Political Thought in Portugal and Its Empire/ c. 1500-1800 | Pedro Cardim e Nuno Gonçalo Monteiro

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Pedro Cardim e Nuno Gonçalo Monteiro | Imagens: Goodreads Goodreads

1A publicação deste livro é, sem dúvida, um acontecimento editorial que merece ser assinalado. Trata-se de uma seleção criteriosa de textos fundadores do pensamento político em Portugal na era moderna (c. 1500-1800), precedida de uma cuidada e esclarecedora introdução de enquadramento interpretativo que também serve para justificar a razão e a oportunidade da sua tradução e publicação em língua inglesa. A introdução e organização editorial do livro são de autoria de Pedro Cardim e Nuno Gonçalo Monteiro que, deste modo, acrescentam às suas importantes contribuições de análise histórica do período em apreço um relevante serviço de divulgação de fontes primárias que apenas têm estado acessíveis, na sua quase generalidade, a leitores de língua portuguesa. A tradução e edição crítica de tais textos fundadores possibilita, a um público internacional alargado, o conhecimento de alguns dos principais protagonistas do debate político em Portugal nos séculos XVI a XVIII, da sua articulação ou diálogo (implícito ou explícito) com autores de referência no quadro europeu e da especificidade dos problemas de ordem institucional, social e política que emergem no contexto da monarquia portuguesa e do seu espaço imperial.
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Political Thought in the French Wars of Religion | Sophie Nicholls

Sophie Nicholls Imagem University of
Sophie Nicholls | Imagem: University of Oxford

The book series ‘Ideas in Context’, published by Cambridge University Press since 1984, has played a major role in establishing the history of political thought as a prominent field of research and debate. Although the series’ roots lie in the so-called Cambridge school of intellectual history associated with J.G.A. Pocock, Quentin Skinner, and others, its volumes have always set out to break down any ‘artificial distinctions between the history of philosophy, of the various sciences, of society and politics, and of literature’.(1)  It is perhaps surprising that until now no volumes in the series have focused on the political thought of the French Wars of Religion (c.1562-c.1598), a period known not only for confessional violence, dynastic crisis, and social rupture, but also for major controversies over questions of authority and resistance, liberty and rights, and other issues that are crucial to the study of early modern political thought.(2)  Nevertheless, path-breaking studies of the political thought of Jean Bodin, François Hotman, and key figures in sixteenth-century French intellectual history published with Cambridge University Press by Julian Franklin, Ralph Giesey, and J.H. Salmon all preceded the series and perhaps helped to establish its terms.(3)

Political Thought in the french Wars of religionThirty-seven years after the ‘Ideas in Context’ series was founded, these important new books by Emma Claussen and Sophie Nicholls both advance the series in new directions and bring it back to its roots in the intellectual history of sixteenth-century France. Their complementary approaches engage closely with established interpretations in the field, but also overcome them by offering new readings of key texts and alternative ways to interpret them, breaking down disciplinary distinctions between the history of literature, philosophy, and politics. Claussen’s eloquent and innovative book explores the uses and ambiguities of the term politique throughout the Wars of Religion, and gives a new history of this keyword that traces its movement from a disciplinary descriptor of political science in the 1560s and 1570s to a polemical weapon of partisan abuse. Leia Mais

O pensamento ético-político de Maria de Lourdes Pintasilgo: diálogos com Martin Heidegger e Hans Jonas – CARRILHO (RFA)

CARRILHO, M. R. O pensamento ético-político de Maria de Lourdes Pintasilgo: diálogos com Martin Heidegger e Hans Jonas. Lisboa: Fundação Cuidar o Futuro, 2019. Resenha de: PROVINCIATTO, Luís Gabriel. Revista de Filosofia Aurora, Curitiba, v.32, n.55, p.322-328, jan./abr, 2020.

O pensamento ético-político de Maria de Lourdes Pintasilgo: diálogos com Martin Heidegger e Hans Jonas resulta de um doutoramento em Filosofia na Universidade de Évora, Portugal, sob a orientação das professoras Fernanda Henriques e Irene Borges-Duarte. A obra que agora se tem, porém, não é a tese doutoral tal e qual, como destaca a própria autora, Marília Rosado Carrilho. O que agora se apresenta sob a forma de livro é, por assim dizer, uma dupla introdução: uma em sentido horizontal e outra em sentido vertical.

Esse duplo movimento introdutório é o que título e subtítulo expressam: o primeiro mostra a introdução em sentido horizontal e o segundo em sentido vertical. Em sentido horizontal porque se trata de apresentar o pensamento ético-político de Maria de Lourdes Pintasilgo, uma mulher que se destacou, sobretudo, por sua intensa atividade político-social em Portugal, na União Europeia e na Organização das Nações Unidas (ONU). Nesse sentido, trata-se de colocar o(a) leitor(a) a par não somente da contribuição de Maria de Lourdes Pintasilgo para a política, mas de mostrar como a política é desenvolvida e aprimorada em seus textos, que, na maioria das vezes, são conferências, palestras, discursos e/ou entrevistas. Além disso, trata-se de mostrar como ética e política estão conjugadas de tal forma que, em Pintasilgo, não se pode pensar uma sem a outra. Pode-se dizer, portanto, de uma introdução como apresentação do pensamento ético-político de Maria de Lourdes Pintasilgo.

A obra é também uma introdução em sentido vertical, pois não se limita somente à apresentação. Trata-se de conduzir o(a) leitor(a) ao interior do próprio pensamento de Pintasilgo, colocando em discussão a sua gênese, formação, desenvolvimento e apontando, ao final, para o legado por ele deixado. Isso torna a obra de Carrilho única: à medida em que coloca o pensamento ético-político de Maria de Lourdes Pintasilgo em um panorama, extrai dele aquilo que lhe é mais fundamental. Disso decorre o encontro com os dois pilares de seu pensamento: Martin Heidegger e Hans Jonas. Diz-se, assim, de uma introdução como um adentrar ao núcleo formativo e estruturante do pensamento ético-político de Pintasilgo.

O texto é aberto por dois prefácios: um assinado por André Barata, que destaca a importância da transição do “poder sobre” ao “poder para”, e outro assinado por Maria Antónia Coutinho, que destaca a força da linguagem humana presente em Maria de Lourdes Pintasilgo e dá ênfase à necessária mudança de paradigma político, a saber, de uma ética da justiça a uma ética do cuidado, centrada, sobretudo, na qualidade de vida. À sequência, seguem-se os cinco capítulos trazidos por Carrilho, antecedidos por uma Introdução, cuja função não é somente apresentar a estrutura da obra, mas também trazer alguns dados biográficos de Maria de Lourdes Pintasilgo. Além disso, a Introdução faz e traz um organograma conceitual do percurso de Pintasilgo: ele é fundamental para o posterior andamento da obra, pois o desenvolvimento dos capítulos está finamente associado a tal percurso aí apresentado.

O primeiro capítulo — A indissociabilidade entre ética e política como linha de força do pensamento e ação de Maria de Lourdes Pintasilgo — faz uma abordagem geral do pensamento de Maria de Lourdes Pintasilgo, mostrando como nele não se pode dissociar ética e política, pensamento e ação, palavra e ato. Desde o início também se percebe a importância de Martin Heidegger e Hans Jonas: do primeiro se toma a noção de “cuidado” como fundamento ontológico do ser humano e do segundo o princípio de responsabilidade como determinante para o convívio em comunidade e para a edificação de uma ética holística, preocupada com o futuro e com a qualidade de vida. Aqui também já se entende a proposta de uma “nova política”, à qual está ligada um conjunto de características fundamentais: consciência cívica, poder, “agir a palavra” e “nova cultura política”. Essas características são trabalhadas ao longo do capítulo. Importa perceber como elas estão interligadas.

A sociedade é formada por todos e todos são responsáveis por ela: esse é o ponto de partida de Maria de Lourdes Pintasilgo. Só há responsabilidade onde há liberdade e só há ética onde ambas estão presentes. Assim, a consciência ética implica na capacidade de escolher, tendo em vista o bem comum, e de se tornar responsável por essa escolha. O que Pintasilgo entende por consciência cívica é a possibilidade do cidadão, por um lado, intervir livre e responsavelmente na sociedade e, por outro, ter consciência da importância dessa intervenção. A consciência cívica exige uma “massa crítica” que deverá ser “reflexiva, denunciadora e interventiva” (CARRILHO, 2019, p.36). A consciência cívica como consciência ética implica numa “nova política” onde o poder é exercido “para” e não mais “sobre”. Essa é a singular mudança trazida pela “nova política”: o exercício da autoridade no poder político, assim, é legitimado pela responsabilidade. Poder, liberdade e responsabilidade são termos correlatos, portanto. A ética, então, está aí pensada a partir de uma necessária vinculação entre teoria e prática, à qual Pintasilgo denomina de “agir a palavra”: “o pensar nada muda sem o agir, mas o agir sem rumo poderá levar à errância” (CARRILHO, 2019, p.43). Atenção seja dada ao alerta aí realizado: a ética deve evitar ao máximo o agir sem rumo, cabendo-lhe, portanto, o papel regulador da ação. Esta regulação, porém, não deve ser vista como um empecilho do progresso, mas como uma aliada, pois ela provém de um projeto educador que está à base do projeto da “nova cultura política”. Maria de Lourdes Pintasilgo busca em Paulo Freire as bases desse projeto educacional capaz de pensar a autonomia do cidadão, sua consciência cívica e sua vida política e social. Desse modo, à indissociabilidade entre ética e política se junta um projeto educador, percebido nas entrelinhas desse primeiro capítulo, e pouco explorado por Carrilho.

O segundo capítulo — A emergência de um novo paradigma como condição para uma governação ético-política — trata, basicamente, da mudança do “paradigma do progresso” para o “paradigma da qualidade de vida”. Essa proposta se inicia com a apresentação daquilo que Maria de Lourdes Pintasilgo chama de “tempo da vergonha”: há progresso, conquista da ciência, aumento da economia mundial e, mesmo assim, ainda há tantas perturbações aos sistemas de suporte da vida. O “tempo da vergonha” é um diagnóstico do final do século XX e início do XXI e, além disso, deve fazer cair o mito do desenvolvimento como um progresso ascendente e que é, na maioria das vezes, um progresso econômico. Propondo a mudança, Maria de Lourdes Pintasilgo afirma a importância do outro para que haja relação ética e, nesse sentido, torna evidente a importância do cuidado: consigo, com as coisas e com os outros. Essa ideia de cuidado é tirada da filosofia de Heidegger, que, além disso, também contribui decisivamente para a caracterização do ser humano como ser relacional, um ser-com-os-outros-no-mundo. Para além de Heidegger, no entanto, Pintasilgo faz convergir o cuidado à dimensão ético-política.

A mudança paradigmática se inicia quando se rompe com o conformismo e com o consenso. Eles são os dois inimigos da mudança: o primeiro por resignar-se com o que está dado e o outro por gerar conforto em vários aspectos, impedindo a mudança, negando-a, na verdade. Para tanto, Carrilho traz aquilo que Pintasilgo denominou como “teoria das brechas”: entrar pelos espaços que são oferecidos e intervir substancialmente no sistema, causando a mudança. A mudança paradigmática, por mais difícil que pareça, nunca deixa de ser realizável para Maria de Lourdes Pintasilgo, que, com isso, resgata politicamente a ideia de utopia, não como algo irrealizável, mas como plenamente realizável desde que seja pensada como horizonte. Trata-se, pois, de olhar para o futuro ao qual a política caminha a partir das decisões adequadas tomadas no presente. Assim, a “qualidade de vida” aparece como uma “utopia política” realizável integralmente: “qualidade de vida é proporcionar patamares mínimos de existência digna, considerados como direitos, uma vez que possibilitam a autossuficiência e independência do indivíduo” (CARRILHO, 2019, p.73). Note-se: o novo paradigma político deve ter como objetivo a autossuficiência e a independência do indivíduo. Para tanto, Pintasilgo propõe um novo contrato social, pautado não mais na subordinação, mas numa comunidade livre e que traz as seguintes características: a instauração de mecanismos de regulação, isto é, uma ética regulatória; uma cidadania com intervenção de homens e mulheres, donde a necessária consciência cívica; e uma soberania alargada e responsável, na qual poder, liberdade e responsabilidade são, de fato, correlatas.

O terceiro capítulo — Cuidar o futuro: fundamento da ética global e imperativo humano — fala sobre a proposta de uma “ética global” a partir daquilo que Pintasilgo chamou de “cuidar o futuro”. O lema traz como seus dois principais objetivos “humanizar a política e possibilitar uma existência digna” (CARRILHO, 2019, p.79). Essa “ética global” proposta por Pintasilgo, ao ser “holística, consequencialista, da responsabilidade e do cuidado” (CARRILHO, 2019, p.81), faz convergir o pensamento de Heidegger e Jonas ao seu projeto ético-político. Além disso, ela ainda propõe alterações fundamentais às éticas tradicionais: o sujeito ético deixa de ser o indivíduo e passa a ser o coletivo, o objeto ético deixa de ser estritamente o humano e passa a abarcar a natureza, a ação moral deixa de estar pautada na intenção e passa a remeter às (possíveis) consequências da ação, a dimensão temporal da ética deixa de avaliar a ação no imediato de sua realização para “se entender que importam as repercussões a médio e longo prazo” (CARRILHO, 2019, p.83). Assim, uma “ética global” está posta porque os problemas se tornaram globais tanto pela extensão quanto pela duração que a ação humana passou a ter. Essa “nova ética” deve, primeiramente, questionar a ação a ser realizada. O papel regulador da ética provém do caráter questionador da filosofia, atestando a importância desta para a “nova política”. Desse modo, a “ética global” de Pintasilgo questiona e regula: “nem tudo o que é cientificamente exato ou tecnologicamente viável é socialmente aceitável; é a pessoa humana [pensada na integridade com a natureza] a primeira e a última finalidade de toda decisão política” (CARRILHO, 2019, p.87). Carrilho, ao final desse capítulo, traz um importante esclarecimento: a ética global proposta por Pintasilgo não é uniforme, tampouco pautada num denominador comum. Ela é a descoberta de um núcleo dos valores éticos compartilhados pelos grandes sistemas do pensamento.

O quarto capítulo — Cuidado e responsabilidade como pilares do agir ético-político — se propõe a mostrar a direta influência de Heidegger e Jonas no pensamento ético-político de Maria de Lourdes Pintasilgo. Carrilho inicia mostrando como os termos “cuidado” e “responsabilidade”, principais contributos dos filósofos mencionados, passam a fazer parte do vocabulário de Pintasilgo. Interessante destacar que Carrilho, nesse momento, dedica-se a apresentar o “cuidado” heideggeriano e a “responsabilidade” jonasiana em suas devidas conjunturas. Desse modo, a primeira divisão do capítulo — O cuidado como fundamento ontológico do ser humano — traz uma abordagem geral do cuidado no contexto de Ser e tempo, apresentando-o como caracterização ontológica do ser humano, concretizando-se como ocupação e solicitude. Mesmo levando a noção de cuidado para além da caracterização ontológica apresentada por Heidegger, Pintasilgo concorda estritamente com ele em um aspecto decisivo, como mostra Carrilho: “o cuidado é intenção originária, abertura a si e aos outros” (CARRILHO, 2019, p.94). Carrilho procede da mesma maneira com Jonas na segunda parte do capítulo — A responsabilidade como exigência da condição humana de ser-com. Aí a autora dá destaque ao “imperativo categórico da responsabilidade”, próprio de Jonas e apropriado por Pintasilgo. Além disso, apresenta também a responsabilidade a partir de uma tripla caracterização: enquanto sentimento, enquanto dever-ser e enquanto condição da ação causal. Carrilho perpassa, de fato, o núcleo edificante do princípio da responsabilidade de Hans Jonas, mostrando, ao final, como Pintasilgo o faz convergir à “nova ética global”, logo, à “nova política”.

O capítulo final — O legado de Maria de Lourdes Pintasilgo — não é, como a própria autora afirma, uma conclusão. Trata-se de uma retomada do caminho percorrido, fazendo uma síntese das teses apresentadas e apontando o legado deixado por Maria de Lourdes Pintasilgo. Nesse sentido, trata-se de retomar, primeiramente, os pontos apropriados por Pintasilgo de Heidegger e Jonas para, à sequência, mostrar como a temática do “tempo futuro” deve sua fundamentação também a eles. Para Pintasilgo, o futuro é o horizonte da ação ética, ou seja, a vida está sempre em construção, logo, nunca há uma sociedade plenamente realizada. Daí a importância dos governos pensarem a curto, médio e longo prazo: “à fluidez do tempo, é preciso responder com o exercício da decisão responsável. […] Com os ‘pés’ no presente e os ‘olhos’ no futuro, assim deve ser o ser humano responsável” (CARRILHO, 2019, p.115). Em suma: trata-se de agir a partir do local em que se vive e pensar desde uma perspectiva global. Aos governos competem realizar uma ação que pense a longo prazo e implementar um projeto com metas, prazos, métodos e regras para a execução. Não se trata de fazer apenas vigorar leis, mas de torná-las factíveis, avaliáveis e fundadas na verdade e na vontade de saber, “efetivada através do diálogo com o povo, com os diversos saberes e do diálogo interno no seio do sistema governativo” (CARRILHO, 2019, p.119).

Por fim, por cumprir muito bem o papel de ser uma dupla introdução, o texto de Marília Rosado Carrilho não é somente um comentário, mas, na verdade, um condutor até ao pensamento de Maria de Lourdes Pintasilgo. Seguir o percurso dessa obra, à qual se recomenda a leitura, é, de fato, perceber-se introduzido ao e no pensamento de Pintasilgo e, ao mesmo tempo, sentir-se impulsionado para além dos comentários aqui postos pela autora, permitindo-se encontrar, confrontar e discutir com os textos da própria Maria de Lourdes Pintasilgo.

Luís Gabriel Provinciatto – Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, MG, Brasil / Universidade de Évora, Évora, Portugal. Mestre em Ciências da Religião. E-mail: [email protected]

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Monarquia sem despotismo e liberdade sem anarquia: o pensamento político do Marquês de Caravelas (1821-1836) | C. E. C. Lynch

Seria possível conciliar um Estado forte e centralizado ao ideário liberal moderno na prática política oitocentista brasileira? A leitura de Monarquia sem despotismo e liberdade sem anarquia: o pensamento do Marquês de Caravelas nos revela que sim. Defensor tanto da soberania do rei quanto do constitucionalismo moderno, José Joaquim Carneiro de Campos – o marquês de Caravelas – foi personagem fundamental, de acordo com Christian Lynch, no processo de recepção e aclimatação do discurso liberal durante o estabelecimento do Estado de direitos no Brasil.

Prevalecente na Constituição de 1824, o projeto monárquico e estatizante dos coimbrãos contou com a participação ativa de José Joaquim Carneiro de Campos. Segundo Lynch, Caravelas foi responsável por aperfeiçoar o projeto constitucional dos Andradas, caracterizado pelo bicameralismo, por uma rigorosa centralização política-administrativa e pelo veto quase absoluto do Imperador. Sua principal contribuição foi a criação do Poder Moderador e a institucionalização de alguma descentralização político-administrativa a partir da criação dos conselhos gerais de províncias. Para ele, esse arranjo seria o ideal pois garantia “uma monarquia sem despotismo e uma liberdade sem anarquia”, expressão definidora do seu pensamento político (p. 53).

Lynch relacionou a teoria das formas de governo de Caravelas com a tradição clássica aristotélica. Segundo esta, as formas de governos existentes – monarquia, aristocracia e a democracia – eram instáveis e oscilavam constantemente entre bons e maus governos, a monarquia corrompida se degeneraria em tirania, a aristocracia em oligarquia e a democracia em demagogia. No entanto, havia uma maneira de evitar a corrupção e estabilizar esses governos: uma composição mista entre monarquia, aristocracia e democracia. Assim como Aristóteles, Carneiro Campos considerava que a melhor maneira de tornar as instituições políticas brasileiras duráveis seria por meio de um governo misto. Em sua opinião, a forma moderna que permitia o equilíbrio entre os elementos governamentais seria a monarquia constitucional representativa temperada ou limitada. Se o fundamento conceitual de Caravelas estava em Aristóteles, sua sociologia política se apoiava em Montesquieu. Isso porque sua principal preocupação, como mostrou o autor, era conciliar o governo constitucional representativo – necessidade dos tempos modernos – com a preservação da ordem e das hierarquias coloniais por meio da criação de uma legislação que respeitasse as tradições e os costumes do povo brasileiro.

O estudo sobre o pensamento político de homens como Caravelas faz parte de um longo debate historiográfico a respeito do lugar do liberalismo no processo de formação do Brasil independente. Debate longo, mas necessário, foi iniciado por obras clássicas – como a de Roberto Schwarz – que defenderam que as ideias estavam fora do lugar. De lá para cá, muito se avançou no tema. Surgiram diversos trabalhos que discutiram, de perspectivas diferentes, a formação do Brasil independente mostrando que as ideias estavam sim no lugar, a exemplo de Maria Sylvia de Carvalho, Alfredo Bosi, Lúcia Maria B. Pereira das Neves, Maria Emilia Prado, Antonio Carlos Peixoto, entre outros.

A análise instigante empreendida por Lynch nos evidenciou que, embora antigo, este debate está longe de ser esgotado. Interessado na história constitucional brasileira – graças à graduação e ao mestrado na área do Direito – bem como no seu desenvolvimento pela perspectiva daquilo que o historiador alemão Reinhart Koselleck chamou de Sattelzeit, Lynch redimensionou o lugar do conservadorismo no Brasil oitocentista por meio do resgate desse importante personagem político da independência brasileira do limbo em que se encontrava.

Nesse sentido, suas reflexões sobre a composição de um campo conservador no Brasil e sobre as construções historiográficas a esse respeito garantem uma análise provocante do processo de formação das instituições políticas brasileiras. Segundo Lynch, o marquês de Caravelas, ao sustentar um projeto liberal que conciliava a implantação de um governo constitucional representativo com a garantia de um Estado monárquico forte, seria o primeiro de uma linhagem de juristas constitucionais, na qual se entronca o visconde de Uruguai, a defender a construção e o fortalecimento do Estado como instância incubadora adequada da Nação.

Embora a obra escrita por Lynch tenha José Carneiro de Campos como objeto de pesquisa, nunca foi preocupação do autor a descrição e o acompanhamento de seus feitos como fazem diversos trabalhos biográficos. Na realidade, todo seu empenho se concentrou na reconstituição do pensamento teórico e sociológico do marquês de Caravelas e sua aplicação prática ao longo dos seus trabalhos enquanto deputado e relator do projeto constitucional de 1824. Tendo em vista esse objetivo, Lynch estruturou seu livro em duas partes: a primeira destinada a um estudo do pensamento político-constitucional do marquês de Caravelas – dividida ainda em cinco capítulos – e uma segunda reservada para a compilação de seus discursos parlamentares mais importantes, fontes que serviram de base para sua pesquisa.

Os discursos parlamentares do marquês de Caravelas foram analisados com base em duas frentes metodológicas: o contextualismo linguístico de John Pocock e a história dos conceitos de Koselleck. Na primeira frente, estes discursos foram entendidos como “atos de fala” elaborados durante a disputa política visando um espaço de atuação e de poder. Na segunda frente, o autor carioca identificou os conceitos presentes nesses discursos examinando os novos significados assumidos por eles de acordo com as circunstâncias, as necessidades e as contingências do Brasil recém-independente.

É em seu primeiro capítulo – “Os desafios da política constitucional oitocentista na Europa e na América ibérica” – que Lynch conseguiu brilhantemente conciliar essas duas frentes metodológicas, procedendo a uma bela análise relacional de texto e contexto. Infelizmente, nos outros capítulos, principalmente os três últimos, nos quais há uma reflexão sobre os elementos constitutivos do pensamento de Caravelas, a análise se concentrou apenas no texto e nos conceitos presentes nele. Apesar disso, suas reflexões sobre o enquadramento ideológico de Carneiro de Campos presentes no primeiro capítulo e as razões historiográficas responsáveis por seu esquecimento, apresentadas no segundo, são de grande relevância para os pesquisadores na área da história política brasileira.

Se a maioria dos trabalhos historiográficos explicam o processo de construção do nosso Estado a partir do liberalismo moderno, Lynch o faz baseado no conservadorismo. Ele defendeu a conservação como elo indispensável tanto para compreensão do pensamento de Caravelas quanto para o entendimento do desenvolvimento das instituições políticas brasileiras das quais ele fez parte. Ao fazer isso, o autor acabou redimensionando o sentido e o papel desempenhado pelo conservadorismo na América Ibérica.

Até hoje relacionamos o conservadorismo a posicionamentos tradicionais e, portanto, contrários a mudanças. De acordo com Lynch, isso acontece devido a conotação negativa que este conceito possuí no Brasil graças ao legado da tradição marxista de intelectuais do século XX, a exemplo de Caio Prado Jr. e Nelson Werneck Sodré, que relacionaram o conservadorismo a uma visão hierárquica de mundo, defensora de privilégios, contrária à democratização e ao reconhecimento das minorias. Inclusive, o autor associou também o esquecimento historiográfico de Carneiro de Campos, bem como sua associação apressada ao absolutismo, a essa visão negativa dos conservadores.

Depois de realizar uma síntese das principais correntes conservadoras – passando por Hume, Burke e Guizot – Lynch afirmou que elas eram equivalentes no Brasil às reflexões dos conselheiros de Estado de D. Pedro I que, baseados no modelo monarquiano do barão Malouet e de Jean Joseph Mounier, defenderam um projeto de governo constitucional e representativo no qual o rei, não a Assembleia, seria o representante da soberania nacional. A implantação desse sistema permitiu a conciliação entre o ideal modernizador ordeiro do despotismo esclarecido com o estabelecimento de um governo constitucional. Por isso, Lynch afirmou que o conservadorismo é uma espécie de liberalismo de direita, de caráter reformista e antirrevolucionário. Nesse sentido, ao invés de se apresentar em oposição total aos liberais, os conservadores teriam uma postura realista da modernidade, aceitando a inevitabilidade do progresso, embora tentassem guiá-lo de forma prudente e gradual, os adequando a cultura histórica de cada sociedade na tentativa de preservar o tecido social e evitar as rupturas revolucionárias.

No entanto, ao longo de todo o processo de independência, do primeiro reinado e dos anos iniciais das regências, o discurso daqueles que orbitavam em torno de D. Pedro I, a exemplo de Caravelas, foram associados ao absolutismo e ao autoritarismo por seus adversários políticos que desejavam um espaço de atuação e de participação no Estado brasileiro.

Somente com os saquaremas, na segunda metade do século XIX, o termo conservador passa a ser empregado na caracterização de um grupo político, apesar de seus projetos existirem desde a época da independência. De acordo com Lynch, diferentemente do Partido Liberal, que reivindicou o grupo brasiliense como primeiro embrião de seu partido, o mesmo não aconteceu com os conservadores, que preferiram venerar a memória de Bernardo Pereira de Vasconcelos e o Regresso como verdadeiro fundador do partido durante as regências. Logo, a imagem de homens como Caravelas sofreu um desgaste duplo. Ao mesmo tempo em que eram desqualificados pela historiografia luzia que os retratava como absolutistas, não tiveram sua imagem resgatada pela historiografia saquarema e ficaram sem uma posteridade política que os reivindicasse positivamente.

Mais uma vez vemos a influência do historiador inglês J. G. A. Pocock em Monarquia sem despotismo e Liberdade sem anarquia. Baseado em suas ideias, o autor buscou compreender a história como choques de discursos antagônicos. Durante muito tempo, a historiografia brasileira vem comprando a versão de autores saquaremas que localizaram o surgimento do conservadorismo no Brasil no movimento regressista. É importante entender que os saquaremas não queriam ter sua imagem pública associada ao grupo “coimbrão” devido a sua fama negativa ligada ao absolutismo.

Ao longo do livro, Cristian Lynch conseguiu demonstrar que o pensamento político de José Carneiro de Campos não tinha nada de absolutista. Muito pelo contrário, partilhava semelhanças com as doutrinas conservadoras do tempo. Isso implica reconhecer, a despeito das afirmações historiográficas, que o conservadorismo aos moldes regressistas e saquaremas existiam de alguma forma no Brasil muito antes do período regencial, sendo esta ao meu ver a principal contribuição da obra. O resgate do marquês de Caravelas do limbo do esquecimento e sua inserção num campo conservador em formação durante todo o processo de construção do Estado brasileiro nos ajuda a redimensionar a própria concepção do conservadorismo na constituição do Brasil independente.

Referência

Lynch, C. E. C. Monarquia sem despotismo e liberdade sem anarquia: o pensamento político do Marquês de Caravelas (1821-1836). Belo Horizonte: Editora UFMG, 2014.

Luaia da Silva Rodrigues – Doutoranda em história pela UFF. E-mail: [email protected]


LYNCH, C. E. C. Monarquia sem despotismo e liberdade sem anarquia: o pensamento político do Marquês de Caravelas (1821-1836). Belo Horizonte: Editora UFMG, 2014. Resenha de: RODRIGUES, Luaia da Silva. O pensamento conservador do marquês de Caravelas e a construção do Estado Brasileiro. Almanack, Guarulhos, n.18, p. 496-501, jan./abr., 2018. Acessar publicação original [DR]

A Virtue for Courageous Minds: Moderation in French Political Thought 1748-1830 | Aurelian Craitu

Em A Virtue for Courageous Minds: Moderation in French Political Thought, 1748-1830, lançado em capa dura em 2012 e impresso em brochura três anos depois, o cientista político e historiador Aurelian Craiutu, professor da Universidade de Indiana, Estados Unidos, oferece aos leitores um livro desafiador e paradoxal.

Autor de vários textos sobre o liberalismo europeu dos séculos XVIII e XIX, dentre os quais se destaca seu livro de 2003 sobre os doutrinários franceses (Liberalism under Siege: The Political Thought of the French Doctrinaires ), Craiutu é tradutor e organizador de outros trabalhos sobre importantes pensadores liberais, tendo apresentado e traduzido para o inglês duas obras fundamentais para a doutrina liberal do século XIX, Considérations sur les principaux événements de la Révolution française , de Mme. De Stäel, e Histoire des origines du gouvernement représentatif, de François Guizot, além de ter ajudado a organizar dois livros sobre Tocqueville. O estudioso reuniu o vasto arsenal adquirido em mais de uma década e meia de estudos sobre a doutrina liberal para avançar a seguinte tese: a moderação é a quintessência da virtude política, um “arquipélago perdido” que historiadores e cientistas políticos ainda estão por descobrir (p. 1).

Dividido em duas partes – cada qual contendo três capítulos -, o livro oferece um estudo aprofundado de certos autores liberais francófonos que, exceção feita ao clássico e bastante conhecido Montesquieu, se destacaram no cenário público francês entre os momentos de crise do Antigo Regime e a Revolução de 1789, muito embora não tenham recebido a devida atenção da academia e do público em geral no passado como no presente. São eles, na ordem, os líderes monarchiens (monarquianos), designação pejorativa que os jacobinos atribuíram a um grupo heterogêneo de deputados da Assembleia Constituinte formado por Mounier, Malouet, Lally-Tollendal e Clermont-Tonnerre entre outros, e os quais se destacaram por defender o bicameralismo e o veto absoluto do monarca (capítulo 3); o banqueiro suíço Jacques Necker, o célebre ministro das Finanças de Luís XVI, cujas reflexões sobre a Revolução Francesa e a relação entre o Poder Executivo e os demais Poderes continuam largamente ignoradas até hoje (capítulo 4); Germaine Necker ou Mme. de Stäel, a filha de Necker e prolífica autora de artigos, panfletos e livros, além de importante ativista política nos quadros do Diretório e da Restauração (capítulo 5); o suíço Benjamin Constant (capítulo 6), parceiro afetivo, intelectual e político de Mme. de Stäel sobretudo nos períodos do Diretório e do Consulado e, como ela, autor igualmente prolífico – depois de Montesquieu, certamente o mais conhecido e estudado entre os elencados.

Além do prólogo, no qual expõe as justificativas e a metodologia da pesquisa, e do epílogo, no qual conclui com uma espécie de “decálogo” explicativo da moderação, o livro apresenta um esboço sobre o lugar ocupado pelo conceito de moderação no pensamento político ocidental, da antiguidade clássica e pensadores cristãos aos humanistas da época Moderna e filósofos franceses da Ilustração (capítulo 1), bem como um longo capítulo dedicado ao autor de O Espírito das Leis (1748), o barão de Montesquieu (segundo 2) – a meu ver o melhor do livro e, não por acaso, a pedra-angular da obra.

A escolha de Montesquieu como marco epistemológico inicial do estudo e da Revolução Francesa como tela de fundo do trabalho se justificam. O primeiro, pelo fato de haver delegado papel central à moderação política em sua grande obra, a qual teve o mérito de destacar os traços constitucionais, institucionais e legais da moderação para além das considerações de ordem ética sobre o caráter dos governantes ou dos legisladores. Ademais, as reflexões políticas de O Espírito das Leis e das produções dos demais autores ilustram os dois principais temas do livro de Craiutu: a moderação como conteúdo de uma agenda crítica e reformista do Antigo Regime; e as diversas tentativas de institucionalização da moderação política durante e após a Revolução de 1789, o eixo ou pano de fundo do livro. Inspirado no conceito de Sattelzeit (“tempo-sela”, tempo de aceleração histórica), cunhado por Reinhart Koselleck, e ecoando reflexões de François Furet acerca dos impactos da Revolução Francesa sobre a cultura política contemporânea, Craiutu justifica a centralidade daquele evento pelo fato de que “continuamos a viver num mundo democrático moldado e construído pelos ideais e princípios da Revolução Francesa” (p. 2).

É tendo por base as reflexões políticas de Montesquieu e de seus intérpretes envoltos no fenômeno revolucionário francês que Craiutu desdobra o que ele próprio designou como as quatro meta-narrativas do livro: I. a moderação abordada pelo aspecto político e institucional (e não como uma virtude pessoal ou individual), cujo propósito é salvaguardar não apenas a ordem, mas também a liberdade individual; II. a afinidade existente entre a moderação política e a complexidade institucional ou constitucional, conforme ilustraram Montesquieu por meio de seu conceito de “governo moderado”, os monarquianos com a defesa do bicameralismo e do veto absoluto, Necker mediante sua teoria da “soberania complexa” ou do “entrelaçamento dos poderes”, Mme. de Stäel com a sua busca de um “centro complexo” para consolidar a república termidoriana e Benjamin Constant em sua teoria do poder neutro; III. a moderação como a defesa sensata da liberdade, o que não se confunde com o conceito filosófico do juste milieu, pois a moderação pode se traduzir em atitudes tanto equilibradas como radicais de acordo com o contexto político; IV. por isso, a ação moderadora não pode ser analisada por meio do vocabulário político usual (direita ou esquerda), uma vez que possui conotações radicais ou conservadoras conforme o tempo e o espaço. Como bem destacou o autor no prólogo, há momentos em que as intenções moderadoras deixam de ser virtude e passam a significar fraqueza ou traição de princípios – poderíamos exemplificá-lo com o infame Pacto de Munique celebrado entre as potências europeias e a Alemanha nazista, que suscitou um célebre discurso de Churchill.

Na esteira do caráter elástico de seu tema, Craiutu optou por uma abordagem eclética na qual o contextualismo linguístico da Escola de Cambridge e a tradição historiográfica revisionista de Furet e seus discípulos (especialmente Lucien Jaume, destacado estudioso do liberalismo francês do século XIX) se articulam para dotar o livro de um caráter duplo. A Virtue for Courageous Mind pode ser lido ora como obra de filosofia política, ora como trabalho de história das ideias, dado o constante diálogo entre a análise textual e interpretação contextual.

Além das referências citadas acima, é possível identificar outras figuras importantes para o desenvolvimento da hipótese do autor, tais como Jonathan Israel, Judith Shklar, Norberto Bobbio e Isaiah Berlin. De acordo com Craiutu, cientistas sociais ignoram o conceito político da moderação por vários fatores, dentre os quais se destacam a persistência de uma tradição filosófica radical que associa a agenda moderada à defesa conservadora do status quo (de Marx a Israel); a tendência a enxergar na moderação um programa minimalista pautado pelo medo ou pela oposição aos extremos (provável alusão a Shklar e seu artigo ”Liberalism of fear”, de 1989); por fim, indo ao encontro de Bobbio e de Berlin, a visão dominante, não restrita à academia, que vincula a moderação à sagacidade de um determinado agente político, o qual, para conquistar seus objetivos, recorre a quaisquer tipos de compromissos ou manobras (o político encarado como um leão ou uma raposa).

Na contramão do insistente e vigoroso senso comum acerca do tema, Craiutu sustenta – inspirado numa citação do liberal-conservador Edmund Burke, de quem toma de empréstimo nada menos que o título do livro – que a moderação é “uma arrojada virtude para mentes corajosas” (p. 9). Ela não deve ser reduzida a mero meio-termo entre extremos nem tampouco representa sinônimo de pusilanimidade, hesitação ou cálculo cínico de realismo político. Com implicações institucionais e, segundo o autor, desempenhando um papel crucial na aquisição ou fortalecimento dos valores democráticos e liberais, a agenda moderada dos autores selecionados possui em comum pluralismo (de ideias, interesses e forças sociais), reformismo (reformas graduais em vez de rupturas revolucionárias) e tolerância (postura cética que reconhece limites humanos, especialmente para a ação política).

Antes de comentar o que, a meu ver, constitui o problema central do livro, a saber, a identidade das reflexões moderadas desses autores para a aquisição, manutenção e fortalecimento da democracia liberal (p. 9), gostaria de destacar alguns méritos da obra.

O primeiro ponto que saliento é, se não a originalidade, ao menos a correção no tratamento de um autor clássico como Montesquieu. Craiutu sugere que, mais do que propor um governo moderado fundado na separação dos poderes, equívoco reproduzido por incontáveis intérpretes, o que Montesquieu efetivamente sustentou foi uma teoria sobre a divisão dos poderes na qual o Executivo e o Legislativo exerciam controles recíprocos e moderavam as iniciativas de cada um – sua visão, no espírito da doutrina do equilíbrio de poder vigente na época e inspirada na constituição inglesa, pode ser traduzida na fórmula de que só um poder é capaz de controlar e regular outro poder, de modo que a estrita separação entre ambos daria margem a usurpações ou levaria à paralisia institucional. Nos quadros da Revolução Francesa, esse tópico da complexidade constitucional/institucional como condição sine qua non para a obtenção de um governo livre (moderado) se desenvolve nas obras dos monarquianos (bicameralismo e veto absoluto), de Necker (teoria do entrelaçamento dos poderes) e, sobretudo, de Benjamin Constant (teoria do poder neutro). Para demonstrá-lo, Craiutu procedeu a uma criteriosa pesquisa de fontes primárias (obras e discursos dos autores e de seus interlocutores, além de textos legais ou constitucionais) e secundárias (nas mais diversas línguas, do francês e inglês ao alemão), bem como a um erudito exercício de interpretação e reconstrução contextual. Do ponto de vista formal, os únicos senões correm por conta da omissão de um importante intérprete atual da obra de Benjamin Constant (Tzvetan Todorov), bem como da inusitada ausência de uma bibliografia no final do livro, o que dificulta a leitura de suas inúmeras e ilustrativas notas.

Craiutu foi feliz na escolha e no tratamento dos autores, na medida em que eles possuem um núcleo conceitual comum, a moderação vista sob o prisma da complexidade institucional, e defendem princípios filosóficos semelhantes: de Montesquieu a Constant, a mesma preocupação com a moderação das penas e com a absoluta liberdade de expressão; os benefícios do comércio; as garantias para a propriedade privada; o entendimento das desigualdades sociais como resultantes da fortuna ou do intelecto, numa visão otimista da meritocracia; o estabelecimento de pesos, contrapesos e divisões entre os poderes, o que é diferente da separação entre eles; a necessidade de um Judiciário independente do Legislativo e do Executivo; e a crítica às visões monistas ou absolutistas do poder que, da vontade geral de Rousseau às críticas de Paine ao governo misto da Inglaterra, redundaram na mera transferência do poder absoluto do monarca para o poder absoluto do Legislativo (como sabemos, trata-se de uma das principais teses de Furet sobre a Revolução Francesa).

Segundo Craiutu, o pensamento liberal, devido em grande medida à experiência da Revolução Francesa e do traumático período do Terror, teria passado por uma nítida evolução. Aos poucos seus autores teriam se preocupado menos com quem exerce a soberania (o monarca, uma maioria popular ou uma minoria abastada e ilustrada) e mais com a maneira em que a soberania é exercida, até concluírem que o que realmente importa é o estabelecimento de limites ao poder a fim de proteger os indivíduos da autoridade política – ainda que exercida em nome do povo, da nação, da vontade geral, ou sob a bandeira de ideais generosos e humanitários como a igualdade.

Exceção feita a Montesquieu, que não viveu a tempo de testemunhar a Revolução Francesa, os demais autores apresentaram diagnósticos lúcidos sobre as causas que conduziram à “derrapagem” daquele grande evento. Para além das já conhecidas interpretações liberais de Mme. de Stäel e Benjamin Constant para o período de 1789-1794 – as quais são de conhecimento dos iniciados na historiografia da Revolução Francesa -, Craiutu resgata as valiosas contribuições teóricas e balanços históricos dos monarquianos, especialmente Mounier (Recherches sur les causes qui ont empêché les Français de devenir libres, 1792), e de Necker, cujo panfleto De La Révolution Française, de 1796, não recebeu uma única edição sequer ao longo de mais de 200 anos!

A despeito de uma visão consolidada pelos próprios revolucionários franceses, dos jacobinos aos girondinos, que viam na retórica dos deputados monarquianos intenções aristocráticas ou conspiratórias a serviço da Corte, Craiutu reabilita esse grupo, sustentando, à guisa de Tocqueville, que os monarquianos eram dotados de um verdadeiro espírito revolucionário. Embora lutassem pelo estabelecimento de um governo moderado balizado por garantias constitucionais, eles seriam unânimes na oposição aos privilégios da nobreza. Craiutu sugere, após reconstruir as causas que levaram à derrota política dos monarquianos, que o Terror poderia ter sido evitado se as propostas de Mounier, Malouet, Clermont-Tonnerre, Lally-Tollendal & Cia. tivessem sido adotadas, observando que o projeto constitucional triunfante em 1814 e consolidado durante a Monarquia de Julho guardava estreitas afinidades com os diagnósticos políticos do grupo (p. 106).

Outro ponto alto do livro é o tratamento nada condescendente dispensado a figuras tão complexas quanto Mme. de Stäel e Benjamin Constant, as quais, sobretudo no período em que apoiaram o governo republicano do Diretório, sustentaram posições dificilmente classificáveis como moderadas ou liberais. Embora Craiutu tenha examinado bem os panfletos termidorianos da dupla e o crítico contexto de sua elaboração, ele poderia ter devotado um pouco mais de atenção à questão religiosa – como fez, por exemplo, Helena Rosenblatt em seu estudo sobre Constant, autora com a qual Craiutu dialoga frequentemente e concorda sobre a importância da religião para o pensamento político da dupla (p. 200).

Por fim, o autor conclui que as modernas democracias devem ser encaradas como formas mistas de governo representativo, não como simples expressões do “governo do povo”, e que a moderação política “pode promover ideais democráticos” (p. 248). Esta última afirmação nos coloca diante de um problema e de um paradoxo. Problema, porque apesar de os autores em destaque apoiarem a igualdade civil, todos defendiam uma ou mais cláusulas de exclusão (nível de renda, posses ou conhecimento formal) quando o assunto era a participação ativa dos cidadãos na política – o que, ademais, constituía a regra para os liberais da época, sendo Thomas Paine, referência bastante citada no livro, rara exceção no campo liberal do período. Diante dessa constatação, e levando-se em conta o meticuloso trabalho de reconstrução histórica de Craiutu, é uma pena que este importante detalhe tenha sido inexplorado. Por outro lado, e aqui adentramos o paradoxo, o autor acerta em cheio ao apontar a relevância dessa agenda moderada para os estudiosos dos regimes democráticos do presente, na medida em que estes, para além do sufrágio universal como fundamentação e método de funcionamento do sistema, baseiam-se no pluralismo, nos direitos individuais e nos direitos das minorias (vide Lucien Jaume, Le discours jacobin et la démocratie).

Antes de encerrar, caberia levantar uma questão: afinal de contas, o autor logra ou não convencer o leitor de que a moderação é a quintessência da virtude política? Com base no problema relatado acima, arrisco dizer que não. Por outro lado, concordo com Craiutu (e Burke) quando ele (s) afirma (m) que a moderação deve ser encarada como virtude para mentes corajosas. Ao contrário do que afirmou Nietzsche, e com base nas trágicas experiências do século XX, podemos concluir que coube justamente aos estadistas moderados reconstruir o mundo após o apocalipse de guerras e regimes tirânicos engendrados a partir da “mentalidade de rebanho”.

José Miguel Nanni Soares – Universidade de São Paulo, São Paulo SP, Brasil. E-mail: [email protected]


CRAIUTU, Aurelian. A Virtue for Courageous Minds: Moderation in French Political Thought 1748-1830. Princeton: Princeton University Press, 2015. Resenha de: SOARES, José Miguel Nanni. Revisitando um arquipélago quase esquecido. Almanack, Guarulhos, n.14, p. 314-320, set./dez., 2016.

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Cidadania/ historiografia e Res publica: contextos do pensamento político | John Greville Agard Pocock

O renomado historiador das ideias John G. A. Pocock afirma que, além de buscar as linguagens existentes em contextos históricos muito bem determinados, estabelecendo uma análise sincrônica dos discursos políticos, a sua própria inteligência histórica “tende para o diacrônico, o estudo de o que acontece quando as linguagens mudam ou os textos migram de uma situação histórica para outra.” (POCOCK, 2013, p. 276) E é dessa maneira que ele propõe os seus questionamentos e afirmações no interior do grupo já há muito conhecido como Linguistic Contextualism da “Escola do Pensamento Histórico e Político” de Cambridge. Ao se posicionar como um pesquisador mais interessado em performances discursivas, nas interações entre langue e parole (entendidas como texto e ação, respectivamente), Pocock, por meio de sua perspectiva teórica antiparadigmática (é equivocado pensar que ele seja um tributário da perspectiva de paradigma formulada por Thomas Kuhn, como o faz grande parte de seus críticos) e multidimensional, acabou por relegar ao anacronismo bibliotecas inteiras. Leia Mais

Pensamiento político e historia: ensayos sobre teoría y método | John G. a. Pocock

A história das ideias políticas precisa ser analisada na condição de ser uma história da linguagem ou linguagens políticas, sendo o papel do historiador apreender, ou melhor, reconstruir o contexto retórico e sociolinguístico do passado. Eis uma das premissas básicas da qual parte o historiador neozelandês John Greville Agard Pocock para as suas análises. Paralelamente ao britânico Quentin Skinner, que possivelmente atraiu mais os olhares de admiradores e críticos no campo intelectual com o passar dos anos, ele é um dos grandes expoentes do já há décadas conhecido Linguistic Contextualism, oriundo da Escola Histórica da Universidade de Cambridge. Os caminhos de Skinner e Pocock sempre se cruzaram, haja vista a formação que tiveram desde a época da graduação. E não é despropositado afirmar que nessa confluência de experiências vividas há mais de cinquenta anos, há muito mais convergências do que divergências. Mas é claro que as especificidades são inerentes a cada um e, por isso, os estudiosos ganham muito ao disporem de mais uma obra de Pocock, e que é muito relevadora acerca das suas pesquisas nas últimas cinco décadas. Trata-se de Pensamiento político e historia. Ensayos sobre teoría y método. Leia Mais

Pensamento político de Maquiavel – FICHTE (C-FA)

FICHTE, Johann Gottlieb. Pensamento político de Maquiavel Trad. Rubens Rodrigues Torres Filho. São Paulo: Ed. Hedra,2010. Resenha de: GASPAR, Francisco Prata. Maquiavel e a sua aplicação. Cadernos de Filosofia Alemã, São Paulo, n.17, Jan./Jun., 2011.

Mãos se encontrando, cantando, esperando servir-se de justiça.

Impaciência de gerar outra carne, outra polícia diferente destas armas sempre justas para o crime1

Publicado originalmente no número 1 da revista Vesta, de Königsberg, em 1807, o ensaio de Fichte sobre a obra de Maquiavel é, decerto, um texto de divulgação e elogio da obra do “nobre florentino” para o leitor alemão da época. Retomando o texto-homenagem de Goethe escrito como um monumento erigido a Winckelmann, o propósito inicial de Fichte é o de recuperar a obra de Maquiavel, dando-lhe a sua devida importância – o que significa pretender menos que Goethe, afinal, se no caso do historiador da arte antiga se trata de alguém já com perfeita honra e dignidade, no caso de Maquiavel, embora haja alguns simpatizantes de sua obra, ele se encontra também “totalmente mal-compreendido e medido segundo uma medida que ele expressamente proíbe, depois caluniado, ultrajado, seu nome usado como pejorativo” 2. Mas, ao mesmo tempo, o ensaio é também um texto de intervenção política, no qual é o próprio Fichte que, através de Maquiavel, toma posição diante do rumo equivocado dado pelo governo prussiano para a sua política externa, e cujo desfecho tinha sido então a ocupação francesa de parte do território prussiano. Na sombra, Maquiavel ainda pede um sepultamento com honra, e é para isso que Fichte pretende contribuir; sob a ocupação francesa, é Fichte e a sua filosofia que, perturbados, não querem se calar.

Assim como um texto de divulgação, o ensaio é composto de duas partes: uma primeira parte introdutória, em que Fichte, ao fazer uma apresentação geral do autor e de suas obras, procura não só pro por uma nova interpretação da obra de Maquiavel, a fim de tirá-lo dessa sombra em que se encontra, mas também se pergunta qual aplicação a política de Maquiavel teria no tempo presente (de Fichte); e então uma segunda parte, que consiste em uma seleção de passagens traduzidas pelo próprio Fichte do Príncipe e acrescidas de alguns adendos seus. De início, é preciso afastar a má-compreensão e, com ela, por conseguinte, todos os seus preconceitos subjacentes. E Fichte o fará justamente, por incrível que pareça, como um historiador moderno da filosofia: através de uma leitura imanente de Maquiavel, a compreensão da obra é dada pela própria obra, e o leitor não deve vir com prévios conceitos ou prévios juízos, mas produzir o conceito da obra, isto é, julgar a obra, a partir das medidas que ela própria lhe fornece 3. E é desse modo, pois, que na mesma medida em que critica as leituras enviesadas de Maquiavel e suas respectivas incompreensões, Fichte pode apresentar um Maquiavel despido de preconceitos, não mais aquele autor imoral, tomado pelo paganismo e autor partidário e parcial, mas aquele que, insuflado pelo suprassensível e por uma natureza ética superior, formula uma filosofia política de alto alcance.

.Com efeito, para bem julgar a obra maquiaveliana, é preciso situar Maquiavel naquilo que ele tem em vista e não naquilo que nós temos em vista. Maquiavel, diz Fichte, se circunscreve à vida efetiva e à história, e é daqueles que formula seu pensamento a partir da vida, tudo introduzindo e extraindo da história – trata-se, pois, diz Fichte, de uma “sabedoria prática da vida e do governo (Lebens– und Regierungswei sheit) ”. Por isso, quando escreve, Maquiavel não tem em vista “as perspectivas superiores da vida humana e do Estado do ponto de vista da razão” 4 ; ele chega mesmo a ter aversão aos ideais, ao “dever ser”, mas circunscreve-se às coisas como são, procurando sempre a eficácia das ações políticas. Não exigir de Maquiavel, portanto, o que ele próprio não exigia dele, funciona aqui como chave de leitura de sua obra, e “a maior das perversões, assevera Fichte, é julgá-lo como se ele tivesse querido escrever um Direito de Estado transcendental e obrigá-lo, séculos depois de sua morte, a entrar numa escola que mesmo em vida ele não teve ocasião de frequentar” 5.

O Príncipe, por exemplo, não é um livro para ser lido como a exposição de uma moral ou de um direito puros, mas um livro em que Maquiavel, na medida em que procurou dar alguma firmeza e duração à relação dos Estados da Itália, apresenta um conjunto de regras e medidas políticas a serem tomadas conforme a situação, seguido sempre também de um conjunto de exemplos – que podem valer como regras, “modelos” – de como homens do passado agiram em determinadas situações. E se o que se busca é a consolidação de relações estáveis na Itália, o dever de todo príncipe não será um dever moral, mas o dever político de auto-conservação (Selbsterhaltung), e a sua suprema e única virtude será, em função desse dever, a consequência (Konsequenz), isto é, a coerência e sensatez em suas ações. Assim, não é a ação mais correta do ponto de vista moral que tem validade aqui, mas a ação mais eficaz de acordo com esse fim superior que Maquiavel se coloca.

Várias virtudes, ao contrário, como a generosidade ilimitada e insensata ou a clemência, são nefastas para o bom governo, e pecam em eficácia na conservação da nação e do poder político do príncipe. Aliás, é também nessa chave de leitura que é preciso interpretar a linguagem de Maquiavel: quando ele fala em “avareza, crueldade e assim por diante”, ele o faz apenas utilizando a linguagem popular da época, pois sob essas palavras o que se visa são virtudes efetivas do governar e não vícios: “uma sábia parcimônia, um rigor que se mantém inexorável na execução da lei e assim por diante” 6. Se Maquiavel faz uso dessa linguagem, diz Fichte, a culpa não está totalmente nele, pois nisso ele apenas partilhava a linguagem da época, de modo que a culpa tem de ser partilhada com ela.

Não querendo escrever uma doutrina transcendental da moral ou do direito, mas procurando formular, a partir da vida e da história, regras eficazes para a conduta política dos príncipes para um governo estável e sólido, Maquiavel não é, portanto, um autor imoral. Ao contrário, pensa Fichte: a sensatez e coerência que ele busca nos príncipes, o raciocínio rigoroso e bem ordenado e a finalidade geral de uma nação italiana unificada são os índices claros de que a obra de Maquiavel não só é uma leitura atraente, como de uma natureza ética da qual ninguém “se afastará sem amor e respeito, mas também, ao mesmo tempo, não sem lamentar que a esse soberbo espírito não tenha sido dado um palco mais regozijante para as suas observações” 7.

Isso em relação ao suposto caráter imoral de Maquiavel como escritor. Mas a mesma operação de dissolução de incompreensões e preconceitos que se imiscuem na leitura consagrada da obra do nobre florentino é também realizada em relação ao paganismo de Maquiavel, à sua indecisão entre republicanismo e monarquismo e ao seu partidarismo. Tais dissoluções, contudo, não vêm ao caso aqui. Pois é de interesse maior entender o trecho final da parte introdutória do ensaio, exatamente na medida em que, ao se perguntar pela aplicação da política de Maquiavel aos tempos presentes, começa a expor ainda mais claramente todo o caráter de intervenção política do ensaio, fazendo assim a transição para a sua segunda parte, na qual se apresentam algumas passagens do Príncipe, que, enquanto tais, foram traduzidas e selecionadas, como se tentará mostrar, não sem razão.

Mas já de início é de se perguntar, entretanto, como é possível a Fichte retomar a política de Maquiavel a fim de aplicá-la ao seu tempo presente? Isso porque se, por um lado, Fichte compartilha o “princípio capital” da política de Maquiavel, a saber, a ideia de que todo Estado pressupõe a guerra de todos contra todos, sendo sua finalidade, então, produzir a paz comum, mesmo que seja apenas como fenômeno exterior8 – pressuposição inevitável e inquestionável, já que, dado o Estado como instituição de coerção, é necessário pressupor essa guerra de todos contra todos –, por outro lado, todavia, enquanto Maquiavel introduz e extrai tudo da vida e da história, Fichte, ao contrário, é aquele que tem em vista o Estado de razão e o direito transcendental; mais que isso, Maquiavel parece ser justamente aquele “político especulativo meramente empírico” que é tão criticado por Fichte no Estado comercial fechado, o apêndice à Doutrina do Direito. É ali, pois, no Estado comercial fechado, que Fichte começa a delinear o estatuto da política no interior da doutrina-da-ciência como a ciência mediadora entre o puro direito público (das reine Staatsrecht) e a realidade efetiva 9. Afinal, na medida em que desse puro direito público nasce um Estado de razão que, por sua vez, não é imediatamente aplicável à realidade efetiva – já que em parte alguma os homens são encontrados sob uma constituição oriunda da razão e de conceitos, mas antes do acaso e providência – se faz necessária uma mediação, que faça a passagem entre o Estado de razão e o Estado efetivo dado, do contrário, a destruição repentina da constituição efetiva em proveito da constituição do Estado de razão resultaria na própria destruição dos homens, tornando-os selvagens. Em outros termos, o puro direito público fornece as regras (Regeln) universais necessárias a toda constituição fundada na razão e nessa “sua suprema universalidade elas convêm a tudo e, justamente por isso, não convêm a nada determinado ”, donde a sua imediata inexequibilidade – ou inaplicabilidade – na realidade efetiva; ora, para serem aplicadas, diz Fichte, elas “teriam somente de ser mais determinadas para um estado (Zustand) efetivo dado”, e essa determinação a mais da regra universal estabelecida no puro direito público ocorre na ciência que “eu denomino Política ” 10. Assim, dada esta certa heterogeneidade entre o Estado de razão e um Estado efetivo dado, entre a regra universal do direito e uma situação efetiva dada, torna-se necessária uma mediação, ou um termo médio, que permita a passagem dos dois mundos. A política enquanto ciência, e não enquanto prática, é uma ciência do governo que, portanto, partindo não de uma situação totalmente determinada, mas da avaliação de um estado geral de coisas, fornecerá como determinação a mais da regra universal as medidas (Maßregeln) a serem tomadas para que o Estado efetivo dado nessa situação geral se aproxime do Estado de razão; medidas que, enquanto determinação a mais das regras universais, se referem não a um caso particular, mas a um estado geral de coisas e possuem, por isso, ainda uma certa universalidade. – Traçando um paralelo ilustrativo, sugerido pela nota 18 do Tradutor 11, a política, como mediadora que torna possível a aplicação do puro direito à mera experiência, funciona aqui aproximadamente ao modo como o esquematismo da imaginação funciona na Crítica da Razão Pura de Kant. Lá, como aqui, está em questão a aplicação das regras, e lá, como aqui, entre as regras e aquilo sobre o que elas serão aplicadas há uma heterogeneidade que exige uma mediação, um terceiro termo homogêneo aos dois mundos; lá, essa mediação é dada pelos esquemas que, lembremos, enquanto efeito do entendimento (as regras) sobre a sensibilidade (um diverso em geral da sensibilidade), não “têm em vista uma intuição singular, mas só a unidade na determinação da sensibilidade” 12, aqui, essa mediação é dada pelas medidas, que ainda permanecem universais sob um certo ponto de vista, já que a política, como ciência do governo, não pode ser a política para a França ou Alemanha, nem a política para a França ou Alemanha no ano de 1800, mas tem de ser uma política comum a um certo estado geral de coisas 13.

Ora, se é assim, se a política é a ciência do governo que fornece, através das medidas, a determinação a mais que as regras do puro direito público exigem para a sua possível aplicação a um Estado existente, ela, então, se tem um elemento que provém da realidade efetiva, toma, na verdade, a sua substância das regras universais do direito transcendental, de modo que parece ser incompatível a Fichte utilizar a política de Maquiavel, aquele que introduz e extrai tudo da história, para aplicá-la ao seu presente histórico – e não se trata nem mesmo de saber se ela é aplicável ou não, já que de início ela parece ser incompatível com a concepção fichteana de política. E na crítica de Fichte ao que ele chama de “político especulativo meramente empírico” talvez seja o próprio Maquiavel que é ali encontrado: aquele é um político que, não confiando em nenhum conceito ou cálculo, mas apenas na experiência imediata, “rejeitaria esta política [a de Fichte], porque ela não conteria fatos, mas apenas conceitos e cálculos de fatos, em suma, porque ela não seria história. Um tal político tem em sua memória como uma reserva um número de casos e medidas (Maßrege ln) exitosas, que outros antes dele tomaram nesses casos. O que aparece a ele, ele pensa em um daqueles casos e procede como um dos políticos que o precederam” 14 – afinal, não é também Maquiavel, a partir da própria leitura de Fichte, que deliberadamente circunscrito à vida, formula suas regras e medidas a partir dos exemplos que encontra na história? E no entanto, Fichte não só se pergunta em que medida a política de Maquiavel é aplicável aos seus tempos, como antes já o havia elogiado profundamente – sendo o seu propósito, aliás, dar-lhe um sepultamento digno.

É que aqui dois pontos precisam ser considerados, e que, juntos, permitem entender a pergunta pela aplicação da política de Maquiavel e, com isso, a dimensão política do ensaio de Fichte. Em primeiro lugar, quando Fichte se pergunta pela aplicabilidade da política de Maquiavel é preciso entender que ele já não se encontra no terreno da política como ciência, mas já passou para o terreno da aplicação mesma da política, isto é, para a aplicação das medidas a um determinado caso dado, isto é, para a prática da política. Ora, como a medida é algo ainda geral, ela exige uma capacidade do político para saber se ela deve ser aplicada naquele caso e como ela o deve ser – como diz Fichte: “o político em exercício (ausübender Politiker) tem sempre ainda de aplicar uma regra, de certo ponto de vista sempre ainda universal, a um caso particular, e para cada caso particular um pouco diferentemente” 15, embora a aplicação não possa se afastar da regra.

Essa capacidade para aplicar a regra pode ser denominada, mantendo -se o paralelo com Kant, de capacidade de julgar, isto é, aquele talento para distinguir se algo está ou não sob a regra dada 16. E é o próprio Fichte que assim explica a aplicação da regra a partir de uma ciência mediadora: “sempre resta ao julgamento daquele que pratica (Beurteilung des Praktikers) um vasto campo; a ciência mediadora apenas o encaminha e indica a ponte dos dois mundos diferentes. Como a lacuna permanece, ele tem de se ajudar a si mesmo pelo julgamento (Beurteilung) ” 17.

Quer dizer, no momento em que é preciso aplicar a regra ou medida à realidade, o político prático, em exercício, necessita ter uma capa cidade de inventividade e discernimento para que mesmo a distância entre a medida da política, enquanto ciência mediadora, e a realidade seja acomodada 18. – E isso ele o fará pelo seu talento próprio em julgar e simultaneamente, caso este não seja suficiente, a partir de exemplos passados que mostrem como a medida foi aplicada – e é Kant quem diz que os exemplos aguçam a faculdade de juízo 19. É aqui, pois, que Maquiavel entra em cena, afinal, ao se situar no terreno da vida e da história e formular a partir delas regras para a boa conduta dos príncipes, ele acaba também por fornecer uma série de exemplos de como políticos do passado se portaram, isto é, como aplicaram as regras – em alguns casos, virtuosamente, em outros, de modo vicioso. O próprio Príncipe, aliás, é um livro escrito para Lorenzo de Médicis, para que, com a instrução do livro, possa unificar a Itália e bem governá-la, “pressuposto sempre que vos atenhais à maneira daqueles que vos apresentei como modelos ” 20 – aqui, o exemplo vale como medida, um pouco como no juízo reflexionante kantiano.

Em segundo lugar, com efeito, é preciso considerar também que quando Fichte se pergunta pela aplicabilidade da política de Maquiavel, ele não tem em vista a relação do príncipe com os seus súditos – que era a questão que movia Maquiavel ao escrever o Príncipe –, pois em geral os príncipes da Europa do século XIX já estão em paz com os seus súditos e não necessitam de uma política para isso, mas o que o move é a relação do príncipe com as outras nações. Ora, nessa relação entre os Estados não há nenhum direito superior, nem nenhuma lei, a não ser a lei do mais forte, e neste caso, não havendo direito, a relação de permanente volúpia da guerra é ainda mais forte e necessária. Como então formular uma política se não há um direito para lhe dar as regras universais que ela deverá determinar? É aqui, enfim, que a política de Maquiavel é aplicável, justamente porque, sem nenhum direito que lhe dê a regra, ele formula, com exemplos da história e tendo em vista a eficácia das ações, um conjunto de regras para dar estabilidade e duração à relação dos Estados da Itália. Assim como Maquiavel, Fichte procura agora formular regras para os príncipes para que haja estabilidade na relação entre os Estados, que justamente se encontram em guerra naquele momento.

Com efeito, no caso presente, em que não há nenhum direito superior que reja a relação entre os Estados e em que a volúpia de guerra de todos contra todos se intensifica ainda mais, cada nação procurando continuamente se engrandecer às custas da outra, a estabilidade entre os Estados não será estabelecida por qualquer confiança ou relação de tipo moral entre as nações, mas tão somente se cada nação conservar-se forte em seus limites, estiver bem preparada para a guerra, sempre atenta a qualquer tentativa de seu vizinho em mudar a situação em seu proveito – pois se ele puder, ele o fará necessariamente, mesmo que seja seu irmão – e em não confiando de modo algum nas palavras, mas sempre procurando forçar uma garantia – “e absolutamente não abrir mão dessa condição da garantia e, estando em armas, não as depor, a todo risco, antes de ter chegado a ela” 21. Desse modo somente, nesse estado de permanente atenção e tensão, nenhuma nação encontrará uma ocasião segura para se lançar contra o seu vizinho e “uma espada manterá a outra em repouso e sucederá uma paz crônica” 22. Por sua vez, essa perspectiva política, diz Fichte, se não decorre do direito, está porém de acordo com o ponto de vista da razão, pois, na medida em que os povos não são uma propriedade do príncipe, ele não pode os considerar como um assunto privado seu: ele não pode, como o faz um cidadão privado, acreditar na humanidade, na honestidade dos homens, afinal, quando o cidadão privado é lesado, é apenas ele que é lesado e ele ainda pode recorrer à justiça de sua nação, enquanto o príncipe, se assim o fizer, é toda a nação que será prejudicada e ele não pode arriscar, em nome dessa crença, a sua nação, o seu povo e todo os seus bens. Nesse sentido, aliás, a moral não tem validade na política, o príncipe está vinculado à lei moral somente em sua vida privada, pois, em relação aos seus súditos, é ao direito de sua nação que ele está vinculado e, em relação aos outros Estados, são por essas regras e política de força que Fichte formula que ele deve se guiar, sempre tendo em vista o bem-estar e a dignidade de seu povo.

Ora, é essa perspectiva “mais séria e vigorosa” que, afirma Fichte, foi deixada de lado em seu presente, e a filosofia do tempo que então vigora, “enamorada da paz perpétua”, oferece como bem somente uma certa “humanidade, liberalidade e popularidade, suplicando que simplesmente se seja bom e então tudo também será bom, por toda parte recomendando a áurea via média, isto é, o amálgama de todas as contradições em um surdo caos”. E o pior é que essa filosofia do tempo tem entrada nos gabinetes e cortes dos governos, e é a ela basicamente que Fichte concederá a honra de todas as desastradas decisões políticas do governo prussiano no cenário internacional, principal mente na relação com a França de Napoleão. Decerto, a liberdade, a igualdade e a fraternidade, mostra Fichte, são os “alicerces eternos e inabaláveis de toda ordem social”, mas exclusivamente com eles não é possível construir e gerir um Estado 23. Aliás, é de se perguntar se não é essa mesma ingênua filosofia do tempo a raiz daquela leitura moralizante da obra de Maquiavel, de modo que em um só lance a obra de Maquiavel é recuperada e a filosofia política da época criticada.

Assim, considerados esses dois pontos diante da pergunta pela aplicação da política de Maquiavel ao tempo presente, a saber, que essa aplicação já se dá no terreno da prática e que o seu campo são as relações entre os Estados nas quais não há nenhum direito que as reja, é possível então compreender todo o caráter de intervenção política do ensaio de Fichte sobre Maquiavel e, nessa chave de leitura, passar aos trechos traduzidos selecionados por Fichte. Imagine agora, por tanto, leitor, um prussiano letrado em 1807 que vive desgostoso sob a ocupação francesa e, depois de ter lido a parte introdutória do ensaio, lê na primeira passagem selecionada do Príncipe – a Exortação a Libertar a Itália –: “Jamais, na verdade, o tempo foi mais favorável a um príncipe capaz de tornar-se o criador de uma nova ordem de coisas na Itália do que justamente agora” 24 ; que, diante da vacilação e adiamento do governo prussiano para declarar guerra contra a França de Napoleão, lê que os romanos não adiavam uma guerra se isso significasse adiar problemas que uma vez certamente virão, “pois bem sabiam que com isso a guerra não é sustada, mas meramente, e aliás para vantagem do outro, adiada para mais adiante” 25 ; imagine leitor, quando esse prussiano ainda lê as passagens do Príncipe sobre a arte da guerra, sobre como a neutralidade em uma disputa é sempre um equívoco – neutralidade pregada pelo governo prussiano – ou quando, enfim, lê sobre os secretários dos príncipes. Todas são passagens do punho de Maquiavel, mas é da política da época que elas falam também. E Fichte tem consciência disso: ele quer despertar – ou não seria vivificar? – em seu leitor um estado de coisas que poderia ter sido diferente 26. O texto é datado, mas hoje, em que o direito internacional e as suas instâncias são pouco respeitados, ainda dá muito o que pensar e imaginar. Imagine, pois, leitor, porque, de certa forma, também é disso que se trata, nessa confluência entre história da filosofia, filosofia e intervenção política, contida no ensaio de Fichte sobre Maquiavel, cuja já consagrada tradução de Rubens Rodrigues Torre Filho foi ano passado reeditada, depois de ter sua primeira publicação em 1979, no número 9 da revista Almanaque.

Notas

1Torres Filho. “Poema desmontável”. In: Novolume, São Paulo, 1997, p. 146.

2 FICHTE, J. Pensamento político de Maquiavel. Tradução de Rubens Rodrigues Torres Filho. São Paulo: Hedra, 2010, p. 18.

3 Coisa que o próprio Fichte exigia dos leitores da sua doutrina-da-ciência, dado o seu caráter radicalmente reflexionante. Aqui, com Maquiavel, ele apenas faz a um outro filósofo o que ele exige para si. Sobre o princípio de leitura da doutrina-da-ciência, vale a pena ver a obra filosófica do tradutor, notadamente: Torres Filho., R. R. O espírito e a letra: crítica da imaginação pura em Fichte, São Paulo, Ática, 1975, cap. 1

4 FICHTE, J. Pensamento político de Maquiavel, p. 19.

5 Idem, p. 21.

6 Idem, ibidem.

7 Idem, p. 23.

8.Para isso, Fichte cita o próprio Maquiavel: “todo aquele que funda uma república (ou, em geral, um Estado) e lhe dá leis tem de pressupor que todos os homens são malignos e que, sem exceção nenhuma, darão vazão a sua malignidade intrínseca tão logo encontrem para isso uma ocasião segura”, idem, p. 40.

9 Toda essa discussão sobre a política em Fichte e, depois, a comparação com a imaginação em Kant, foi sugerida pela nota 18 do Tradutor, onde, depois de uma citação do Estado comercial fechado, na qual aparece a definição de política, o Tradutor comenta: “Tão central quanto a imaginação como mediadora entre o sensível e o inteligível, ela [a política] é, para Fichte, o meio -termo entre ‘história’ e ‘filosofia’”, idem, p. 42 – nota 18 da tradução

10 FICHTE, J. Der geschlossene Handelsstaat. In: Werke, III, Berlin, Walter der Gruyter, 1971, p. 390-1. No apêndice à Doutrina dos Costumes, Fichte escreve: “O que medeia (das Vermittelnde) a aplicação da pura Doutrina do Direito às de terminadas constituições públicas existentes chama-se Política ”, Ascetik als Anhang zur Moral, Werke, XI, p. 123.

11.A propósito, alguém poderia dizer que o paralelo da nota 18 feito pelo tra dutor é de Fichte com ele mesmo, e não da política em Fichte com a imaginação em Kant. Não adentraremos nessa discussão, mas apenas apontaremos para as relações estabelecidas pelo próprio Torres Filho, em sua referida obra filosófica, entre o esquematismo como meio da Crítica e a imaginação como centro da doutrina-da-ciência (ver: Torres Filho., R. R. O espírito e a letra, cap. 2). E a isso acrescentaremos que, aqui, Fichte não se encontra no nível transcendental originário das exposições da doutrina-da-ciência, mas em um nível derivado em que ao a priori se opõe o a posteriori, nível semelhante àquele da Crítica, pois a questão aqui é como introduzir na vida a ciência (ver: Fichte, J. Ascetik als anhang zur Moral, Werke, XI, p. 122).

12 KANT, I. Kritik der reinen Vernunft. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1974, v. III, p.189 (A140/B179).

13 FICHTE, J. Der geschlossene Handelstaat, Werke, III, p. 391.

14 Idem, ibidem.

15 Idem, ibidem.

16 KANT, I. Kritik der reinen Vernunft, p. 184 (A132/B171).

17 FICHTE, J. Ascetik als Anhang zur Moral, Werke, XI, p. 122-3.

18 Talvez seja possível dizer que a política como ciência fornece uma estratégia para a política e a política como prática, ao procurar aplicar essa estratégia, precisará formular uma tática.

19 KANT, I.Kritik der reinen Vernunft, A134/B173. Não é curioso que o próprio Kant, quando fale da faculdade transcendental de juízo se refira à necessidade de um político de ter o talento do juízo e diga: “Um médico, um juiz ou um estadista (Staatskundiger) podem ter na cabeça excelentes regras patológicas, jurídicas ou políticas, a ponto de cada um poder ser um importante professor nelas, e no entanto, facilmente se equivocar na sua aplicação (Anwendung), ou porque falte a ele o juízo natural (embora entendimento, não), e ele pode compreender o universal in abstracto, mas não pode distinguir se um caso pertence a ele in concreto, ou também porque ele não foi preparado o suficien te para esse juízo com exemplos e ocupações concretas” (Idem, p. 185, A134/ B173).

20 FICHTE, J. Pensamento político de Maquiavel, p. 55 (passagem selecionada do Príncipe ).

21 Idem, p. 46.

22 Idem, p. 47.

23 Idem, p. 51.

24 Idem, p. 53 (passagem selecionada do Príncipe ).

25 Idem, p. 61 (passagem selecionada do Príncipe

26 Fichte escreve: “Assim dizem que o avestruz fecha os olhos ante os caçadores que vêm ao seu encontro, também como se o perigo que não lhe é mais visível simplesmente não existisse mais. Não seria nenhum inimigo do avestruz quem lhe gritasse: – Abre teus olhos, vê, ali vem o caçador, foge para aquele lado para que lhe escapes”. Idem, p. 85.

Referências

FICHTE, J. Pensamento político de Maquiavel. Tradução de Rubens Rodrigues Torres Filho. São Paulo: Hedra, 2010.

_____.Der geschlossene Handelsstaat, Werke, III. Berlin: Walter de Gruyter, 1971.

Ascetik als Anhang zur Moral.In: _____, Werke, vol. XI. Berlin: Walter de Gruyter, 1971.

KANT, I. Kritik der reinen Vernunft. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1974.

TORRES Filho. O espírito e a letra: crítica da imaginação pura em Fichte.São Paulo: Ática, 1975

Francisco Prata Gaspar – Doutorando em Filosofia pela Universidade de São Paulo.

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