, já que redatores brasileiros conviviam, mesmo informalmente, “com a imprensa de outros países. Foi o caso dos estudantes brasileiros em Coimbra que circulavam pela Europa ou de emissários enviados pela Coroa portuguesa aos quatro cantos do mundo (…)4”. Já naquela época, ao lado da impressa, estavam a censura prévia e o oficialismo. Mas, ressalta ele, esse marco não significa que não existiram outras tipografias no país. Afinal, várias obras foram imprensas em diferentes regiões do país. Haviam prelos que faziam esse serviço. E as experiências pioneiras – “Correio Braziliense”, “O Patriota” – são reconstituídas por Morel.

A doutora em História Social Ana Luiza Martins traz o segundo texto “Imprensa em Tempos de Império”. Nele, o envolvimento da imprensa com a crise do Absolutismo, com o Segundo Reinado e com as ideologias políticas que predominavam nesse período. Tem informações sobre a Revolução Liberal, a Revolução Farroupilha, os movimentos entre liberais e conservadores e a história do Jornal do Commercio, considerado a principal voz oficial do Império (1826). Era um elo entre as províncias e o governo central e tinha uma função comercial clara perante seus leitores. Ela também menciona outros jornais que criaram novos padrões estéticos, como O Guarani, O Paulistano e A Província de São Paulo (atual O Estado de S. Paulo). Cita revistas femininas e folhetins, que conquistavam muitos leitores. “Coube à crônica, porém, exercer papéis múltiplos, ocupando o lugar do artigo de fundo, fazendo às vezes do que hoje se denomina editorial (…)5”. Veremos também descrições da imprensa propagandística, do jornalismo republicano, jornalismo abolicionista e como se comportava a imprensa que era oposição, até chegarmos ao fim do Império e entrarmos para a República, em 1889. A partir daí, o Brasil passa a viver sob um novo regime que se mantém até os dias de hoje.

A Parte II “Tempos Eufóricos da Imprensa Republicana” reúne o trabalho de quatro especialistas. Maria de Lourdes Eleutério, doutora em Sociologia, reconstitui na “Imprensa a serviço do progresso” o período da Primeira República (1889-1930) com diversos exemplos. Foi uma época de inovação tecnológica onde a ilustração com charges, caricaturas e fotografias foram incluídas na imprensa com força total. Um dos marcos é a revista Kosmos. Haviam jornais a favor do Império e outros da República, entre todos haviam jornalistas perseguidos, redações invadidas e a censura era permanente. Foi quando surgiu a Associação de Imprensa, garantindo assistência à classe e aos direitos dos profissionais da comunicação. Entre os diversos jornais que surgiram, permaneceu o Jornal do Brasil (1891). A imprensa também muda seu ritmo de trabalho e para se tornar ágil na transmissão das notícias, investe na cobertura in loco, com o repórter próximo ao fato. A linguagem mais coloquial e a crônica surgem com mais frequência nos jornais e revistas.

No início do século XX existiram milhares de jornais, alguns oficiais, comerciais, diários, semanais, religiosos, infantis. É o que diz Ilka Stern Cohen, doutora em História Social, no capítulo “Diversificação e segmentação dos impressos”. “A variedade de tendências políticas, contudo, não se repetia na aparência material6”, ou seja, mesmo com os avanços técnicos, os jornais eram parecidos. E geralmente o mercado superava o idealismo de alguns impressos. A autora destaca o entrelaçamento do jornalismo e da literatura e cita autores que conquistaram muitos leitores como Olavo Bilac, Monteiro Lobato, Menotti Del Picchia. A Belle Époque só é deixada de lado com o início da Primeira Guerra Mundial, que influencia a economia de diversos países, entre eles, o Brasil. Entre 1916 e 1925, foi a Revista do Brasil, com uma linha editorial voltada para ser um “núcleo de propaganda nacionalista7”, que se destacou na imprensa. Mudou nas mãos de Monteiro Lobato, a partir de 1918, ampliando um espaço para a literatura. Logo vieram as revistas ilustradas, com diversos temas, separados por muitas seções. Podemos destacar A Cigarra e Fon-Fon. O momento também é da Revista Feminina (1914-1936), que ditava as normas mais cabíveis para as mulheres da época. Foi um sucesso de vendagem e de valores. Cohen também dá detalhes sobre a imprensa que predominou nas comunidades, entre a classe operária – A Lanterna, A Vanguarda (1911) e A Plebe (1917) – com conteúdo político. Ao mesmo tempo, existiam revistas e jornais que pretendiam apenas informar com isenção, neutralidade, sem se posicionar a favor ou contra em determinados assuntos, como a Revista Brasileira (1934).

Com o professor titular de Teoria Literária da Unicamp, Antônio Arnoni Prado, conhecemos a relação “Imprensa, Cultura e Anarquismo”. O título abre caminho para sabermos mais a respeito de periódicos produzidos por e para anarquistas, revolucionários, comunistas e tolstoianos. Misturavam-se proletários, escritores profissionais, críticos, intelectuais e sociólogos a favor de uma causa. A história da Kultur, Spártacus, Renovação, A Vanguarda, Na Barricada e A Vida, por exemplo, é relatada das páginas 131 a 148 da obra. Como era o processo intelectual e a produção de cada jornal e qual era a repercussão que provocava na sociedade é registrada pelo autor neste texto.

Coube a doutora em História Social Tânia Regina de Luca escrever sobre a “A Grande Imprensa na primeira metade do século XX”, quando as máquinas modernas ocupam seus espaços e surgem novos meios de comunicação na sociedade: cinema, máquinas fotográficas, máquinas de escrever e fonógrafos. A vida fica mais dinâmica e a imprensa ganha novo impulso. É hora da publicidade e das agências norte-americanas ocuparem seus lugares dentro e ao lado da imprensa escrita. Surgem inúmeros títulos: Diário de Pernambuco (1825), Jornal do Commercio (1827), Correio Paulistano, Diário da Bahia (1853-1957), O Estado de S. Paulo, Jornal do Brasil (1891), Correio do Povo (1885) e Diário de Minas (1899).

E a história ganha contornos mais políticos quando é relatada no trecho que leva o subtítulo “Imprensa e o movimento de 1930”, com a chegada do presidente Getúlio Vargas a presidência da República. Entram em cena princípios liberais e democráticos e o nacionalismo, as disputas entre patrões e empregados, as influências do comunismo e o anticomunismo, e as propostas do Estado Novo para a nação brasileira, por meios de decretos e de uma legislação originada no autoritarismo e nacionalismo getulista. Um regime de censuras, restrições à liberdade de imprensa e abusos de poder que perdurou de 1937 a 1945.

A Parte III “De 1950 aos nossos dias” tem cinco textos, sendo o primeiro deles “Batalhas em letra de forma: Chatô, Wainer e Lacerda”, escrito por Ana Maria de Abreu Laurenza, jornalista e doutora em Ciências da Comunicação. De forma primorosa, ela descreve a relação entre esses três jornalistas, responsáveis por importantes veículos de comunicação, respectivamente, Diários Associados, que editava a revista O Cruzeiro, Última Hora, e Tribuna da Imprensa. Todos tendo como pano de fundo os governos de Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek e muitas histórias políticas, de negociatas feitas nos bastidores e, depois, muitas vezes, estampadas nas páginas da imprensa. O destaque fica para quem eram os donos desses jornais e revistas e como se comportavam no contexto onde estavam inseridos.

A história das revistas é contada no “A era das revistas de consumo” pelo jornalista e vice-presidente do Conselho Editorial do Grupo Abril, Thomaz Souto Corrêa, que narra o surgimento das primeiras magazines da editora Abril, instalada em São Paulo, contrariando todas as demais editoras que preferiam estar no centro da capital federal, no Rio de Janeiro. Começou editando O Pato Donald (1950), Capricho (1952) e Contigo (1963). As duas últimas ainda estão nas bancas, com uma nova roupagem e uma outra linha editorial. A Capricho, por exemplo, que tinha em suas páginas fotonovelas agora é voltada para os jovens. Mas outras revistas surgiram, entre elas, Quatro Rodas (1960), com serviço para o leitor sobre estradas e carros. Em 1961, a Abril lança a Claudia para concorrer com a Jóia, da editora Bloch, que depois se transformou em Desfile (1969). Segundo Corrêa, uma revista voltada para o público feminino e inteligente. Possuía uma redação com ótimos jornalistas como Rubem Braga, Marina Colasanti, Fernando Sabino e Vinicius de Moraes. Para completar, a jornalista Carmem da Silva escrevia artigos sobre temas que nem eram tratados na intimidade, quanto mais numa magazine. Ele cita também a Realidade, lançada em 1966, que concorreu com O Cruzeiro, Manchete e Fatos & Fotos.

Na página 218 começa a história da revista Veja (1968). O objetivo de Victor Civita era oferecer ao leitor informação rápida e mantê-lo bem informado, uma nova forma de encarar a função de uma publicação semanal. Mais tarde chegaram ao mercado outras revistas que também se mantém nas bancas até hoje: Isto É, da Editora Três (1977), e a Época da Editora Globo (1998). Mais adiante, ele explica sobre a segmentação das revistas e cita números. Em junho de 2007, por exemplo, a Abril detinha 41% dos exemplares vendidos no Brasil.

Da página 233 a 247, cabe a Flavio Aguiar, professor e editor-chefe da agência de noticias virtual Carta Maior, relatar os fatos marcantes da imprensa alternativa com os jornais Opinião, Movimento e Em Tempo. Mas, alerta o autor, as imprensas alternativas sempre existiram, desde 1808. Alguns jornais duraram mais, outros menos.

Pretendiam cumprir a sua missão editorial para ser lido por aqueles que desejavam um veículo isento ou pelo diferente dos existentes. Os alternativos vão além do que se convencionava dizer que são jornais que se opõem a “tendência hegemônica na imprensa convencional brasileira8”. O surgimento deles se justifica também pela falta de espaço para os jornalistas e de liberdade para escrever a partir do golpe de 1964. Como a informação era censurada, criaram-se novos espaços para se escrever e dizer o que pensavam grupos de jornalistas. E foi principalmente por causa do Ato Institucional número 5 e da censura mais ferrenha que muitos jornais, cerceados de noticiar determinados fatos, substituíram espaço por receitas de culinária. Segundo o autor, “Censores foram instalados nas redações dos jornais; circulares eram enviadas a elas, dizendo o que se podia dizer e o que não se podia, vetando assuntos, nomes de pessoas e até palavras, como Brizola, Arraes, ‘comunismo’, ‘tortura’, ‘etc’9”. Aguiar descreve as características e linguagens adotadas pelos três jornais, inserindo-os nos momentos marcantes da política brasileira. Dois deles acompanharam de perto o surgimento do Partido dos Trabalhadores e das centrais sindicais dos trabalhadores, na década de 80.

Foi com a nova Constituição de 1988 e a redemocratização do país que a imprensa alternativa perdeu sentido porque sua articulação, seu fortalecimento e sua sobrevivência se deu principalmente por causa da repressão e da ditadura de 1964, explica Aguiar. Hoje, afirma o autor, a imprensa alternativa está nos sites e blogs, novos meios de comunicação que saem fortalecidos com a nova cultura surgida por causa da internacionalização da mídia.

Sobre as novas tecnologias, quem se aprofunda é Luiza Villanéa, jornalista e mestranda em História pela Universidade de São Paulo. No texto “Revolução tecnológica e reviravolta política” ela descreve cenas de quem viveu na década de 1980 numa redação barulhenta, entre máquinas de escrever e muitos papéis, e se deparam, dez anos depois, com o computador. Um equipamento que era para agilizar a produção jornalística mas, às vezes, causava indignação porque sumia com os nossos textos e tudo por causa de problemas técnicos que não tínhamos controle. E logo veio a internet, acesso rápido a um mundo até então distante. Estávamos inseridos num cenário cada vez mais complexo e, ao mesmo tempo, a favor profissional de comunicação. Afinal, esse equipamento agilizava o trânsito de informações e o acesso às fontes.

A chegada da informática, conta Villanéa, começou no jornal Folha de S.Paulo.

Logo outros seguiram essa onda de modernidade como o Estado de S. Paulo, Jornal do Brasil e Zero Hora. Nessa Era, também, a cobertura ganhou uma dinâmica diferente e os acontecimentos políticos se destacavam. O Brasil vivia a redemocratização e a imprensa estava na cobertura das Diretas-Já, das eleições diretas (1989) e dos escândalos do governo Collor (1990-1992).

O último texto “O meio é a mensagem: a globalização da mídia”, escrito por Cláudio Camargo, jornalista e sociólogo, recupera o pensamento de um dos principais teóricos da comunicação, Marshall McLuhan (1911-1980). O século XXI tornou-se uma nova aldeia global, como ele havia profetizado, e agora por causa da informatização. “A revolução digital rompeu as fronteiras que antes separavam as três formas tradicionais de comunicação: o som, a escrita e a imagem10”. Estava decretado: a internet era o quarto modo de se comunicar e de se informar. Um dos aspectos negativos dessa nova fase para o Brasil é que a mídia eletrônica fica concentrada com poucos e grandes grupos empresariais da comunicação. Citando Venício A. de Lima, o autor diz que essas mudanças começam a partir dos “anos 1990 quando o Brasil passou a adotar uma agenda agressiva de privatizações e abertura ao capital externo para se integrar ao processo de globalização, as comunicações tornaram-se, a partir de 1995, o paradigma dessa nova política11”. O problema aumenta quando é aprovada a emenda constitucional de número 8 e ocorre a quebra do monopólio estatal das telecomunicações e as “leis que permitem a participação do capital estrangeiro nas áreas de telecomunicações e, principalmente, a Emenda Constitucional n. 36, de 2002, que autoriza a participação de pessoas jurídicas no capital social das empresas jornalísticas e de radiodifusão, inclusive de capital estrangeiro, limitado a 30% do total12”. Por causa disso, informa Camargo, ocorrem mudanças nas empresas tradicionais de jornalismo que afetam o controle acionário desses meios. Alguns grupos familiares que detinham o monopólio da grande mídia, exemplifica ele, são a família Marinho (Organizações Globo), Frias (Grupo Folha) e Sirotsky (Rede Brasil Sul). Em 2000, essas empresas registraram uma queda em suas receitas porque a circulação de jornais e de publicidade também diminuiu.

A partir daí, outras transformações ocorreram nos meios de comunicações.

Camargo registra no artigo quando o Grupo Folha cria o Universo On Line (UOL), marcando assim o ingresso da mídia brasileira na era digital, em 1996. Com Fernando Henrique Cardoso, o país vive seu ápice com a privatização e a imprensa acompanha e estampa tudo nas capas e em páginas e páginas, na imprensa escrita e na internet. Os escândalos pululam e contribuem para alterar a maneira de se fazer coberturas políticas.

O jornalista, apoiado pela grande mídia que percebe ser o quarto poder, acaba se transformando num investigador e estampa nas capas de jornais e revistas reportagens mais sensacionalistas do que investigativas, questionadas pelo leitor mais crítico. E esse fenômeno, explica o autor, não é apenas brasileiro, ocorreu nos Estados Unidos após a Guerra do Vietnã e no escândalo político de Watergate. Mais adiante, Camargo chama atenção para esse fato e cita a banalização e “generalização de matérias comportamentais nas grandes revistas, como Veja, Época e Isto É em detrimento das reportagens investigativas que foram a glória das semanais no passado13”.

A obra “História da imprensa no Brasil”, lançada em 2008, reconstitui e contextualiza as principais fases da imprensa do país, desde 1808 até 2008, e é, sem dúvida, essencial para pesquisadores, principalmente, das áreas das Ciências Humanas e Sociais, e para leitores curiosos que se interessam pelos fatos que marcaram o país. Os onze autores narram os acontecimentos desse período, cada um com suas características, com uma riqueza de detalhes que certamente irão empolgar quem conhece e quem desconhece alguns fatos históricos. Um livro para ser lido, relido, e para consultado e utilizado como referência bibliográfica para diferentes trabalhos acadêmicos.

Notas

1. Mestre em História do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC. E-mail: [email protected] 2 MARTINS, Ana Luiza, e LUCA, Tânia Regina de. História da Imprensa no Brasil. São Paulo: Contexto, 2008. p. 9.

3. Idem. Ibidem. p. 9.

4. Idem. Ibidem. p. 28.

5. Idem. Ibidem. p. 70.

6. Idem. Ibidem. p. 104.

7. Idem. Ibidem. p. 108.

8. Idem. Ibidem. p. 236.

9. Idem. Ibidem. p. 238.

10. Idem. Ibidem. p. 270.

11. Idem. Ibidem. p. 271.

12. Idem. Ibidem. p. 272.

13. Idem. Ibidem. p. 284.

Izani Mustafá – Mestre em História do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC. E-mail: [email protected].


MARTINS, Ana Luiza; De LUCA, Tania Regina. (orgs.). História da imprensa no Brasil. São Paulo: Contexto, 2008, 304 p. Resenha de: MUSTAFÁ, Izani. Em Tempo de Histórias, Brasília, n.14, p.203-211, jan./jun., 2009. Acessar publicação original. [IF].