A Vulva é uma Ferida Aberta e Outros Ensaios | Gloria Anzaldúa

Gloria Anzaldua Imagem American Statesman 1
Gloria Anzaldúa | Imagem: American-Statesman

O ato de falar e de escrever é marcado por relações de poder e atravessado por modelos epistemológicos que tentam suprimir línguas e formas de existir (Conceição EVARISTO, 2021). Questiona-se: quem ousa falar tem o poder de se fazer ouvir? É da complexidade que envolve essa pergunta que sugerimos a leitura de Gloria Anzaldúa. A autora, ao produzir teorias sobre a sua existência nas fronteiras, dá cores e tons a sua linguagem insubmissa que desafiou os olhos do homem branco. A tradução do livro de Gloria Anzaldúa, A Vulva é uma Ferida Aberta e Outros Ensaios, foi lançada no Brasil em 2021, pela editora A Bolha.

O livro reúne seis ensaios e um poema produzidos em momentos distintos da sua carreira. Neles se encontra uma amálgama de discussões sobre as questões de mestiçagem, fronteira, raça, gênero, sexualidade, classe, saúde, espiritualidade, escrita e linguagem, que são questões centrais em sua obra. Cláudia de Lima Costa e Eliana Ávila (2021), tradutoras da obra de Gloria Anzaldúa no Brasil, assinam o prefácio do livro e destacam a importância da autora para o surgimento da discussão sobre diferenças – sexual, étnica e pós-colonial – no bojo feminismo norte-americano. Já o posfácio é um ensaio de AnaLouise Keanting (2021), professora na Texas Women’s University, em estudos de mulheres, e é a atual depositária do Gloria Anzaldúa Literary Trust. Nesse texto encontramos uma importante reflexão sobre as teorias mais recentes de Gloria Anzaldúa, pós-Borderlands/La Frontera, tornando a leitura de A Vulva é uma Ferida Aberta e Outros Ensaios ainda mais instigante. Leia Mais

Ensaios de História e Filosofia da Química | Luciana Zaterca e Ronei Clécio Mocellin

Detalhe de capa de Ensaios de Historia e Filosofia da Quimica

Detalhe de capa de Ensaios de História e Filosofia da Química

Por meio de discussões filosóficas baseados em casos históricos e até de assuntos contemporâneos,  Zaterka  e  Mocellin,  no  livro  Ensaios  de  História  e  Filosofia  da  Química,  levantam questões importantes em torno da química, entrelaçando vieses epistemológicos, ontológicos e até mesmo éticos, ambientais, econômicos, sociológicos e políticos. Os ensaios, distribuídos em cinco capítulos e as considerações finais, trazem discussões que podem contribuir para ativi-dades no ensino de química superior, em aulas de disciplinas específicas de história e filosofia da ciência/química e ensino. Os capítulos podem ser lidos de forma independentes, porque tratam de assuntos (estudos de caso) autônomos. Esses capítulos podem, também, contribuir no planejamento de outras disciplinas da graduação, para contextualização de conceitos como a experimentação (caso da alquimia no capítulo 1, filosofia experimental no capítulo 2 etc.), as substâncias simples (caso do alumínio no capítulo 4) e a síntese química (caso do plástico no capítulo 4 e fertilizantes capítulo 5). Os casos envolvem os conhecimentos acerca da matéria/materialidade/mundo material, por meio da discussão de práticas, produtos e processos ligados, desde a alquimia, passando pela química e a medicina até chegar à agricultura industrial (química agrícola).  Assim, lendo o livro de forma completa, apresenta-se a química com toda a sua centralidade, identidade epistêmica e capilarização social. Leia Mais

El otro posible y demás ensayos historiográficos | Alexander Torres Iriarte

Me resulta muy grato escribir unas breves líneas sobre la más reciente producción intelectual del historiador Alexander Torres Iriarte: El otro posible y demás ensayos historiográficos, publicado por Monte Ávila Editores Latinoamericana. Se trata de un texto que reúne ocho ensayos de carácter historiográfico en el que el autor analiza, en los cinco primeros, el proceso histórico venezolano comprendido entre los años 1815 y 1820, destacando la actuación del Libertador Simón Bolívar en ese período y en los que examina, con ojo crítico, dos documentos fundamentales: la Carta de Jamaica y el Discurso ante el Congreso de Angostura. En otros dos ensayos realiza acercamientos sobre Simón Rodríguez y Andrés Bello, personajes con los que nuestro autor parece tener una especial predilección, y la historiografía venezolana posee, aún, una deuda que pone en evidencia lo que desde el Centro Nacional de Historia han llamado: Nudos Críticos en el análisis de nuestros procesos históricos, queriendo destacar con esto, la empecinada obsesión de escribir historia centrada en nuestra epopéyica gesta emancipadora y en la pléyade de nuestro procerato independentista, dejando en el olvido u otorgando poco significación a personajes y procesos sobre los que estudios sistemáticos podrían arrojar visiones y perspectivas distintas de nuestro acontecer histórico. El libro concluye con un ensayo en el que se analiza la condición de José de Oviedo y Baños, como primer historiador venezolano.

Desde esta perspectiva y poniendo de relieve su condición de historiador profesional, Alexander Torres Iriarte se adentra en el contexto sociopolítico del hombre de las dificultades, para mirarlo y comprenderlo en el tiempo histórico en el que estaba tomando las decisiones que finalmente ejecutó, y construyendo las ideas que plasmó en documentos trascendentales como los presentados en Jamaica y Angostura. Leia Mais

A Vulva é uma Ferida Aberta e Outros Ensaios | Gloria Anzaldúa

O ato de falar e de escrever é marcado por relações de poder e atravessado por modelos epistemológicos que tentam suprimir línguas e formas de existir (Conceição EVARISTO, 2021). Questiona-se: quem ousa falar tem o poder de se fazer ouvir? É da complexidade que envolve essa pergunta que sugerimos a leitura de Gloria Anzaldúa. A autora, ao produzir teorias sobre a sua existência nas fronteiras, dá cores e tons a sua linguagem insubmissa que desafiou os olhos do homem branco. A tradução do livro de Gloria Anzaldúa, A Vulva é uma Ferida Aberta e Outros Ensaios, foi lançada no Brasil em 2021, pela editora A Bolha. Leia Mais

El concepto de Estado y otros ensayos | Reinhart Koselleck

El concepto de Estado y otros ensayos reúne cuatro trabajos de Reinhart Koselleck, seleccionados por Elías Palti y Claudio Ingerflom, en su traducción al español. Los primeros tres ensayos, que conforman la primera parte del libro, versan sobre los principios teóricos que subyacen a la labor histórica de Koselleck. El último trabajo, que integra la segunda parte del libro, es una traducción de la voz “Estado” del Geschichtliche Grundbegriffe: Historisches Lexikon zur politisch-sozialen Sprache in Deutschland (GG), diccionario de conceptos históricos fundamentales en lengua alemana editado por Otto Brunner, Werner Conze y el propio Koselleck. Leia Mais

Cidades vacinadas. Ensaios urbanos e ambientais para um Brasil pós-pandemia | Leila Marques

Breve identificação da obra, organizadoras e autores

Trata-se de uma coletânea de cinquenta textos – ou ensaios, como descrito no título – de sessenta e sete autores, majoritariamente arquitetos e urbanistas – quarenta, mais precisamente – além de vinte e sete profissionais de outras áreas da ciência que relacionam-se com o urbanismo tais como Engenharia, Direito, Turismo, Biologia, Administração, Comunicação, Relações Internacionais, Antropologia, História, Geografia, Paisagismo, Economia, Artes e outras especializações, reunidos em doi capítulos principais, um capítulo extra, com três textos lúdicos sobre a temática, e um apêndice com uma entrevista auto descritiva com um professor e vereador da cidade do Rio de Janeiro, além da minibiografia de todos os participantes da obra. Leia Mais

Ensaios de História Medieval: temas que se renovam | Renata Cristina de Souza Nascimento

O livro Ensaios de História Medieval: temas que se renovam é um exemplo, junto a outros publicados nos últimos anos1, da consolidação dos estudos universitários brasileiros sobre a Idade Média. Desde meados da década de 1990 o medievalismo no Brasil vem crescendo influenciado por diversos fatores2. A fundação da ABREM (Associação Brasileira de Estudos Medievais), em 1996, foi um marco desse sucesso. Nesse processo, grupos de estudos, periódicos especializados e eventos regulares na área também se estabeleceram nas regiões Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul. Em Goiânia, por exemplo, nas dependências da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC Goiás), Área II, foi realizado nos dias 20 e 21 de maio de 2019 o Colóquio de Estudos Medievais & Curso de Atualização: “Ensaios de História Medieval: temas que se renovam”. Nesse evento, foi lançado a obra aqui resenhada, organizada pelos professores doutores Renata Cristina de Sousa Nascimento (UEG/ UFG/PUC-GO) e Paulo Duarte Silva (UFRJ). Leia Mais

7 Ensayos sobre socialismo y nación (incursiones mariateguianas) | Diego Giller

Las conmemoraciones suelen ser ocasiones propicias para reconfirmar ciertas adhesiones y dar nuevo impulso a compromisos políticoafectivos. Estas fechas, cuando se enlazan a un nombre propio, a la obra de un pensador, se convierten, además, en oportunidades para recrear su herencia, reactualizar un legado o resignificar la tradición que lo alberga. Los tres gestos convergen en la reciente publicación llevada a cabo por Diego Giller quien, bajo el título de 7 Ensayos sobre socialismo y nación, conmemora los 90 años transcurridos desde la primera publicación de uno de los pocos libros concebidos como tales por José Carlos Mariátegui, 7 Ensayos de interpretación sobre la realidad peruana (1928). La variación en el título es uno de los tantos guiños que el autor nos hace, a nosotros, sus lectores. El libro se compone de siete ensayos, cuatro de ellos del propio Mariátegui, de los cuales dos aparecieron en 1924, el primero en la compilación Peruanicemos al Perú, y el segundo en Temas de nuestra América. Los dos restantes se encuentran, uno, en 7 Ensayos… (1928) y otro, en Ideología y política, libro póstumo que reúne distintas intervenciones del pensador peruano además de ésta fechada en 1929. Los otros tres ensayos que suman siete, corresponden a figuras emblemáticas de nuestro acervo intelectual: René Zavaleta Mercado, Oscar Terán y José María Aricó. El artículo de René Zavaleta representa una gran novedad, pues habiendo sido hallado por Giller en la biblioteca Aricó de Córdoba fue cedido a la editorial boliviana Plural quienes, a su vez, autorizaron su inclusión en el presente volumen. El libro se completa y abre con un muy documentado “Estudio preliminar” a cargo de su compilador. Esta introducción es una invitación amorosa –e inteligente– a la vida y obra de José Carlos Mariátegui. En ella, Giller, nos recuerda los obstáculos que el amauta debió sortear en su intensa y breve existencia. Desde su exilio en Italia, pasando por sus dolencias físicas, hasta las persecuciones sufridas y el encarcelamiento a su regreso a Perú. Ninguno de estos avatares, no obstante, opuso la fuerza suficiente como para disuadirlo de realizar gran parte de su proyecto político intelectual. En efecto, hacia 1926 funda la casa editorial Amauta, en ese mismo año se une a la Alianza Popular Revolucionaria Americana (APRA) comandada por Haya de La Torre con quien rompería hacia1928 para participar de manera activa en la creación del Partido Socialista Peruano (PSP). Como señala Diego Giller, la resistencia a cambiar el nombre de este flamante partido por Partido Comunista, junto a las provocativas tesis mariateguianas sobre la articulación entre realidad nacional peruana y “un socialismo que debe partir del reconocimiento del comunismo incaico” (p. 14), le valieron la enemistad con la Internacional Comunista. Estas circunstancias, entre otras, contribuyen a explicar tanto su voluntad de radicarse en Buenos Aires –interrumpida por el temprano final que encontró su vida–, como el penoso proceso de “‘desmariateguización’ de la izquierda peruana” (p. 17) que siguió a su muerte. Un proceso que implicó el re bautismo del PSP por Partido Comunista Peruano, el cierre de Amauta, y la no reedición de sus obras por varias décadas. La exhumación de su pensamiento se realizó al compás de las inflexiones de la historia. Así, como nos narra Giller en las primeras páginas del libro, una de las primeras reediciones de los 7 Ensayos…coincide con la “crisis del estalinismo” del año 1956; la publicación de su obra completa tiene lugar en Perú, pocos años después de la Revolución Cubana; en vísperas del mayo francés se traduce a aquella lengua los 7 Ensayos; por esa misma época y al calor del gobierno de Velazco Alvarado y Sendero luminoso, su obra es reivindicada en su tierra natal. Y así podríamos continuar, glosando el detallado periplo de estas interpretaciones sobre la realidad peruana. De todo este relevamiento, una fecha en particular se vuelve, para nosotros y para el libro que estamos reseñando, significativa: 1978. Año del 50 aniversario de los 7 Ensayos y, otra vez, ocasión privilegiada para la actualización de un legado. Los nombres del argentino José María Aricó y los peruanos Aníbal Quijano y Flores Galindo, así, en ese orden –en virtud de un criterio cronológico que señala la aparición de distintas obras dedicadas a Mariátegui–, serán fundamentales. Como no podía ser de otro modo, este redescubrimiento se realizará también al compás de otra inflexión histórica, esta vez, menos feliz que la de las revoluciones de la década del ‘60: la derrota del movimiento nacional popular en América Latina. “Es el tiempo del reflujo,” –señala Giller– “los exilios, la crítica de las estrategias foquistas y la lucha armada, la ‘crisis del marxismo’ y la emergencia del eurocomunismo” (p. 20). Este paisaje alojará parte de la obra de este pensador heterodoxo, bajo una clave singular de lectura: el problema de la nación y su articulación con el socialismo y el indigenismo. Una cuestión no del todo elaborada por la tradición del marxismo, una pregunta poco atendida sino subestimada por los referentes del comunismo, y un tema, sin duda, clave, en la disputa por la construcción de hegemonía en nuestros países latinoamericanos. Quién mejor, entonces, que un marxista esquivo y moderno para dar oxígeno a un debate pendiente de la izquierda latinoamericana, y quizás, sobre todo, de la izquierda argentina. Como expone Giller con agudeza “ese mismo problema que lo había convertido en un pensador maldito para sus contemporáneos, lo devolvía, a cincuenta años de su muerte, al centro de la escena” (p. 21). Se trata, podemos decir, de un “centro descentrado”, o bien, de un encuentro ocurrido en ocasión de un violento desplazamiento de quienes tomarían la posta –quizás un poco tardía– de Mariátegui: Aricó, Zavaleta y Terán. Los tres exiliados de sus respectivos países por motivos políticos. Los pormenores que informan cada una de estas biografías, los encontrará el lector en los apartados II, III y IV del “Estudio Preliminar”. Allí se ofrece, en la lengua de una sociología de los intelectuales, un semblante de estos militantes pensadores que hicieron escuela y abrieron surcos en la tradición de los estudios del marxismo latinoamericano. En esas páginas nos reencontramos con el imprescindible rol que Aricó desempeñó en la difusión y renovación “del pensamiento marxista en general y del mariateguiano en particular” (p. 21). Una tarea llevada a cabo mediante su inestimable labor en la revista Pasado y Presente (1963-1965), secundada luego por la editorial Cuadernos de Pasado y Presente (1968-1983) y por su función en la filial argentina de Siglo XXI que se extiende desde comienzos de los años ‘70 hasta el golpe cívico-militar de 1976 que lo obliga al exilio mexicano. Será en estas latitudes donde Aricó dará continuidad –por distintas vías– a su labor intelectual y se abocará a la obra de José Carlos Mariátegui. Aunque su incursión en los textos del peruano data de 1959 –según leemos en el texto de Giller– será hacia 1978 en adelante cuando esta vinculación se intensifique. En aquel año reúne un conjunto de artículos en un volumen titulado Mariátegui y los orígenes del marxismo latinoamericano; doce meses después auspiciará la publicación del libro de Robert Paris La formación ideológica de José Carlos Mariátegui. Junto a Terán organizarán un dossier para la revista Buelna sobre la obra del peruano que “ofició como preludio del Coloquio Internacional ‘Mariátegui y la revolución latinoamericana’” (p. 23) realizado en la Universidad de Sinaloa en 1980 y del cual participaron junto a un puñado de intelectuales de renombre. “El Mariátegui de Aricó es el traductor. Es la figura señera para que el marxismo deje de estar en América Latina y pase a ser de América Latina” (p. 28), afirma Giller. Una vez pasado por el tamiz gramsciano, Mariátegui resulta un pensador desprejuiciado, inquieto, preocupado por la unidad nacional y, luego, por la construcción de lo nacional-popular en un movimiento contra-hegemónico y socialista. El espíritu de Aricó es el de redimir a Mariátegui de la violencia de la operación de “ortodoxia” a la que fue sometida su obra. Aricó se da a la tarea de liberar los significados subordinados en ella para que fulgure –afirma– su lección de método y de realismo, “su manera de proceder para que un saber se abriera al mundo de lo concreto y permitiera develarlo” (p. 156). Si Aricó es el responsable de la publicación del libro de Robert Paris, Terán será el encargado de su traducción. Sus reflexiones en torno a la obra del fundador del PSP darán nacimiento al libro Discutir Mariátegui que, escrito y publicado en 1985, tendrá que esperar a 2017 para reeditarse y estar al alcance de los lectores. 7 Ensayos sobre socialismo y nación ofrece uno de sus capítulos “Discutir la Nación”. En él, Terán, luego de visitar algunos pasajes de la vida de Mariátegui, señala los años 1925-1928 como el período de ruptura al interior de su pensamiento y de tematización del “problema de la nación”. Introduce en su planteo una importante distinción: la preocupación de Mariátegui –ausente en su par Argentino Aníbal Ponce– no es la “cuestión nacional”, entendida como la autonomía de las nacionalidades, sino “la cuestión de la nación”, es decir, el enigma de la identidad nacional (p. 121). Un tema acuciante para todos aquellos países asentados “sobre la base de realidades heterogéneas y muchas veces centrífugas” (p. 122). A él lo desvelará el esfuerzo por fusionar intereses populares agrarios con intereses urbanos, la búsqueda de respuestas a demandas indígenas insatisfechas, la caracterización del problema del indio como un problema económico-social antes que político o moral. En medio de estas preocupaciones adquieren relevancia la función del mito soreliano –y su resignificación mariateguiana–, las afinidades entre los desarrollos del peruano y la tradición del populismo ruso, sin descuidar los modos en que su prosa anticipa o es simultánea a las posiciones desplegadas por Mao Zedong. “Decir la nación” será para el Mariátegui de Terán una forma de conjurar el pecado de la conquista replicado por la fallida República. René Zavaleta Mercado completa esta constelación de artículos que dan cuerpo a las incursiones mariateguianas. Intelectual y dirigente político boliviano, compartió junto a tantos otros latinoamericanos, el destino del exilio mexicano, sólo que su condición de exiliado fue más precoz, pues ya en 1964, con la asunción del General René Barrientos, debió dejar Bolivia y emprender otros rumbos (Uruguay primero, Inglaterra después, de nuevo Bolivia, para partir a Chile y terminar en México). La suerte que corre desde entonces es retratada con gran destreza por Diego Giller en las páginas introductorias de este libro. Allí leemos, además: “Como el ‘Perú de Mariátegui’ –la expresión es de Flores Galindo– la Bolivia de Zavaleta también descubre los problemas profundos de la nacionalidad a partir de una derrota bélica” (p. 44). No obstante, no es solo esta circunstancia la que los aproxima, sino que son, sobre todo, las semejanzas socio-históricas de ambos países lo que lleva a Zavaleta a afirmar que “tal vez [Mariátegui] al pensar en su país, pensaba ya en todos nosotros” (p. 96). Esa interpelación de la que se hace eco Zavaleta comprende la pregunta incómoda por la relación siempre contradictoria entre lo universal y lo local condensada en la cuestión de la identidad nacional. La ventaja de Mariátegui está en haber planteado este dilema por fuera de los términos abstractos, en general, tan a la mano. Su osadía radica en disputarle a la oligarquía peruana los sentidos, valores y significados de la nación para reinscribirlos en una gramática estructurada en torno a la “conexión entre lo nacional, lo indígena y lo agrario” (p. 103). Hablar la nación, dirá Zavaleta, es hablar el indio, hacer hablar a las mayorías y, hablar, por fin, la cuestión agraria. 7 Ensayos sobre socialismo y nación nos entrega así, en un “juego de espejos”, como propone Giller, tres miradas sobre un mismo objeto que refractan sobre nuestro presente. Tres puntos de vista que, puestos uno al lado de otro, producen un efecto iluminador de gran potencia y valor. Se vuelve a Mariátegui, así, con la intuición de que algo en ese entramado de textos de (y en torno a) un autor derrotado “puede asistirnos” –como quisiéramos junto a Diego Giller– “en la tarea de pensar las urgencias y los peligros de nuestro tiempo, que es también un tiempo de derrota –aunque ninguna derrota, lo sabemos, es definitiva” (p. 53). Leia Mais

A Filosofia Natural de Benjamin Franklin: Traduções de Cartas e Ensaios sobre a Eletricidade e a Luz | Breno Arsioli

Breno Arsioli Moura is a Professor at the Federal University of ABC (Universidade Federal do ABC – UFABC), at the Centro de Ciências Naturais e Humanas [Natural and Human Sciences Center] (CCNH), Santo André, SP, Brazil, and a faculty member of the graduate program PEHCM (Pós-Graduação em Ensino e História das Ciências e da Matemática2 [Graduate Program in Teaching and History of Science and Mathematics]). Moura, both a historian of science and science educator, is known for his contributions to the history of science in the 18th century, history of optics from Newton to early-19th century, and the utilization of science studies in science teaching and education. His book, A Filosofia Natural de Benjamin Franklin: Traduções de Cartas e Ensaios sobre a Eletricidade e a Luz (2019) [The Natural Philosophy of Benjamin Franklin: Translations of Letters and Essays on Electricity and Light], is a work of scholarship on the scientific achievements in electricity by Benjamin Franklin (1706-1790), famous American statesman, publisher, scientist, and diplomat. Leia Mais

Traduzione, transcreazione, saggi – CAMPOS (A-EN)

CAMPOS, Haroldo de. Traduzione, transcreazione, saggi. Tradução e organização de Andrea Lombardi e Gaetano D’Itria, Nápoles: Oèdipus/Fundação da Biblioteca Nacional, 2016. Resenha de MULLER, Fernanda Suely; BURNELLO, Yuri. Traduzione, transcreazione, saggi, Alea, Rio de Janeiro, v.19 n.2, may./aug., 2017.

A obra que ora vem a lume pela Editora napolitana Oèdipus, organizada e traduzida para o italiano por Andrea Lombardi e por Gaetano D’Itria, consiste na publicação de ensaios críticos de Haroldo de Campos na e para a Itália. Tal operação editorial objetiva tornar conhecida aos leitores italianos a faceta de crítico e teórico da literatura de um dos mais importantes intelectuais brasileiros do século XX, para além de sua relevância como poeta contemporâneo.

A produção lírica de Haroldo de Campos se tornou conhecida na Itália sobretudo através do poeta Lello Voce que, no ano de 2005, organizou o volume L’Educazione dei cinque sensi (CAMPOS, 2005), coletânea de poemas do escritor brasileiro traduzidos por Daniela Ferioli. Somando esforços àqueles de Lello Voce, Andrea Lombardi – docente de Literatura italiana na UFRJ – tem se dedicado a difundir com afinco todas as nuances da ligação haroldiana com a Itália, tendo especialmente como leitmotiv a produção crítica e poética feita a partir do diálogo entre a visão estético-linguística de Haroldo de Campos e a arte de escritores de língua italiana. Uma das primeiras incursões de Lombardi nesse sentido tinha sido a organização de um livro dantesco de Haroldo de Campos, intitulado Pedra e Luz na poesia de Dante (CAMPOS, 1998), cuja ideia central, de certa forma, é continuada pela editora italiana Oèdipus. Com efeito, Traduzione, transcreazione, saggi avulta ainda mais pelo fato de que muitas das questões oferecidas ao público italiano por Andrea Lombardi e Gaetano d’Itria têm como temática principal a difusão de autores do cânone italiano, como Dante, Giacomo Leopardi ou Giuseppe Ungaretti. O rigor de tal desafio intercultural é confirmado pela participação no volume de dois intelectuais italianos de renome, como Umberto Eco – cuja contribuição constitui um dos últimos textos antes do falecimento – e Piero Boitani, professor titular de Literatura comparada na Università “La Sapienza”, de Roma, que assinalam respectivamente a importância do volume na introdução e na contracapa da publicação.

Traduzione Transcreazione Saggi é composto por sete textos de Haroldo de Campos anteriormente publicados e republicados alhures em português. Aos textos haroldianos, somam-se um capítulo sobre observações acerca da particularidade de traduzir Haroldo de Campos – Nota del traduttore – e, por fim, um posfácio de Andrea Lombardi, no qual o organizador escrutina a atividade e as especificidades de Haroldo de Campos enquanto tradutor em Una condizione babelica – Haroldo de Campos traduttore.

Se na Introdução Umberto Eco relata as suas conexões estabelecidas com Haroldo de Campos desde o ano de 1962, o capítulo inaugural La nuova estética di Max Bense discorre sobre as ideias do filósofo e crítico alemão Max Bense acerca da distinção entre a informação documentária, informação semântica e informação estética, no bojo do experimentalismo artístico-concreto, do qual Max Bense fora protagonista – juntamente com Haroldo de Campos e os outros integrantes de Noigandres – em meados da década de 1960. É necessário destacar a tessitura de Haroldo de Campos concernente ao tema que é igualmente um dos pontos nevrálgicos de sua produção enquanto artista, crítico e intelectual, que transpassa as questões relativas aos limites de uma tradução concebida como equivalente ao texto de partida (por isso, justamente, o uso, desde o título, do adequado vocábulo transcreazione, em português, “transcriação”).

Com efeito, tanto no ensaio supracitado quanto no capítulo Della traduzione come creazione e come critica, Haroldo de Campos apresenta ao leitor propostas desafiadoras no que diz respeito às problemáticas encontradas ao traduzirem ou “transcriarem” de suas línguas maternas escritores como Guimarães Rosa ou James Joyce. O transcriador “babélico” (CAMPOS, 2016: 162) – para mencionar uma das definições que Andrea Lombardi fornece de Haroldo de Campos – não se limita a exemplos de escritores em língua portuguesa, mas analisa soluções possíveis, tais quais a interpolação de versos alheios ou os “arrevesamentos sintáticos” (CAMPOS, 2016: 39CAMPOS, 2013: 10)3, encontradas por críticos-tradutores como Ezra Pound, teórico do make it new, da tradução como re-criação, ou Manuel Odorico Mendes, autor de “traduções-transcriações”, que “na história criativa da poesia brasileira […] tem um lugar assegurado” (CAMPOS, 2016: 42CAMPOS, 2013: 11-12).

Sendo o primeiro capítulo a abordar a literatura italiana em si nessa compilação de Andrea Lombardi e Gaetano D’Itria, Ungaretti e l’estetica del frammento constitui uma espécie de resenha sobre o legado ungarettiano. Haroldo de Campos percebe uma certa “distinção” entre duas fases do poeta italiano, com particular atenção ao seu último período: o crítico sublinha justamente que o fragmentário se torna a “única forma possível de poesia no universo fraturado em que vivemos” (CAMPOS, 2016: 71CAMPOS, 1969: 87). Ao refletir que tal estética fragmentária se coloca como tema do fazer poético ungarettiano tanto pela constatação realizada a partir da leitura de alguma de suas obras – como Il Taccuino del Vecchio – quanto pela reiteração proposta pelo próprio autor em uma conferência proferida em 1966, o ensaio Ungaretti e l’estetica del frammento acaba instituindo uma ponte entre as soluções de Ungaretti e suas inovações expressivas – o “sentimento de surpresa” (CAMPOS, 2016: 73CAMPOS, 1969: 88), “o inesperado que punge” (CAMPOS, 2016: 73CAMPOS, 1969: 88) -, que tinham sido elaboradas no século XIX por Giacomo Leopardi, cujas propostas teóricas “seriam traduzíveis em termos da atual teoria da informação” (CAMPOS, 2016: 73CAMPOS, 1969: 88).

Extremamente pertinente se confirma a decisão dos organizadores ao escolherem, como ensaio sucessivo, uma intervenção de Haroldo de Campos especificamente dedicada a tal questão – provocativa na época, assim como ainda é nos dias de hoje; ou seja, o vanguardismo de Leopardi. Em Leopardi, teorico dell’avanguardia, à luz de uma possível “poética sincrónica” (CAMPOS, 2016: 77CAMPOS, 1969: 186), teorizada sob a influência de Roman Jakobson, Haroldo de Campos coaduna ao já citado poeta outros pares (Friedrich Hölderlin e Sousândrade), sublinhando pontos convergentes entre os três. Haroldo de Campos discorre igualmente sobre a dificuldade de sistematizá-los em alguma categoria precisa de análise, sem deixar de considerar, contudo, o papel de crítico exercido por Leopardi sobretudo em Zibaldone (e suas “antecipações” sobre alguns temas polêmicos como a oposição entre a linguagem da ciência e a linguagem da poesia). O autor arremata ainda o ensaio com uma proposta de tradução de uma das obras mais famosas de Leopardi, L’infinito.

Nos três capítulos subsequentes, Haroldo de Campos realiza uma incursão mais aprofundada nas sendas da literatura italiana, ao analisar aspectos fundamentais do principal expoente literário daquele país: Dante. Assim, como podemos inferir pelo próprio título, em Petrografia dantesca, o crítico abordará as rime petrose de Dante, considerando-as como o ápice da criação dantesca antes da Divina Comédia. As petrose representariam, para Haroldo de Campos, um momento-chave de realismo no repertório do poeta italiano. Todavia, o realismo de Dante sobre o qual Traduzione, transcreazione, saggi foca não têm nada de referencial: nada têm da consistência figural da mimesis auerbachiana nem da “homologia estrutural” de Lucien Goldmann. Haroldo de Campos se detém ao experimentalismo de alguns procedimentos das rime petrose, concluindo que “o realismo destes poemas acaba sendo, em última instância, um realismo de signos” (CAMPOS, 2016: 92CAMPOS, 1998: 22), celebrando, portanto, a materialidade dos significantes das rime petrose.

Já no quinto capítulo, Luce: la scrittura paradisíaca, Haroldo de Campos esmiúça aos leitores seu projeto de tradução-transcriação de alguns versos do Paraíso de Dante, nos quais o mesmo se preocupa com a “reconstituição da informação estética do original em português […], com o escopo de produzir um texto isomórfico em relação à matriz dantesca” (CAMPOS, 2016: 99CAMPOS, 1998: 67). Para completar a tríade dantesca, sem abandonar a vertente exegética semiótico-estruturalista, em Il Dolce Stil Novo: bossa nova nel Duecento, o crítico se volta ao frescor juvenil de Dante na Vita Nuova, analisando algumas de suas estratégias formais “precursoras” do modernismo e possíveis reflexos na produção de Thomas Stearns Eliot e Ezra Pound.

O derradeiro ensaio acerca da crítica haroldiana sobre a literatura italiana mais estilística e estruturalmente questionadora, Dal testo maccheronico al permutazionale tem como mote a antologia de literatura então recém-lançada e intitulada I Novissimi (GIULIANI, 1961). Ao abordar a produção dos poetas ali compilados (Elio Pagliarani, Alfredo Giuliani, Edoardo Sanguineti, Nanni Balestrini e Antonio Porta), Haroldo de Campos destaca a função da “poesia macarrônica” utilizada por alguns dos poetas, a qual assume no entendimento do autor uma função muito mais crítica e lírica do que puramente satírica, efeito ao qual muitas vezes o macarrônico é interligado.

As referências ao “permutacional” (CAMPOS, 2016: 131CAMPOS, 2013b: 137) remetem à cibernética, assim como muitas das categorias utilizadas por Haroldo de Campos na interpretação dos escritores italianos estudados em Traduzione, trascreazione, saggi reenviam o leitor à teoria da informação, à semiótica de Max Bense, à linguística estrutural de Roman Jakobson, ou seja, a fenômenos hermenêutico-culturais de enorme relevância histórica, apesar – em parte de suas premissas e conclusões – ultrapassados. Oportunamente, Andrea Lombardi, no seu posfácio, acaba atualizando muitas das visões haroldianas, colocando-as dentro de uma perspectiva pós-estruturalista ou no âmbito das mais recentes aquisições dos estudos da tradução. À guisa de conclusão, o que ainda permanece viva é a solidez das intuições críticas de Haroldo de Campos, uma vez abstraídas dos paradigmas teóricos dentro das quais foram concebidas.

No ano de 2005, Gianni d’Elia deu ao seu estudo L’eresia di Pasolini o subtítulo de L’Avanguardia della tradizione dopo Leopardi (D’ELIA, 2005), para indicar que a escolha de uma forma em aparência tradicional tanto por parte de Pasolini quanto, anteriormente, por parte de Leopardi, tinha como pressuposto uma opção de ruptura cultural. Em 2016, Carlo Ossola, titular da cátedra de Literaturas modernas no Collège de France, publicou uma monografia sobre Ungaretti, Ungaretti, poeta (OSSOLA, 2016), na qual elogia a poesia ungarettiana pela sua “responsabilidade cósmica da palavra poética, herdada de Leopardi, para que nós possamos acompanhar o caminho deste século perdido” (OSSOLA, 2016b: 28, tradução nossa). No final da década de sessenta, Haroldo de Campos já tinha percebido na poesia leopardiana a presença de uma “fratura ideológica entre o ponto de vista clássico e o romântico antes se configurar na linguagem no nível do significado que no do significante” (CAMPOS, 2016: 78CAMPOS, 1969: 186), bem como assinalara a metafísica leopardiana do inacabado como representante da “raiz autóctone da poesia ungarettiana” (CAMPOS, 2016: 71CAMPOS, 1969: 87). Essas são somente duas das numerosas intuições hermenêuticas presentes em Traduzione, transcreazione, saggi que constituem prova irrefutável que, muitas vezes, os grandes críticos sobrevivem aos seus próprios métodos.

Referências

CAMPOS, Haroldo de. Traduzione, transcreazione, saggi. Tradução e organização de Andrea Lombardi e Gaetano D’Itria. Nápoles: Oèdipus/Fundação da Biblioteca Nacional, 2016. [ Links ]

____. Transcriação. São Paulo: Perspectiva, 2013a. [ Links ]

____. A ReOperação do texto. São Paulo: Perspectiva, 2013b. [ Links ]

____. L’educazione dei cinque sensi. Tradução de Daniela Ferioli e organização de Lello Voce Pesaro: Metauro, 2005. [ Links ]

____. Pedra e Luz na poesia de Dante. Rio de Janeiro: Imago, 1998. [ Links ]

____. A Arte no Horizonte do Provável. São Paulo: Perspectiva, 1969. [ Links ]

D’ELIA, Gianni. L’eresia di PasoliniL’Avanguardia della tradizione dopo Leopardi. Milão: Effigie, 2005. [ Links ]

GIULIANI, Alfredo (Org.). I novissimi. Milano: Rusconi Paolazzi, 1961. [ Links ]

OSSOLA, Carlo. Ungaretti, poeta. Venezia: Marsilio, 2016a. [ Links ]

____. Universi e fantasmi. Il Sole 24 Ore, Milano, n. 328, 2016b. [ Links ]

Notas

1Por convenção, por se tratarem de textos originalmente escritos em língua portuguesa, optamos por fazer a citação direta das obras originais e indicar, respectivamente, o número da página da edição italiana (objeto da resenha) e o número da página da edição brasileira. Nas citações subsequentes, que apresentam igual estrutura, adotamos o mesmo procedimento.

Yuri Brunello. Possui graduação em Letras pela Università di Genova (Itália) e mestrado em Cultura e Sociedade pela Universidade Federal da Bahia. Doutorou-se pela Università “La Sapienza” de Roma (Itália), em 2012. Atualmente é professor Adjunto de Literatura Italiana do Departamento de Letras Estrangeiras da Universidade Federal do Ceará. E-mail: [email protected]

Fernanda Suely Muller – Possui graduação em Letras português-italiano pela UNESP e mestrado e doutorado na USP. Atualmente é professora Adjunta de Língua e Literatura Italiana do Departamento de Letras Estrangeiras da Universidade Federal do Ceará. E-mail: [email protected]

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Arquivos literários: teorias, histórias, desafios – MARQUES (A-EN)

MARQUES, Reinaldo. Arquivos literários: teorias, histórias, desafios. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2015. Resenha de: COELHO, Haydée Ribeiro. Arquivos literários: teorias, histórias, desafios. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2015. Alea, Rio de Janeiro, v. n.  jan./apr. 2017.

Arquivos literários, comparativismo e outras navegações

O livro que resenhamos, do professor e pesquisador Reinaldo Marques, decorre de reflexões teóricas, da prática de pesquisa em acervos e de sua experiência administrativa como diretor do Centro de Estudos Literários e Culturais da Faculdade de Letras da UFMG. Quatro dos nove ensaios que compõem o livro trazem nos títulos o termo “arquivos literários”. Qual o sentido de arquivo literário? Como conceituá-lo? Na “Apresentação”, o autor afirma ser um conceito que “resultou numa ficção teórica para ficar num registro borgiano” (p.10) e “como produto de uma atividade especulativa (…) remete a um objeto mais imaginado e ideal nem sempre localizável no mundo empírico” (p. 11).

Na exposição sobre o arquivo e a Literatura Comparada (“Arquivos Literários e reinvenção da Literatura Comparada”), parte da perspectiva de Spivack diante dos rumos da Literatura Comparada na contemporaneidade, destacando, entre outros, aspectos como a tradução e o diálogo transdisciplinar, o que o leva a ressaltar ainda o sentido da literatura comparada como “multilíngue”. A partir das questões do comparativismo, propõe pensar no “arquivo literário” e “no pesquisador comparatista no arquivo” (p. 18). Em relação ao primeiro aspecto, são objeto de consideração os sentidos topológico e monológico do arquivo; sua desterritorialização e reterritorialização (que se dá na passagem do privado ao público) e o limiar do privado ao público. A “feição heterogênea” dos “fundos documentais” e a abordagem transdisciplinar, que requer metodologias da arquivologia, da museologia e biblioteconomia, são alguns dos pontos que propiciam o estudo do “arquivo literário” sob a perspectiva do comparativismo.

A reflexão teórica sobre o arquivo, advinda de saberes diferentes como Filosofia, Política e, ainda, Estudos culturais, suscita a noção de “arquivo literário” como “espaço aberto e inacabado, zona de contato e relações entre distintas temporalidades e subjetividades, capaz de percorrer descontinuidades e estranhamentos em relação ao tempo presente, a ativar anacronismos potencialmente problematizadores da racionalidade arcôntica, estatal e científica, da evidência histórica, que normalmente rege o arquivo” (p. 22).

Se, por um lado, o arquivista é responsável por zelar pelos documentos, normalizar, hierarquizar, armazenar e recuperar os dados nos arquivos, cabe ao pesquisador comparatista “desconstruir a ordem estabelecida (…) a intencionalidade que a estruturou” (p. 25). Tornando-se um “anarquivista”, o pesquisador comparatista está atento aos jogos que envolvem o poder e o saber, torna-se um “genealogista” (o que remete ao sentido de arquivo para Michel Foucault). É importante salientar que a proposta do autor dos ensaios, conforme esclarece em nota, anarquizar não corresponde a “bagunçar” o arquivo, mas interpretar os documentos, estabelecendo outras lógicas, outros deslocamentos que podem ser realizados com base nas tendências do comparativismo contemporâneo.

O segundo ensaio do livro, “Arquivos literários, entre o público e o privado”, está dividido nas seguintes seções: Arquivos de escritores: desterritorializações e reterritorializações; O público e o privado: rasuras; O arquivo do escritor no espaço privado; e O pesquisador, o arquivo, a lei. Nos primeiros parágrafos do estudo, há o questionamento da crítica textual, tendo em vista outras abordagens como a pós-estruturalista e aquela desenvolvida pelos estudos culturais. Essas tendências, aliadas aos estudos já existentes sobre os arquivos, podem trazer contribuições inovadoras, como fica comprovado ao longo dos nove ensaios de Arquivos literários: teorias, histórias, desafios.

Ao ser evidenciada a diferença entre a noção de “arquivo literário” daquela de “arquivo do escritor”, é ressaltado que este “ganha visibilidade na cenografia do arquivo literário, exibindo máscaras da persona autoral” (p. 35). Na comparação entre posições críticas (de Michel Foucault e de Jacques Derrida), é observado que a concepção de arquivo para o primeiro é “mais acentuadamente discursiva” (p. 36). Para o segundo filósofo, o princípio institucionalizador do arquivo está marcado pelo “lugar de consignação”. O poder arcôntico da interpretação faz com que Reinaldo Marques trate das relações entre a retórica e os arquivos. A explicitação dos sentidos de “mal de arquivo” expõe as singularidades da teoria derridiana.

A noção de “arquivo do escritor” suscita reflexões sobre o público e o privado, abrindo espaço para um campo amplo de indagações. O autor do estudo toma como referência textos básicos da teoria política moderna (A condição humana, de Hannah Arendt e Mudança estrutural da esfera pública, de Jürgen Habermas). No contexto do mundo globalizado, há um “encolhimento do espaço público” (p. 49), havendo repercussões sob o ponto de vista ético. Ao abordar o arquivo do escritor no espaço privado, muitas são as ideias que Reinaldo Marques deixa semeadas no caminho de nossa leitura, cartografada por ele: a institucionalização da vida privada pela difusão da leitura e da escrita; a biblioteca como refúgio, gerando um duplo afastamento (público e civil); o mundo privado da escrita em comunicação com o público; a relação entre a vida privada e o mundo burguês; o “indivíduo privado” buscando os “holofotes da publicidade”; o “entre-lugar” habitado pelo escritor e “a prática de arquivamento de si”. Esse último ponto é exemplificado com base na correspondência trocada entre Abgar Renault e Carlos Drummond de Andrade, escritores mineiros, cujas missivas são abordadas também em outro estudo do livro, tendo em vista o conceito “locação”, associado ao moderno “nos níveis literário, cultural, político e dos afetos” (p. 174).

Ainda no segundo ensaio, na seção destinada ao pesquisador, ao arquivo e à lei, é salientado, entre outros aspectos, no âmbito do público e do privado, o diálogo entre a arquivologia e o direito. Ao mostrar que o trabalho bemsucedido com os arquivos se realiza pela publicação dos resultados, o autor do livro em destaque, menciona dois exemplos de pesquisa “em acervos literários, um de êxito, outro de dificuldades”. No primeiro caso, refere-se aos trabalhos realizados e publicados a partir dos arquivos de Henriqueta Lisboa e, no segundo, ao “Diário alemão”, texto que foi traduzido e mantido inédito por questões jurídicas. Nessa exposição, fica claro que o arquivo e a memória representam um “campo de lutas políticas” (p. 83). É oportuno ressaltar que “Grafias de coisas, grafias de vida” (outro ensaio do livro) aborda justamente o “Diário alemão”, de Guimarães Rosa. O caráter heterogêneo dos “seis cadernos de anotações de João Guimarães Rosa” demandou um trabalho que abarca diferentes questões tratadas nos itens: leitura e escritura como coleção; a memória das coisas: breve biografia de um documento e biografias entrecruzadas.

No início desta resenha, mostrei que o termo “arquivo literário” aparece nos quatro primeiros ensaios do livro em destaque. No volume publicado, como no conto de Jorge Luis Borges, os artigos de Reinaldo Marques se imbricam e se bifurcam. Nesse sentido, a seguir, tratarei de aspectos que se interceptam e que criam outras possibilidades de análise dos arquivos, levandose em consideração o que já foi exposto e outros caminhos apresentados, no livro, sobre os arquivos.

A importância da imagem na cena contemporânea implica o estudo das representações do escritor, como este se encena nos “arquivos literários”. Tomando como referência o texto de Philippe Artières, Reinaldo mostra que, nas sociedades letradas, a existência dos indivíduos se faz pelo registro escrito. Ao utilizar o conceito de “arquivamento do escritor”, ele revela um duplo movimento que está associado ao arquivamento de papéis e ao arquivamento do próprio escritor que produz imagens de si mesmo, ao arquivar. Nos acervos literários, encontra-se uma variedade de imagens de escritores (“grafemáticas, fotográficas, plásticas, entre outras”). Exemplos ilustrativos, de imagens pictóricas, depreendidos do “Acervo de Escritores Mineiros”, dominam parte do ensaio destinado às imagens do escritor e aos arquivos literários. Os aspectos assinalados permitem que o leitor estabeleça conexões com outro texto do volume. Refiro-me ao artigo “O arquivamento do escritor” em que são assinalados “aspectos apontados por Philippe Artières, na constituição de arquivos pessoais” em confronto com “práticas de arquivamento” de escritores mineiros.

O pesquisador, que anarquiza o arquivo, não perde de vista os “restos” dos arquivos. Como dar conta dos “restos e ruínas”? Para essa travessia, Reinaldo se vale teoricamente das noções de “resíduos e farrapos da história”, de Walter Benjamin; da noção de “resto”, de Giorgio Agamben; e das considerações de Jeanne Marie Gagnebin, explicitadas na apresentação do livro do filósofo italiano – O que resta de Auschwitz. Na esteira da História, não faltam ainda em Arquivos literários: teorias, histórias e desafios, comentários sobre as relações entre arquivos literários e a formação do Estado Nacional; sobre o discurso e o saber sobre a literatura “capitaneado pela universidade”; sobre o papel pioneiro da Academia Brasileira de Letras, e a respeito das histórias locais e os arquivos literários brasileiros.

No último ensaio do livro, Reinaldo mostra que Terry Cook, ao abordar a questão dos arquivos, fornece elementos para se pensar na “dimensão subjetiva e de intervenção do arquivista”. Essa vertente da subjetividade, aliada ao conceito de “imaginação construtiva” (termo utilizado por Robin George Collingwood), evidentemente institui uma ligação intrínseca com o conceito de “arquivo literário” decorrente de uma “ficção teórica”. Apoiado na “imaginação construtiva”, que não perde de vista o “faro para a ‘estória’”, o autor do livro oferece múltiplas navegações em rede. Por essa e por outras razões explicitadas, a publicação comentada constitui uma referência fundamental para o estudo dos arquivos.

Haydée Ribeiro Coelho Professora da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Possui Graduação em Letras pela Universidade Federal de Minas Gerais (1973); Mestrado em Literatura Brasileira pela Universidade Federal de Minas Gerais (1981); Doutorado em Teoria da Literatura e Literatura Comparada pela Universidade de São Paulo (1990) e Pós-Doutorado pela Universidad de la República, onde desenvolveu uma pesquisa sobre o exílio de Darcy Ribeiro no Uruguai. Dedica-se, atualmente, às interlocuções culturais, literárias e críticas entre o Brasil e a América Latina. Atualmente, é coordenadora do GT ANPOLL Relações Literárias Interamericanas. E-mail: [email protected]

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O interesse e a regra: ensaios sobre o multilateralismo | Gelson Fonseca Junior

O conjunto de ensaios sobre o multilateralismo reunido pelo embaixador Gelson Fonseca Jr em “O interesse e a regra” revelam as preocupações do autor sobre o papel a ser cumprido pela Organização das Nações Unidas na ordem internacional do século XXI. O livro é dividido em um artigo central, inédito, escrito depois de o autor ter deixado suas funções na ONU, e outro cinco artigos escritos há mais tempo, já publicados, que dialogam com o texto principal na medida em que tratam de temas que muitas vezes se cruzam e se complementam.

O artigo central discute a importância da referência de legitimidade emanada das Nações Unidas na dinâmica de contraposição constante que existe entre os interesses particulares dos Estados nacionais e o conjunto de regras e normas construído na arena multilateral. A busca pela legitimidade das ações internacionais dos estados nacionais no palco global é que faria a mediação entre o particular e o universal, entre a vontade individual e a norma multilateral. No texto, rico em exemplos históricos, fruto da vasta experiência do autor enquanto diplomata e estudioso das relações internacionais, o autor esquiva-se de se referenciar exclusivamente a uma linha teórica para entender o fenômeno do multilateralismo onusiano. Embora parte do artigo seja dedicada a desenvolver as idéias de John Ruggie, perspectivas funcionalistas, construtivistas e realistas alternam-se ao longo do texto. Frente à complexidade e à diversidade dos temas analisados, essa escolha se converte em um trunfo do artigo. Leia Mais

Mais malandros. Ensaios tropicais e outros | Kenneth Maxwell

Talvez por sua consolidada reputação no país como especialista na história do império português e dada a ambigüidade do título desse seu último livro publicado no Brasil, essa coletânea de ensaios do historiador inglês Kenneth Maxwell não desperte entre os estudiosos das relações internacionais e da política externa brasileira a atenção que a obra merece. O título Mais malandros. Ensaios tropicais e outros parece fazer sentido apenas se a obra for entendida como sucedânea de outra coletânea de trabalhos do autor, publicada no país em 1999, intitulada Chocolate, Piratas e outros malandros. Ensaios tropicais (Paz e Terra). Os vinte e seis ensaios reunidos em Mais malandros foram, em sua maioria, publicados no extinto site NO (Notícia e Opinião) e no Caderno Mais da Folha de São Paulo, sendo os demais publicados em periódicos estrangeiros.

Se Maxwell é conhecido como autor, entre outros, de uma interpretação clássica da Inconfidência Mineira (A devassa da devassa, Paz e Terra, 1977), de uma biografia definitiva do Marquês de Pombal (Pombal: paradoxo do Iluminismo, Paz e Terra, 1996) e de uma provocativa interpretação da Revolução dos Cravos, ainda inédita no Brasil (The making of Portuguese Democracy, Cambridge University Press, 1995), a prazerosa leitura do trabalho aqui resenhado confirma a erudição e a vastidão dos interesses do autor, o que, por si só, já valeria a empreitada. Contudo, em Mais malandros destacam-se também a sagacidade e o pendor heterodoxo do autor na articulação de seu amplo conhecimento histórico a eventos sociais e políticos contemporâneos, tecedura essa usualmente evitada pelos historiadores. Leia Mais