O Brasil Colonial – Volume 1, 1443-1580 | João Fragoso e Maria de Fátima Gouvêa

A apresentação da coleção O Brasil Colonial, organizada pelos professores João Fragoso (professor titular da UFRJ) e Maria de Fátima Gouvêa (professora da UFF, falecida precocemente em 2009) tem como título La guerre est finie. Provocante expressão para designar os últimos 20 anos de um debate historiográfico, às vezes acirrados, no qual os estudiosos sobre o Brasil no período colonial têm travado, a partir da crítica feita à concepção de um Antigo Sistema Colonial, consagrada por Fernando Novais, Professor da USP e do Instituto de economia/UNICAMP, por um grupo de professores do Rio de Janeiro, professores da UFRJ, UFF e UFRRJ, bem como de colegas portugueses, como o Prof. António Manuel Hespanha. A expressão também sugere uma ideia de que os organizadores têm sobre o atual estágio da historiografia brasileira, ou seja, os conceitos utilizados e a discussão trazida por ambos fossem a vitoriosa no meio acadêmico nacional.

Não se tem dúvidas que desde a publicação, no ano 2001, do livro O Antigo Regime nos trópicos: a dinâmica imperial portuguesa: (séculos XVI-XVIII), organizados pelos mesmos autores mais a Maria Fernanda Bicalho, Professora da UFF, juntamente com o acesso aos milhares de documentos da coleção Resgate, que contém a documentação riquíssima do Arquivo Histórico Ultramarino, houve um boom dos estudos sobre a colônia portuguesa na América. O grupo do ART, Antigo Regime nos Trópicos, como é conhecido no meio universitário especializado, de fato trouxe novas abordagens, a luz de conceitos discutidos em Portugal, Espanha e Estados Unidos, trazendo para o Brasil e para a história do Brasil novas possibilidades de análise. O grupo lançou outras coletâneas, no qual os participantes não necessariamente compactuam piamente com as ideias dos nomes mais conhecidos, e mesmo após 15 anos do marco inicial, algumas noções foram modificadas ou aprofundadas, felizmente, visto que a história é dinâmica. Leia Mais

Dar nome ao novo: uma história lexical das Américas portuguesa e espanhola, entre os séculos XVI e XVIII (as dinâmicas de mestiçagem e o mundo do trabalho) | Eduardo França Paiva

“Quem chama quem de quê? Como cada qual se define e define o outro?” A partir dessas interrogações, o historiador Eduardo França Paiva instiga a leitura e nos aproxima das problemáticas que norteiam sua nova obra “Dar nome ao novo”. Neste novo trabalho, o uso de vocabulários, de expressões, de léxicos são fios que conduzem o leitor para pensar sobre os usos de definições, categorias ou hierarquizações ao longo de três séculos. O objetivo está em levar quem lerá a obra a uma intensa compreensão das nomeações e descrições que marcavam, separavam e hierarquizavam os agentes históricos pelas dinâmicas biológicas e culturais das mestiçagens.

É importante destacar, para o maior entendimento da obra, o processo histórico entendido pelo autor como parte das “dinâmicas de mestiçagens”. Afinal, esse é um conceito elaborado recentemente, e permeia as dimensões históricas resultantes de mesclas, interseções, de mobilidades e de trânsito, no plano das representações e dos discursos, que geraram sociedades e produtos mestiços e não-mestiços (índios, brancos, negros, pretos e crioulos). Leia Mais

A Justiça D’Além-mar: lógicas jurídicas feudais em Pernambuco (Século XVIII) | Maria Filomena Coelho

As ideias advindas da Escola dos Annales por muito tempo constrangeram o historiador que se aventurava pelas pesquisas da História política ou administrativa. Atualmente o ponto de vista político na historiografia tornou-se não só de suma importância para a compreensão da realidade das sociedades, mas também mostrou não ter sido o verdadeiro alvo das críticas da escola francesa fundada por Marc Bloch e Lucien Febvre1. Seguindo essa linha de raciocínio, Maria Filomena Coelho em seu trabalho A Justiça D’Além-Mar: Lógicas jurídicas feudais em Pernambuco (Século XVIII), parte do ponto de vista da administração da Justiça e aplicação do Direito na América Portuguesa em busca de vestígios de “lógicas jurídicas feudais” na Capitania de Pernambuco, como o título sugere. Para tal, doutora em História Medieval, do direito e das instituições, Filomena Coelho se fundamentou nos escritos de António Manuel Hespanha, bem como na concepção de um Antigo Regime nos Trópicos1, trazendo-nos um estudo do caso intrigante narrado por Veríssimo Rodrigues Rangel, cônego da Sé de Olinda, entre 1750-54 1.

A execução do testamento do padre Alexandre Ferreira fez de Olinda e Recife palco de um conflito protagonizado por juízes eclesiásticos e do rei, confronto jurisdicional este que durou cinco anos (1749-1753). Antônio Teixeira da Mata, Juiz de fora e Provedor dos defuntos e ausentes, capelas e resíduos, representando a Justiça secular (sua jurisdição e a da Coroa) entrou em choque com o Bispo, Frei Luiz de Santa Tereza e o Vigário geral, Manoel Pires de Carvalho. Maria Filomena Coelho nos descreve o embate ao longo de seu trabalho ressaltando, principalmente, o papel histórico e apologético do manuscrito de Veríssimo Rangel1. Leia Mais

Nas solidões vastas e assustadoras: a conquista do sertão de Pernambuco pelas vilas açucareiras nos séculos XVII e XVIII | Kalina Vanderlei Silva

Não é nada fácil resenhar um livro como Nas solidões vastas e assustadoras, da historiadora Kalina Vanderlei Silva. Professora da Universidade de Pernambuco, trabalha com as linhas de pesquisa que envolve os assuntos relacionados à América Colonial com ênfase na concepção analítica sociocultural. Foi seguindo essa mesma perspectiva de análise que em 2001 a autora publicou O miserável soldo e a boa ordem na sociedade colonial, original de sua dissertação de mestrado. O trabalho dispensa comentários, a não ser os mais belos, pois serviu de grande inspiração para atrair vários novos pesquisadores junto ao exame das instituições bélicas relacionando-as a dinâmica colonial de forma sociocultural. Reafirmando as ideias, abordagens e reflexões que visa buscar a chamada Nova História Militar2, assim como em sua dissertação de mestrado, o seu livro resenhado aqui, resultado das pesquisas de doutoramento da autora, foi publicado em 2010 pela editora Cepe. É rico em detalhes quanto ao processo analisado, o que nos faz querer ressaltar demasiado tudo o que se apresenta na obra. Leia Mais

Guerra Contra Palmares: Um estudo das expedições realizadas entre 1654 e 1695 | Laura P. Mendes

Os Mocambos de Palmares foram núcleos compostos, em sua maioria, por ex-escravos, fugidos das plantações de cana de açúcar do vasto território da Capitania de Pernambuco, índios e brancos livres, marginalizados pelas elites detentoras do status social. Os diversos Mocambos tiveram uma existência de mais de um século – de fins do século XVI até princípios do século XVIII – passando por organizações político-sociais as quais tiveram de enfrentar as mais diversas entradas e expedições organizadas pelo governo pernambucano e por suas elites.

A historiografia que se deteve sobre o estudo desses Mocambos foi pertinente em tentar contar a história desse período secular de vivência liberta dos palmarinos. De forma cronológica e diretamente atrelada às constantes batalhas e resistências contra as expedições, esses autores tiveram que se deter em uma documentação que versava acerca do ponto de vista dos agentes coloniais portugueses, bem como os holandeses2. Essa historiografia marcou o século XX, consolidando termos como Quilombo ou República dos Palmares. Leia Mais

Cativos do Reino: A circulação de escravos entre Portugal e Brasil, séculos 18 e 19 | Renato Pinto Venâncio

A obra “Cativos do Reino: A circulação de escravos entre Portugal e Brasil, séculos 18 e 19”, de autoria do professor doutor Renato Pinto Venâncio, foi lançada em 2012 pela editora Alameda. Ao longo de oito capítulos, o autor leva os seus leitores a repensar a escravidão sob uma vertente diferenciada. A perspectiva que se tem é a da movimentação e circulação de escravos. Entendida como um fenômeno referente à transferência de cativos de uma região a outra, em áreas externas ao continente africano, esta circulação envolvia também fatores essencialmente humanos, como o trânsito de valores e as ideias.

Logo no primeiro capítulo Venâncio traça um dos itinerários que irá percorrer em suas reflexões: as rotas de circulação de cativos no interior do império português, especialmente nas Minas Gerais colonial. As Minas foram um lugar de intensa circulação de pessoas e mercadorias pós-descoberta do ouro, lugar em que senhores, acompanhados por seus escravos, vindos de partes distantes do império luso, fixaram residência e buscaram enriquecimento sob influência da quimera aurífera. Leia Mais

Concelhos e organização municipal na Época Moderna | Joaquim Romero Magalhães

Nas últimas duas décadas é possível observar uma tendência cada vez maior entre os pesquisadores de divulgar seus trabalhos por meio de artigos. Isso se deve, em boa medida, ao acesso amplo e gratuito que a maior parte das revistas e periódicos online tem permitido, assim como à praticidade de se congregar os resultados de projetos de pesquisa em um único livro2. Se por um lado, essa modalidade de publicação é extremamente benéfica, por permitir um acesso mais conciso às ideias que cada autor quer transmitir, por outro, acaba estimulando a dispersão de suas contribuições historiográficas.

É tentando contornar esse problema e, ao mesmo tempo, articulando alguns resultados de 44 anos de carreira que Joaquim Romero Magalhães publicou pela Editora da Universidade de Coimbra o seu “Concelhos e organização municipal na Época Moderna”. Trata-se do primeiro volume de uma série prevista para três coletâneas intitulada “Miunças” (termo que, aludindo ao conjunto de produtos menos volumosos que compunham parte dos dízimos, explica o lugar que este trabalho tem na totalidade da obra do autor: um conjunto de miudezas que passam a ser agrupadas segundo alguma temática e que assim, ganha algum sentido mais amplo) que tem por objetivo reunir as publicações do autor sobre as temáticas dos Concelhos Municipais 3, da História Econômica do Algarve e do Regime Republicano em Portugal. Leia Mais

Paulistas e Emboabas no coração das Minas. Idéias, práticas e imaginário político no século XVIII | Adriana Romeiro

Em instigante artigo, António Manuel Hespanha rebate e discorre sobre algumas críticas desferidas ao emprego conceitual de “Antigo Regime” na historiografia luso-brasileira, e apresenta a proposta de substituição dos debates de uma referência geográfica, a separação oceânica e cultural entre colônias e metrópole, por uma questão essencialmente política: “Antigo Regime e Regime Colonial podem coexistir?”2 . Ao propor esta reflexão, o historiador do Direito explicita o cerne dos debates travados entre os pesquisadores que confrontam estes dois “modelos explicativos”. Não devemos avaliar uma realidade histórica problematizando-a unicamente como atrelada a um sistema de acúmulo de riquezas em centros hegemônicos, transferindo recursos para setores decadentes e parasitários. Tampouco, sujeitar e vincular as trajetórias coloniais a uma subordinação e perpetuação do domínio metropolitano. Assim como não podemos privilegiar as economias vinculadas ao mercado externo em detrimento das que não tangenciaram esta órbita. Todavia, não podemos pensar em um estatuto político equitativo entre os colonizados e colonizadores; concebendo um arquétipo sócio-cultural e simbólico característico do Antigo Regime compartilhado pelos indivíduos neste inseridos. Valer-se de uma tática de submissão, amor e serviço incondicional ao rei como um instrumento analítico, reduz o campo de reflexões e possibilidades históricas. Outrossim, tais aspectos se relacionavam a uma lógica e etiqueta empregada para o peticionar, constituindo um artifício retórico acionado para cunhar representações sociais. Neste sentido, refletimos que estes aspectos analíticos não podem prescindir e antever aos fatos empíricos. Tais pressupostos teóricos não devem ser impostos aos procedimentos e produtos do fabrico histórico, uma vez que sua aplicabilidade, tenacidade e essência devem estar em consonância e comunhão. Leia Mais

Ultramares | UFAL | 2011-2015

Ultramares Ultramares

A Escrita da História do Brasil tem sua origem em um relato oficial: a carta de Pero Vaz de Caminha. Mesmo sendo um documento repleto de intenções, grande parte dos estudiosos o consideram como o primeiro registro do território explorado pelos portugueses do outro lado do Atlântico, angariado, principalmente, através das bulas papais e pelas disputas de controle territorial com o monarca espanhol.

Lá se foram mais de quinhentos anos da época deste primeiro olhar sobre o território e seus habitantes para os dias atuais! Evidentemente muitas mudanças, imposições, controles, negociações, disputas, insubordinações, barganhas e outros elementos se fizeram presentes no cotidiano Américo português entre 1500 e 1822, quando houve a separação administrativa e a instituição de um território “emancipado”. Os intelectuais desse novo espaço administrativo, denominado de Império Brasileiro, ao olhar para trás iniciou a construção de uma escrita da História Colonial, sobretudo após a criação do Instituto Histórico Geográfico Brasileiro. Assim, saía-se dos relatos e descrições feitas por aqueles que viviam o dia a dia das conquistas (missionários, clérigos, viajantes, cronistas e demais “curiosos”) para interpretações sobre essas impressões, entremeados com os registros documentais deixados pelos agentes régios, pelos moradores locais, pelos órgãos administrativos e pelos homens dos mais variados grupos sociais.

Devido a este cenário, a ideia de construir uma revista exclusivamente para discutir as temáticas sobre a experiência das conquistas portuguesas na América torna-se interessante, como um meio de ampliação de resultados dos programas de pós-graduação e pesquisas científicas dos profissionais da história e áreas afins. Neste sentido, privilegiando a variabilidade de assuntos, os diversos cortes cronológicos e o uso das mais diversificadas fontes documentais, a Revista Ultramares propõe-se, ousadamente, a se tornar um espaço de referência intelectual e científica para os especialistas da área tanto no âmbito nacional, quanto no âmbito internacional.

Seu nome vincula-se, justamente, a esta missão ousada e, por que não dizer, arriscada em atingir “mares nunca d’antes navegados” ou passar por costas e sertões já explorados, mas com outros vieses e interpretações. Em sua estrutura editorial, a revista tem como autor corporativo o Grupo de Estudos América Colonial (GEAC) da Universidade Federal de Alagoas (UFAL) que visa, através da revista,  estimular as conexões de rede de pesquisa e a inserção das pesquisas alagoanas no cenário nacional/internacional sobre a temática. Todavia, em seu objetivo de publicação, a meta é prezar pela diversificação de assuntos, autores e espaços geográficos abordados, tentando dar conta do mundo plural das conquistas, garantindo as especificidades, mas proporcionando flertes de comparações e olhares próximos sobre os domínios Atlânticos. Assim, olhares que possibilitam visões sobre poder, administração, cotidiano, economia, escravidão, cultura, arte e vida social dos homens e instituições no Ultramar. Visões que possibilitem (re)visões, (re)leituras e (re)interpretações historiográficas, sobretudo oriundas das críticas e novos sentidos dado a documentação primária.

Por fim, a Revista Ultramares traz em sua obrigação o comprometimento com a diversidade, originalidade, periodicidade, credibilidade e organicidade. Elementos, aqui, entendimento como fulcrais para a consolidação do periódico como referência científica tanto no mêttie dos estudos da História das Conquistas Coloniais Portuguesas, como na própria Historiografia do Brasil. Missão árdua, mas, no mínimo sedutora, fazendo-nos lembrar dos navegantes em busca de aventuras, novos caminhos e outras vidas…

Periodicidade semestral

Acesso livre

ISSN 2316 1655

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