Movimientos sociales, activismos y resistencias desde la escuela/Revista Izquierdas/2022

Introducción

La presentación del siguiente monográfico está organizada en tres apartados, que buscan proporcionar un marco de entendimiento común sobre el potencial que tiene la educación para generar espacios y dinámicas para la transformación social. Para ello, en la primera parte se presenta el contexto educativo histórico y presente en el cual se inscriben los trabajos, poniendo el énfasis en la pugna actual por hacer de la educación un espacio de reproducción o de resistencia al orden social dominante. En la segunda parte, se describen los ejes temáticos que ordenan el monográfico y se presentan brevemente cada uno de los 18 artículos que lo componen. Finalmente, se señalan algunas consideraciones que hemos podido extraer a partir de la lectura del material teórico y empírico presentado al monográfico, compuesto por voces relevantes de distintas geografías y tradiciones. Leia Mais

Estado, democracia e movimentos sociais na América Latina contemporânea | Revista Eletrônica da ANPHLAC | 2020

Desde princípios do século XX, os países da América Latina se veem diante do desafio de construir alternativas para a modernização do Estado e o desenvolvimento nacional, frente à crise e ao colapso dos regimes de dominação oligárquica, fundamentados no modelo primário-exportador. Liberais em aspectos econômicos, na política, o Estado oligárquico era bastante interventor, especialmente na garantia da exclusividade do poder para os grupos primário-exportadores por meio de intensa repressão contra os demais setores da sociedade. Nas primeiras décadas do século, alguns países vivenciaram rupturas com o modelo oligárquico, como a Revolução Mexicana, iniciada em 1910, e a eleição de Hipólito Yrigoyen para presidente da Argentina, em 1916. Porém, é somente a partir dos anos de 1930, que a maioria dos países da América Latina se depara com o desafio de superação da dominação oligárquica, frente ao colapso do modelo primário-exportador no contexto da depressão mundial. Intensificam-se as mobilizações em prol da democratização da sociedade e de novos modelos de desenvolvimento econômico. Esse cenário foi marcado pela exacerbação do nacionalismo, do autoritarismo, dos movimentos sociais e das polarizações ideológicas. As propostas para superação do modelo oligárquico das sociedades latino-americanas não foram adotadas sem conflitos e convulsões. Leia Mais

Movimentos Sociais e Meio Ambiente / Revista Brasileira de História & Ciências Sociais / 2020

É com imenso prazer que trazemos a público o dossiê Movimentos Sociais e Meio Ambiente. A ideia de organizar um dossiê que concentrasse trabalhos focados na interrelação entre seres humanos e natureza se origina na percepção de uma demanda social improtelável. As dinâmicas humanas de apropriação do que convencionamos chamar de recursos naturais têm transformado as próprias relações sociais.

Agradecemos a Revista Brasileira de História & Ciências Sociais pela oportunidade de apresentar ao seu público leitor um dossiê que congrega trabalhos acadêmicos de qualidade e comprometidos com as urgentes demandas da sociedade. Agradecemos, ainda, às autoras e autores que submeteram seus trabalhos, fruto de pesquisas que foram desenvolvidas nos mais diversos âmbitos da vida acadêmica oriundos de diferentes regiões deste país e do exterior.

O dossiê Movimentos sociais e Meio Ambiente foi gestado por dois historiadores que percebem o valor da interdisciplinaridade na pesquisa tanto dos movimentos sociais, quanto na temática ambiental. Os trabalhos aceitos para publicação, depois da avaliação cega por pares, são fruto de arranjos interdisciplinares que exprimem a atual encruzilhada científica que está posta pela crise ambiental, uma vez que a vida em todas as suas tonalidades não respeita as fronteiras criadas pela ciência.

Destacamos que, apesar da crise ambiental afetar a todos os seres humanos, há de se ponderar sobre a forma com que os mais diversos grupos são prejudicados. As populações mais pobres acabam ocupando áreas sujeitas aos mais variáveis riscos ambientais, e, dessa forma, os resultados da produção de riqueza não são divididos universalmente. Há, portanto, uma heterogeneidade dos problemas oriundos desta crise e que toca sujeitos e territórios de maneiras diversas. De forma equivalente, há uma pluralidade de lutas e formas de resistência no contexto latino americano contemporâneo.

A presente edição (2020 / 1) tem a função de trazer exemplos destas formas de organização e luta social em face ao maior desafio que a espécie humana já enfrentou. Os trabalhos dão conta de questões que vão dos movimentos indígenas no Brasil até a falta de esperança expressa pelas obras distópicas do final do século XX. As mais diversas lentes (gênero, patrimônio cultural, decolonialidade, emancipação política, associativismo, direito à existência) são usadas para avaliar condições de vulnerabilidade, estratégias de articulação social e enfrentamento da atual crise ambiental.

O primeiro trabalho é dos organizadores do Dossiê, Alfredo Ricardo Silva Lopes e Mario Marins Viana Junior. O Antropoceno como Regime Historicidade avalia que a velocidade com que os seres humanos têm se apropriado de outros seres e elementos naturais resulta numa nova forma de compreender o tempo. Diferente da ideia progressiva e crescente estabelecida com a Revolução Industrial e Revolução Francesa, o tempo é agora materializado pelos limitados recursos naturais restantes. E a degradação do planeta é o cronômetro que marca a possível extinção humana e provoca a história e a historiografia em desafios teórico-metodológicos.

Em Os Movimentos Indígena e Ambientalista sob o viés de análise da História Ambiental: a repercussão no Ensino de História, Poliene Soares dos Santos Bicalho, Maria de Fátima Oliveira e Fernanda Alves da Silva Oliveira discutem as interrelações entre os movimentos indígena e ambientalista no Brasil. A preocupação com a natureza é avaliada nos diferentes grupos a partir dos discursos nos livros didáticos, tendo como objetivo a temática da preservação do meio ambiente.

Ayelen Dichdji analisa a percepção pública dos primeiros conflitos ambientais na Patagonia Argentina a partir da década de 1980 em Movimientos socioambientales, decolonialidad e historia ambiental en los conflictos patagónicos en Argentina (1980-2003). A autora avalia o surgimento da opinião pública sobre a exploração dos recursos naturais, através das páginas dos periódicos Clarín e La Nacion.

A Região Amazônica teve e tem marcada em todo seu processo histórico uma pluralidade de anseios de diversas fontes. Nesse contexto, Fabiane Araujo Oliveira e Elizabeth Conceição Santos examinam as memórias do processo de ocupação da Área de Proteção Ambiental Floresta Manaós (localizada na zona Centro-sul da cidade de Manaus-AM). Em A História Ambiental da APA Floresta Manaós: um movimento pela defesa territorial e a emersão da Ciência Ambiental foi observada a complexidade nos embates entre os mais diversos atores interessados na preservação do ambiente.

Alicia Ferreira Gonçalves evidencia em Mapas Sociais: Subsídios para a elaboração do Plano de Gestão Territorial e Ambiental potiguara a importância da produção de mapas sociais pelos indígenas Potiguara para gestão do próprio território. Nas observações da pesquisadora, a elaboração do Plano de Gestão Territorial e Ambiental (PGTA) fortalece a autonomia na gestão dos territórios indígenas em consonância com a proteção do ambiente.

Em Movimento Social de Pescadores e Pescadoras Artesanais em Mato Grosso: Patrimônio Cultural e Lutas Políticas, Manuela Areias Costa e Luciano Pereira da Silva trazem reflexões sobre o movimento dos pescadores e pescadoras artesanais, o meio ambiente e o patrimônio cultural imaterial. Na avaliação dos autores as políticas públicas para pesca que restringem o uso de utensílios comunalmente apropriados pelas pescadoras e pescadores colocam em risco o direito ao trabalho e a reprodução cultural do grupo.

A mobilização social das mulheres no Movimentos dos Atingidos por Barragens (MAB) é estudada por Monise Vieira Busquets, em Bordando a Luta: O Coletivo de Mulheres do Movimento dos Atingidos por Barragens e as oficinas de Arpilleras como estratégia de mobilização social. A partir das reflexões das militantes e idealizadoras do projeto “Arpilleras, Bordando a Resistência” a autora destaca a resistência e organização como parte central da vida dessas das mulheres.

Eunápio Dutra do Carmo discute como o campo político da cidade de Barbacena-PA foi recomposto em função da mineração. Em Contra-informação e conhecimento emancipatório como práticas educativas no enfrentamento da economia de desastres da mineração em Barcarena (PA) o autor analisa atuação dos movimentos sociais na produção social da contra-informação no contexto da economia de desastre, no intuito de romper com a percepção tecnicista dos desastres.

Para avaliar o contexto do surgimento das associações ambientalistas, Olivia Cristina Perez destaca que as associações ambientais em Santos-SP surgem, em sua maioria, após os anos 2000. Em Relações entre Estado e associações: origens de associações ambientais em Santos (SP) fica evidente o papel do financiamento estatal para o financiamento das fundações privadas e associações sem fins lucrativos no Brasil.

Gustavo Seferian busca, a partir da tradição marxista no direito, evidenciar o duplo caráter do direito à vida. Em O duplo caráter do direito à existência: luta de classes e articulação estrutural das contrarreformas sociais, políticas e ambientais, o autor demonstra como as contrarreformas direcionadas aos direitos sociais guardam articulação estrutural com os ataques direcionados ao meio ambiente. Avalia ainda que a contraposição incisiva dos movimentos sociais na defesa de seus interesses imediatos se aglutina às bandeiras ecológicas.

A representação da distopia ambiental no cinema é examinada por Franco Santos Alves da Silva em “O Mundo de 2020”: Relações sociais e meio ambiente na distopia de 1973. Na observação do filme “O Mundo de 2020”, (Soylent Green, no título original), o autor discorre sobre a relação da narrativa distópica com a emergência das questões geopolíticas e ambientais da década de 1970.

Em suma, o conjunto de trabalho aqui reunidos tem ainda o propósito de provocar o leitor a um duplo-movimento. Aqueles e aquelas que estão distantes do debate sobre a questão ambiental e crise na qual estamos imersos poderão compreender a amplitude dos problemas pelo convite a se aproximarem das reflexões ora apresentadas. Por outro lado, há uma interpelação mais incisiva: a de fomentar aprendizados sobre distintas formas de lutas e resistências que, neste dossiê, incluem desde o debate sobre livros, filmes, documentos oficiais, etc., até as ações diversificadas de uma massa plural de sujeitos (indígenas, pescadores, camponeses, entre outros) que enfrenta amplos e diferentes conflitos ambientais na América Latina.

O dossiê Movimentos Sociais e Meio Ambiente, portanto, é um trabalho coletivo de pesquisadoras e pesquisadores engajados e preocupados com o tempo que nos resta e com o espaço que habitamos. Boa leitura!

Alfredo Ricardo Silva Lopes – Professor

Mário Martins Viana Júnior – Professor

Fortaleza – Campo Grande / Inverno de 2020.


LOPES, Alfredo Ricardo Silva; VIANA JÚNIOR, Mário Martins. Apresentação. Revista Brasileira de História & Ciências Sociais. Rio Grande, v.12, n. 23, jan. / jun., 2020. Acessar publicação original [DR]

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Abertura política e redemocratização: igrejas, movimentos sociais e partidos políticos / Crítica Histórica / 2018

A proposta deste dossiê partiu da constatação de que, na produção acadêmica, sobressaem trabalhos dedicados à efervescência política do final dos anos 1950 e início dos anos 1960, aos acontecimentos que antecederam o Golpe de 1964 e ao período ditatorial que se estabeleceu no Brasil por mais de 20 anos. Entretanto, no que se refere particularmente a esse último período, priorizam-se a primeira década do Regime e, sobretudo, os seus contornos mais repressivos. Pouca atenção tem sido dada mais especificamente ao lento, controlado e controvertido processo de abertura implementado a partir de 1974, sob a presidência do General Ernesto Geisel, e, mais adiante, à redemocratização parcial e ao retorno à legalidade dos partidos.

Estes mais de 10 anos que se seguem à repressão mais intensa não devem, no entanto, ser deixados de lado. São marcados por uma importante mobilização e por um retorno à ação de muitos sujeitos e instituições, entre os quais igrejas, partidos e movimentos sociais. Todos eles são favorecidos por um contexto de maior abertura e procuram se reinserir nele e estabelecer suas práticas e estratégias.

Além disto, este interesse ainda incipiente tem se concentrado, principalmente, nas questões jurídicas e legais e nas mudanças políticas e institucionais ocorridas a partir de então. Fazem-se, inclusive, numa perspectiva mais panorâmica, apenas menções e breves referências a episódios marcantes, sem a devida análise e o aprofundamento necessário para entender a complexidade e a trama que envolvem todo o momento. É o caso, por exemplo, de alusões superficiais e insuficientes a respeito das tratativas que levaram à revogação do AI-5, da campanha pela Anistia, do retorno ao pluripartidarismo ou ainda da campanha pelas Diretas Já. Perscruta-se muito pouco a atuação dos atores os mais diversos possíveis neste cenário tão complexo que levou arduamente ao desmantelamento dos aparelhos de repressão e de censura e ao lento restabelecimento do sistema democrático.

Mais recentemente, algum esforço notório de produção historiográfica tem sido empreendido no sentido de preencher ou ao menos dirimir esta lacuna. As práticas e trajetórias dos atores sociais, neste contexto de abertura progressiva, têm sido reconstruídas e analisadas a fim de compreender os meandros da sua atuação e da sua subjetividade. Como puderam se reinserir neste novo cenário e nos debates travados então? Quais problemas enfrentaram? Quais estratégias puseram em prática? Quais as memórias e narrativas produzem a este respeito? Eis alguns dos inúmeros e importantes questionamentos que podem ser levantados para dinamizar os estudos e as pesquisas nesta direção. Pesquisas que revisitam temas clássicos da historiografia nacional, dando-lhes um enfoque muito mais direcionado ao período pós-1974 e, sobretudo, pós-1979.

Neste quesito, inúmeras são as fontes a serem mobilizadas sob este recorte temporal e sob este olhar, para além do contexto mais abrangente e ressaltando o papel dos sujeitos individuais e coletivos. Entre elas, pode-se destacar a imensa contribuição trazida pela metodologia da História Oral e toda a reflexão teórica que a acompanha a fim de compreender a complexa relação entre a história, a memória e a construção de narrativas referentes aos acontecimentos vivenciados, aos dilemas enfrentados e aos traumas sofridos. Cabe aqui ainda o recurso à memória herdada ou compartilhada, referente àqueles que estiveram bem próximos aos episódios e aos seus atores e que produzem igualmente narrativas sobre eles. Além disto, destacam-se também documentos escritos, como cartas, relatórios, atas de assembleias, reuniões, encontros, documentação produzida por organizações, partidos e movimentos sociais, sem contar os jornais, tradicionalmente mais recorrentes neste tipo de análise.

No bojo deste esforço mais recente, propõe-se, portanto, este dossiê com a finalidade de enriquecer o debate e a produção acadêmica em torno de temas nevrálgicos para a compreensão da história nacional. Destes resultaram, em grande medida, os contornos que assumiram posteriormente o sistema político e o regime democrático em construção. Destes ainda resultaram inúmeras e inestimáveis trajetórias e narrativas produzidas por sujeitos que vivenciaram e vivenciam estes acontecimentos passados, relembrando e tecendo memórias a seu respeito. Abordagens específicas podem, inclusive, ser propostas a fim de se fugir do olhar mais genérico e pautado exclusivamente na esfera política mais ampla, nas grandes manobras palacianas, legislativas e da magistratura ou ainda no grande clamor da sociedade por mudanças. É preciso, neste ponto, descer à escala do micro e perceber a complexidade e a subjetividade que gira em torno dela. Nesta perspectiva, a apreensão da historicidade do momento deve suplantar o olhar meramente macro-político e de cunho institucional. Deve voltar-se às bases regionais e locais a fim de perceber como nelas atuam partidos, organizações, associações, grupos, igrejas, mulheres, negros, indígenas, LGBTs, quilombolas, trabalhadores urbanos e rurais e os mais diversos sujeitos individuais ou coletivos.

Com base nestas reflexões iniciais, foram propostos artigos que procuram preencher essa lacuna historiográfica e fazer uma discussão mais direcionada sobre temas específicos deste momento histórico. Para a constituição do dossiê, optou-se então por fazer uma organização temática dos trabalhos selecionados.

Dos seis artigos que o compõem, os dois primeiros abordam a questão política e institucional e situam-na entre o início da transição democrática, em 1974, e a Constituinte de 1987 e 1988. “A Contrarrevolução Democrática: a transição pelo alto e a institucionalização das instituições (1974-1979)”, de Pedro Cardoso, analisa o governo do General Ernesto Geisel e o processo de abertura por meio do papel desempenhado pela Comissão Trilateral e pelo seu membro Samuel Huntington, cientista político estadunidense, na formulação do projeto de distensão. “Conflito intrapartidário e Reforma Agrária: o PMDB na Constituinte”, de Pedro Vicente Medeiros, ressalta o conflito existente no PMDB quanto à definição da Reforma Agrária na Constituinte entre 1987 e 1988. Aprofunda o debate e as divergências internas entre parlamentares do partido que compunham a Subcomissão de Política Agrícola e Fundiária. Embora estes dois primeiros artigos se somem a uma abordagem mais clássica da política institucional do período, ambos o fazem de forma mais aprofundada e levantando problemáticas específicas e centradas em alguns sujeitos e organizações.

O quatro artigos seguintes dedicam-se unicamente à Igreja Católica e a sua atuação ao longo da Ditadura e, sobretudo, a partir da segunda metade dos anos 1970. Como parte da instituição teve um engajamento político e social notório desde os anos 1960, a maior parte dos autores optou por remontar a esta década, enveredando em seguida nos anos 1970 e 1980, quando se fortaleceu a atuação católica nos conflitos e debates. “O caminho percorrido pela diocese de Propriá- SE até a redemocratização do país (1964-1985)”, de Osnar Gomes dos Santos, concentra-se na mudança de posição ocorrida na diocese sergipana de Propriá em meados da década de 1970. Sob a autoridade de Dom José Brandão de Castro, a mesma passou do apoio declarado aos militares ao engajamento em favor da luta pela terra e da organização de sindicatos rurais. A sua atuação foi desde então destacável e chegou, inclusive, a entrar em atrito com as elites da região, que pressionaram para a sua aposentadoria precoce. “Relações de trabalho, Igreja Católica e direitos na Zona Canavieira de Pernambuco: organização e mobilização de trabalhadores rurais no Regime Militar”, de Cristhiane Laysa Andrade Teixeira Raposo, também opta por uma abordagem mais abrangente da atuação da Igreja, desta vez em relação aos trabalhadores rurais e a sua luta por direitos na Zona Canavieira de Pernambuco. Ainda que de maneira breve, a autora destaca o período da abertura e o papel nele exercido pela instituição católica, quando se intensificam a sua oposição ao Regime e o seu pleito em favor do retorno à democracia. “A Ação Católica Rural: mudanças e desafios políticos de 1978 a 1985”, de Maria do Socorro de Abreu e Lima, analisa as práticas desempenhadas pela Animação dos Cristãos no Meio Rural-ACR no trabalho de conscientização dos trabalhadores rurais e o seu posicionamento diante do cenário e dos debates travados. Esse movimento católico passou a abordar cada vez mais questões não só religiosas, mas, sobretudo, políticas. “‘Comunistas na Igreja’: a atuação dos católicos progressistas no incentivo à participação popular na Região Sisaleira da Bahia nos anos finais do século XX”, de Cristian Barreto de Miranda, encerra o dossiê abordando o papel de católicos da cidade de Conceição do Coité, na Região Sisaleira da Bahia, no fomento à participação popular no período que se seguiu ao fim da Ditadura. Mais uma vez, ressaltam-se as práticas adotas pela Igreja em favor das camadas mais pobres e dos trabalhadores.

Desta maneira, espera-se estar contribuindo para o aprofundamento das discussões referentes à abertura política e à redemocratização situadas a partir de 1974 e estendendo-se até o final dos anos 1980, com os trabalhos da Constituinte de 1987 e 1988. Pelos importantes episódios vivenciados nesses mais de 10 anos e pela sua influência na configuração que assume posteriormente a democracia em construção, tal momento tem valor inestimável e merece, inclusive, que outros pesquisadores se interessem cada vez mais por ele e por leituras mais direcionadas e diversificadas a seu respeito.

Por fim, os textos do fluxo contínuo deste número trazem discussões importantes que circulam da história política, à história social do crime e história do catolicismo. O artigo “Classes populares, cultura política e Constituinte (1984-1988)” de Charleston José de Sousa Assis propõe-se a estudar a cultura política brasileira, com foco nos anos da transição democrática e “a partir das sugestões da população à Assembleia Nacional Constituinte, encaminhadas por carta ao Congresso Nacional”. Em seguida em “Instruir-se para instruir”: a Ação Católica Brasileira e a formação da Juventude Estudantil Católica no Brasil (1935-1966), Carolina Maria Abreu Maciel analisa a Ação Católica Brasileira a partir da experiência da JEC, suas influências teóricas para formação de quadros para a instituição religiosa. Já Patrícia Marciano de Assis no texto Reflexões sobre Chefatura de Polícia do Ceará enquanto instituição policial do Império historiciza o papel da chefatura tendo como perspectiva sua ação no controle da população pobre, como forma de manutenção das estruturas de poder. O artigo “O paraíso dos criminosos”: imprensa, política e crimes na cidade do Rio de Janeiro durante as eleições do início do século XX de Ana Vasconcelos Ottoni procura abordar como a imprensa retratava as “supostas relações entre política e as ocorrências de crimes na cidade do Rio de Janeiro durante as eleições do início do século XX”. Encerra o número a resenha intitulada “O símbolo histórico de um movimento pela terra: A desapropriação da Fazenda Annoni no Rio Grande do Sul” que apresenta a obra de Simone Lopes Dickel, Terras da Annoni: entre a propriedade e a função social, publicado em 2017, e defendida como dissertação de mestrado em 2016, no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade de Passo Fundo- RS. Nela Caroline da Silva aponta como a autora estabelece um diálogo entre a História e o Direito, apontando a questão fundiária e social da terra em uma construção histórica de luta no período 1972-1993.

Boa Leitura!

Samuel Carvalheira de Maupeou – Professor Adjunto da Universidade Estadual do Ceará-UECE.

Equipe Editorial Revista Crítica Histórica


MAUPEOU, Samuel Carvalheira de. Apresentação. Crítica Histórica, Maceió, v. 9, n. 18, dezembro, 2018. Acessar publicação original [DR]

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Associativismo e movimentos sociais / Estudos Históricos / 2018

Nesta edição de número 65, a revista Estudos Históricos traz aos leitores artigos relacionados a um tema caro à tradição interdisciplinar, que é marca constitutiva do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC): associativismo. No campo das Ciências Sociais, tal conceito pode ser rastreado até os trabalhos clássicos de Alexis de Tocqueville sobre as virtudes (e os perigos) da democracia norte-americana, passando por obras seminais da sociologia política mais recente, como “Comunidade e Democracia”, de Robert Putnam. Entre os historiadores, as formas encontradas por homens e mulheres para produzir vida em comum também foi tema crucial de pesquisa, em especial nas vertentes analíticas inspiradas pela obra seminal de E.P. Thompson sobre a formação da classe trabalhadora na Inglaterra. A fertilização mútua entre História e Ciências Sociais tornou quase impossível delimitar com precisão onde começam e terminam suas respectivas jurisdições sobre as artes da associação humana. Thompson, por exemplo, foi fonte recorrente para sociólogos interessados em transformar o “fazer-se” específico estudado pelo autor em instrumento para decifrar processos mais amplos de formação de classes nas sociedades capitalistas. E o conceito de “capital social”, por sua vez, percorreu itinerários complexos nos trabalhos de historiadores interessados em desvendar redes e laços entre grupos, comunidades, irmandades e clãs.

Esses debates e cruzamentos teóricos estão bem representados no dossiê que o leitor tem em mãos. Há artigos que retomam o clássico tema do associativismo dos grupos subalternos, em especial dos trabalhadores, como no caso dos textos de Samuel de Oliveira sobre trabalhadores favelados no Rio e em Belo Horizonte, durante a República de 1946, e de Mário Brum sobre a Pastoral de Favelas e sua conexão com a Teologia da Libertação. Elis Angelo e Maria Izilda de Matos, por sua vez, revisitam as relações entre imigração e formas associativas por meio de estudo sobre a Casa dos Açores de São Paulo. As variáveis étnico-raciais que estruturaram as formas de ação coletiva no Brasil são abordadas no texto de Petrônio Domingues, centrado na história da Frente Negra no Rio de Janeiro, evidenciando novas frentes de investigação sobre a articulação entre raça, classe, cidadania e associativismo.

A cidade, como não poderia deixar de ser, figura com destaque em vários artigos, por se constituir no espaço por excelência para a invenção de novas formas de vida em comum de homens e mulheres. Pode-se aprender sobre esse associativismo urbano no texto de Lia Rocha sobre a história recente da criminalização do associativismo nas favelas cariocas, no artigo de José Bortolucci sobre as redes entre arquitetos e movimentos populares em São Paulo no processo de redemocratização e no trabalho de Jonatha Santos e Wilson de Oliveira sobre o Coletivo Debaixo e suas práticas comunicativas na esteira dos movimentos de 2013 em Aracaju. Finalmente, se o nexo entre democracia e associativismo parece ser tomado como pressuposto em muitos debates, o artigo de Reginaldo Sousa nos permite repensar tal relação ao investigar o associativismo feminino em apoio à ditadura civil-militar no Paraná.

Acreditamos que o conjunto de textos disponível nesta edição irá interessar não apenas aos estudiosos do associativismo, mas a toda a comunidade de historiadores e de cientistas sociais que veem na construção de formas de vida em comum não apenas um tema de pesquisa disciplinar, mas também um credo fundamental para o revigoramento de nossa combalida democracia.

Referências

PUTNAM, Robert D. Comunidade e Democracia – a experiência da Itália moderna. Rio de Janeiro: FGV, 2008.

THOMPSON, Edward. P. A Formação da Classe Operária Inglesa: A árvore da liberdade. vol. I, 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

Bernardo Borges Buarque de Hollanda – Professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV). Editor da Revista Estudos Históricos. E-mail: [email protected]

João Marcelo Ehlert Maia – Professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV). Editor da Revista Estudos Históricos. E-mail: [email protected]

Ynaê Lopes dos Santos – Professora da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC / FGV). Editora da Revista Estudos Históricos. E-mail: [email protected]

Os editores


HOLLANDA, Bernardo Borges Buarque de; MAIA, João Marcelo Ehlert; SANTOS, Ynaê Lopes dos. Editorial. Estudos Históricos. Rio de Janeiro, v.31, n.65, set. / dez. 2018. Acessar publicação original [DR]

Movimentos Sociais e Identitários / Ofícios de Clio / 2017

Braços erguidos, punhos cerrados. Essa imagem marca importantes momentos históricos em diferentes tempos e espaços. Os movimentos sociais e identitários são parte fundamental na engrenagem que move a História, mesmo quando repreendidos e / ou criminalizados. A Revista Ofícios de Clio oportuniza nesse número um espaço de divulgação de pesquisas e de debates entre historiadores que abordam esses movimentos. Objeto de estudo tradicional, normalmente filiado ao campo da História Social, compreendendo as perspectivas do trabalho, da política sindical e da etnicidade; recentemente, tem dialogado com outros campos e categorias de análise, por exemplo, cultura, gênero, queer e raça. Dessa forma, são contemplados por esse campo de estudo os movimentos de trabalhadores e de estudantes, os que lutam pelo acesso à terra e à moradia e os coletivos que defendem populações tradicionais. Também os movimentos LGBT+, feministas, raciais, entre outros. A agência desses sujeitos coletivos ou individuais são compreendidos a partir de suas formas de (re) organização, de expressão, de luta e o engajamento político e / ou intelectual de militantes e ativistas. A produção de conhecimento histórico sobre os movimentos sociais e identitários está em constante movimento, os pesquisadores tem ampliado os possíveis caminhos teórico-analíticos e metodológicos constantemente.

Esses movimentos são a origem de inovações e de produção de saberes articulados aos processos políticos, sociais e culturais nos quais estão inseridos. A própria produção intelectual formal está em transformação devido o engajamento de grupos sociais e identitários; principalmente a partir do tensionamento dos debates sobre racismo na sociedade brasileira e da implementação das ações afirmativas. Os ativistas passam a reescrever a sua própria História, desde o seu lugar de fala. O diálogo entre a História Social e o Tempo Presente também tem proporcionado discussões sobre a importância da perspectiva dos historiadores para a compreensão de ações coletivas contemporâneas, como as Jornadas de 2013 e o Golpe de 2016.

Os doutorandos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, José dos Santos Costa Júnior e Roger Camacho Barrero Júnior, ao escreverem o artigo “Jovens como esperança na transformação: a campanha Juventude Participa! em Campina Grande (PB 2009-2011)”, aproximam-se desse debate, ao buscar na perspectiva de análise do Tempo Presente elementos para compreender os jovens como “sujeitos historicamente situados que participam de processos de transformação social e / ou manutenção e atualização de determinados modelos de comportamento e formas de ação social”. Suas fontes foram imagens, relatórios institucionais e boletins informativos, pelas quais analisaram o discurso sobre a participação política de jovens e os significados atribuídos aos conceitos de juventude, participação e cidadania. Ressalta-se que foi considerada a pluralidade do grupo e as discussões apontadas pela Política Nacional de Juventude (PNJ).

A Paraíba também é o local onde está situado o objeto de estudos de Iany Elizabeth da Costa, doutoranda em Geografia pela Universidade Federal Fluminense. No artigo “Movimento Quilombola na Paraíba: algumas considerações sobre a organização social pelo direito à terra”, privilegia o estudo sobre a Coordenação Estadual de Comunidades Negras e Quilombolas da Paraíba (CECNEQ), mas também estabelece relações com a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ). No transcorrer do artigo pode-se acompanhar um levantamento teórico sobre a relação do Movimento Negro e do Movimento Quilombola na luta por direitos sociais desde a Constituição de 1988. Iany buscou “compreender os avanços e limites no estudo dessas organizações sociais, a fim, de perceber como as antigas comunidades negras rurais adquirem espaço na luta dos movimentos sociais brasileiros” e como articulam-se para “ocupar espaços nas pautas reivindicatórias por direitos sociais” na atualidade.

A luta por direitos sociais é o principal elemento articulador dos movimentos sociais, entre esses está o direito à terra. O Movimento Sem Terra surgiu nos anos 1980, e hoje é um dos maiores movimentos sociais do Brasil. Da mesma forma que ocorre no movimento negro, no quilombola, no direito à moradia, as mulheres ocupam papel central na luta. Leonardo Dantas D’Icarahy, mestrando da Universidade Federal da Bahia, debruçou-se sobre essa questão ao escrever “Mulheres sem terra no surgimento do MST na Bahia (1987-89)”. Com o aporte da história oral, ouviu a história de vida de cinco mulheres do MST que participaram do período de surgimento e estabelecimento desse movimento social na Bahia. Analisou o papel delas na decisão familiar de ocupar terras e as estratégias utilizadas para sobreviver no acampamento. O autor, sem deixar de considerar as “hierarquias de poder das relações de gênero dentro deste movimento social”, percebeu a participação política de suas entrevistadas em diferentes aspectos do cotidiano, ressaltando “o protagonismo dessas mulheres nesta fase inicial do MST no estado baiano”.

Os movimentos citados até o momento tiveram seu auge no processo de redemocratização do Brasil, mas suas “bandeiras” têm origem em períodos anteriores. Durante a Ditadura Civil-Militar no Brasil, diferentes organizações coletivas foram perseguidas, dificultando a sua manutenção e ação. Assim como no Brasil, Portugal também viveu uma Ditadura, recorte cronológico contemplado pelo artigo “Contra o Estado Novo: manifestações e organizações em Portugal no período marcelista (1968-1974)” de Pamela Peres Cabreira, doutoranda da Universidade Nova de Lisboa. O estudo apresenta algumas organizações civis que agiram contra o Estado Novo português (1926-1974). Pamela parte do pressuposto de que o país não estava “adormecido” frente a situação nacional no período, marcado por retrocessos socioeconômicos e políticos. Através de fontes documentais, como o periódico Avante! Clandestino e discussão bibliográfica, analisou as ações do Partido Comunista Português, os levantes nos quartéis, os movimentos dos estudantes e dos trabalhadores “enquanto frentes mobilizadoras e legitimadoras de uma luta contra o sistema retrógrado do Estado Novo em Portugal”, criando “um espaço revolucionário” com o fim do período ditatorial.

Por fim, a pós-graduanda do Instituto Federal Fluminense, Mariana Mendes Christo, amplia o debate ao compartilhar um texto que analisou o século XVIII. Nessa análise, parte dos conceitos aliados a concepção de Antigo Regime nos Trópicos, para compreender as relações de poder no interior das capitanias do Rio de Janeiro e das Minas Gerais. Como pode-se apreender pelo título “Manoel Henriques e as relações de poder nos Sertões de Macacu (1765 – 1787)”, toma como objetivo central a ação do bando liderado por Manoel Henriques, no interior dos Sertões de Macacu, analisando suas ações e o papel executado por esse sujeito naquele contexto social. A hipótese que pretende comprovar durante o desenvolvimento do artigo, é de que no interior da colônia existiam diversas redes de poder que fugiam ao controle da Coroa.

Compartilho com a Revista Discente Ofícios de Clio a alegria de poder trazer aos nossos leitores artigos que demonstram a vitalidade e a importância das pesquisas que tomam como objeto os movimentos sociais e identitários.

Boa leitura!

Micaele Irene Scheer – Doutoranda UFRGS / CAPES


SCHEER, Micaele Irene. Apresentação. Revista Discente Ofícios de Clio, Pelotas -RS, v. 2, n. 3, ago./dez., 2017. Acessar publicação original [DR]

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História do mundo rural e movimentos sociais / História – Debates e Tendências / 2017

Compor um dossiê tendo por objeto a história do mundo rural e movimentos sociais é oportunizar um espaço de reflexão, discussão e divulgação de problemáticas da história pretérita e atual. O referido dossiê centra a investigação em três eixos temáticos: o mundo rural, a propriedade da terra e os movimentos sociais. Eles possibilitam discutir as temáticas, as metodologias e as teorias de estudos e pesquisas por meio da relação entre história agrária, história da agricultura, ocupação e apropriação da terra, conflitos fundiários, movimentos sociais, fronteiras agrárias e políticas, relações socioculturais e grupos sociais rurais. A perspectiva que aproxima e aglutina esses estudos é a do mundo rural e dos movimentos sociais latino-americanos e brasileiros, em interação com os demais territórios. Busca-se interface entre história, antropologia, geografia, sociologia rural e direito, procurando discutir as várias realidades rurais, na perspectiva do regional, em seus múltiplos desdobramentos. Leia Mais

História e movimentos sociais / Fronteiras – Revista Catarinense de História / 2016

A expressão “movimento social”, como afirma Peter Burke, passou a ser empregada a partir da década de 1950 por sociólogos americanos e entrou para o campo da História com Eric Hobsbawm na obra Rebeldes e Primitivos, de 1959. Desencadeou, a partir daí, uma série de estudos envolvendo antropólogos, sociólogos e historiadores. [1]

O XVI Encontro Estadual de História promovido pela ANPUH-SC ocorreu no mês de junho de 2016, na cidade de Chapecó, no Campus da Universidade Federal da Fronteira Sul – UFFS. A universidade foi criada em 2010 após uma grande mobilização dos movimentos sociais da região. A ANPUH-SC, para homenagear esses movimentos, decidiu como tema para o XVI Encontro: “História e Movimentos Sociais”. A temática acabou atraindo vários pesquisadores que estão dedicando seus estudos sobre o assunto, muitos militantes dos movimentos sociais, principalmente ligados ao campo, que também participaram efetivamente do evento. Destaca-se a participação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), com apresentação musical fruto de um projeto de extensão desenvolvido pela UFFS junto ao movimento.

O Encontro de História ocorreu em meio a uma grande efervescência política e social no país, como a luta contra o golpe jurídico parlamentar, a luta contra a perda de direitos, desenvolvida pela a mais vasta gama de movimentos sociais. Desta forma, a temática “História e Movimentos Sociais” acabou ganhando ainda mais relevância. Nesse sentido, optamos em desenvolver esse número da revista Fronteiras com o Dossiê História e Movimentos Sociais, aproveitando assim a emergência do tema para a atualidade em que nos encontramos.

O presente número inicia com o artigo de Paulo Pinheiro Machado “História e movimentos sociais: a vida, a História e a Democracia” – que foi a conferência de abertura do evento – e destaca os movimentos camponeses no sul do Brasil, relacionando com os aspectos da democracia brasileira e como esses temas são tratados no campo da História. Alexandre Assis Tomporoski contextualiza o movimento do Contestado com a concentração fundiária na região. Esta tem sua origem no século XIX e permanece até os dias atuais. A expansão colonizadora na região oeste de Santa Catarina e a relação com os povos indígenas é analisada por Wilmar R. D’Angelis. A atuação de Vitorino Condá, o Indio Condá, (hoje na memória da cidade de Chapecó, com nome de rua, rádio e estádio de futebol), demonstra como elementos indígenas se envolveram no processo.

A guerra civil ocorrida entre 1835 e 1845 no Sul do Brasil, que ganhou o nome de Revolução Farroupilha, é tratada no artigo de Anderson Marcelo Schmitt. O autor analisa, a partir de uma exaustiva pesquisa documental, as relações cotidianas no período pensando a maneira especial de comportamento das pessoas comuns em meio ao conflito.

Mateus Gamba Torres, no artigo “Movimento estudantil e resistência: Recurso ordinário criminal, AI-5 e a luta dos estudantes da Faculdade de Ciências Médicas e Biológicas de Botucatu-SP”, analisa como os julgados da época, 1970, pretendiam um discurso de neutralidade jurídica sob o regime de exceção da ditadura militar após a implementação do Ato Institucional número 5.

“O preto feiticeiro Sete Cabeças: a circularidade de crenças e religiosidades na sociedade escravista do século XIX” é o artigo de Paulo Roberto Ataudt Moreira. Estuda o cotidiano da sociedade portoalegrense do século XIX utilizando os processos criminais como fonte. Para o autor, “os autos de corpo de delito podem fornecer-nos aspectos da cultura religiosa em sua materialidade”.

Este número ainda conta com uma entrevista com o historiador José Augusto Pádua, nome de referência nos estudos de História Ambiental, dentro e fora do país. Na entrevista, Pádua conta sua trajetória acadêmica, sua atuação junto ao Greenpeace, assim como aponta questões latentes sobre a importância dos estudos sobre o meio natural.

Por fim, este número da revista é encerrado com a resenha “Uma Martinha vale uma Lucrécia?”, onde Fernando Vorjniak aponta como Raquel Campos traz uma abordagem inovadora, acerca de Machado de Assis, das interpretações sociais dos historiadores e críticos literários que subordinaram a especificidade da literatura machadiana a um princípio de identidade nacional.

Desejamos aos todos uma excelente e produtiva leitura.

Nota

1 BURKE, Peter. História e Teoria Social, 2ªed. São Paulo, UNESP, 2012. Pag. 142.

Antônio Luiz Miranda

Samira Peruchi Moretto


MIRANDA, Antônio Luiz; MORETTO, Samira Peruchi. Apresentação. Fronteiras: Revista catarinense de História. Florianópolis, n.28, 2016. Acessar publicação original [DR]

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Trabalho e Movimentos Sociais no Brasil / Vozes Pretérito & Devir / 2015

Os artigos que compõem o dossiê “Trabalho e Movimentos Sociais no Brasil” foram escritos por pesquisadores de diversas regiões do país – Nordeste, Sudeste e Sul. De um modo geral, estão centrados no campo da história social e refletem sobre as experiências cotidianas, condições de vida e trabalho de escravos no século XIX e trabalhadores livres no século XX, no meio rural e urbano. As ações dos trabalhadores são percebidas para além das relações de trabalho e dos movimentos organizados, buscando uma leitura que escapa à tradicional dicotomia que por muito tempo impregnou a historiografia brasileira. Nesse sentido, os autores estabelecem diálogos com a historiografia mais recente em que a história social do trabalho, a partir de sua aproximação com a antropologia e novamente com a sociologia, passou a integrar um movimento de superação das dicotomias no campo da história do trabalho. De outro modo, nesses Mundos do Trabalho são evidenciadas as redes de sociabilidade, como as experiências individuais e coletivas de sujeitos simples e suas atuações em processos históricos específicos, colocando-os no centro dos acontecimentos.

Em “O suicídio de Felisberto: a fazenda São Fernando entre elites e escravos (Vassouras – 1850–1888)”, Fábio Pereira de Carvalho procura demonstrar a construção da elite escravista de Vassouras, no período 1850 a 1888, através do estudo de uma fazenda em particular: São Fernando. Nesse sentido, o autor enveredou pela vida em comunidade de seus escravos, e em específico, do suicídio do escravo doméstico Felisberto. O seu enforcamento abre brechas para verificar como a construção da comunidade escrava, vista de forma não homogenia, implicou em uma lógica de prestígio e desprestígio que também estava relacionado com o trabalho realizado por determinado escravo.

Lia Monnielli Feitosa Costa, autora de “O mesquinho pão das mil e uma dificuldades: imigrantes, abastecimento e tensões políticas no discurso do jornal piauiense ‘A Época’ (1878)”, analisa tal periódico em suas edições do ano de 1878, relacionando a vinda de imigrantes do Ceará para o Estado do Piauí e o gerenciamento do abastecimento de carne e grãos, realizado pelo governo da época.

Em “Sobreviver e se organizar: o movimento contra a carestia e a formação da classe trabalhadora no Rio de Janeiro”, Kaio César Goulart Alves analisa as manifestações públicas contra a carestia, conduzidas pelos trabalhadores urbanos do Rio de Janeiro no ano de 1913. Segundo o autor, as campanhas contra a carestia mobilizaram trabalhadores urbanos do centro e dos subúrbios, qualificados e não qualificados. Os comícios públicos de protesto foram o método de ação privilegiado. Diante disso, Kaio traça um estudo sobre as manifestações dos trabalhadores nas ruas da cidade, em lutas pela sobrevivência, mas também pela formação de novos sindicatos, e pela conquista de direitos sociais.

Em “A trajetória do Centro Social de Monte Grave – Milhã / CE (1973 a 2000) ”, de Antonia Natália de Lima e Telma Bessa Sales, realiza-se um análise a respeito da conjuntura de fundação do Centro Social de Monte Grave (CSMG). A Associação foi constituída na década de 1970 na localidade de Monte Grave (Milhã / CE) e atuou no âmbito da saúde, educação e outros serviços sociais. A partir do uso de fontes orais a autora destaca o envolvimento dos sujeitos na organização da instituição e no estabelecimento das atividades da mesma.

Ramsés Eduardo Pinheiro de Morais Sousa é autor de “Na luta por direitos: As ligas Camponesas e a resistência aos grandes proprietários no Piauí (Campo Maior e Teresina, 1962- 1964)”. Ele analisa ações de resistência dos lavradores no processo de constituição das ligas Camponesas no Piauí e evidencia uma resistência ampliada dos camponeses e a existência de uma rede de solidariedade entre os lavradores. O dossiê temático é fechado com o artigo: “O Primeiro de Maio nos jornais anarquistas A Plebe e A Lanterna (1932-1935)”, de André Rodrigues, nele são abordados os sentidos e significados produzidos em torno dia do trabalhador a partir dos jornais na primeira metade dos anos 30, no Brasil.

A edição é complementada por dois artigos, uma entrevista e uma resenha. Ana Crhistina Vanali é autora de “Agnes Heller e Michel de Certeau: propostas de análise sobre a vida cotidiana. ” e “O Poeta do Riso e da Dor: A relação entre música e história na obra de Sérgio Sampaio (1970-1980) ” de Fabrício Nunes Mendes Brito. O livro “Le ‘nouveau’ Front National: Etude de la nouvelle ligne du parti à travers le discours” de autoria de Marine Le Pen, resenhado por Guilherme Ignácio Franco de Andrade e uma entrevista realizada com Paulo Pinheiro Machado.

Este volume traz à tona discursos e narrativas sobre as ações de sujeitos simples negligenciados pela historiografia tradicional. De um modo geral, os trabalhos aqui reunidos expressam várias possibilidades de estudos sobre os mundos do trabalho no Brasil a partir de uma perspectiva “dos de baixo”, dialogando com as diversas áreas do conhecimento.

Cristiana Costa da Rocha – Professora Doutora (UESPI)

Telma Bessa Sales – Professora Doutora (UVA)


ROCHA, Cristiana Costa da; SALES, Telma Bessa. Apresentação. Vozes Pretérito & Devir. Teresina, v.4, n.1, 2015. Acessar publicação original [DR]

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Terra: relações, conflitos e movimentos sociais / Tempos históricos / 2014

Os estudos relacionados à história rural no Brasil e na América Latina, na atualidade, revelam relações sociais conflitivas e diversificadas; modos de vida; memórias acerca de experiências de ocupação da terra e do trabalho rural; disputas judiciais pela posse da terra e disputas de trabalhadores rurais por direitos trabalhistas; formas individuais e coletivas de luta pela terra e contra a construção de usinas hidrelétricas, bem como modos diversos de conceber a posse, o uso e as relações com a terra e o meio ambiente.

Este universo rural plural, desigual e conflitivo visualiza-se nos problemas abordados em artigos, publicados em grande número no passado recente, o que demonstra a vitalidade da história rural, que para além de problematizar tradicionais temas, como o dos movimentos sociais, incorporou e abriu novas frentes de análise. Também possibilitou a voz e conferiu movimento às práticas dos sujeitos sociais a partir de um leque diversificado de fontes, entre as quais as narrativas orais.

A multiplicação de estudos sobre a vida rural vem propiciando a revisão das historiografias construídas tradicionalmente, elaboradas e problematizadas nos centros urbanos, ao destacar a homogeneização que elas supõem. A irrupção de análises com estas características nos permite resignificar concepções de mundo, pleitear a necessidade de um desenvolvimento que interpretamos como humano e social e não meramente econômico, bem como consolidar um olhar mais amplo para a relação entre sociedade e natureza, no âmbito do pensamento holístico.

Tal configuração se verificou também na organização do presente Dossiê “Terra: relações, conflitos e movimentos sociais”. Os organizadores receberam dezenas de artigos, versando sobre múltiplas temáticas, o que também se têm nos artigos que compõem o Dossiê. Eles retratam questões situadas em diferentes espaços e tempos históricos em diversos países da América Latina (Brasil, Argentina, México e Peru) e com perspectivas teóricas, abordagens e fontes diversas, entre as quais: matérias de jornal impresso, entrevistas orais, índices estatísticos, leis, entre outras.

A problematização das leis agrárias, do direito da / à terra e do direito do / ao trabalho, permeia os seis primeiros artigos do Dossiê. Neles emergem disputas entre diferentes sujeitos sociais – indígenas, pequenos agricultores e grandes proprietários rurais – pela posse da terra. Neste terreno movediço e conflituoso, no questionamento do Direito e, ou, na busca da justiça por meio dele, bem como na forma de movimentos sociais, evidencia-se a constituição de sujeitos como portadores de direitos; a recriação de representações sociais; políticas públicas, leis agrárias e confrontos em torno delas.

Tematizando a Lei Hipotecária de 1964, Pedro Parga Rodrigues questiona se esta lei originou a propriedade privada no Brasil, confrontando a interpretação da criação da propriedade privada no Brasil pelas normas jurídicas.

O paper de Vânia Maria Losada Moreira nos chama atenção para o Direito como uma das dimensões centrais na luta índios pela posse e uso de suas terras, “discutido a obliteração dos índios como sujeitos portadores de direitos na historiografia clássica sobre a formação territorial brasileira”, bem como, a partir de estudo de caso, como a recorrência ao Direito e “busca da Justiça foram os dois principais instrumentos mobilizados pelos índios para assegurar a posse e controle sobre suas terras”.

Fábio Baião, por sua vez, nos convida à reflexão sobre as estratégias de luta coletiva do Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN), movimento armado e constituído em sua maioria por indígenas do sul do México. O autor problematiza os usos de representações sociais pretéritas pelo EZLN, como ferramenta de combate e legitimação, numa conjuntura neoliberal, de ameaça da perda da terra e das tradições.

Os professores Henrique Kujawa e João Carlos Tedesco abordam os conflitos entre indígenas e pequenos agricultores, engendrados pelas políticas públicas relacionadas às demarcações de terras indígenas no Norte do Rio Grande do Sul e os conflitos territoriais na atualidade.

O artigo de Silvia Lázzaro analisa a política agrária peronista, na década de 1970, explicitando como a Lei Agrária foi inviabilizada pela confrontação tecida pelas corporações dos grandes proprietários, bem como de fissuras internas ao governo peronista.

Em “Sobre a lei do trabalho infantil no agro argentino”, Ignacio Rullansky aborda as “diretrizes gerais que servem de base para o aprofundamento da análise histórica do direito do trabalho na agricultura argentina e do trabalho infantil”.

Os artigos que se seguem abordam diferentes dimensões da questão agrária no Brasil e na Argentina. São temas: a apropriação privada da terra, os conflitos e a sujeição do trabalho e dos trabalhadores engendrados por este processo; o acesso a terra pelos trabalhadores rurais, a reforma agrária e as alterações da vida no campo contemporâneo.

A questão agrária, dimensionada pela apropriação privada da terra, pelos conflitos e territorialidades em áreas de colonização, é objeto de análise dos artigos de José Carlos Radin, em “Questão agrária na fronteira catarinense” e de Carlo Romani, César Martins de Souza, Francivaldo Alves Nunes, em “Conflitos, fronteiras e territorialidades em três diferentes projetos de colonização na Amazônia”.

Christine Rufino Dabat analisa a trajetória de acesso a terra dos trabalhadores rurais da zona canavieira de Pernambuco, entre 1960 e 1980, concluindo que a “brecha camponesa, sob a forma de sítio / roçado, permitiu, após a abolição, a manutenção da sujeição da força de trabalho rural”, na forma da relação de trabalho assalariada.

A “modernização agrícola”, como discurso político a partir de um estudo de caso em Minas Gerais, Brasil, é tema do artigo de Auricharme Cardoso de Moura. As alterações da vida no campo no Oeste do Paraná, na segunda metade do século XX, por sua vez, dimensionadas por meio da análise da desestruturação ambiental, ocasionada em grande medida pela utilização de agrotóxicos, são problematizadas por Carlos Meneses de Sousa Santos e Sheille Soares de Freitas.

Na sequência há cinco artigos que têm como objeto de análise as experiências e memórias da luta pela reforma agrária no Peru e no Brasil. Também são temas abordados: a trajetória social, as condições de vida e a resistência de assentados rurais na terra e na relação com o coletivo, proposto pelo MST como forma de organização na terra, na contraposição a “terra de trabalho”.

Vanderlei Vazelesk Ribeiro aborda o processo de reforma agrária no Peru, entre 1969 e 1993, desde as cooperativas sob intervenção militar à parcelação de terras de corte neoliberal, apontando as contradições desse processo.

O artigo de Leandra Domingues Silvério analisa condições de vida e de trabalho de assentados da reforma agrária na contemporaneidade a partir “de narrativas construídas por eles no ato de lembrar-se de suas histórias e de suas lutas, trazendo à tona a complexidade de se viver no campo”.

Fabiano dos Santos Rodrigues focaliza em seu texto a trajetória social e as formas de resistência de trabalhadores rurais do assentamento Califórnia em AçailândiaMA diante de um conflito ecológico, engendrado pelo avanço do cultivo de grandes áreas com plantações de eucalipto em áreas ao entorno do assentamento.

Em seu paper, Pere Petit, Airton Pereira, Fábio Pessôa abordam o confronte entre camponeses e fazendeiros pela posse da terra no Sul e no Sudeste do Estado do Pará, durante a segunda metade do século XX, na relação, em especial, com setores ligados à Teologia da Libertação.

As lutas camponesas do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no Pontal do Paranapanema, São Paulo, Brasil, é temática abordada por Maria Celma Borges. A autora problematiza as práticas camponesas, priorizando “trama vivida entre a Organização (dirigentes e militantes) e os demais personagens, com destaque para a necessidade de superação dos termos “massa” e “vanguarda” na compreensão das ações deste movimento social”.

No seu conjunto, os artigos do Dossiê explicitam temas e preocupações relevantes para o debate no âmbito da história rural, ao evidenciarem as disputas pela terra, os modos de viver nela e as memórias dos sujeitos sociais, não como meras manifestações ou decorrentes do econômico, mas permeadas e engendradas igualmente por diferentes dimensões do social, como a da cultura, da política e do jurídico.

A partir deste escopo, o Dossiê pretende contribuir com o debate no âmbito da história rural acerca das disputas de diferentes sujeitos pela terra, do trabalho, dos modos de viver e das memórias dos trabalhadores da terra, das relações, dos conflitos e dos movimentos sociais.

Davi Félix Schreiner – Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo (USP). Professor Associado do Curso de História e do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE).

Mónica Gatica – Doutora em História pela Universidad Nacional de La Plata. Professora da Universidad Nacional de la Patagonia San Juan Bosco, Argentina, (UNPSJB).

Os organizadores.


SCHREINER, Davi Félix; GATICA, Mónica. Introdução. Tempos Históricos, Paraná, v.18, n.2, 2014. Acessar publicação original [DR]

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Trabalhadores, Culturas e Movimentos Sociais / História & Perspectivas / 2014

A Revista História & Perspectivas apresenta neste número o Dossiê: Trabalhadores, Culturas e Movimentos Sociais, composto por artigos que trazem reflexões em torno da presença dos trabalhadores, da visibilidade de suas práticas socioculturais na arena pública e as diferentes configurações políticas que essas práticas assumem enquanto movimentos sociais contemporâneos. O nosso objetivo é o de contribuir com o debate, apresentando propostas investigativas com focos diferenciados de análises acerca desse eixo temático. Artigos cuja contribuição está, sobretudo, no apontamento das diferentes problemáticas vinculadas às culturas e experiências do fazer-se dos trabalhadores enquanto protagonistas da História.

O artigo de Mariana Mastrángelo tem como objetivo refletir sobre a existência de uma cultura operária esquerdista no interior da Argentina, a partir dos testemunhos de operários, intelectuais e militantes de esquerda que viveram em duas cidades da província de Córdoba, nas décadas de 1930-1940. Seu enfoque tem como suposto as reflexões de Raymond Willians, no que diz respeito a investigar a cultura em seus processos variáveis, em suas definições sociais e, também, em suas inter-relações dinâmicas, apontando que cada cultura contém elementos explorados de seu passado, mas o seu lugar no processo cultural contemporâneo é variável. Desse modo, através dos testemunhos recolhidos, a proposta é de analisar os problemas da memória elucidando na cultura dos seus protagonistas o modo como convivem os elementos “residuais”, “emergentes” e “dominantes” nos processos de narrar / significar / resignificar o presente-passado.

O artigo de Pablo A. Pozzi também parte dos supostos de Raymond Willians sobre cultura ordinária e estruturas de sentimentos, propondo analisar a longa tradição de consignas políticas que conformam cânticos, por exemplo, no “apego” cultural dos trabalhadores pelo futebol, e que também coroaram as participações nos movimentos nacionais de disputas políticas na Argentina. Refletindo as canções e metáforas da linguagem socialmente produzida nessas práticas culturais, o autor busca as articulações e significados das mesmas nos processos de tensão, conflitos e resistências vividos pelos trabalhadores em diferentes conjunturas políticas. Sua hipótese é a de que essa linguagem evidencia propostas programáticas, uma identificação de inimigos e / ou aliados e, em particular, elementos que apontam para a definição de uma “identidade própria”. Nas palavras do autor: a proposta é traçar por meio do estudo de uma série de cânticos e consignas políticas, a permanência de uma subjetividade política de esquerda durante parte do século XX argentino (…) vinculadas a figuras específicas que aparecem em distintos testemunhos de militantes políticos; o impacto do cântico quando o testemunhante busca explicar com maior profundidade um conceito repetindo algumas consignas apreendidas durante as participações nas mobilizações políticas.

Já o artigo Los Indignados de Latino América – de Antonio J. Chica Badel, Giovani Cheuiche Godoy, José María Monzón e Mércia Pereira – busca refletir sobre o que os autores consideram a força dos movimentos sociais nas lutas por melhores condições de vida, melhores oportunidades de trabalho e igualdade. Movimentos que contribuem para o questionamento de paradigmas que sustentam a ideia de uma sujeição tradicional e ou submissa ao sistema dos mercados globalizados. Segundo os autores, tais movimentos sociais reclamam autonomia em relação ao poder das forças econômicas que interferem na organização interna dos países da América Latina.

Outro artigo que contribui para as reflexões desse Dossiê é Breve história das jornadas de junho: uma análise sobre os novos movimentos sociais e a nova classe trabalhadora no Brasil, de Josué Medeiros. É uma reflexão sobre as novas configurações dos movimentos sociais focadas nos protestos ocorridos em junho de 2013 e que foram chamados de Jornadas de Junho. O autor trata esses protestos como novos movimentos sociais, pautado na análise sobre a constituição da nova classe trabalhadora no Brasil. A indagação é sobre a natureza política dos protestos, problematizando a maneira como foram difundidos pela imprensa periódica, atentando para ações e participações dos seus integrantes nas redes sociais, questionando sobre quem eram os agentes ou jovens, protagonistas desses protestos, o que reivindicavam por meio dessas ações, suas visibilidades na arena política mediante a conjuntura e suas propostas de intervenções. Questões que se articulam na hipótese de que as jornadas de Junho de 2013 no Brasil podem ser vistas enquanto um momento de afirmação de novas formas de organização coletiva e que podem ser relacionadas com o debate acerca da nova classe social ou da nova classe trabalhadora, diante das políticas dos governos pós-neoliberais no Brasil.

O último artigo do Dossiê é de Fernando Perli sobre a temática: Impressos, leituras de passado e configurações do ensino de História no Movimento dos Sem Terra (MST), no qual apresenta uma análise relevante sobre as propostas desse movimento no que diz respeito à produção das “representações de passado”, tecidas por lideranças, intelectuais e entidades de apoio como atos que delineiam um lugar para o ensino de História na organização do movimento. O autor faz sua interpretação pautando-se nos processos de produção dos impressos difundidos pelo MST.

Na seção dos artigos avulsos encontram-se textos cujas análises assentam-se em pesquisas sobre memórias, culturas e experiências de trabalhadores de diversas localidades do Brasil. A problemática da participação / organização dos trabalhadores nos movimentos sociais de bairro na década de 1980, no município de Toledo no Estado do Paraná, foi foco da pesquisa de Jiane Fernando Langaro. Em seu artigo, o autor analisa as trajetórias, os aprendizados dessas lutas, por meio das memórias dos seus protagonistas, primando por compreender os significados dessas experiências durante um processo tenso de busca por parte do poder publico municipal em institucionalizar as organizações, associações comunitárias, destacando, principalmente, o caráter de sujeitos históricos daqueles que se envolveram nessas lutas por direitos naquela cidade. Já o artigo de Rosangela M. Silva Petuba dialoga com as experiências dos trabalhadores e de suas famílias na cidade de Ponta Grossa (PR). O interesse foi demonstrar a maneira pela qual esses trabalhadores constituíramse ferroviários, por meio de um modo de vida, entendido como prática social, em que visões e projetos de viver, morar e trabalhar se articulam na vida da cidade e na ferrovia. Experiências que foram analisadas como outra possibilidade de diálogo com o tempo vivido e como alternativa para a construção de outras histórias da ferrovia e de sua relação com a cidade. Noutro enfoque, temos o artigo de Sheille Soares de Freitas e Carlos Meneses de Souza Santos cujo tema é: Laços de Violências em vínculos classistas: os trabalhadores rurais na porção Oeste do Paraná na segunda metade do século XX. A análise problematiza o modo como determinadas relações de poder, estabelecidas por trabalhadores rurais, podem extrapolar definições fragmentárias, indicadas em noções como “mundo do trabalho” e “cotidiano de trabalhadores”.

Ainda nessa seção encontram-se os artigos de Marco Antonio S. de Almeida, intitulado O que ocorreu com os trabalhadores desligados da indústria de transformação da microrregião de Juiz de Fora pós-abertura econômica?; de Antonio de Pádua Bosi – Uma História Social comparada do trabalho em frigoríficos: Estados Unidos e Brasil (1880-1970); e de Alysson Luiz Freitas, – A violência praticada por escravos e homens livres: crimes em comum? que tratam de temáticas relativas às mudanças nos processos de produção capitalista, a exploração do trabalho em situações distintas e comparadas e as transgressões e ou violências praticadas e vividas por trabalhadores em variadas relações de subordinação / dominação em diferentes temporalidades históricas.

Por último, o artigo de Alessandro de Almeida e Edwirgens A. Ribeiro Lopes de Almeida, intitulado Que Presidente sou eu? A telenovela como instrumento de propaganda eleitoral nas eleições de 1989, problematiza a produção de telenovelas pela empresa Rede Globo, no ano de 1989, como instrumento político que contribuiu para a vitória do candidato vinculado ao projeto neoliberal no Brasil.

Vale destacar a nova seção Debates criada nesse número e que aborda Sobre a Profissão do Historiador. Esta seção traz o posicionamento de duas Associações sobre este tema: a da Sociedade Brasileira de História da Ciência – SBHC e da Associação Nacional dos Professores de História – ANPUHNACIONAL. A profissionalização do historiador tem sido debatida em vários fóruns e é uma preocupação constante da ANPUH. A apresentação destes posicionamentos visa contribuir com a divulgação deste debate.

Por fim a seção Resenhas, com o texto: A atualidade do pensamento de Antonio Gramsci para a historiografia contemporânea de autoria de Heloisa Helena Pacheco Cardoso. A autora tece considerações sobre a importante presença dos referentes teóricos de Antonio Gramsci na historiografia brasileira, analisando os artigos publicados no livro intitulado Sociedade Civil. Ensaios Históricos, 2013, organizado por Dilma Andrade de Paula e Sônia Regina de Mendonça.

Celia Rocha Calvo – Conselho Editorial


CALVO, Celia Rocha. Trabalhadores, Culturas e Movimentos Sociais. História & Perspectivas, Uberlândia, v.27, n.51, 2014. Acessar publicação original [DR].

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História, Estado, Relações de Poder e Movimentos Sociais / Crítica Histórica / 2013

A edição da Revista Crítica Histórica nº 8 – Dossiê História: Estado, Relações de Poder e Movimentos Sociais apresenta temáticas que se estendem da organização do um comércio legal na grande Senegâmbia, pós proibição do tráfico de escravos, atravessando o Atlântico e terminando no Brasil para entender a formação de relações de poder nos oitocentos, chegando ao debate racial dos anos trinta.

O artigo que abre o Dossiê, apresenta como na Senegâmbia Histórica, após a proibição do tráfico de escravos, outras atividades comerciais se desenvolveram. A extinção do tráfico negreiro alterou a visibilidade das relações de poder sobretudo, econômicas, políticas e sociais, no interior da Costa da Guiné e daí com os portugueses. Quais atividades comerciais se formam aí e como elas aconteciam são perguntas as quais o artigo de Diego Zonta e Cristina Portellla, pretendem responder.

Já o artigo de Martha Vieira, procura entender como o processo de Independência do Brasil, em especial, entre 1821 e 1822, alterou significativamente as relações políticas institucionais na Província de Goiás, gerando uma crise de autoridade local que acabou por reorganizar seus próprios fundamentos.

Pensando no cotidiano, Sebastião Pimentel Franco, apresenta-nos as características sociais da população da Comarca de Vitória (ES) em meados dos oitocentos. Ressalta-se, porém, no artigo, como, através dos autos criminais, é possível dar visibilidade aos aspectos do cotidiano daquela sociedade.

De forma geral, o artigo de Célia Nonato articula a ideia de que o messianismo oitocentista pode ser pensado como movimentos sociais diferenciados na medida em que se articularam no mundo rural, contra o reformismo e o barroco, tornando tais aspectos centrais na ação coletiva que empreenderam e projetaram.

Encerrando o Dossiê, o artigo sobre o médico alagoano, Arthur Ramos, parte de sua atuação profissional, em especial entre os anos trinta e quarenta, na qual atua em diferentes áreas cujo foco central era o “racismo”, sempre tratado pelo médico nas suas dimensões políticas, sociais e culturais.

Na Seção Artigos, há uma complexa e interessante abordagem sobre a historiografia do Congo, ao mesmo tempo em que a articula na abordagem epistemológica e nas estratégias metodológicas plurais que evidenciam as contribuições da historiografia africanista ao campo da História.

Ana Paula Palamartchuk – Professora Doutora. Editora Chefe / Coordenadora do Dossiê


PALAMARTCHUK, Ana Paula. Apresentação. Crítica Histórica, Maceió, v. 4, n. 8, dezembro, 2013. Acessar publicação original [DR]

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Política e movimentos sociais / Revista Trilhas da História / 2013

A composição deste número é sugestiva para pensarmos a dinâmica da história, da política e de seus movimentos e agentes sociais. Os artigos apresentam contribuições substanciais para a compreensão dos discursos políticos produzidos desde o Brasil Império à Primeira República. Traz a discussão da vida na estiva, das políticas de colonização; das lutas dos mutilados pelo sisal na Bahia dos anos 1980 e das práticas de resistência das mulheres no contexto da Constituinte de 1988.

Os Ensaios, com propriedade, apresentam resultados de pesquisas na graduação, evidenciando como é profícuo o diálogo entre o ensino e a pesquisa na formação do professor. Os textos enfocam desde os lugares da “fala franca” na Antiguidade; de festas e de lazer na capital fluminense da Primeira República ao fazer artístico da Tropicália da década de 1970. A Resenha instiga o leitor ao conhecimento de parte da cultura do continente africano. A seção Fontes nos brinda com a história de um trabalhador da cana de Porto Rico.

É um prazer apresentar este número, pela sua riqueza, pela diversidade de temas e de contribuições que se entrelaçam, a partir de várias instituições de muitos lugares do país. A seguir apresentaremos cada uma das contribuições buscando instigar os leitores a acessar os textos integrais, carregados de vida e partilhados de forma generosa pelos autores.

O artigo “As relações Brasil e Uruguai através dos discursos do Visconde do Rio Branco proferidos em 1855”, de Jaqueline Schmitt da Silva, enfoca os discursos e as ações de Visconde do Rio Branco no quadro de conflitos entre Brasil e Uruguai, contribuindo para a discussão da história política e dos caminhos tomados pela política externa brasileira naquele momento histórico.

Erika Arantes, ao utilizar-se da documentação policial, entre outras fontes, em “A Vida na Estiva – O cotidiano dos trabalhadores do porto do Rio de Janeiro nos primeiros anos do século XX”, conta a história dos trabalhadores do porto em sua dura rotina de desemprego e de violência policial. O enredo evidencia o drama do viver nas ruas e nelas dormir a procura de trabalho ou por não ter conseguido emprego para aquele dia, o que implicava vivenciar constantes repressões policiais, particularmente pela tarja da “vadiagem”. A rotina do trabalho e o modo de vida na zona portuária carioca do início da República desvelam as políticas de controle e o papel da polícia na tentativa de disciplinarização da classe trabalhadora. Mas, mais que isto, desvelam ainda os limites da administração pública e privada para este controle.

O artigo “A conciliação entre capital e trabalho em Evaristo de Moraes e Jorge Street via sindicato operário”, de Pedro Paulo Lima Barbosa, aborda dois autores que, segundo Moraes, mesmo em muitas ocasiões estando em lados opostos no debate do movimento operário da Primeira República, muito contribuíram para o abrandamento do conflito entre capital e trabalho. Isto se deu ao incentivarem a criação de sindicatos para “barganharem” junto à burguesia e ao Estado, evitando conflitos e a aproximação com alas “mais radicais”.

O texto “O movimento dos trabalhadores mutilados da região sisaleira da Bahia”, de Cassiano Ferreira Nascimento, apresenta um “movimento reivindicatório” da década de 1980, envolvendo trabalhadores rurais que sofreram mutilação e não conseguiram a aposentadoria por invalidez. O autor reconstrói histórias de lutas por meio de memórias dolorosas, ao contarem a experiência da amputação. A dor torna-se símbolo da resistência em um dos muitos movimentos que efervesceram por todo o país nos anos 1980. Os relatos demonstram o desespero diante da deformação e da falta de horizontes quanto a um novo trabalho. A mutilação é sentida como um marco de memória semelhante ao tempo da conquista da aposentadoria, pois a partir dela “viveriam em condições mais dignas”.

O artigo “„Lobby do Batom‟: uma mobilização por direitos das mulheres”, de Kerley Cristina Braz Amâncio, explicita a organização das mulheres, por meio do movimento político “Mulher e Constituinte”, empreendido pelo CNDM (Conselho Nacional dos Direitos da Mulher) na luta pelo reconhecimento e inclusão de seus direitos na Constituição de 1988. Utilizando jornais da época e documentos produzidos por estas mulheres no movimento que ficara conhecido como “Lobby do Batom”, a autora, com propriedade, demonstra os lugares ocupados por essas ações de resistência que foram muito além da questão de gênero, pois redimensionaram o lugar das mulheres na classe trabalhadora.

O texto “Políticas de colonização no extremo oeste catarinense e seus reflexos na formação da sociedade regional”, de Paulo Ricardo Bavaresco, Douglas Orestes Franzen e Tiones Ediel Franzen, observa a condição de fronteira dos projetos de colonização alemã do alto Vale do Rio Uruguai, municípios de Mondaí e Itapiringa; da região de fronteira entre Brasil e Argentina, em Dionísio Cerqueira, e do município de São Miguel do Oeste. No estudo desses três espaços é possível entender que projetos de colonização implicam varias facetas como jogos de interesses, migrações, conflitos entre estados pela posse da terra e discursos civilizatórios. A abordagem traz para a cena da história a formação do espaço e do povo da fronteira oeste de Santa Catarina.

O Ensaio de Graduação “Transformações da „fala franca‟ no mundo antigo”, de Kauana Candido, parte da análise de Michel Foucault e de sua produção, em especial a parresia (a fala franca). Em seguida discute a política no contexto da Antiguidade grega e romana e as suas relações com a contemporaneidade, momento em que indaga: “o que é falar francamente”? As redes sociais e as ruas em movimentos ocorridos em 2013 possibilitaram discernir entre os “bajuladores” e os “parresistas”? Estas são questões que possibilitam o diálogo entre os diferentes tempos.

O Ensaio intitulado “‟E dançaram a noite toda, até a manhã…‟: Um estudo sobre o funcionamento das sociedades recreativas, carnavalescas e clubes na capital fluminense (1908-1913)”, de Igor Estevam Santos de Oliveira, faz uma análise bibliográfica e de fontes do Arquivo Nacional que permitem levantar um número expressivo de associações desta natureza nos subúrbios do Rio de Janeiro do início do século XX. O texto apresenta várias questões envolvendo estas organizações, e apreende os laços de amizade e de solidariedade mútua que poderiam facilitar a constituição de uma identidade comum entre os seus membros.

“Um verme passeia na lua cheia‟: performance e cenicidade audiovisual em Ney Matogrosso na construção de um fazer artístico na década de 1970”, de Robson Pereira da Silva, conta a trajetória artística de Ney Matogrosso, com ênfase para a sua inserção no movimento Tropicalista e ainda para a indústria cultural da década de 1970. O ensaio contribui para a compreensão dos movimentos artísticos que nasceram nesse período da ditadura militar e alicerçam a crítica ao regime, expondo ainda a transgressão corpórea e visual.

A Resenha de Júnio Viana Gomes do romance Hibisco Roxo, de autoria de Chimamanda Ngozi Adichie, apresenta a história de uma família nigeriana e os conflitos vividos na intimidade do lar, mas também no processo de colonização da Nigéria. Segundo Júnio Gomes, mais do que a narrativa da história de uma família bem sucedida, Adichie quer mostrar outras histórias e outros olhares sobre o continente e a cultura africana, com seus embates, contradições e a sua beleza.

Na Seção Fontes, temos o texto “Fonte para a história dos trabalhadores da cana – MINTZ, Sidney. Worker in the cane: a Puerto Rican life history”, de autoria de Flávia Bruna Ribeiro da Silva Braga e Pedro Henrique Falcão Sette. O romance conta a história de vida de um trabalhador da cana, “Don Taso”, que vive em Porto Rico, em meados do século XX, e sente no corpo o domínio econômico e político dos EUA, ao vivenciar a ocupação americana de seu país, após a Guerra hispano-americana de 1898. A abordagem, segundo os autores, é antropológica e etnológica, pois Taso, de quarenta anos, uma esposa e onze filhos, é um excelente informante. Amparado em gravações e anotações realizadas na convivência com Taso, Mintz apresenta uma história em que a sua preocupação é a de “compreender a presença estrangeira e as mudanças no modo de vida dos portorriquenhos”. Mintz destaca que a vida política de Taso explicita suas posições claramente contrárias ao patronato. Esta é uma análise reveladora das possibilidades da literatura como fonte para a história.

Uma boa leitura a todos!!!

Maria Celma Borges

Primavera de 2013


BORGES, Maria Celma. Apresentação. Revista Trilhas da História. Três Lagoas, v.3, n.5, jul. / dez., 2013. Acessar publicação original [DR]

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Movimentos Sociais e Sociedade / Revista Eletrônica História em Reflexão / 2013

O ano de 2013 foi especial para a Revista Eletrônica História em Reflexão (REHR). No seu sétimo ano de existência, o periódico conquistou a classificação no estrato B3 do Qualis Periódicos / Capes (área de História). Essa conquista é fruto de muito trabalho, seriedade e esforço coletivo dos editores – discentes do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal da Grande Dourados (PPGH / UFGD) – e dos membros do Conselho Editorial e Consultivo da Revista.

Ao longo de sua existência, a REHR tem se consolidado como um meio relevante na interlocução de pesquisas no âmbito da História e das Ciências Humanas em Mato Grosso do Sul, e no cenário brasileiro. Destacam-se autores e autoras de Instituições de todo o Brasil e, recentemente, de outros países, que contribuem com seus trabalhos. Em todas as suas “chamadas de trabalhos”, a REHR tem recebido uma quantidade considerável de artigos e resenhas, sendo estes de qualidade digna de nota. O interesse e confiança dos pesquisadores e pesquisadoras em publicar no periódico evidenciam sua qualidade e credibilidade.

Nessa perspectiva, é com enorme alegria e satisfação que apresentamos a XIII Edição da REHR, cujo dossiê é “Movimentos Sociais e Sociedade”. A proposição do dossiê se justifica pela relevância da temática e quantidade de pesquisadores que se dedicam a compreender os caminhos e descaminhos dos movimentos sociais, suas relações com os meandros do social, político, econômico e cultural, bem como as diversas experiências dos sujeitos que compuseram / compõem e deram / dão vida a esses grupos. Também, a importância do dossiê se expressa pelo fortalecimento da linha de pesquisa do PPGH / UFGD, intitulada “Movimentos Sociais e Instituições”.

Nesta edição, expressamos os nossos sentimentos e pesar com o falecimento do professor John Manuel Monteiro que, com seus pensamentos e ideais, se tornou uma referência para os estudos sobre os povos indígenas no Brasil. O professor John Monteiro faleceu no dia 26 de março de 2013, vítima de um acidente de trânsito na Rodovia dos Bandeirantes / SP. Era docente da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), reconhecido nacional e internacionalmente por suas pesquisas na área de história indígena. Em sua homenagem, publicamos a crônica do professor José Bessa, intitulada “John, um Negro da Terra”. A REHR se solidariza e estende os desejos de conforto e afeto à família do saudoso professor John Manuel Monteiro.

Abrindo o dossiê “Movimentos Sociais e Sociedade” está o artigo do professor mexicano Carlos Antonio Aguirre Rojas, intitulado O que são os Movimentos Antissistêmicos? [1] . No trabalho, Rojas nos brinda com um instigante texto no qual se preocupa em apresentar sua concepção daquilo que se convencionou chamar de “movimentos sociais antissistêmicos”. Para tanto, inicialmente, analisa as diversas possibilidades de protesto social e a enorme pluralidade das formas e manifestações sociais, que, inclusive, é um claro sinal da imensa dificuldade para caracterizar e definir com mais precisão as suas variadas facetas. Para Rojas, após a revolução cultural de 1968, houve a emergência dos chamados “movimentos antissistêmicos” que expandiram as ações dos “movimentos anticapitalistas”, alcançando pontos que iam além da luta contra a exploração econômica, o Estado e a cultura capitalistas. Os “movimentos antissistêmicos” trouxeram para a pauta de reivindicações elementos como a herança das sociedades de classe, o patriarcado e o machismo, a exploração irrefreada da natureza, além da divisão entre o trabalho manual e intelectual. Assim sendo, os “movimentos antissistêmicos” passaram não apenas a afrontar o sistema capitalista, mas igualmente estenderam sua luta contra outros dois sistemas que o sustentam, quais sejam: o sistema de organização social dividido em classes sociais antagônicas, e segundo, usando um termo de Marx, contra o sistema do reino da “escassez natural”, ou o predomínio do “reino da necessidade”.

Em Multitudes Ambientalistas en Lucha Contra los Agrotóxicos, os pesquisadores argentinos Cecilia Carrizo e Mauricio Berger recuperam, a partir de entrevistas e análise de documentos, três experiências de luta contra pesticidas nos últimos cinco anos em Córdoba, uma das principais províncias produtoras de soja da Argentina, identificando em cada caso, a pluralidade de saberes e práticas em jogo. Assim, recuperam as noções de Multidões e Justiça Ambiental, para contribuir com a autocompreensão das lutas como políticas e a reflexão sobre o anacronismo de seguir chamando sociais as práticas que, fora do sistema político representativo, resistem ao modelo dos agronegócios.

“Nascemos Assim!”: o movimento LGBT brasileiro e o perigo da estratégia essencialista (1978-2012) é o título do trabalho de Tiago da Silva Ferreira. O autor propõe um debate em torno das estratégias que o movimento LGBT brasileiro vem traçando para combater a discriminação sofrida pela população cuja sexualidade diverge da norma heterossexual. Dessa forma, interessa particularmente o foco que o movimento tem dado, especialmente nos últimos anos, ao que chama de argumento biológico. Ou seja, a estratégia de apregoar a aceitação da diferença sexual pela via da naturalização. Recorre a uma breve reconstituição histórica sobre o discurso acerca da homossexualidade a partir do século XIX, passando pela constituição do moderno movimento gay brasileiro em 1978 até chegar ao contexto atual. O trabalho almeja demonstrar o perigo de despolitização que a aposta na naturalização das sexualidades representa para este importante movimento social contemporâneo.

Fabiano Coelho, em Experiências de Pesquisa: reflexões sobre o MST e a construção de representações sobre os presidentes brasileiros (1984-2006), salienta que o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), desde sua criação, esteve presente e atuante em diversos momentos da história do Brasil, como no final da Ditadura Militar, no processo de “abertura política” do país e na consolidação das eleições diretas para presidente, a partir de 1989. Nesse período, o Movimento se projetou como oposição e resistência aos presidentes, representando-os como conservadores, elitistas e “inimigos” da reforma agrária. Por ora, apresenta reflexões iniciais de pesquisa sobre as representações do MST face aos presidentes brasileiros, entre os anos de 1984 e 2006, sendo eles de José Sarney, Fernando Collor de Mello, Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, e Luiz Inácio Lula da Silva, por meio do Jornal Sem Terra. Destaca também a importância do Jornal Sem Terra como um instrumento político, utilizado pelo MST para elaborar e publicizar representações sobre os presidentes no período delimitado.

O trabalho de Fernando Perli, intitulado O Internacionalismo em Questão: rede de solidariedade em jornais e cadernos do MST (1984-1986), reflete que o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) se definiu mediante estratégias políticas que articularam um movimento social com abrangência nacional. Nos debates que arregimentaram movimentos sociais rurais de várias regiões do Brasil, os meios de comunicação do MST contribuíram para intensificar contatos, experiências e identidades políticas. O artigo analisa, a partir dos jornais e cadernos do MST, a construção de uma rede de solidariedade que colocou em pauta, num período de definições organizativas do Movimento, o internacionalismo da luta pela terra.

Cláudia Delboni, em Os novos Atores Sociais: a formação do acampamento de Sumaré II no Estado de São Paulo (1980), realiza algumas considerações teórico-metodológicas sobre a participação das mulheres na consolidação do acampamento de Sumaré II, que ocorreu na década de 1980, no município de Sumaré / SP. Os anos de 1980 foram marcados pela eclosão de diversos movimentos, que trouxeram para o cenário político novos atores sociais. O artigo é fruto de sua dissertação de mestrado, que na qual se utilizou da História Oral de Vida para analisar categorias de análise que instrumentalizaram na compreensão da temática, tais como cidadania e identidade.

No artigo Caminhos para a Emancipação em Tempos de Globalização: transformação social e economia solidária, Hermes Moreira Jr. discute as possibilidades da Economia Solidária como proposta de renovação das teorias críticas ao status quo conservador, no intuito de encontrar novos caminhos e novas agendas para a emancipação social e as consequentes possibilidades de transformação da realidade.

Marcos Alan S. V. Ferreira, em seu artigo Violação dos Direitos Humanos em Nome da Segurança Estatal: considerações sobre os eventos de abril de 2003 em Cuba, analisa as violações dos direitos humanos promovida pelo governo cubano em 2003. Nesse sentido, atenta o olhar para a onda repressiva promovida pelo governo cubano em março e abril de 2003, que resultou na aplicação da pena de morte a três sequestradores e na prisão de 75 opositores de Fidel Castro. Esses atos cometidos por Cuba tiveram forte repercussão internacional, com protestos expressados por personalidades de destaque, como os escritores ganhadores do Prêmio Nobel de Literatura, Gabriel García Márquez e José Saramago.

O artigo Concepções e Experiências da Educação Popular no Instituto Administrativo Jesus Bom Pastor – IAJES, da autora Mariana Esteves de Oliveira, discute o tema da Educação Popular a partir de algumas experiências vividas por movimentos sociais ligados a uma instituição católica na cidade de Andradina / SP, como representativas das práticas de resistência a partir do ano 1970 até meados dos anos 1990. Seus conceitos, seus teóricos, suas matrizes discursivas se encontram com experiências vivenciadas por homens e mulheres que se puseram em luta a partir das discussões empreendidas no bojo desta Educação Popular propugnada pelo educador Paulo Freire e por teólogos da libertação. Dessa forma, as conquistas e contradições dos grupos conformam, em muito, na própria construção das classes populares na América Latina e contribuem para a reflexão que ilumine os caminhos e descaminhos de uma educação que na atualidade se mostra esquizofrênica e inoperante, incapaz de envolver a juventude e incentivá-la a construir um novo horizonte social, uma nova utopia.

Encerrando o Dossiê, André do Nascimento Corrêa, em Sociedade Agrária: hierarquia entre os criadores de gado vacum de Caçapava (1821-1850), analisa as características socioeconômicas do universo agrário de Caçapava, província do Rio Grande do Sul, na primeira metade do século XIX. As principais fontes empregadas são os inventários post mortem e o período abordado estende-se entre 1821 e 1850. Realizou-se, também, um diálogo bibliográfico com estudos sobre História Agrária. O autor investiga a concentração de terras e animais nas mãos de poucas pessoas. Entretanto, ao lado desse pequeno grupo concentrador de recursos, havia uma miríade de pequenos produtores, muitos também senhores de escravos. Assim, sinaliza para um universo social mais complexo do que aquele geralmente descrito nas obras que tratam do contexto local no período abordado.

Na sessão de artigos livres, Adriana Gomes em A Criminalização do Espiritismo no Código Penal de 1890: as discussões nos periódicos do Rio de Janeiro, discute a importância dos periódicos que circulavam na capital federal na segunda metade do século XIX: o Jornal do Commercio, O Apóstolo e o Reformador – para a inserção da Doutrina Espírita, a sua divulgação, ataque e a defesa diante da criminalização de algumas de suas práticas no Código Penal de 1890. Nos discursos divergentes e com tons diferenciados dos periódicos, cada um dos grupos em discussão, tinha um objetivo muito claro: transformar os seus discursos em mecanismos de compreensão e legitimação de suas ideias. E com discursos “legítimos”, buscavam convencer o leitor que os seus argumentos eram os mais coerentes em contraposição aos argumentos do discurso do outro.

José Augusto Ribas Miranda é autor do artigo “El Ambiente que se Respiraba en Nuestro Campo, Era la Conviccíon Íntima del Triunfo de Nuestras Armas”: fotografias de efetivos Militares como construção imagética da superioridade bélica do Chile na Guerra do Pacífico (1879-1884). No trabalho, analisa a construção imagética da superioridade bélica chilena na Guerra do Pacífico em fotografias de efetivos militares, presentes no Album Grafico Militar de Chile, de 1909. Por meio da análise das fotografias, realizadas por Eduardo Clifford Spencer, discute como tais imagens atuam como agentes de construção de uma ideia de superioridade bélica chilena para os próprios nacionais, em obra posterior ao conflito.

No artigo Hetáira e o Sympósion: relações de gênero em banquetes na Atenas do V e IV século a. C., Juliana Magalhães dos Santos salienta que para compreender as relações sociais tecidas em consonância com a dinâmica de banquetes (symposia), é preciso atentar para algumas particularidades sobre a festividade e seus participantes. Identificada como figura recorrente em banquetes, as hetáirai (cortesãs) são elementos importantes para apontar as trocas específicas ocorridas durante os banquetes. Nessa perspectiva, indica a sua dinâmica neste espaço de frequência e suas relações afins, além de analisar este circunscrito espaço de trânsito e ação. Como parte importante para a apreciação do tema, é apresentado um breve comentário sobre a sua expressão imagética e as concepções e considerações a respeito de estudos de gênero que tentam compor um olhar sobre o feminino na História e em particular sobre as cortesãs na Atenas do século V e IV a.C.

Em O Caso de Claudia de Quinta e Magna Mater sob a perspectiva dos estudos do Feminino e da Religião Romana, Pedro Paulo Rosa, reflete que Magna Mater, deusa de origem antiga da região da Frígia, está presente nas festividades públicas e femininas do mês de abril em Roma. Os romanos domesticaram a versão antiga dessa deusa – Cibele – e a trouxeram para a cidade de Roma, no contexto histórico da II Guerra Púnica (no final do III a.C.). Nesse sentido, Magna Mater vem suprir o papel de grande mãe dos romanos, bem como se destina não apenas aos rituais religiosos femininos, isto é, de matronas romanas, mas também é uma deusa urbana, que abrange os magistrados, os equestres, e grande parte da população romana. É geral e particular. Feminina, quando se destina à Claudia Quinta e a outras ricas matronas, uma ordem social sagrada; e masculina, quando também representa e salvaguarda o jovem futuro homem de Estado.

Memórias e Raízes: os alicerces da Faculdade de Direito do Piauí (1930-1935) é o título do artigo dos autores Eduardo Gefferson Silva Ferreira e Marcelo Leandro Pereira Lopes. No trabalho, recuperam a memória da Faculdade de Direito do Piauí, o contexto histórico-político e social de sua instalação, e investigam também os atores envolvidos no processo de sua implantação, compreendendo porque sua implantação foi tardia. Também reflete sobre a influência da Faculdade de Recife e da Revolução de 1930 na sua formação, e ainda apresenta o projeto curricular da instituição. Através de pesquisa documental, discute o longo caminho para a abertura da primeira faculdade de Direito do Piauí e percebe sua importância na formação de uma nova camada burocrática.

Otávio Erbereli Júnior, em seu artigo Do Populismo “Clássico” ao Neopopulismo: trajetória e crítica de um conceito, tem como foco central a crítica de Angela de Castro Gomes à utilização dos conceitos de populismo e neopopulismo na caracterização de determinados períodos da vida política brasileira, notadamente 1930-1964. Pelo fato desta historiadora ter por inspiração teórica a História dos Conceitos, achou por bem reconstituir o trajeto de crítica à tradicional História das Ideias, bem como expor as principais formulações acerca do populismo com os quais Castro Gomes irá dialogar e rejeitar. Por fim, expõe sua proposta de adoção do termo trabalhismo em substituição ao populismo.

Ao finalizar a XIII edição da REHR, apresentamos a resenha de dois livros: Cuba e a Eterna Guerra Fria: mudanças internas e política externa nos anos 90, do autor Marcos Antonio da Silva, resenhada por Claudio Reis; e Daniel Rincon Caires resenhou a obra O Epaminondas Americano – trajetórias de um advogado português na Província do Maranhão, cujos autores são Yuri Costa e Marcelo Cheche Galves.

Desejamos agradáveis e proveitosas leituras. Aventurem-se no universo das palavras.

Nota

1. O trabalho foi traduzido pelos pesquisadores André Dioney Fonseca (Doutorando em História – USP) e Eduardo de Melo Salgueiro (Doutorando em História – UFGD), a quem a REHR agradece a gentileza e colaboração.

Fabiano Coelho – Editor

Dourados / MS, Inverno de 2013.


COELHO, Fabiano. Apresentação. Revista Eletrônica História em Reflexão. Dourados, v.7, n. 13, jan. / jun., 2013. Acessar publicação original [DR]

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Trabalho e Movimentos Sociais: Velhas, novas, outras questões / Canoa do Tempo / 2011-2012

Como no passado, nosso mundo contemporâneo tem se mostrado prenhe de transformações as mais diversas – econômicas, políticas, sociais, culturais, que trazem, todavia, percepções de uma aceleração do tempo nunca antes vivenciada pela humanidade, em especial por estarem, tais transformações, ancoradas numa arrancada tecnológica igualmente sem precedentes.

Como argumenta Marshall Berman, diante do turbilhão do novo, muitas vezes se afiguram tanto uma sensação de desencanto, com a perda do mundo antigo que se esvai; quanto o receio e a incerteza diante dos processos desconhecidos que vão se avizinhando no horizonte. [1] No cruzamento de tais percepções, é sempre comum ver emergir uma plêiade de profetas a brandir suas sentenças aos quatro cantos do planeta.

Há não mais de duas décadas, em nosso próprio ofício, uma propalada crise de paradigmas das ciências sociais, nos prostraria aos pés de doutrinas e posturas niilistas, a apregoar nossa condição de mero gênero literário, desprovido da capacidade de prova e aferição da verdade, deixando em seu lugar a pluralidade de discursos e jogos de linguagem. [2] Em paralelo, passamos à contagem regressiva para o desaparecimento do livro e do impresso diante das novas mídias. [3] No plano político, com o alardeado fim da história, os ideais de um mundo socialmente mais justo se viram expurgados para os escombros da história junto com as marcas do socialismo real e de seus muros, dando lugar a novas sacralizações do mercado e do capital. [4] Vigoroso esforço teórico foi igualmente estabelecido para decretar a perda de centralidade do trabalho, [5] levando de roldão a classe trabalhadora e seus movimentos, tidos, outrora, como incômodos e inconvenientes, e agora como personagens de um passado a ser esquecido. [6]

As dimensões mais propriamente conservadoras desses processos, bem como seus impactos no cenário historiográfico contemporâneo, têm sido frequentemente percebidos e denunciados. [7] Em que pese à riqueza e o adensamento alcançado no interior de nosso campo disciplinar, não se deve descuidar, tampouco, de abordar os caminhos historiográficos recentes de forma crítica [8 ]e atenta à pluralidade de suas dimensões. [9]

Felizmente, como nos lembra Chartier, “os historiadores têm sido sempre os piores profetas”, [10] e a dinâmica histórica contemporânea tem nos apontado para a necessidade de repensar integralmente aqueles postulados lançados há duas décadas. Assim, o livro e o impresso reafirmaram sua força e vigor, chegando em 2012 a patamares editoriais nunca alcançados; a construção historiográfica tem resistido ao ceticismo das interpretações pós-modernas [11] e, no interior dos mundos do trabalho, os movimentos sociais recobram suas forças e voltam ao cenário das ruas. [12]

Com efeito, a explosão de novos temas, a centralidade adquirida pelo conceito de cultura no interior do trabalho historiográfico e mesmo certa supremacia da História Cultural, não anularam os aportes e o legado da História Social. Antes, permitiram um diálogo novo e enriquecedor,13 em que a retomada de temas tradicionais é flagrada em dimensões novas e inusitadas. [14]

Os artigos que compõem o dossiê temático, assim como as demais contribuições que integram este número da revista Canoa do Tempo, trazem a marca desse complexo e profícuo diálogo, em que a articulação do eixo temático Trabalho e Movimentos Sociais, reafirmando sua vitalidade e pertinência, alcançam dimensões e perspectivas inovadoras.

Em primeiro lugar, longe das tradicionais noções hierarquizantes, que frequentemente, na análise dos movimentos sociais, opunham em escala valorativas descendentes, movimentos revolucionários às rebeliões de escravos ou à simples turbas urbanas, [15] os movimentos sociais aqui analisados são pensados em suas dimensões e potencialidades intrínsecas, que existiram enquanto possibilidades históricas de intervenção e transformação social.

Em segundo lugar, tampouco são os movimentos sociais ou os processos de trabalho que articulam crianças, mulheres, seringueiros, posseiros ou operários, abordados aqui em esquemas interpretativos arcaicos e/ou alheios aos aportes historiográficos contemporâneos. Ao contrário, eles nos dão a ver dimensões culturais, que se veem incrustadas nos processos de experienciação e identificação vivenciada por esses múltiplos sujeitos.

Por fim, outro ponto importante a ser salientado está no fato de que as análises presentes no dossiê – sejam elas acerca dos movimentos de rebeldia e sedições do século XIX, dos mocambos do Baixo Amazonas ou dos portuários riograndinos – passam ao largo de recorrentes perspectivas polarizadoras como as noções de centro/periferia ou mesmo a de história nacional/história regional. Com efeito, a produção historiográfica que elas articulam e exemplificam dão conta de processos singulares que, materializados em diferentes espaços do país, reconfiguram outras histórias do Brasil. [16]

Por tais dimensões, fica aqui o convite para uma leitura que desejamos ser ao mesmo tempo instigante e prazerosa.

Notas

1 BERMAN, Marshall. Tudo que é sólido desmancha no ar: a aventura da modernidade. São Paulo: Cia das Letras, 1999. p. 15-35.

2 MALERBA, Jurandir. Teoria e História da Historiografia. In: MALERBA, Jurandir (Org.). A História Escrita: teoria e história da historiografia. São Paulo: Contexto, 2006. p. 13.

3 CHARTIER, Roger. A aventura do livro: do leitor ao navegador. São Paulo: UNESP, 1998.

4 HOBSBAWM, Eric. A Era dos Extremos: O breve século XX. São Paulo: Cia das Letras, 2002. p. 537-562.

5 ANTUNES, Ricardo. Os Sentidos do Trabalho: Ensaios sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo: Boitempo, 2005, p. 13-14.

6 GORZ, Andre. Adeus ao Proletariado: para além do socialismo. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1982.

7 DOSSE, François. A História em Migalhas: Dos Annales à Nova História. Campinas: Editora da Unicamp, 1992.

8 VAINFAS, Ronaldo. Avanços em Xeque, Retornos Úteis. In: CARDOSO, Ciro Flamarian e VAINFAS, Ronaldo (Orgs.). Novos Domínios da História. Rio de Janeiro: Eselvier, 2012, p. 319-335.

9 Veja-se o comentário de Antoine Prost acerca do caso francês: “É verdade que se alterou a conjuntura do fazer história. O complexo de superioridade dos historiadores franceses, orgulhosos de pertencerem, em maior ou menor grau, à escola dos Annales – cuja excelência, supostamente, é elogiada pelos historiadores do mundo inteiro – começou a tornar-se , não propriamente irritante, mas injustificado”. PROST, Antoine. Doze Lições de História. Belo Horizonte: Autêntica, 2008, p. 9.

10 CHARTIER, Roger. A História ou a Leitura do Tempo. Belo Horizonte: Autêntica, 2009, p. 8.

11 GINZBURG, Carlo. O Fio e os Rastros: Verdadeiro, falso, fictício. São Paulo: Cia das Letras, 2007.

12 SANTOS, Boaventura de Souza. Trabalhar o Mundo: Os caminhos do novo internacionalismo operário. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005.

13 PROST, Antoine. Social e Cultural Indissociavelmente. In: RIOUX, Jean-Pierre e SIRINELLI, Jean-François (Orgs.). Para uma História Cultural. Lisboa: Estampa, p. 123-137.

14 Cf.: BATALHA, Cláudio, SILVA, Fernando Teixeira da e FORTES, Alexandre. Culturas de Classe: Identidade e Diversidade na Formação do Operariado. Campinas-SP: Editora Unicamp, 2004.

15 GARCIA, Marco Aurélio. Reforma ou Revolução/ Reforma e Revolução. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 10, n.º 20, mar.91/ago.91, p. 9-38.

16 Cf: MONTENEGRO, Antonio Torres et al. História, Cultura e Sentimento: Outras histórias do Brasil. Recife: Editora da UFPE; Cuiabá: editora da UFMT, 2008.

Referências

ANTUNES, Ricardo. Os sentidos do trabalho: Ensaios sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo: Boitempo, 2005.

BATALHA, Cláudio; SILVA, Fernando Teixeira da; FORTES, Alexandre. Culturas de classe: identidade e diversidade na formação do operariado. Campinas-SP: Editora Unicamp, 2004.

BERMAN, Marshall. Tudo que é sólido desmancha no ar: a aventura da modernidade. São Paulo: Cia das Letras, 1999.

CHARTIER, Roger. A aventura do livro: do leitor ao navegador. São Paulo: UNESP, 1998.

CHARTIER, Roger. A história ou a leitura do tempo. Belo Horizonte: Autêntica, 2009.

DOSSE, François. A história em migalhas: Dos Annales à Nova História. Campinas: Editora da Unicamp, 1992.

GARCIA, Marco Aurélio. Reforma ou Revolução/ Reforma e Revolução. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 10, n. 20, p. 9-38, mar.91/ago.91.

GINZBURG, Carlo. O fio e os rastros: verdadeiro, falso, fictício. São Paulo: Cia das Letras, 2007.

GORZ, Andre. Adeus ao proletariado: para além do socialismo. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1982.

HOBSBAWM, Eric. A era dos extremos: o breve século XX. São Paulo: Cia das Letras, 2002.

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MONTENEGRO, Antonio Torres et al. História, cultura e sentimento: outras histórias do Brasil. Recife: Editora da UFPE; Cuiabá: Editora da UFMT, 2008.

PROST, Antoine. Doze Lições de História. Belo Horizonte: Autêntica, 2008.

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SANTOS, Boaventura de Souza. Trabalhar o mundo: os caminhos do novo internacionalismo operário. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005.

VAINFAS, Ronaldo. Avanços em Xeque, Retornos Úteis. In: CARDOSO, Ciro Flamarian; VAINFAS, Ronaldo (Org.). Novos domínios da história. Rio de Janeiro: Eselvier, 2012. p. 319-335.

Luís Balkar Sá Peixoto Pinheiro – (Ufam)

Maria Luiza Ugarte Pinheiro – (Ufam)

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Movimentos Sociais / Crítica Histórica / 2010

Quando a história apareceu como área de conhecimento desgarrada da filosofia, nos idos do século XIX, o seu caminho para “cientificidade” passou pela formação de um método e teoria atrelado ao que os historiadores denominaram de “história positivista”. Genuinamente alemã, este modelo de pensar o passado não só exigia o uso de documentos (exclusivamente escritos e preferencialmente oficiais) como prioritários para a realização da análise de um fato, mas também elegia o mundo político como o locus central para se entender a realidade. Neste caso, a história de grandes personagens célebres (Luis XVI, Napoleão Bonaparte, D. Manuel e D. Pedro) e mais precisamente da elite econômica e política fora devassada pelos historiadores que seguiram o modelo rankeano.

No Brasil, tais instruções e / ou orientações foram absorvidas pelo Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) que visando à construção de uma identidade nacional também “olhou para trás” buscando seus personagens mais “ilustres”. Assim, não foi por acaso que com a necessidade de demonstrar raízes mais profundas do sentimento do nativismo brasílico que a figura de Tiradentes tenha sido a eleita para corporificar estas expectativas. Neste caso, apesar de representar um episódio muitas vezes considerado como “libertino” e na época “crime de lesa-majestade”, Joaquim José da Silva Xavier fazia parte de um grupo: a elite das Minas. Para os membros do IHGB, ávidos por demonstrar que a independência não havia sido pensada em 1822 (sob os auspícios de D. Pedro I, um português) e sim em 1789, Tiradentes reunia todos os ingredientes necessários para servir de espelho e identificação para os criadores desse mito.

Mas, por outro lado, a população de uma maneira geral podia (e provavelmente) enxergava tal personagem muito distante de suas características sociais. Ou seja, apesar do esforço incomensurável (?) dos pensadores do IHGB em associar o movimento social como matriz da história nacional, sua identificação não representava ainda o bojo da população. Assim, é quase lícito afirmar que a história política quando se debruçou sobre os movimentos sociais (talvez sendo os primeiros a já fazerem isso, há de se ressaltar!) não conseguiram dar voz, fala e apelos aos personagens comuns, aos homens do cotidiano e aos episódios que tinham como figura justamente estes indivíduos.

Somente como a Escola dos Annales, no início do século XX, e com os trabalhos que tinham como base as teorias marxistas que a história dos movimentos sociais ganharia uma nova roupagem. Evidentemente, a mais importante e principal delas esteja relacionada a entender os conflitos, as revoltas, as revoluções, as devassas, os motins, as insurreições, as bernardas, as conjurações e as greves também levando em consideração o povo (neste caso, pensando também na própria metamorfose que o conceito de povo sofreu na virada das centúrias), o homem comum e o cidadão explorado e vilipendiado por um grupo, por um sistema, por uma pessoa ou por um comportamento social.

Tais críticas foram absorvidas até mesmo pelos historiadores políticos no terceiro quartel do Novecentos, quando “a nova história política” passava a entender que outros atores sociais também deveriam ser levados em consideração para a compreensão dos embates de uma sociedade. Indo além disso, não só a política fora repensada como a “cultura política” passava a fazer partes dos textos para compreensão das ações sociais, interconectada com os elementos econômicos, religiosos, comportamentais, religiosos e culturais. O resultado desta mudança de análise e até mesmo posicionamento teórico, redundou em investigações sobre as revoltas escravistas, as greves dos sindicatos, a interpretação das ONG’s, o papel dos movimentos culturais, os motins anteriores a insurreição mineira de 1789, a resistência indígena e dentre outras temáticas. Logo, o que se percebe é a ampliação e variabilidade temática dos estudos sobre os movimentos sociais nos tempos atuais, debate essencial em grande parte dos cursos de graduação e pós-graduação do país.

Assim, tendo em vista o cenário amplo, irrestrito, rico e diferenciado para esta temática, o presente número da revista Crítica Histórica tem por objetivo, em seu Dossiê, abri espaço para discussão desta temática. Para isso, seu primeiro artigo Os amotinados e seus algozes: A construção de imagens do homem rebelde na América Portuguesa (Séculos XVII-XVIII) escrito por Antonio Filipe Pereira Caetano analisa como os revoltosos na América Portuguesa eram vistos por aqueles que sofriam seus reveses, bem como pela coroa portuguesa, entendida como a reguladora das relações sociais e de poder nos dois lados do Atlântico. No fundo, a intenção também é entender como esses homens agiam e de que maneira usaram tais recursos como barganhas políticas para a construção do espaço ultramarino. Rumando ao século XIX, Anna Marie Buyers em Em Defesa da Honra: a Emancipação de Alagoas no Imaginário Institucional faz uma breve análise historiográfica sobre um dos episódios mais controversos e debatidos na historia alagoana, a Insurreição Pernambucana de 1817 que culminou na separação da comarca das Alagoas da capitania de Pernambuco. Expondo as versões sobre o fato, a autora demonstra a existência dos interesses de cada grupo institucional em fazer com que sua “verdade” prevalecesse sobre o movimento, contribuindo para dificuldades de interpretações, mas das vezes não fundamentadas em um corpus documental.

Chegando ao início do século XX, Filipe Pinto Monteiro nos traz A Santíssima Trindade nos Sertões: Severino Tavares e a Gestação do Movimento Messiânico-Milenarista de Pau de Colher (Casa Nova, Bahia, 1934-1928), onde tenta inserir seu personagem beato no rol dos episódios conectados com aqueles ocorridos com o Padre Cícero Romão Batista (no Ceará) e José Lourenço Gomes da Silva (Caldeirão dos Jesuítas), praticamente ocorridos ao mesmo tempo. Desta feita, a intenção é fazer um estudo comparativo apresentando as aproximações e as divergências entre o ocorrido em Pau de Colher e as outras localidades nordestinas. Ainda discutindo movimento social, Igreja Católica e religiosidade, Celia Nonata da Silva em “Os pobres herdaram a terra”: Conflitos rurais e a Igreja Católica no Brasil na Segunda Metade do Século XX analisa de que maneira as Conferências de Medellín e Puebla alteraram a forma de pensar dos líderes religiosos e camponeses na luta pela terra, construindo discursos que resgatam o papel missionário e de luta da Igreja nos sertões brasileiros que remontam ao século XIX.

Afastando-se da discussão religiosa, mais ainda permanecendo no debate da problemática da terra, Edson Hely Silva discute em Os Índios Xucurus e as Ligas Camponesas (Pesqueira / PE, 1961) de que maneira os ameríndios lutam para a garantia de seus espaços invadidos por proprietários de terras locais. Com uma farta documentação (oral e escrita) o texto demonstra também como havia um discurso forjado pelas autoridades de manipulação dos índios pelos grupos comunistas da época, desprezando o entendimento de que os mesmos já se enquadravam na condição de trabalhadores assalariados e explorados pelos proprietários de terra. Finalizando o dossiê, mas incluído na seção Documentação, Alberto Vivar Flores nos prestigia com a transcrição da entrevista do General Emiliano Salazar Zapata para o Diário Nova Era, em 1911, momento em que revelava os bastidores da Revolução Mexicana (1910). Tal documento torna-se oportuno neste momento, justamente em que o episódio completa seu centenário de aniversário e ainda é considerado por muitos como um dos pilares da discussão sobre a reforma agrária, a valorização dos indígenas e a ampliação dos direitos e liberdades na América Latina.

Nos artigos de fluxo contínuo Loiva Canova avalia em As Representações de Antônio Rolim de Moura Sobre a Paisagem no Interior da América Portuguesa no Século XVIII como este funcionário através de uma viagem que percorreu o Rio de Janeiro, São Paulo e Mato Grosso em meados do Setecentos não só descortinou o cenário maçoeiro como analisa a impressão da fauna, flora e aspectos da morfologia destes espaços ultramarinos. Enquanto isso, Marcos Guedes Vaz Sampaio em Padrão dos Investimentos Britânicos e a Modernização Conservadora na Economia Baiana Oitocentista explora como a infra-estrutura baiana (sobretudo a de transporte) foi ventilada pela inserção de capital norte-americano na segunda metade do século XIX, o que não implicou em alterações nos mecanismos produtivos da agricultura, mas apenas reforçando sua condição agro-exporadora. Saindo do mundo da história econômica e flertando com a história cultural, Diogo Cesar Nunes em História, Linguagem e Literatura: Dilemas e Perspectivas da Historiografia Contemporânea ousadamente nos apresenta como a crítica ao contextualismo e apologia a interpretação contribuíram para redefinições teóricometodológicas na própria histórica que possibilitaram uma sobrevivência e maior aproximação entre a História e a Literatura.

Ainda na discussão sobre teoria, José D’Assunção Barros em seu texto Os Tempos da História: do Tempo Mítico às Representações Historiográficas do Século XIX faz uma análise historiográfica sobre as diversas interpretações sobre o tempo ao longo da História que perpassa desde a antiguidade até fins do século XIX, buscando compreender como essa relação tempo-história se forjou em concepções e representações. Já Gabriel Magalhães Beltrão propõe em A Continuidade da Abordagem Positivista Acerca do Folklore na Obra de Théo Brandão uma análise sobre olhar sobre o conceito de folclore em um dos principais representantes desta área no Estado de Alagoas. Neste caso, a intenção também é entender como o positivismo intervém nas construções epistemológicas no fenômeno folclórico. No debate sobre política pública e educação, Caio Penko em Multiculturalismo e Direitos: do marco legal à política pública interpreta como as alterações previstas na Lei 11.645 / 08 deflagrou uma ação diferenciada na educação brasileira visando tratamentos diferenciados as minorias étnico-raciais, elementos constituintes das novas políticas governamentais de reconhecimento social e minimização das diferenças étnicas.

Encerrando esta seção, Ticiane Oliveira de Sales nos desafia a compreender a relação entre história e patrimônio em Práticas Urbanísticas e Preservação Patrimonial no Brasil onde discute como o debate de preservação do patrimônio tem se desenvolvido na formação social do país, principalmente mediante ao crescimento urbano e os impedimentos que o desenvolvimento das cidades acarreta para a manutenção patrimonial.

Por fim, na seção Resenhas João Vinicius Bobek em Distinção e Divulgação: a civilidade e seus livros nos apresenta uma análise da obra Leitura e Leitores na França do Antigo Regime do Antigo Regime de Roger Chartier como uma alternativa para a compreensão do perfil cultura dos homens do Antigo Regime.

Logo, como se pôde observar este número da Revista Crítica História privilegiou não só uma discussão diversificada dos movimentos sociais (temática de nosso dossiê) como também ampliou possibilidades teóricas, metodológicas e de temáticas em seu conteúdo complementar. Função esta que tem como principal objetivo continuar contribuindo para um debate aberto e plural no meio historiográfico nacional.

Antonio Filipe Pereira Caetano – Conselho Editorial

Maceió, dezembro de 2010


CAETANO, Antonio Filipe Pereira. Editorial. Crítica Histórica, Maceió, v. 1, n. 2, dezembro, 2010. Acessar publicação original [DR]

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Trabalho e Movimentos Sociais / Tempos históricos / 2010

Nossa revista completa doze anos!

Em 1999, quando apresentamos seu primeiro número, tínhamos a expectativa de que ela nos ajudasse a estabelecer e estreitar laços institucionais com outros cursos de História e grupos de pesquisadores de modo a concretizar a graduação na UNIOESTE. Junto a este objetivo, esperávamos também que ela viabilizasse “o anseio de nossos professores e alunos por um canal direto de divulgação de seus trabalhos”, constituindo-se “uma via natural e segura para a afirmação de um Departamento de História e de uma Universidade ainda bastante jovens”. Os problemas enfrentados no início foram muitos, desde a carência de recursos financeiros até a pouca experiência com a edição e os procedimentos de produção de um periódico científico. O fato de termos vencido tais expectativas há certo tempo confirma o êxito deste projeto e uma longevidade que superou uma década.

O nome da revista explicitava uma proposta que se manteve. Como consta na apresentação do primeiro número de 1999, Tempos Históricos “enfatiza a dimensão diacrônica desta disciplina, remetendo às noções de mudança, de renovação e, num certo sentido, até mesmo de avanço de nosso meio universitário”. Sinalizava também “para a ideia de pluralismo teórico e temático, que está incluída na sua própria concepção”.

Mas em tempos de Qualis Capes nos vimos obrigados a semestralizar a revista e a estimular obrigatoriamente um perfil diversificado na composição dos autores dos artigos. Contudo, observar os critérios da Capes e manter a qualidade da publicação mostraram-se tarefas inglórias porque tais critérios muitas vezes não foram observados pelos representantes deste órgão. Por duas vezes registramos discordância com a avaliação feita no Qualis Capes sem, contudo, obter nenhum tipo de resposta. E isto tem acontecido a despeito de a revista mostrar-se diretamente responsável pela estruturação do Mestrado, de Laboratórios de Pesquisa e do curso de graduação que lhe pôs ao mundo.

O retrato ampliado de sua trajetória pode ser avaliado a partir de uma periodicidade ininterrupta e da publicação de 16 dossiês, 23 resenhas, 10 traduções, 5 conferências, 1 entrevista, 14 relatos de pesquisa e 115 artigos! Disponibilizada no formato online, Tempos Históricos conta com financiamento da Fundação Araucária desde 2001, e temos registrado mais de 3 centenas de acessos.

Certamente que este percurso foi coletivo. Devemos agradecer aos autores que nela publicaram, aos membros do Conselho Editorial e da Comissão Editorial, à UNIOESTE por ter garantido condições institucionais e recursos, e à fundação Araucária pelo suporte financeiro. Além disso, desde Marcos Antônio Lopes e Paulo José Koling, seus primeiros organizadores, agradecemos também a todos os que assumiram tal tarefa, Dilma Paula de Andrade, Davi Felix Schereiner, Méri Frotscher, Antônio Bosi, Rinaldo Varussa e Yonissa Wadi Marmitt.

Finalmente, um breve comentário sobre o dossiê que constitui este número. Nos últimos trinta anos, as abordagens sobre as questões do Trabalho e dos Movimentos Sociais no Brasil têm sido enriquecidas por inúmeras pesquisas de campo. Visões da Sociologia, Antropologia, Geografia e da História vêm sendo examinadas e reformuladas à luz do esforço de centenas de pesquisadores que intensificam o deslocamento do eixo temático “trabalho” para as experiências vividas pelos trabalhadores. O que se tem pretendido é apreender o trabalho menos como “técnica” e mais como produção de sentidos e significados pelos trabalhadores mergulhados em processos históricos percebidos em termos de pressões que conduzem a lutas, acomodações e novos enfrentamentos. Parte da complexidade dos desdobramentos históricos pesquisados que forma esta difícil trilha pode ser conferida nos artigos que compõem o dossiê “Trabalho e Movimentos Sociais”.

A todos uma boa leitura!

Antônio Bosi – Professor nos cursos de Graduação e Mestrado em História da Universidade Estadual do Oeste do Paraná.

Rinaldo Varussa – Professor nos cursos de Graduação e Mestrado em História da Universidade Estadual do Oeste do Paraná


BOSI, Antônio; VARUSSA, Rinaldo. Introdução. Tempos Históricos, Paraná, v.14, n.1, 2010. Acessar publicação original [DR]

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Idéias e Movimentos Sociais na América Latina / História Unisinos / 2007

Com o dossiê Idéias e Movimentos Sociais na América Latina, a Revista História Unisinos completa o ciclo de edições comemorativas aos vinte anos de atividade do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade do Vale do Rio dos Sinos. Os artigos publicados apresentam contribuições de pesquisadores que vêm desenvolvendo investigações nos campos da história das idéias, da história social, da história política e da história cultural.

Os enfoques dos textos selecionados guardam relação com as temáticas desenvolvidas na linha de pesquisa Idéias e Movimentos Sociais na América Latina, acompanhando as tendências teórico-metodológicas e as problemáticas privilegiadas pelos docentes do Programa.

Os primeiros artigos relacionam-se com um dos objetos de estudo que têm concentrado a atenção de nossos pesquisadores, ou seja, os intelectuais. Nesse sentido, os textos de Palti e Cezar focalizam os intelectuais como sujeitos historiográficos, destacando a contribuição dos mesmos à produção do conhecimento histórico latino-americano e brasileiro. Perissinotto concentra sua análise na relação entre história e sociologia, focalizando as contribuições de autores como Pierre Bourdieu e Michel Foucault. A contribuição desse último para a construção historiográfica contemporânea é o tema do artigo de Castelo Branco. A memória e o imaginário, também presentes nas investigações desenvolvidas no Programa, são analisados por Possamai através das imagens de um álbum de fotografias.

Relacionado com a problemática da inserção da população negra na sociedade latino-americana, igualmente inserida na linha de pesquisa aqui focalizada, Vitorino oferece uma reflexão sobre as razões do predomínio da mão de obra escrava em detrimento da livre durante o Império brasileiro.

Na seção Artigos, Truzzi contribui com um interessante texto acerca da contribuição dos árabes à cultura e à sociedade da América do Sul.

Resenha e Notas de Pesquisa completam o fascículo, sendo que, nestas, os docentes da linha de pesquisa Idéias e Movimentos Sociais na América Latina do Programa de Pós-graduação em História / Unisinos apresentam relatos e / ou resultados parciais das pesquisas que realizam, dando a conhecer, assim, problemas que vêm sendo investigados, atualmente, no Programa.

Comissão editorial


Comissão editorial. Apresentação. História Unisinos, São Leopoldo, v.11, n.3., setembro / dezembro, 2007. Acessar publicação original [DR]

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Culturas Políticas e Movimentos Sociais / Revista Eletrônica de História do Brasil / 2005

Dando continuidade a nossa série temática, trazemos neste volume trabalhos que dão ênfase ao tema: Culturas Políticas e Movimentos Sociais. Trata-se de artigos que, com enfoques, períodos e métodos variados, abordam aspectos da cultura política no Brasil e as formas de ação social em nossa história. Essa temática sempre esteve presente em nossos números anteriores e agora abrimos maior espaço para a publicação de artigos que debatem a política e os movimentos sociais em uma dimensão mais ampla.

Neste sentido, pretende-se abordar os movimentos sociais como formas variadas de ação política, isto é, como ação contínua capaz de redefinir práticas sociais, políticas e econômicas, pois entendemos que esse é um campo de atuação e redefinição cultural. Assim como já nos assinalou Raymond Williams sobre a cultura ser um sistema significante pelo qual uma ordem social é transmitida, experimentada e transformada (Cultura, Paz e Terra, 2000), queremos entender culturas políticas como um campo de experiências historicamente construídas e continuamente redefinidas.

Assim, as questões relativas à construção da representação popular sobre a monarquia durante a abolição da escravidão; às formas de resistência e negociação política de trabalhadores camponeses no período pós-abolição; aos conflitos de interesse em torno dos poderes locais; à construção da cidadania; à música popular brasileira frente à censura militar e a transição política ao Estado democrático, apresentadas neste número trazem a perspectiva da redefinição ou re-significação das práticas e saberes políticos e sociais de nossa história recente.

Além dessas análises dos embates sociais, trazemos outras duas formas de abordagem cultural: a narrativa sobre a conversão dos índios através da apropriação dos festejos nativos e a identificação da medicina tropical com as práticas culturais típicas dos climas quentes. Através de uma maior aproximação com conceitos da antropologia, estas duas abordagens apresentam aspectos ideológicos importantes de construção identitária para a compreensão dos aspectos constitutivos de nossa cultura política.

Finalmente, mantivemos neste número nossa proposta de publicar textos de jovens pesquisadores de diversas e importantes instituições de pesquisa no país

Carla Maria Carvalho de Almeida

Cláudia Maria das Graças Chaves

ALMEIDA, Carla Maria Carvalho de; CHAVES, Cláudia Maria das Graças. Apresentação. Revista Eletrônica de História do Brasil. Juiz de Fora, v.7, n.1, jan./jun., 2005. Acessar publicação original [DR]

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