Oil Palm: A Global History | Jonathan E. Robins

The two main fields of reference of Jonathon Robins’ new book, Oil palm: a global history, are immediately revealed in its title: the history of commodities and global history. This work fits within the historiographical genre famously inaugurated by Sydney W. Mintz in 1985 1. It is not by chance that Robins, associate professor of History at the Michigan Technological University, investigated the history of another commodity, cotton (in the British Empire), before dealing with palm oil. Furthermore, the title indicates that the main character of the book is not the commodity itself but the tree producing it. In sum, it tells «the story of how humans used and lived with oil palms» 2. Surely this choice is also due to the fact that the oil palm tree, differently from the cotton plant for example, gives birth to more than one commodity: indeed, palm kernel oil played almost as fundamental a role in the globalization of palm products as the much more renowned palm oil (palm wine, on the other hand, never developed an appeal outside of African domestic markets). Leia Mais

Amado Alonso en la Argentina. Una historia global del Instituto de Filología (1927-1946) | Miranda Lida

Después de una breve introducción, este libro se divide en cinco capítulos. En el primero Miranda Lida resume las circunstancias en que en 1922 se creó el Instituto de Filología en Buenos Aires, un ambicioso proyecto científico que supuso una colaboración estrecha entre Argentina y España. Así, por un lado, destaca los grandes contingentes de inmigrantes que desde mediados del siglo XIX llegaban al Río de la Plata, “ [llamando ] la atención de intelectuales, funcionarios y políticos acerca del problema de la lengua como elemento aglutinador para una población heterogénea” (p. 12). Mientras que, por otro, centra su atención en España, en el interés de la Junta para Ampliación de Estudios (JAE) por promover un nuevo hispanoamericanismo “progresista”, alejado del viejo imperialismo de los tradicionalistas. Esta política nueva, inspirada en el krausismo (nos explica la autora), contemplaba una relación de diálogo y de respeto mutuo destinado a forjar “una común argamasa de estudios hispánicos en diferentes lugares de Hispanoamérica, desde Estados Unidos y el Caribe hasta el Cono Sur” (p. 41). Y para conseguir esa finalidad la JAE contaba sobre todo con el Centro de Estudios Históricos (CEH), dirigido en Madrid por el filólogo Ramón Menéndez Pidal. Dado el prestigio internacional de que Menéndez Pidal gozaba entonces, fue lógico que el decano de la Universidad de Buenos Aires, Ricardo Rojas, ansioso por resolver el problema de la lengua, acudiera a él en busca de orientación y cooperación. Y fue así como en 1922 se creó el Instituto de Filología, una especie de filial del CEH en Buenos Aires. Curiosamente, pese al entusiasmo inicial expresada por ambas partes, el proyecto no arrancó con el éxito que todos querían. El primer director, Américo Castro, apenas duró unos meses en el puesto, y los otros miembros del CEH que lo sucedieron, Agustín Millares Carlo y Manuel de Montoliu, poco más. De hecho, no fue sino hasta 1927, con el nombramiento de un muy joven Amado Alonso (1896-1952) como director, cuando el Instituto por fin empezó a arraigarse. Leia Mais

Utopian Universities: A Global History of the New Campuses of the 1960s | Jill Pellew e Miles Taylor

Detalhe de capa de Utopian Universities A Global History of the New Campuses of the 1960s
Detalhe de capa de Utopian Universities: A Global History of the New Campuses of the 1960s

The 1960s were a period of expansion in many higher education systems. In their introduction to Utopian Universities, Pellew and Taylor note that approximately 200 new university campuses were created during the decade, and these initiatives provided a unique space to redesign the university in physical, organizational, and curricular terms. Emerging from a two-year project, this edited volume focuses on the developments and aspirations associated with a selection of these new universities, contributing to our understanding of this important developmental phase within higher education in some jurisdictions.

The first section of the book, which focuses on the development of nine new universities in the United Kingdom (UK) (including seven in England) is the strongest and most integrated component of the volume, in large part because of the relatively common contextual elements underscoring these initiatives, but also because the section includes a number of quite masterful thematic analyses. These include an outstanding chapter by William Whyte describing the influence of the “Redbrick” civic universities on the new British universities that emerged in the 1960s, and the fascinating assumptions underscoring the design and architecture of these new campuses. Leia Mais

Provincializing Global History: Money/Ideas/and Things in the Languedoc/ 1680-1830 | James Livesey

James Livesey Imagem University of Dundee
James Livesey | Imagem: University of Dundee

James Livesey’s Provincializing Global History: Money, Ideas, and Things in the Languedoc, 1680-1830 examines the ways significant knowledge shifts amongst ordinary men and women tied into, and helped create and solidify, deep economic change in the long eighteenth century. Part of making that argument for Livesey entails tying changes in culture in a specific place, here Languedoc, to broader economic development and transformation. The questions he lays out – how and why did the economic and industrial movements that originated in Western Europe come to capture and then dominate global economic activity and culture – are ones that many historians puzzle over in some fashion or another. For Livesey, answers lie in understanding the experiences of the subaltern, peasants and more generally ordinary folks in Languedoc, and the ways they connected to, understood and eventually participated in and transformed knowledge culture and economic development. He makes the argument that technological and scientific advances were not predicated solely, or even primarily, on inventions themselves and how effective they were. Rather a supportive local political environment, and the local adaptation of new technologies to the particular conditions of a place, made change possible. Livesey examines three examples of local transformation, connected to broader shifts, that connected the population of Languedoc to broad shifts in thought and practice developed and adopted elsewhere in order to trace how the provincial shaped and responded to global history. The three examples roughly correspond to the subtitle of the book – money (provincial debt holding), ideas (botany), and things (swing plow). Leia Mais

O que é história global? | Sebastian Conrad

O que é a história Global? É um ensaio histórico escrito por Sebastian Conrad, cujo título original é What is Global History? traduzido para a língua portuguesa por Teresa Furtado e Bernardo Cruz, publicado pelas edições 70, em Lisboa, em 2019, com 310 páginas. Os onze capítulos estão entre a introdução e o posfácio, “o lento fazer da história global”, escrito por Miguel Bandeira Jerónimo.

Para se entender a concepção do global é imperativo perceber como é que as noções de mundo mudaram ao longo do tempo, pois a globalização alterou a forma como escrevemos a história. Deixou de ser possível estudar o Estadonação de forma isolada e de apreender a história mundial a partir do Ocidente. Mas o que é a história global? Sebastian Conrad explica a razões do global, que é um estudo que se revelou em uma das áreas inovadoras e promissoras do conhecimento histórico. Leia Mais

O que é história global? | Sebastian Conrad

Sebastian Conrad, Professor – Doutor em História e que, desde 2010, ocupa a cadeira de História Moderna na Universidade Livre de Berlim, é autor da obra What is Global History? [O que é história global?], lançada em 2016 2. Em seu capítulo introdutório, Conrad expõe seus objetivos: compreender o aumento da popularidade que a linha da história global adquiriu tanto mundialmente quanto dentro da disciplina de História, assim como apresentar uma perspectiva atual de História em oposição ao modelo historiográfico de história universal do século XX, um modelo profundamente eurocêntrico.

Segundo o autor, os primeiros esboços de uma história global surgem após a II Guerra Mundial e o interesse pela mesma ganha fôlego já no final do século XX. As principais razões para isso se devem à tendência em encontrar na globalização o ponto de explicação do presente, assim como o de análise das origens históricas de um processo e da revolução comunicacional, um contexto que impactou os historiadores e a maneira como produzem História. Tal efeito se deu tanto a partir das insuficiências dos instrumentos usados pelos profissionais até aquele momento quanto por conta dos desafios lançados pela globalização das ciências sociais. Leia Mais

The Law of Nations in Global History | Charles Henry Alexandrowicz

Lançada em 2017 pela editora Oxford University Press, a obra The Law of Nations in Global History compreende um compilado de escritos do jurista e historiador polonês Charles Henry Alexandrowicz (1902-1975) publicados no período de 1951 a 1980. A coletânea, organizada por David Armitage e Jennifer Pitts, conta com 432 páginas e faz parte da coleção History and Theory of International Law, de iniciativa de Nehal Bhuta, Anthony Padgen e Benjamin Straumann. A série, que inclui outras publicações relevantes do campo do Direito Internacional Público (DIP), objetiva promover um fórum de debates historiográficos e teóricos, a fim de estimular a consciência histórica, na tentativa de revisitar o passado da matéria para melhor construir seu futuro.

Os organizadores pretenderam, ao publicar a coletânea de escritos de Alexandrowicz, dar maior visibilidade ao trabalho do autor e deixá-lo mais acessível ao público. Esta primeira edição conta com dois prefácios, sendo o primeiro do diretor da série, Benjamin Straumann, e o segundo de B. S. Chimni, professor e jurista de Direito Internacional filiado à escola Third World Approaches to International Law (TWAIL). O texto introdutório, de autoria dos editores da obra, expõe uma visão geral sobre a vida e o pensamento de C. H. Alexandrowicz, no qual o leitor é apresentado a diversos determinantes da biografia do autor que contribuíram para sua postura crítica com relação ao DIP. Leia Mais

Global History | Jürgen Osterhammel e Pierre-Yves Saunier

É de comum acordo entre os historiadores e as historiadoras que nossa disciplina tem sua história e que nossas perguntas para as fontes variam com o contexto, as sociedades e suas culturas. Desde a institucionalização da disciplina, com as escolas metódicas do século XIX, até as várias renovações historiográficas dos anos 70 a 90, cada epistemologia trouxe contribuições que enriquecem nosso campo. A partir disso, buscamos analisar o artigo Global History, de Jürgen Osterhammel junto ao comentário de Pierre-Yves Saunier, publicados no livro Debating New Approches to History. Leia Mais

What is Global History? | Sebastian Conrad

El historiador alemán Sebastian Conrad (1966) a lo largo de su carrera ha trabajado en los campos de la historia transnacional y de la historia global. Ello tanto desde la refl exión teórica como mediante la aplicación de sus metodologías en el análisis de casos de estudio concretos. Actualmente detenta la cátedra de historia moderna en la Freie Universität de Berlín, donde también dirige la maestría en Historia Global. En 2018, su trayectoria académica fue reconocida al nombrársele miembro de la Academia Europaea y de la Academia de ciencias de Berlín-Brandemburgo1. En su libro, What is Global History, Conrad se propuso realizar una discusión de alcance teórico sobre este tipo de historia y su práctica, discutiendo, por ejemplo, la política implícita en su ejercicio y los efectos del enfoque global en las categorías utilizadas por los historiadores, como las nociones de espacio y tiempo2.

En su texto, Conrad plantea una defi nición heurística de esta práctica historiográfi ca, concibiéndola como un enfoque diferenciado que exploraría “alternative spatialities, is fundamentally relational, and is self-refl ective on the issue of Eurocentrism”3. Leia Mais

Historia Global: Perspectivas y Tensiones / Carlos Rojas

livro História Global: perspectiva e Tensiones foi organizado por Carlos Riojas e Stefan Rinke com a seleção de autores que participam de grupos de trabalho voltados à História Global e à História da América Latina. Na introdução do livro, os organizadores relembram os grupos de estudos sobre História Global, bem como publicações, que juntas, articulam uma agenda. A ideia deles foi pensar quais eram as premissas básicas para reconhecer o que a bibliografia especializada chama de História Global. Delineia-se uma teoria que evita a história única, a história événementielle ou que tenta somar as partes para fazer o todo. Sem se inscrever numa geografia específica, trata-se de um enfoque que dá ênfase às redes, às conexões, ao mecanismo de sustentação ou difusão de constelações.

O primeiro capítulo dedicado a História Global, escrito por Sebastian Conrad, defende a abordagem enquanto uma tentativa de fugir da história da nação e da herança de uma matriz disciplinar fundada no século XIX. Para a sua superação propõe-se uma virada heurística a partir de objetos já pesquisados e documentos já descobertos (CONRAD, 2017, p. 36). Portanto, não se trata de buscar uma história ainda não descoberta, mas olhar de outra maneira para o mundo que já conhecemos.

Nesse sentido, o livro foi estruturado em oito capítulos com abordagens que problematizam narrativas amplamente difundidas no ambiente historiográfico. Por exemplo, categorizar a América Latina como periferia do mundo ou menosprezar este continente – e outros como Ásia –, no papel de globalização, ainda no século XVI.

A maneira como o livro traz a perspectiva global é uma revisão a partir de abordagens que vem sendo debatidas desde os anos 1950, como uma nova história política, uma nova história intelectual, as teorias desconstrutivistas, a crítica pós-colonial entre outras. Mas, em vez de destacar o acirramento entre tais teorias, há uma tentativa de conciliação. Por exemplo, para falar do equívoco do eurocentrismo, isto é, uma história feita a partir de uma visão sobre povos e culturas, que os classifica segundos uma hierarquia cujo ponto de chegada é a civilização europeia, com seus Estados, suas leis, sua urbanização, são retomadas questões sobre viajantes da modernidade (RIOJAS; RINKE, 2017, p. 16). Tais viajantes geralmente são entendidos como um instrumento do eurocentrismo, por viajarem pelas Américas a fim de explorar os continentes e produzirem o conhecimento necessário para a conquista. Além disso, esses relatos de viagem teriam sido usados exaustivamente por intelectuais residentes nas Américas para formar a própria visão do país, como na Literatura Indianista Brasileira. No livro não há a negação de tais fatos, mas a sugestão “de una dinámica intercultural la cual modificó paulatinamente el carácter de todos los actores inmiscuídos en estos viajes conforme los contactos se hicieron más estrechos y frecuentes” (RIOJAS; RINKE, 2017, p. 12). Portanto, tanto metrópole como colônia transformam-se pari passu uma a outra.

Alguns trabalhos, hoje clássicos, já problematizaram a relação entre metrópole e colônia, como Maria Sylvia Carvalho Franco em Homens Livres na Ordem Escravocrata (1969), em que evidencia os vínculos entre trabalhos escravo e homens livres, de modo que a escravidão colonial faz parte do desenvolvimento capitalista nascente das metrópoles. Este argumento contraria visões que postulam diferenças essenciais e dicotômicas que podem ser percebidas em nomenclaturas como metrópole e colônia, desenvolvidos e subdesenvolvidos, periféricos e centro (FRANCO, 1976). Dessas diferenças viriam uma causalidade de acontecimentos da economia agrícola à industrialização, do atraso ao desenvolvimento, da barbárie à civilização. As teses de Franco não estiveram sozinhas e fizeram escola em livros como O Nascimento das Fábricas (1993), de Edgar De Decca, que interpretou a organização da sociedade em torno do engenho como uma forma de modelo industrial; e Londres e Paris no século XIX: o espetáculo da pobreza (1986), de Stella Bresciani, que enxergou a barbárie nos ditos civilizados. Perceba, portanto, que a História Global é um guarda-chuva de debates historiográficos sustentados por uma noção de totalidade que reformula a percepção sobre a história. Para Rinke e Riojas, “el todo es más que la soma de las partes” (RIOJAS; RINKE, 2017, p. 14).

A história total já foi proposta outras vezes, seja com uma variante de universalidade, como em Friedrich Schiller (2019), para quem as histórias da Ilustração eram um amontado de fragmentos faltado conexão entre os eventos; ou a História Total pensada por Hippolyte Taine, que em seu recorte deveria abarcar a raça, o meio e o momento (DE DECCA, 2002, p. 163). Hoje não restam dúvidas que essas ambições modernas e iluministas produziram formas de engajamentos pelo mundo, que, por exemplo, encontram lugar comum em Victor Hugo, Euclides da Cunha, Marc Bloch, Domingo F. Sarmiento entre tantos outros. Não por acaso, Rinke e Riojas citam O mediterrâneo (1949) de Fernand Braudel como pioneiro na História Global. Entretanto, será possível conseguir se distanciar da história nacional e sua matriz disciplinar do século XIX com uma proposta fundada nessa mesma matriz disciplinar?

Adentrando ainda mais no livro, percebe-se textos que procuram reinterpretar os acontecimentos históricos para dar um novo sentido. Há também outros textos que enfatizam a inescapável globalização do período contemporâneo. A exemplo da proposta de Bernd Hausberger, até mesmo alguns livros recentes como Globalization in World History, organizado por A. G. Hopkins, pecam por dedicar poucas páginas ao papel da América Latina. O objetivo Hausberger foi lembrar que o comércio e a indústria desenvolvida na Europa nos séculos XVIII e XIX só foi possível com o ouro, com a prata, com as mercadorias e com consumo das colônias, sobretudo da América Latina (HAUSBERGER, 2017, p. 57). Percebe-se, portanto, que a história global caminha para um eixo historiográfico de não apenas fazer síntese, mas ser crítica sobre a própria produção.

Outro exemplo de abordagem da história global foi ensaiado por Carlos Riojas, ao comparar a agenda da globalização no final do século XX entre Hungria, Argentina e México. Estes países tinham em comum alto grau de endividamento, ficando à mercê de mais empréstimos e regras ditadas internacionalmente por instituições financeiras. Porém, as reformas econômicas não necessariamente acompanhavam processos democráticos, como no caso do Chile, em que se justificava a ditadura do Pinochet para fazer as implementações solicitadas pelo mercado e pela imprensa internacional (RIOJAS, 2017, p. 147). Essa abordagem de história comparada é pertinente até para pensar o tempo presente, porque hoje, os países citados por Rojas, sofrem novamente por problemas econômicos, escaladas autoritárias e repressão a população civil.

A história global aparece como uma forma de mediar as diversas formas de escrita da história pelo mundo, investindo na pluralidade, na diversidade e na perspectiva. A história global ainda estará sob às críticas mais duras ao eurocentrismo no ofício do historiador, por deixar dúvidas em relação às ambiguidades presentes na terminologia história. Ainda assim, em um século XXI de nacionalismos, reinvindicações identitárias, aceleração do tempo, pandemia, uma historiografia de mediações é fulcral para estabelecer diálogos e agendas.

Referências

BRESCIANI, Maria Stella Martins. Londres e Paris no século XIX: o espetáculo da pobreza. Brasiliense, 1982.

CONRAD, Sebastian. História Global – Agendas y Perspectivas. In: RIOJAS, Carlos; RINKE, Stefan (org). Historia Global: Perspectivas y Tensiones. Verlag Hans-Dieter Heinz: Akademischer Verlag Stuttgart, 2017.

DE DECCA, Edgar. Euclides e os Sertões: entre a literatura e a história. In: FERNANDES, Rinaldo de (Org). O Clarim e a Oração. Cem anos de os Sertões. São Paulo: geração editorial. 2002.

DE DECCA, Edgar Salvadori. O nascimento das fábricas. São Paulo: Brasiliense, 1982.

FRANCO, Maria Sylvia de Carvalho. As ideias estão no lugar. Cadernos de debate. Vol 1. História do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1976.

FRANCO, Maria Sylvia de Carvalho. Homens livres na ordem escravocrata. Unesp, 1969.

HAUSBERGER, Bernd. Consideraciones acerca del papel de América Latina para el arranque de la globalización. In: RIOJAS, Carlos; RINKE, Stefan (org). Historia Global: Perspectivas y Tensiones. Verlag Hans-Dieter Heinz: Akademischer Verlag Stuttgart, 2017.

RIOJAS, Carlos; RINKE, Stefan (org). Historia Global: Perspectivas y Tensiones. Verlag Hans-Dieter Heinz: Akademischer Verlag Stuttgart, 2017.

RIOJAS, Carlos Agendas Globales Agendas Locales. In: RIOJAS, Carlos; RINKE, Stefan (org). Historia Global: Perspectivas y Tensiones. Verlag Hans-Dieter Heinz: Akademischer Verlag Stuttgart, 2017.

SCHILLER, Friedrich. O que significa e com que fim se estuda a história universal? Trans/Form/Ação. Vol.42 no.3 Marília July/Sept. 2019  Epub Oct 07, 2019.

Alesson R. Rota – Historiador, doutorando pela Unicamp e entusiasta de tecnologias. Nas horas vagas dedico-me ao canal História da História.

RIOJAS, Carlos; RINKE, Stefan (org). Historia Global: Perspectivas y Tensiones. Verlag Hans-Dieter Heinz: Akademischer Verlag Stuttgart, 2017, 158p. Resenha de: ROTA, Alesson. A história global e a mediação das teorias. HH Magazine – Humanidades em Rede. 20 set. 2020. Acessar publicação original [IF].

The politics of vaccination: a global history | Christine Holmberg, Stuart Blume e Paul Greenough

A literatura recente do campo da saúde tem se dedicado amplamente ao debate sobre a relação entre proposições que ganham o tom de “medidas globais” e as tensões referentes à aplicação de tais modelos em nível local. A ideia de que determinados agravos e temas podem ser pensados em termos de uma “saúde global” impõe a gestores, profissionais da ponta e pesquisadores reflexões sobre os limites da relação entre o aspecto local das práticas de saúde e suas conexões com outras instâncias. Nesse sentido, um ponto central parece emergir: como articular estratégias globais a contingências e caracteres locais? Ou melhor, quais os limites das políticas e práticas no contexto da saúde global? As perguntas são importantes em um momento no qual as vacinas estão no centro de críticas e ataques de grupos negacionistas, sobretudo religiosos. Ponderações eloquentes a esses questionamentos e ao negacionismo científico contemporâneo estão na base da coletânea The politics of vaccination: a global history , organizada por Christine Holmberg, Stuart Blume e Paul Greenough.

O livro é dividido em três partes temáticas e prioriza estudos que versam sobre as décadas de 1950 em diante, abrangendo, assim, experiências de regiões pertencentes a Ásia Oriental, África Ocidental, Américas e Europa. A primeira seção, “Vaccination and national identity”, acompanha políticas de vacinação e sua contribuição para o fortalecimento das identidades nacionais. Nela se destacam três estudos. Paul Grennough investiga a contribuição do combate à varíola no Paquistão Oriental em 1958, durante a Guerra Fria, para o modelo de erradicação global da doença. Em seguida, Niels Brimnes contextualiza os movimentos de oposição à campanha contra tuberculose (BCG) na Índia nos anos seguintes à independência. Posteriormente, Dora Vargha Examina a ação dos Estados comunistas da Europa Oriental e aponta como o combate contra a poliomielite na Hungria, em 1959, serviu de inspiração à OMS, no ano seguinte. Leia Mais

La história como campo de batalla: interpretar las violencias del siglo XX / Enzo Traverso

TRAVERSO Enzo
Enzo Traverso / Foto: Estaeslalibreria /

TRAVERSO E La Historia como campo de batallaA violência é um fio condutor viável para se compreender a historização do século XX? E ainda: o “campo de ruínas” em que consiste o século em questão oferece condições para a produção de conhecimento, enquanto fonte para reflexões no âmbito da Teoria da História?

As perguntas com que esta resenha se inicia podem ser respondidas por meio do livro La História como campo de batalla: interpretar las violencias del siglo XX, de Enzo Traverso, publicado originalmente L’histoire comme champ de bataille: interpréter les violences du XXe siècle, em Paris, em 2011, sem ainda tradução para o português. Objeto de investigação de um variado número de historiadores, o século XX se recusa a uma definição final: “A era dos extremos” (HOBSBAWM, 1995), “o tempo das crises” (REIS FILHO; FERREIRA ZENHA, 2000), “o século esquecido” (JUDT, 2010), “o século sombrio” (TEIXEIRA DA SILVA, 2004) são algumas das definições cunhadas pela historiografia recente. Traverso não destoa dessas acepções, definindo-o, sobretudo, como a era da violência, das guerras totais, das revoluções que naufragaram e das utopias que desmoronaram (TRAVERSO, 2012, p. 325).

Enzo Traverso é um historiador italiano – professor de Ciência Política na Universidade Cornell em Nova Iorque – conhecido, principalmente, por trabalhos acerca da primeira metade do século XX e de seus regimes totalitários. O livro objeto desta resenha é uma compilação de artigos de origens distintas que se relacionam por abordarem um mesmo objeto: os debates historiográficos em torno das violências do mundo contemporâneo, tendo como pano de fundo as interpretações globais do século XX como a idade das guerras, dos totalitarismos e dos genocídios. Desse modo, o autor problematiza os fenômenos político-ideológicos que influenciaram o desenrolar do conjunto de experiências que definem o status calamitoso desse século, como as Revoluções de 1789 e 1917, o Holocausto judaico e os movimentos anticolianiais.

O ponto de partida do historiador é o ano 1989, que, em seu critério analítico, não se inscreve na continuidade de uma temporalidade linear; ao contrário, indica um limiar, finaliza uma época para dar início à outra. A queda do muro de Berlim constitui um momentum de uma época de transição que mudou radicalmente a paisagem intelectual e política do mundo, modificando vocabulários e substituindo antigos parâmetros. Assim, conclui que 1989 alterou não apenas a geopolítica europeia, mas a maneira de interpretar e escrever a história do século XX (TRAVERSO, 2012, p. 15).

Entre as alterações mais significativas na operação historiográfica, o autor destaca três: o auge da História Global, o retorno do acontecimento e o surgimento da memória. São esses três momentos que estruturam os oito capítulos do livro. A História Global, ele explica, não é uma história das relações internacionais que analisa a coexistência e os conflitos entre Estados soberanos, mas um campo historiográfico que observa o passado como um conjunto de interações, de intercâmbios materiais e transferências culturais que estruturam as diferentes partes do mundo em um conjunto de redes. O retorno do acontecimento como foco de atenção dos historiadores, por sua vez, é apontado como um epifenômeno do fim da Guerra Fria em contraponto à sua redução a uma “agitación da superficie” levada a efeito pela perspectiva de longa duração. Finalmente, no período pós-Guerra Fria, vê-se a eclosão de uma infinidade de memórias, fruto das experiências pessoais das vítimas dos diferentes conflitos ocorridos ao longo do século, que assumirão um espaço privilegiado nas novas abordagens, tanto como fonte quanto como objeto de investigação histórica.

Estruturalmente, o “campo de batalha”, a que Traverso se refere no título da obra, forma-se no âmbito teórico de, pelo menos, dois modos: por um lado, Traverso evidencia que a verdade histórica está em constante tensão com a realidade; por outro, atesta a emersão de perspectivas conflitantes com as teorias tradicionais de interpretação dos fenômenos do século XX. Por exemplo, o entendimento que define as potências europeias como “centro do mundo” é relativizado, sugerindo reconsiderar o papel dos outros continentes no desenrolar dos eventos que marcaram o século XX.

No entanto, para o autor, escrever, tendo como ponto de partida metodológico a História Global, não significa simplesmente conceder maior importância ao mundo extra europeu em relação com a historiografia tradicional, mas sim mudar de perspectiva, multiplicar e cruzar pontos de observação (TRAVERSO, 2012, p. 17). Embora essa seja a defesa do autor, ele mesmo encontra certa dificuldade de pô-la em prática, visto que a centralidade de sua investigação está circunscrita à Europa, com exceção de algumas poucas passagens em que aborda algum aspecto relativo aos Estados Unidos. Mesmo o cruzamento de pontos de observação, como sugeriu, continua seguindo uma lógica essencialmente europeia, o que se revela, de algum modo problemático, no tratamento de um tema tão global quanto a violência.

No que diz respeito ao que considera outra mudança significativa, defende que o fim da Guerra Fria permite um paralelo entre a mudança geopolítica e o que se esboça ao mesmo tempo na historiografia. Traverso refere-se, nesse momento, à reavaliação do acontecimento na escrita da história. No livro, questiona a perspectiva de continuidade, alertando para a importância de se recuperar as inflexões da história. Para ele, o século XX se revelou como a idade das rupturas repentinas, fulminantes e imprevisíveis. As tendências estruturais criam as premissas de bifurcações, crises, cataclismos históricos (guerras, revoluções, violência em massa), mas não predeterminam seu desenvolvimento ou fim. A turbulência da Europa em 1914, a Revolução Russa, a chegada de Hitler ao poder, o colapso da França em 1940, o colapso do “socialismo real” no outono de 1989 representam rupturas que mudaram o curso do mundo, mas cuja emergência não era inevitável (TRAVERSO, 2012, p. 17).

Esses questionamentos colocados pelo historiador são nítidos nos capítulos dedicados ao nazismo e à comparação dos genocídios, acontecimentos que, de acordo com suas proposições, condensam várias ordens de temporalidade. Se o caráter repentino da Shoah põe em questão os paradigmas da história estrutural; o extermínio nazista, como um ponto culminantemente paroxístico de um conjunto de tendências que remontam ao século XIX, exige uma abordagem fundamentada na análise de longa duração. Isso fez, consoante argumenta o autor, com que os investigadores fossem obrigados a renovar sua reflexão sobre a articulação das temporalidades históricas (TRAVERSO, 2012, p. 18).

Além do que já fora mencionado em relação às suas contribuições à Teoria da História, ou seja, a História Global e o retorno do acontecimento, a violência que atua como fio condutor das experiências históricas do século XX pode levar a historiografia a uma série de outros questionamentos. Entre eles, a implicação subjetiva do historiador, a localidade do discurso, o distanciamento entre o historiador e o objeto, e a intersecção entre história e memória.

No capítulo “Exilio e Violencia”, Traverso defende que uma história do pensamento crítico não pode ignorar a contribuição dos intelectuais exilados, pois eles são “sismógrafos sensibles” dos conflitos que atravessam o planeta (TRAVERSO, 2012, p. 237). Em 2004, já havia proposto algo semelhante sobre a contribuição dos exilados para a História do século XX. Na ocasião, salientou que um dia a história do século XX teria de ser relida por meio do prisma do exílio; do exílio social e político, mas também e, sobretudo, do intelectual (TRAVERSO, 2004, p. 05), tarefa à qual tem também se dedicado.

A posição de estrangeiros, de apátridas ou desarraigados resulta em um observatório privilegiado dos cataclismos que afetam o mundo. A distância, nesse entendimento, modifica as perspectivas, acentua ou neutraliza a empatia e o olhar crítico dos observadores. Em razão disso, o efeito do “estranhamento” pode revelar-se frutífero (TRAVERSO, 2012, p. 238), perspectiva explorada também por Carlo Ginzburg na obra “Olhos de madeira: nove reflexões sobre a distância”, em que propõe uma espécie de “hermenêutica da distância”.

A transformação de perspectiva gerada pela distância afeta a escrita da história, uma vez que modifica a própria concepção de história do autor. Ademais, faz com que ele reconheça a impossibilidade de desassociar a interpretação do passado de uma luta inscrita no presente, a partir da constatação de que “no hay historiador sin principio y sin visión del mundo” (TRAVERSO, 2012, p. 240).

Uma observação semelhante seria feita por Estevão Martins em um ensaio publicado em 2006 em que se dedicou a analisar o século XX. Martins aponta que tem-se no século XX três grandes veios de afirmação da elaboração teórica da história como ciência: 1) a primeira, até o início da década de 1930, que se dedica à legitimação da história diante do paradigma das ciências naturais experimentais; 2) a segunda, que vai da fundação dos Annales em 1929 aos anos 1960, que se imerge na pesquisa empírica, sem se embaraçar de considerações epistemológicas e 3) uma terceira, que nos interessa aqui, desde há cerca de meio século, que articula a fundamentação teórica com a realização prática, independente da filiação doutrinária eventual (MARTINS, 2006, p. 3). O itinerário da legitimação do conhecimento histórico em seu formato científico, defende Martins, é o desafio e a aventura da historiografia do século XX (MARTINS, 2006, p. 2).

Para Traverso, a concepção de história como um exercício puramente científico é questionável, já que a interpretação do passado acontece em relação com a condição social do historiador. Sobre esse tema, analisando a historiografia alemã, italiana e espanhola, o autor conclui que no exílio, por exemplo, “las fronteras entre el erudito y el militante se vuelven porosas” (TRAVERSO, 2012, p. 243). A consequência disso é que a condução da escrita da história como um “dever político” pode obstaculizar uma reconstrução mais profunda, bem como crítica do passado, embora seja capaz de revelar a maneira como as escolhas políticas e as experiências individuais dos historiadores interferem nas suas interpretações.

Por fim, Traverso propõe-se à recorrente e, ainda necessária, reflexão acerca dos pontos de convergência e divergência entre história e memória. A intersecção entre os dois conceitos se dá em razão de que tanto a memória como a escrita da história são modalidades de elaboração do passado. No entanto, não se tratam de conceitos iguais: a memória é um conjunto de recordações individuais e de representações coletivas do passado; enquanto que a história consiste em um discurso crítico do passado, uma reconstrução de acontecimentos passados tendente à exame contextual e à interpretação. As relações entre história e memória se tonaram mais complexas, às vezes difíceis, mas sua distinção nunca foi questionada, e seguem sendo uma conquista metodológica essencial nas ciências sociais (TRAVERSO, 2012, p. 282).

A dificuldade em separar história e memória caracteriza nossa época enquanto encruzilhada de diferentes temporalidades, lugar de olhos cruzados em direção a um “acontecido” vivo e arquivado ao mesmo tempo (TRAVERSO, 2012, p. 284). Além disso, caracteriza o historiador do tempo presente, que ora é testemunha, ora é investigador de um mesmo tempo. A escrita da história do século XX, reflete Traverso, é um exercício de “equilíbrio sobre uma corda suspendida entre estas duas temporalidades”. Por um lado, seus atores adquiriram, por sua qualidade de testemunhas, um status inquestionável de fonte para os investigadores; por outro, estes últimos trabalham sobre uma matéria que interroga constantemente suas vivências pessoais, questionando sua própria posição (TRAVERSO, 2012, p. 284).

Conclui o autor que, no cenário devastado que é o século XX em decorrência de guerras, totalitarismos e genocídios, a vítima passa a assumir a centralidade, dominando a nossa visão da história. Nessa reatualização de fontes, sujeitos e escritores, o passado e o futuro se cruzam, criando-se e reinventando-se se mutuamente. (TRAVERSO, 2012, p. 284).

Cabe-nos lembrar que é nesse mesmo século como defendeu Martins (2006, p. 2) “que se realiza a dupla afirmação do campo da história: 1) como capaz de produzir conhecimento confiável 2) porque dotou-se de um a sustentação teórica sólida”, em que pese o caráter mediado da experiência histórica. E ainda, é nele que vê-se crescer a “abordagem sistemática da historiográfica como objeto de pesquisa”. O século XX, na sua condição de campo de ruinas, provou-nos Traverso, é, sem dúvidas, produtor de conhecimento no âmbito da Teoria da História, e a violência um dos fios condutores possíveis (e recomendável) para compreensão dessa era devastada.

Referências

HOBSBAWM, Eric. Era dos extremos: o breve século XX. São Paulo: Cia das Letras, 1995.

FERREIRA, Jorge; REIS FILHO, Daniel Aarão; ZENHA, Celeste (orgs) O século XX. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000.

GINZBURG, Carlo. Olhos de madeira: nove reflexões sobre a distância. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.

MARTINS, Estevão de Rezende. História e Teoria na Era dos Extremos. Revista de História e Estudos Culturais, vol III, ano III, n. 2, abril/maio/junho 2006.

TEIXEIRA DA SILVA, Francisco Carlos (org). O século sombrio. Rio de Janeiro: Campus, 2004.

TONY, Judt. Reflexões sobre um século esquecido 1901-2000. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010.

TRAVERSO, Enzo. Cosmópolis figuras del exilio judeo-alemán. México: UNAM, 2004.

Thais Rosalina de Jesus Turial –Doutoranda pelo Programa de Pós-graduação em História da Universidade de Brasília (PPGHIS-UnB). Currículo Lattes: <http://lattes.cnpq.br/5421508661749527>. E-mail: [email protected].


TRAVERSO, Enzo. La história como campo de batalla: interpretar las violencias del siglo XX. Buenos Aires: Fondo de Cultura Económica, 2012. Resenha de: TURIAL, Thais Rosalina de Jesus. A História é um campo de batalha. Em Perspectiva, Fortaleza, v.6, n.2, p.237-242, 2020. Acessar publicação original [IF].

 

Pasteur’s empire: bacteriology and politics in France, its colonies and the world | Aro Velmet

Fruto de tese de doutorado, Pasteur’s empire combina ferramentas analíticas próprias à história da ciência, à história da medicina e à história global a fim de mapear as consequências políticas e científicas do encontro entre a microbiologia e o império francês. Cronologicamente, o livro abarca uma faixa de tempo compreendida entre o início da colonização francesa na Indochina, na última década do século XIX, até a capitulação de 1940, que encerra oficialmente a Terceira República. Geograficamente, embora tenha uma pretensão quase totalizante expressa em seu título, o livro recobre sobretudo a França e as colônias da Indochina (atuais Vietnã, Laos e Camboja), da Tunísia e do Senegal (este último parte integrante da então África Ocidental Francesa).

Aro Velmet trabalha um tema em particular em cada capítulo, indo desde a gestão de doenças epidêmicas como a peste bubônica, a febre amarela e a tuberculose em alguns desses espaços coloniais, passando pela tentativa dos pasteurianos em estabelecer um monopólio sobre a produção e venda de álcool na Indochina ou pela transformação geral dos pasteurianos, “monges ascetas” na metrópole, em grandes capitalistas coloniais. Após essa viagem por pelos menos três continentes ao longo de quase 50 anos, Velmet conclui que essa época pasteuriana na história da medicina possui características muito próximas da era atual: trabalho em rede, conectado ao mercado global e capaz de fornecer soluções orientadas para as causas biológicas e não sociais dos problemas. Em razão dessa similaridade, Velmet afirma que o deslocamento da microbiologia da França para as suas colônias desvela uma possível origem da saúde global. Leia Mais

What Is Global History? – CONRAD (FH)

CONRAD, Sebastian. What Is Global History? Princeton: Princeton University Press, 2016. 299p. Resenha de: CALÇA, Elaine. História global: uma solução ou um retorno? Faces da História, Assis, v.6, n.1, p.478-482, jan./jun., 2019.

A tentativa de construir uma história não eurocêntrica surge a partir da crise contemporânea do Estado Nacional e dos acontecimentos do final do século XX, consequentemente, surgiram diversas abordagens dentro da historiografia, como história atlântica, história transnacional e história global. Dentre estas correntes, a história global demonstra ser a alternativa menos empregada pelos historiadores brasileiros. Diante disso, esta resenha pretende apresentar o trabalho publicado pela editora da Universidade de Princeton, em 2016, do renomado teórico do campo da História Global na Alemanha, Sebastian Conrad, professor da Frei Universität Berlin e do programa de pós-graduação em História Global na mesma instituição.

A obra de Sebastian Conrad parte da necessidade de esboçar os motivos da popularidade repentina que a História Global ganhou em espectro mundial no início do século XXI dentro do meio acadêmico, em especial, no campo da História; revistas como The American Historical Review e Past & Present estão publicando estudos nessa área, e em 2006 foi fundado pela Cambridge o Journal of Global History.

O trabalho de Conrad nos apresenta uma perspectiva atual da história que, segundo nossa análise, se contrapõe diretamente tanto à tradição historiográfica do século XX, quanto à tradição dos antropólogos, filósofos e cientistas alemães do século XIX, desde Immanuel Kant até Alexander von Humboldt e Adolf Bastian. Enquanto a tradição antropológica alemã alegava que as culturas africanas não possuíam história e, portanto, eram estáticas, a História Global, segundo Conrad, consiste na saída do continente europeu e na busca da história a partir do enfoque nos sujeitos, ideias e comércio em movimento.

Em geral, o autor defende esta corrente por considerar que a tal engaja-se em quebrar a relação estabelecida entre os historiadores do final do século XIX e o Estado Nação, relação esta que é fruto da fundação da História enquanto disciplina.

Entretanto, sabe-se que a reivindicação em história de uma metodologia relacional ou comparativa é presente em outras vertentes como História Comparativa, História Cruzada, História Transnacional, História Atlântica e esta reivindicação é justamente vista como meio de desvincular a atual disciplina com as instituições estatais, as quais a história vinculava-se durante o século XIX e parte do século XX. Essas correntes também tencionam abordar o tema e o objeto de forma diferente da tradicional, dominantemente presente na historiografia. Apesar desse anseio, José d’Assunção Barros pontua que a intencionalidade de transgredir ou se desvincular com a abordagem tradicional não implica no sucesso garantido do trabalho, já que os historiadores também estão inseridos em “categorias e formas estereotipadas de pensamento que os amarram” que exercem “pressões que sobre eles” (BARROS, 2014, p. 279), ou seja, também produzimos estereótipos e pré-conceitos de nosso tempo.

Na introdução o autor apresenta as diversas formas em que a História Global se apresenta, auxiliando o leitor a se orientar dentro desse debate e a definir o termo não enquanto objeto de estudo ou metodologia específica, mas como perspectiva que enfatiza as interações ou transformações estruturadas em nível global. Dividido em introdução e 9 capítulos, este livro é um manual que sistematiza como a história global foi e é utilizada pelos historiadores, nos apresentando os problemas e apreensões que a escrita da história, dentro deste campo, pode encontrar, bem como algumas possíveis soluções.

“História em sua maior duração foi sinônimo de história nacional” (CONRAD, 2016, p. 3), afirma Conrad nas primeiras páginas da introdução, onde explicita que a abordagem da história global objetiva suprimir tal história, já que o Estado Nação tem sido tão problematizado pela historiografia desde o final do século XX. O objetivo não é escrever uma história total do planeta ou ser um sinônimo de macro-história, mas uma tentativa de ressaltar conexões globais e condições estruturais que, na verdade, sempre houve, mas em níveis de impacto diferentes. Sendo assim, tudo pode se tornar história global. Sobre esta perspectiva, o trabalho, enquanto conceito, é uma das temáticas que pode ser analisada numa perspectiva global, por exemplo, como parte da economia da escravidão, que estabeleceu relações entre Brasil, Angola e Portugal.

O capítulo II, “Historiografia Ecumênica”, apresenta ao leitor autores que teriam uma visão planetária da história, como o otomano Mustafa Ali (1541–1600) ou o historiador mongolês Tahir Muhammad (ca. 1560). Conrad (2016) afirma que esses autores teriam produzido uma História Mundial na época da hegemonia ocidental, entretanto, não obtiveram reconhecimento, pois eram considerados historiadores amadores. Ampliando o conceito de história global, segundo o autor, Heródoto e Ibn Khaldun também já teriam escrito uma história considerada planetária. Além disso, pesquisa olhares de pensadores periféricos sobre a Europa, um dos temas deste capítulo, como o exemplo do livro História da Índia Ocidental (Tarih-i Hind-i garbi), escrito em Istambul, em 1580, por um turco em anonimato, que tentava compreender a inesperada ampliação de horizonte e do dilema cosmológico apresentado pela descoberta do “Novo Mundo”.

Ademais, o autor reconhece que fazer uma história global não seria algo novo, e cita que a teoria da dependência produzida na América Latina, os estudos subalternos e de gênero, o pan-africanismo e o movimento de negritude, produzidos por autores como Frantz Fanon (1925-1961), Aimé Césaire (1913-2008) e Léopold Senghor (1906-2001), seriam o ponto de partida para ou uma tentativa de produzir uma história global.

História comparativa, transnacional, estudos pós-coloniais, concepção de múltiplas modernidades e teoria dos sistemas mundiais são abordados no capítulo III, “Disputa de Abordagens”. Estas correntes são colocadas em diálogo com a História Global pelo autor. Ele explicita a influência destas sobre os historiadores globais (por vezes sem reconhecimento), que são potencialmente usadas para escrever uma narrativa global coerente. Cada uma dessas abordagens é apresentada também com seus limites. No conjunto da produção de história comparativa, os estudos permaneceram vinculados ao conceito de diferentes “civilizações” e muitas vezes foram escritas a partir da perspectiva da cultura europeia. A concepção de múltiplas modernidades pressupõe a existência de vários modelos de modernidade, que não são construídos sobre o paradigma da ocidentalização, todavia esta metodologia acaba por negligenciar conectividades globais. Para o autor, os estudos pós-coloniais e as múltiplas modernidades são abordagens historiográficas que derivam da falta de satisfação com a teoria da modernidade, mas também possuem diversas limitações.

Essas vertentes possuem nomes diversos que, no entanto, têm mais semelhanças do que divergências, as quais geraram um debate ainda atual. O uso do método comparativo, por exemplo, acabou sendo um dos argumentos para que estas correntes se diferenciassem. Sean Purdy, em seu artigo A História Comparada e o Desafio da Transnacionalidade, apresenta que historiadores da história transnacional negam o método comparativo. O autor nos propõe uma crítica não ao conceito de transnacionalidade, mas como este é utilizado (PURDY, 2012, p. 65).

Ainda dentro desse panorama, Sebastian Conrad afirma que o marxismo, apesar de ser vulgarmente reconhecido como uma abordagem que daria ênfase aos estágios de desenvolvimento, e seu método materialista histórico, apresentaria análises das muitas interações que ocorrem em nível global ao analisar o desenvolvimento social, o qual vai ao encontro com a proposta dialética apresentada também pela história global.

Diante dos apontamentos críticos que o autor faz as outras abordagens teórico-metodológicas citadas até agora, o capítulo IV, “História Global como uma abordagem distinta”, defende que a História Global responde a urgente necessidade de se repensar a história ao propor a análise de fenômenos, processos e eventos sob o aspecto global, os quais permitem ver relações entre histórias e experiências em tempo e espaço diversos, o que não seria possível dentro da investigação tradicional da história. Os historiadores que desejarem utilizar a história global, segundo o autor, deverão não apenas fazer conexões entre os espaços, mas também revisitar as abordagens e métodos citados anteriormente para a elaboração de uma nova história.

As diferenças entre história global e história da globalização serão apresentadas ao leitor no capítulo 5, bem como as potencialidades que os historiadores possam encontrar ao utilizar tal abordagem para analisar as estruturas e as interações globais. Neste momento do texto, são apontados seis campos de pesquisa como já cristalizados na História Global, são eles: História do Oceano; dos Bens; da Migração; da Nação; História Ambiental e dos Impérios. Em relação a última área, destaca-se que a interpretação trazida pela História Global tem mudado substancialmente a área de estudos sobre Imperialismo, ao olhar para aspectos como as concepções de domesticidade, família, infância, sexualidades e masculinidades.

O autor retoma a necessidade dos historiadores repensarem o tempo e o espaço de formas alternativas nos capítulos 6 – “Espaço segundo a História Global”, como pela micro-história ou pelas interações networks; e 7 – “Tempo segundo a História Global”, com a ideia de curta e longa duração, metodologia consagrada desde a obra de Fernand Braudel (1902-1985), bem como os revestimentos (ou escalas) temporais – Zeitschichten, de Reinhart Koselleck (2000).

Em “Posicionamentos e abordagens centradas”, capítulo 8, o autor questiona se uma versão transcultural da história é acessível em todo o mundo, bem como realça a importância das ciências sociais a despeito de sua origem europeia. Tal discussão é mantida no capítulo 9, “Os conceitos da história global e a construção de mundo”, onde o autor aborda o eurocentrismo, a posicionalidade, a ascensão, a queda e o retorno ao modelo de civilizações.

No último capítulo, “História Global para quem? A Política da História Global”, se discute as diferenças entre escrever sobre globalização e a globalização enquanto uma ideologia presente na política. Esta diferenciação pode ser tênue e utilizada acriticamente, levando a equívocos em relação às desigualdades sociais que, além de econômico e estrutural, também está presente nas tradições historiográficas ocidentais, orientais e africanas, que acaba por prevalecer a historiografia eurocêntrica em detrimento das demais. Além da contribuição da hegemonia do inglês como um instrumento de disseminação do conhecimento que é produzido em um espaço delimitado, ou seja, por instituições e mídias europeias e americanas, sobre todo o mundo.

Por fim, é importante ressaltar que as versões da obra em inglês e em alemão (Globalgeschichte, publicada pela editora C.H. Beck em 2013), apesar de possuírem o mesmo título, são diferentes entre si. É importante salientar que na edição de 2016, a qual nos baseamos para esta resenha, o autor pôde revisar, acrescentar capítulos e descartar outros.

Referências

BARROS, José d’Assunção. História cruzada: considerações sobre uma nova modalidade baseada nos procedimentos relacionais. Anos 90, Porto Alegre, v. 21, n. 40, p. 277-310, 2014.

CONRAD, Sebastian. Globalgeschichte: Eine Einführung. München: C.H. Beck Verlag, 2013.

_________. What Is Global History? Princeton: Princeton University Press, 2016.

KOSELLECK, Reinhart. Zeitschichten. Studien zur Historik. Frankfurt/M.: Suhrkamp Taschenbuch Verlag 2000.

PURDY, Sean. A História Comparada e o Desafio da Transnacionalidade. Revista de História Comparada, UFRJ, Rio de Janeiro, p. 64-84, 2012.

Elaine Calça – Graduada pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP, Assis-SP, Mestranda pelo Programa de Pós-Graduação em História e docente bolsista de alemão do Departamento de Letras Modernas na Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP, Assis-SP. Bolsista de mestrado CNPq. E-Mail: [email protected].

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What is Global History?

Um dos temas mais discutidos nos departamentos de humanidades ultimamente é a História Global. Nos Estados Unidos e no mundo anglo-saxão em geral, tem havido uma proliferação de trabalhos que procuram adotar a história global seja como uma perspectiva, seja como um objeto de estudo. Centros de pesquisa como o Center for Global history na Universidade de Oxford, o Institute for Global and Transnational History na Universidade de Shandong (China) e o centro para História global da Freie Universitat Berlin; publicações como o Global History Journal e o New Global Studies Journal [1] e ainda redes de pesquisadores tal qual a Global History Collaborative e a European Network in Universal and Global History demonstram o crescente interesse pela temática que aqui tratamos [2].

Para o historiador Sebastian Conrad, a História global nasceu da convicção de que os instrumentos que os historiadores vinham utilizando para explicar o passado já não eram mais suficientes. Há duas razões para isso, dois pecados originais das ciências humanas que foram formadas no século XIX. Primeiro, elas foram fundadas a partir de uma ideia de estado-nação, de um “nacionalismo metodológico”, isto é, uma tendência a considerar o Estado-Nação como unidade fundamental de análise. E o segundo pecado original seria o eurocentrismo, ou seja, a tendência das ciências humanas de ver a Europa como o motor da história mundial.

No entanto, não é possível dizer que os historiadores globais foram os primeiros a reagirem a essas limitações. Modelos de História-Mundo já existiam desde Heródoto, Sima Qian e Ibn Khaldun, pois eles produziram narrativas que pensavam a história de seus próprios povos mas também a de outros, mesmo que fossem para constratar civilização com barbárie. Mais recentemente, a História comparada, as teorias de sistema-mundo e os estudos pós-coloniais já desafiavam a compartimentalização arbitrária do passado.

Assim, se temos consciência das origens remotas das formas de pensar globalmente o passado, resta saber o que distingue a Global History dessas outras abordagens? O que, afinal, é a História Global? Essa é a questão que o livro de Sebastian Conrad busca responder.

Sebastian Conrad é professor de História na Freie Universität Berlin, interessado em abordagens de História global e transnacional, em História da Europa Ocidental, da Alemanha e do Japão. Outras publicações conhecidas suas são German Colonialism: A Short History e Globalisation and the Nation in Imperial Germany. Desde 2006, ao menos, o autor vêm publicando artigos, capítulos e livros de cunho teórico-metodológico sobre História global, como o que aqui tratamos, What is Global History?.

No primeiro e introdutório capítulo deste livro, o autor contextualiza brevemente o surgimento dessa abordagem, afinal, provavelmente não haveria História global sem globalização, e disserta sobre o por quê a maneira como os historiadores reconstrõem o passado está mudando, na medida da crescente integração do mundo presente. Além disso, ele aponta três variedades de História Global, a ver: História de Tudo, História das Conexões e História baseada no conceito de Integração.

Na sequência, em “A short history of thinking globally”, ele reconstitui a trajetória das formas de pensar a história para além das fronteiras nacionais, desde as narrativas ecumênicas na Antiguidade e Idade Média, na Época Moderna, a partir da hegemonia ocidental no século XIX, chegando até a World History do Pós-Guerra.

No terceiro capítulo, Conrad mostra como diferentes abordagens mais recentes contribuiram para construir visões do passado que ultrapassam a fronteira do Estado-Nação. Uma delas, a História Comparada, que busca olhar para similitudes e diferenças entre dois ou mais casos, bem como estabelecer conexões entre eles sempre que possível. Ainda, há a História Transnacional, surgida na década de 90, e que pode ser considerada uma mãe da Global History, pois já procurava abertamente transcender a o Estado-Nação. Adicionamos a teoria dos sistemas-mundo que não busca ver a nação, mas blocos regionais e sistemas como unidades primeiras de análise, enfatizando a integração de mercados (economia-mundo) e a integração política em extensos territórios (império-mundo). E, enfim, os estudos pós-coloniais e as modernidades múltiplas que contribuiram, cada um a sua maneira, para crítica ao eurocentrismo.

No capítulo 4, Sebastian Conrad finalmente oferece ao leitor uma definição de História Global enquanto uma perspectiva particular, distinta dos estudos pós-coloniais, da História Comparada e das modernidades múltiplas. Para ele, há um foco nos contatos e interações que marcam os trabalhos dessa corrente. A palavra-chave mais associada a essa linha é a “conexão”, porém a busca por redes e nexos globais não é suficiente para delimitar o que é História global. A Global History, além disso, explora espacialidades alternativas (parte de uma “spatial turn”), busca entender unidades históricas (civilização, nação, família, etc) sempre em relação a outras e é crítica, ou pelo menos auto-reflexiva, quanto à questão do eurocentrismo. No mais, os historiadores globais se distinguem pelo exame de transformações estruturais em larga escala e pela tentativa de rastrear cadeias causais a nível global. Essas são algumas mudança heurísticas que marcam a passagem dos antigos modelos de História-mundo para a atual História Global.

No quinto capítulo, o autor trata da relação entre História e integração global. Deve-se lembrar que História Global não é uma história da globalização, mas a integração global é o contexto em que o historiador, com essa perspectiva, trabalhará. Obviamente, o impacto das conexões a serem estudadas depende do grau de integração de sua época.

Na parte seguinte, Conrad disserta, em dois capítulos, a respeito do espaço e do tempo. Em primeiro lugar, existem algumas espacialidades privilegiadas para historiadores globais. Os oceanos, por exemplo, permitiram interconexões econômicas, políticas e culturais por toda história humana e as redes, enquanto partes amplas de estruturas de poder, são objetos comuns nesses estudos. Mas nem sempre história global quer dizer narrativas planetárias, é possível fazer uma micro- história do global, se quisermos olhar como processos amplos se manifestam localmente. Dessa maneira, uma consequência imediata de se transcender as fronteiras nacionais é ter que adotar uma outra periodização, é preciso periodizar o passado não só localmente, como também globalmente.

Nos três últimos capítulos, o autor se debruça sobre a questão dos “lugares de fala”, ao observar que, mesmo que historiadores queiram contar uma história global, eles sempre o fazem de uma origem geográfica em particular. Além disso, ele mergulha na noção de “world-making” do filósofo Nelson Goodman. E conclui, num dos capítulos mais interessantes do livro, fazendo uma sociologia da Global History, ponderando os seus impactos políticos, seus desafios e horizontes.

Um dos méritos do trabalho de Sebastian Conrad é encontrar a originalidade de cada abordagem que ele trata, sem perder de vista as semelhanças entre cada uma delas. Como é comum nos bons trabalhos de historiografia e História intelectual, ele consegue estabelecer a relação entre os objetivos de cada escolha metodológica (seu programa) e seus resultados nas obras mais representativas de cada uma, às vezes lançando mão de críticas e apontando os limites de algumas perspectivas.

Ademais, Conrad faz um percurso que coloca a História Global ao lado de suas antecessoras, a insere em seu contexto acadêmico e político e a distingue de outras correntes históricas também avessas ao “nacionalismo metodológico”. Neste sentido, podemos dizer que o autor responde a pergunta do livro “ O que é História Global?” tanto diacronicamente, ao investigar as raízes da Global History até as narrativas ecumênicas de Heródoto e de outros, bem como sincronicamente, ao destaca-la de outras formas contemporâneas de narrativas transnacionais.

Por fim, o autor considera e analisa as diferente maneiras de se fazer História Global, na longa e curta duração, na ampla e pequena espacialidade. Ele enxerga a Global History não como uma tentativa de se fazer uma história de tudo, em escala planetária, mas como um perspectiva que não necessariamente exclui outras abordagens históricas como a marxista, a micro- história, os estudos pós-coloniais, etc. Justamente por ser um paradigma abrangente, talvez a História Global possa se consolidar nos meios acadêmicos do Brasil e do mundo. Como Conrad afirmou em tom otimista no final de seu livro: “O gradual desaparecimento da retórica do global irá então, paradoxalmente, assinalar a vitória da História Global como um paradigma” (p.235).

Notas

1. Além disso, revistas importantes como a American Historical Review e a Past & Present têm cada vez mais publicado artigos nesse campo.

2. Nos Estados Unidos, por exemplo, a História global vem respondendo a demandas de inclusão étnica no âmbito do ensino de História tanto nos níveis escolares quanto no superior. As tentativas (nem sempre sem reações) de substituição de cursos de “Civilização Ocidental” e “História dos Estados Unidos” por cursos de “História Global” vão no sentido de construir narrativas que dêem voz a todo o conjunto de imigrantes que construiram o país. Para um panorama desse debate, ver: ÁVILA, A. L. “A quem pertence o passado norte-americano?: A controvérsia sobre os National History Standards nos Estados Unidos (1994-1996)”, Anos 90, Porto Alegre, v. 22, n. 41, p.29-53, jul. 2015.

Filipe Robles – Graduando em História pela Universidade Federal Fluminense. E-mail: [email protected]


CONRAD, Sebastian. What is Global History? Princeton: Princeton University Press, 2016. Resenha de: ROBLES, Filipe. Escrevendo e pensando a História globalmente. Cantareira. Niterói, n.28, p. 235-237, jan./jun., 2018. Acessar publicação original [DR]

 

Storia globale. Un’introduzione – CONRAD (BC)

CONRAD, Sebastian. Storia globale. Un’introduzione. Roma: Carocci, 2015. 210p. Resenha de: PERILLO, Ernesto. Il Bollettino di Clio, n.5, p.55-60, giu., 2017.

Non considerata a rigore tra i segnali paratestuali, l’introduzione assolve a diversi compiti importanti: indicare le ragioni della trattazione del tema in oggetto; presentare il tema, esplicitando, se necessario, questioni, genesi, elementi; ricapitolarne riassuntivamente il contenuto.

Posta sulla soglia del testo, l’introduzione ne costituisce, dunque, la necessaria porta di ingresso: una mappa per la comprensione anticipata del territorio che vogliamo esplorare. In questo caso quello della storia globale: il libro di S.Conrad ci consente di averne una visionecomplessiva e articolata, capace di farci conoscereil tema ancora prima di averlo attraversatoconcretamente e utile proprio per esserne unaguida preventivamente efficace.

Un’introduzione, appunto.

Analizziamo la mappa/introduzione alla storia globale: ci mostra sostanzialmente tre luoghi e consente di rispondere a tre domande:  La sua genesi: quando e com’ è nata la storia globale?  Definizione e contenuti: che cosa è e di cosa si occupa la storia globale?  Gli aspetti critici: quali le controversie e le obiezioni più frequenti?  Cominciamo allora l’esplorazione, partendo dalla definizione di storia globale :  “A un primo approccio, ancora molto generale, la storia globale definisce una forma di analisi storica nella quale fenomeni, eventi e processi vengono inquadrati in contesti globali. Con ciò non si intende necessariamente che l’indagine venga estesa all’intero globo terrestre; per molti temi i punti di riferimento saranno più limitati. Ciò significa anche che la maggior parte degli approcci di storia globale non cerca di sostituire l’affermato paradigma storico-nazionale con un’ astratta totalità del “mondo”, cioè di scrivere una storia totale del globo. Spesso si tratta più facilmente della storiografia di aree limitate, quindi non “globali”, ma piuttosto con una consapevolezza delle relazioni globali”.1  La storia globale è dunque innanzi tutto una prospettiva2, che pone in primo piano altre dimensioni, altre domande attraverso le quali traguardare il passato. Ma è al tempo stesso un tema specifico del discorso storico: per una contestualizzazione globale è spesso importante rendere conto del grado e del carattere dei collegamenti delle reti globali.3

La genesi

Quando si chiede a uno storico/a una definizione, (di solito) la riposta è il racconto di una storia: la comprensione di un fatto è custodita nella sua genesi; nei contesti e/o nei processi dentro i quali esso si è manifestato.

S.Conrad dedica i capitoli iniziali della suaintroduzione alla storia della storia globale, a partire dall’antichità, per mostrare come i concetti di “mondo” e globalità siano storicamente mutevoli e diversi a seconda dell’epoca e dei luoghi. E mette a fuoco un elemento decisivo:

“ Come qualsiasi altra forma di storiografia, anche la storia globale è sempre plasmata dalle sue condizioni di nascita e dal contesto sociale concreto nel quale viene scritta. Una prospettiva di storia globale è, a questo riguardo, prima di tutto una specifica lettura delle relazioni globali, e non significa affatto che questa visione debba anche essere capita o addirittura accettata ovunque nel mondo. Così come i testi scolastici tedeschi, francesi o polacchi si possono differenziare (nei loro interessi tematici, in ciò che omettono, ma anche nelle interpretazioni degli eventi che trattano), altrettanto le rappresentazioni della storia mondiale possono variare talvolta in maniera sostanziale.

(…) Singoli temi, ad esempio lo schiavismo, mutano il loro significato sociale in maniera basilare, a seconda se esso venga preso in considerazione dalla prospettiva dell’Angola o della Nigeria, del Brasile o di Cuba, ma anche della Francia o dell’ Inghilterra. E anche il concetto di mondo rispettivamente rilevante non è affatto omogeneo in differenti società e nazioni.

Poiché la storia globale non è un soggetto naturalmente dato ma rappresenta una prospettiva, è tanto più importante considerare da dove essa viene osservata.” (p. 45)

Tre sono gli approcci che dagli anni Novanta del secolo scorso caratterizzano la storia globale:  -l’analisi di connessioni transnazionali(senza un esplicito riferimento al”mondo”): il riferimento è alla storiacomparata (ma non solo) e all’attenzioneprivilegiata alle macroregioni (OceanoIndiano, Oceano Atlantico, il continenteeuropeo nel suo complesso…); -la storia delle civiltà; -la pluralizzazione della storia globale emondiale: “conviene osservare la storia globale in una prospettiva di storia globale, per assicurarsi della relatività e della posizionalità di ogni lettura del passato globale.”(p. 63)

I contenuti

a.Gli ambiti

S.Conrad individua quattro ambiti didiscussione, all’interno dei quali attualmente gli storici riflettono sulla dinamica del mondo moderno:  -la teoria del sistema-mondo: dall’approccioteorico elaborato da I. Wallerstein negli anni Settanta alle critiche successive circa la possibilità del suo utilizzo ancora oggi: superamento della cornice analitica dello Stato nazionale, uso del concetto dell’incorporazione graduale in un contesto dominato dall’Europa, attenzione ai cambiamenti strutturali di natura macrostorica;  -i postcolonial studies per una lettura noneurocentrica del mondo moderno. Dopo aver messo in luce alcuni elementi critici della prospettiva postcoloniale, l’autore ne sottolinea tre aspetti ancora significativi: l’esistenza di spazi di ibridazione, acquisizioni locali, negoziazioni in condizioni coloniali accanto alla diffusione e all’adattamento come processi di transfer culturali di storia mondiale; l’attenzione alle dipendenze, interferenze, connessioni, superando l’idea che nazione e civilizzazione siano da considerare unità “naturali” della storia, contro una storiografia mondiale eurocentrica che legge lo sviluppo europeo/occidentale slegato dal resto del mondo; la considerazione che i processi di integrazione globale si realizzano entro rapporti e strutture di dominio;  -le analisi delle reti: l’epoca degli Statinazionali, basati sul controllo di territori pensati come superfici in relazione tra di loro, è stata sostituita dall’epoca della connessione (merci, informazioni, uomini e donne);  -il concetto di multiple modernities: al centrodell’attenzione la pluralizzazione delle linee di sviluppo della modernità e il ridimensionamento dell’assioma della secolarizzazione che avrebbe accompagnato ovunque i processi di modernizzazione.

Diversi, secondo Conrad, sono gli ambiti storiografici rivisitati in prospettiva di storia globale dalla storia economica a quella sociale, da quella geopolitica alla storia culturale e della vita quotidiana, per citarne alcuni. L’autore indica sei campi nei quali oggi la ricerca è particolarmente attiva: merci globali; storia degli oceani; la migrazione; gli imperi; la nazione; la storia dell’ambiente.

b.Le problematiche di riferimento

Quali le principali questioni della storiaglobale? Conrad le individua a partire dalle seguenti domande:  “Come si può scrivere una storia del mondo e delle sue connessioni che non sia eurocentrica e la cui logica non sia prestrutturata attraverso l’uso di concetti occidentali? Da quando si può propriamente parlare di un contesto globale, e di una storia della globalizzazione? Ha corso la storia del mondo sempre verso l’egemonia dell”’Occidente”, come essa si è manifestata nel XIX e XX secolo, e quali erano le cause di questa divergenza tra Europa e Asia? Infine, c’è stato un potenziale di modernizzazione anche al di fuori dell”’Occidente”, e quale significato hanno avuto le rispettive risorse culturali di società premoderne per la transizione a un mondo moderno globalizzato? “ (p. 95)  Sono questioni importanti: potrebbero (dovrebbero?) essere domande guida anche per la storia generale insegnata. Vediamole nel dettaglio:  Eurocentrismo  Per molto tempo nella storiografia mondiale l’Europa (e la master narrative eurocentrica) era vista come l’unico soggetto attivo.

Nell’assunzione critica dell’eurocentrismo si tratta di trovare un equilibrio tra il superamento di questa impostazione e la non marginalizzazione dell’Europa, distinguendo tra eurocentrismo come dinamica del processo storico (incomprensibile senza il riferimento all’egemonia dell’Europa occidentale e più tardi degli Stati Uniti, in un processo che non fu lineare e che ebbe inizio solo nel XIX secolo) ed eurocentrismo come prospettiva: presunti concetti analitici come nazione, rivoluzione, società o progresso trasformarono un’esperienza parziale, quella europea, in una lingua teorica universalistica, che prestruttura già l’interpretazione dei rispettivi passati locali.

Periodizzazione

Anche qui ha senso distinguere in modo euristico tra globalizzazione come processo e globalizzazione come prospettiva. In merito al primo punto: la maggior parte degli storici pone l’inizio di una connessione globale al principio del XVI secolo. La seconda possibile cesura di questa storia cade nel XIX secolo: fino ad allora il mondo era ancora un mondo delle regioni, strettamente unito da molteplici reti (reti commerciali e correnti migratorie così come comunanze culturali). Ma solo dalla metà del XIX secolo si giunse a una connessione sistematica, all’integrazione globale delle società, in ragione della sovrapposizione di «due macroprocessi reciprocamente dipendenti» (Charles Tilly) del mondo moderno: la formazione e la diffusione del sistema degli Stati nazionali e la creazione di un meccanismo universale di mercati e di accumulazione di capitale.

Si può parlare di una nuova fase della globalizzazione dal 1990? Conrad mette in discussione questa ipotesi, sottolineando come, in generale, una storia della globalizzazione non dovrebbe essere una narrazione lineare della sempre più grande connessione del mondo.

Altro aspetto fondamentale: la globalizzazione come prospettiva. Nel XIX secolo la globalizzazione ha presupposto la diffusione di norme euro-americane, in condizioni di colonialismo e di estensione universale dello Stato nazionale. All’interno di questo paradigma le differenze culturali erano state gerarchizzate e disposte in scala temporale: la connessione del modernizzazione complessiva e di un’omogeneizzazione graduale. Dal tardo XX secolo, sostiene Dirlik, ciò è mutato: la differenza culturale non appariva più come arretratezza, ma era concepita come alternativa a concetti eurocentrici o, meglio, universali. La globalizzazione e l’insistenza sull’ autonomia culturale andavano di pari passo. E ancora: l’aumento d’interazione globale addirittura rafforzava e produceva specificità culturali. Invece di una temporalizzazione della differenza, nel senso della costruzione di diversi gradi di sviluppo, il mondo globale del XXI secolo ha vissuto addirittura uno spatial turn. Progetti di modernità culturalmente diversi e concorrenti potevano dunque essere pensati come esistenti fianco a fianco contemporaneamente.

Asia e Europa

Perché l’Europa? In che cosa consisteva il Sonderweg (“la via speciale”) europeo? È davvero esistito?  Nella lunga discussione su questo tema, si possono distinguere essenzialmente tre posizioni. La prima rimandava a Marx e poneva in primo piano la questione dei modi di produzione. In opposizione a ciò, gli storici che si orientavano all’opera di Weber insistevano sui fattori culturali e istituzionali. Sia l’approccio classicamente marxista che quello weberiano privilegiano, secondo Conrand, modelli esplicativi endogeni e si limitano a una narrativa che spiega l’ascesa dell’Europa da sé stessa, internalisticamente.

A partire dai tardi anni Novanta è stata pubblicata una serie di lavori che hanno spostato il terreno sul quale era stata condotta questa discussione in maniera sostanziale. Conrad passa in rassegna i contributi revisionistici della cosiddetta California School (l’espressione designa storici come Pomeranz, Wong, Frank) che hanno proposto una spiegazione della dinamica dell’economia inglese non più endogena e non basata su lunghe continuità culturali e istituzionali. Al centro di questa lettura la prospettiva comparata, lo sguardo dalla Cina, l’accentuazione di interazioni transregionali, l’attenzione alle origini politiche della rivoluzione industriale e l’enfatizzazione di fattori casualmente coincidenti (conjunctural foctors).

Early modernities

In generale si tratta di capire quale significato possa essere attribuito, nel passaggio al mondo moderno, alle diverse risorse culturali di società non occidentali.

Gli approcci più interessanti della early modernity si riferiscono a un periodo dell’età moderna, che durò all’incirca dal 1450 al 1800, un’epoca durante la quale si costituirono le forze e le strutture che produssero trasformazioni in collegamento tra di loro, ma per nulla identiche, che poi sfociarono nel mondo del XIX secolo: solo nell’ambito dell’integrazione imperialistica e capitalistica del mondo dopo il 1800 esse furono gradualmente incorporate negli ampi processi che plasmarono il mondo moderno.

La più estesa argomentazione della early modernity è stata sinora formulata per la Cina e in generale per altri paesi asiatici (India e Giappone)  Le critiche  I progetti di storia mondiale e globale non sono stati esenti da critiche e obiezioni, anche se le riserve, in fondo, non hanno messo in discussione in modo radicale tale approccio. Nell’illustrare i principali limiti della ricerca di storia globale, l’autore vuole dare un contributo costruttivo per l’approfondimento di questa prospettiva.

La riserva metodologica

Gli storici globali non si basano su fonti primarie ma sono vincolati del tutto alla letteratura secondaria. Del resto questa è anche la situazione delle opere generali di storia nazionale che si basano su una visione d’insieme dei risultati di ricerche “locali”.

La strumentazione concettuale

Le nozioni/concetti con cui si scrive la storia delle connessioni globali sono quelle/i dela  “zavorra” eurocentrica: feudalesimo, nazione, religione…? Non c’è il rischio di omologare concettualmente situazioni diverse, e di appiattire differenze e particolarità? Il concetto di globalizzazione rischia di essere un macroconcetto poco utilizzabile in contesti specifici che presentano dinamiche diverse.

La finalizzazione teleologica  Le prospettive storico-globali corrono il rischio di costruire una genealogia dell’attuale processo di globalizzazione come svolgimento quasi inevitabile e naturale.

La storia e la connessione globale limitate alle sole relazioni con l’Europa

L’esempio è quello della storia dell’India che sarebbe stata liberata dalla stagnazione solo con il colonialismo, mentre già in epoca precoloniale intratteneva rapporti economici e culturali importanti con l’Africa, l’area araba e il Sud-Est asiatico.

La ricerca storica globale secondo Conrad deve affrontare una serie di questioni e evitare alcuni pericoli per poter sviluppare un proficuo dialogo critico al suo interno: il rischio di sostituire l’eurocentrismo con il sinocentrismo (come nel libro ReOrient di Frank); la sopravvalutazione dei fattori esterni, assegnando particolare valore al contesto spaziale nella spiegazione di eventi e processi; la sopravvalutazione delle connessioni, dei punti di contatto trascurando le particolarità; la feticizzazione della mobilità; la marginalizzazione degli approcci che soprattutto negli anni Ottanta hanno messo in evidenza l’importanza delle dimensioni storico-culturali e di storia del genere del passato; la tentazione di dimenticare che la storia globale è pur sempre una prospettiva per gettare un nuovo sguardo sul passato, non semplicemente un oggetto che esiste senza problemi.

Conrand insiste, come abbiamo già detto sulla pluralizzazione della storia globale e la “posizionalità” di ogni lettura del passato globale. E cita lo studioso della letteratura S. Krishan che mette in evidenza i meccanismi linguistici e narrativi attraverso i quali il mondo viene creato come unità connessa e interdipendente:

«Nelle discussioni recenti sulla globalizzazione viene tacitamente accettato che l’aggettivo “globale” si rivolga a un processo empirico, che ha luogo “lì fuori” nel mondo. [ … ] Al contrario io parto dal presupposto che “globale” descriva un modo della tematizzazione, o un modo di occuparsi del mondo». La lingua del globale suggerisce una trasparenza, un accesso diretto a un processo da osservare empiricamente: in effetti, però, si tratta di un modo che riassume diversi fenomeni in un comune discorso e così lo rende controllabile. Esso non rimanda al mondo in sé, ma alle condizioni e alle implicazioni dei modi istituzionalizzati per mezzo dei quali i diversi terreni e popoli di questo mondo vengono resi leggibili all’interno di un’unica cornice» (…). Il globale rappresenta la prospettiva dominante dalla quale il mondo viene prodotto come rappresentabile e controllabile». (p. 79).

[Notas]

1 S. Conrad, Storia globale. Un’introduzione, Roma, Carocci, 2015, p.18.

2 “Per fare un esempio, si può osservare il Kulturkampf in Baviera nel XIX secolo da un punto di vista di storia locale, con una problematizzazione storico-culturale o di storia di genere, o come parte della storia tedesca. Però lo si può anche collocare in maniera storicoglobale e intendere come espressione dei contrasti tra lo Stato liberale e le Chiese, che furono condotti nel XIX secolo in molte parti del mondo: in tutta Europa, ma anche in America Latina o in Giappone”. Ibidem, p. 20.

3 “Il crash della borsa di Vienna nel 1873 ebbe un’ importanza differente dalle crisi economiche del 1929 e 2008, perché il grado di collegamento dell’economia mondiale, ma anche l’intreccio mediatico degli anni intorno al 1870, non aveva ancora raggiunto la stessa densità che in seguito”. Idem.

Ernesto Pirillo

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Histoire globale. Un autre regard sur le monde. Paris: éditions Sciences humaines – TESTOT (DH)

TESTOT, Laurent (éd.). Histoire globale. Un autre regard sur le monde. Paris: éditions Sciences humaines, 2015 (2e éd. revue et aug.), 288 p. Resenha de: BUGNARD, Pierre-Philippe. Didactica Historica – Revue Suisse pour l’Enseignement de l’Histoire, Neuchâtel, v.1, p.206-208, 2015.

Histoire globale, dans sa deuxième édition, renoue avec les approches et les objets lancés par la deuxième génération des nouveaux historiens, celle de l’école française des Annales, à partir des années 1970. Les meilleurs géo-historiens actuels renouvellent ici le genre en y greffant, notamment, la transdisciplinarité de l’espace-temps. L’ouvrage, entre « microstoria » et « histoire connectée », rassemble une série de monographies impliquant chacune leur propre histoire-monde. Voilà de quoi donner aux programmes scolaires toutes les raisons de s’ouvrir à une nouvelle histoire globale enseignée.

Le livre se conclut sur un chapitre consacré à l’enseignement de l’histoire globale par Vincent Capdepuy, géo-historien à l’Académie de La Réunion, invité au cours 2015 du GDH « L’Histoire-Monde, une histoire connectée ! ». Deux autres conférenciers de ce cours contribuent à Histoire globale: Bouda Etemad (« Empires coloniaux: essai de bilan global ») et Christian Grataloup (« Des mondes au Monde: la géohistoire »).

Nous livrons ici in extenso la recension et la table du site des éditions Sciences humaines: http:// editions.scienceshumaines.com/histoire-globale_ fr-559.htm (consulté le 5 mai 2015).

Recension La mondialisation nous impose aujourd’hui d’envisager une histoire du Monde pris dans son ensemble. Il est devenu urgent de concevoir une histoire ouverte, qui s’enrichit de comparaisons entre différentes sociétés, étudie les connexions entre civilisations, tisse des liens entre les parcours individuels et les destins des empires, ose s’attaquer à de nouveaux objets en mobilisant la géographie, l’économie, l’anthropologie, les sciences politiques, la sociologie… L’approche globale en histoire revêt deux visages.

D’abord celui de l’histoire mondiale, un récit englobant le passé commun de l’humanité, de son apparition en Afrique il y a plusieurs millions d’années à la globalisation contemporaine. Le second visage est celui de l’histoire globale. Elle propose une méthode d’analyse, à la fois transdisciplinaire, au long terme, sur longue distance. L’historien doit savoir jouer de la mobilité de son regard, varier les échelles d’approche, penser autrement le passé – ce passé qui aurait pu être autre, qui est aussi perçu différemment ailleurs.

Produire des histoires à parts égales, où l’humanité se découvre des passés et un futur communs. Tel est le projet de l’histoire globale. Depuis longtemps reconnue dans les pays anglo-saxons, cette histoire globale est restée dans le monde francophone l’apanage de quelques pionniers, de trop rares livres… Le présent ouvrage constitue une première exploration d’ensemble de ce champ de recherche en pleine émergence.

Laurent Testot est journaliste à Sciences humaines, il a dirigé plusieurs dossiers consacrés à cette nouvelle discipline qu’est l’histoire globale, dont le hors-série Sciences humaines Histoire n° 3 « La nouvelle histoire du Monde » (décembre 2014-janvier 2015).

Coordinateur du présent ouvrage, il a également coordonné, aux Éditions Sciences humaines, La Guerre. Des origines a nos jours (avec Jean-Vincent Holeindre), 2012 ; Une histoire du monde global (avec Philippe Norel), 2012 ; La Religion. Unite et diversite (avec Jean-François Dortier), 2006. Il administre, avec Vincent Capdepuy, le blog « Histoire globale »: http://blogs.histoireglobale.com.

Avec les contributions de: Frédéric Barbier, Jérôme Baschet, Philippe Beaujard, Roy Bin Wong, Lucette Boulnois, Vincent Capdepuy, Dipesh Chakrabarty, Gérard Chaliand, David Cosandey, René-Éric Dagorn, Frédéric Denhez, Marcel Detienne, Caroline Douki, Bouda Etemad, Christian Grataloup, Olivier Grenouilleau, Catherine Halpern, Nicolas Journet, Jacques Lévy, Régis Meyran, Philippe Minard, Philippe Norel, Jean- Pierre Poussou, Benoît Richard, Pierre-François Souyri, Bernard Vincent.

Table

Préface

Introduction

L’histoire au défi du monde (L. Testot)

Les sources de l’histoire globale (R. Meyran)

I. Restituer des dynamiques

Commerce et conquêtes… sur les routes de la soie (L. Boulnois)

Les racines médiévales de l’expansion occidentale (J. Baschet)

Le monde à l’envers: un Moyen Âge japonais? (Rencontre avec P.-F. Souyri)

1492: année cruciale (Rencontre avec B. Vincent)

Empires coloniaux: essai de bilan global (B. Etemad)

L’onde de choc des révolutions (J.-P. Poussou)

La société-Monde, une histoire courte (J. Lévy)

II. De nouvelles perspectives

Un espace mondialisé: l’océan Indien (P. Beaujard)

Comment les peuples guerriers ont façonné le monde (Rencontre avec G. Chaliand)

La naissance de l’imprimerie et la globalisation (F. Barbier)

Les raisons du « miracle européen » (Rencontre avec D. Cosandey)

Jalons pour une histoire globale de l’esclavage (O. Grenouilleau)

La Chine face à l’Occident (R. Bin Wong) Les enjeux d’une histoire du climat (F. Denhez)

III. Les approches méthodologiques

Pour un changement d’échelle historiographique (C. Douki et P. Minard)

La dimension globale en histoire économique (P. Norel)

Big history et histoire environnementale (R.-É. Dagorn)

Des mondes au Monde: la géohistoire (C. Grataloup)

Des Grecs aux Iroquois, une démarche comparative (Rencontre avec M. Detienne)

Les postcolonial studies: retour d’empires (N. Journet)

Quelle histoire pour les dominés? (Rencontre avec D. Chakrabarty)

Conclusion

Enseigner l’histoire globale (V. Capdepuy)

Pierre-Philippe Bugnard – Université de Fribourg

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The Oxford Handbook of World History | Jerry Bentley

Pouco conhecida no cenário historiográfico brasileiro, a denominada História Global tem se desenvolvido com força desde a década de 1980 nos meios acadêmicos europeus e norte-americanos. As perspectivas globais, a busca por efeitos-causa e a explicitação de grandes processos, que nortearam a produção historiográfica inglesa e norte-americana desde as obras de Arnold Toynbee (1955) nos anos 1930 até Immanuel Wallerstein (1974) e William McNeill (1963) nos anos 1970, passaram por um intenso processo de renovação e rediscussão.

O livro organizado pelo Professor da Hawai’i University, Jerry Bentley†1, reúne as mais atualizadas discussões sobre o tema, proporcionando em seu conteúdo uma visão ampla e sistêmica da História Global. Em seu prefácio, Bentley apresenta ao leitor as novas – e as não tão novas – dificuldades e armadilhas dos historiadores globais. Influenciados pelos estudos póscoloniais e pela descentralização do saber acadêmico, ocorrido ao longo do século XX – que descendeu das cátedras europeias às mais variadas partes do mundo – os historiadores globais rejeitaram velhas idiossincrasias das denominadas “Histórias Universais”, como o etnocentrismo e um manifesto “sentido da história” hegeliano, em prol de uma análise de processos, encontros e trocas entre as sociedades, considerando sua fluidez e permeabilidade, espalhados por dilatadas dimensões espaciais e temporais. Leia Mais

Declaração de Independência: uma história global | David Armitage

Publicado originalmente em inglês em 2007 e editado no Brasil em 2011, Declaração de Independência: uma história global, de David Armitage, é um livro bastante original, erudito e prenhe de questões importantes, resultado do empenho de um historiador altamente profissional e cheio de razões para se incomodar com uma tradição historiográfica ainda muito em voga em seu país. Qual seja: a que concebe uma história paroquial, provinciana, muitas vezes até mesmo nacionalista, e que insiste em sustentar uma excepcionalidade da trajetória dos Estados Unidos da América que não apenas costuma ser portadora de uma ideia de superioridade civilizacional, mas que também poucas vezes resiste a um exame sério e minimamente historicizante de muitos de seus conteúdos clássicos. Precisamente dentre estes se encontra a Declaração de Independência de 1776, e que neste livro encontra interpretação bastante diversa.

Dividido em três capítulos, aos quais se segue uma coletânea de declarações de independência ou documentos afins – que, segundo seu autor, se inspiraram direta ou indiretamente naquela que aqui se considera simultaneamente modelo paradigmático e evento fundacional –, o livro de Armitage, desde sua primeira linha, procura uma visão abrangente do fenômeno a ele central: a concepção, a instituição e o espraiamento de um documento supostamente capaz de subsidiar concepções e ações políticas mundo afora e desde então.

O primeiro capítulo, “O mundo da Declaração de Independência” (p.27-56), dedica-se a examinar e iluminar o fato de que o documento de 1776 só fazia sentido por estar direcionado a um sistema de relações internacionais que o explica e que o faz, radicalmente, uma peça “internacional”. O segundo, “A Declaração de Independência no Mundo” (p.57-88), examina recepções e leituras que o mundo de sua própria época realizou do documento, configurando um processo capaz de dotá-lo de uma energia vital a convertê-lo em típico protagonista do que o autor pretende “uma história global”. Finalmente, o capítulo 3, “Um Mundo de Declarações” (p.89-117), indica e organiza uma sequência de declarações que, à luz dos capítulos antecedentes e dos próprios preceitos do livro, surgem em um olhar criativo e, sem sombra de qualquer dúvida, fortemente provocador.

O que seria, então, essa “história global”? Armitage não a define, mas a pratica. Trata-se, então, de um olhar de um historiador que escreve “em um período de aguda consciência da globalização” (p.13); igualmente, de um fenômeno constituído a partir de um ponto preciso, perfeitamente bem definido no tempo e no espaço, e que se espraiaria para tempos e espaços que o transcendem. No presente caso, portanto, essa “história” se originaria com a própria criação dos Estados Unidos da América, e seguiria sua trajetória mundo afora como uma espécie de mundo que esses Estados Unidos criaram. Não se confunde, em nada, com uma história de coisas simultâneas, menos ainda com uma história de todo o globo, mas se define como a história de uma influência que, se impossibilita de qualquer indicação de término – posto que, como o autor pretende, essa influência ainda se fazia presente em 2007 – jamais deve perder de vista seu ponto de origem.

Temos, então, uma “história global” a partir de um ponto de vista anglo-americano, ou norteamericano. Não um ponto de vista que se pretenda relativo, mas objetivo: pois é dele que se parte aquilo que construirá – ou construiu – uma “história global”. E não há nenhuma dúvida de que, daqui para frente, a historiografia deve a Armitage uma forte contribuição para o entendimento de documentos e eventos de grande importância que ganham extraordinária clareza quando vistos desse modo. Deve-se, portanto, endossar parcela das mais importantes conclusões do autor.

Porém, e em parte na contramão desse endosso, pode-se destacar um aspecto central e abrangente do livro de Armitage de modo a dele extrair problema de concepção. Um problema que, creio, deve ser enfrentado por todo aquele que, de diferentes modos, se ocupa atualmente de compreender fenômenos políticos inscritos na conjuntura geral que Armitage identifica como de origem do tema que o interessa, ou que vão ao encontro de muitas outras conjunturas que podem ser identificadas como sucedâneas àquela inicial.

Tal problema é de ordem histórica e teórica ao mesmo tempo; e é por isso que pode-se considerar exemplos extraídos do próprio livro de Armitage, bem como acrescentar algum outro a ele alheio. Por isso, que fique bem claro: não proponho um diálogo puramente bilateral, com uma leitura crítica exclusivamente dessa obra; mas sim aproveitar o que Armitage nos traz para discutir um problema mais amplo, já que de seu labor resultou uma elaboração notavelmente paradigmática.

Enuncio o problema em duas questões: como fundamentar a existência de fenômenos históricos que pretensamente se configuram em uma dinâmica de irradiação temporal e espacial? E como interpretar realidades diacrônicas a partir de supostos impactos e conexões de fenômenos capazes de aproximá-las, e de torná-las uma mesma e ampla realidade? Em suma, questiono a base de configuração de uma unidade histórica – a “história global” – por meio de um corte do tipo do realizado por Armitage, isto é: o advento e a reprodução alterada de declarações de independência a partir da dos Estados Unidos da América de 1776.

Devo repetir que não só reconheço aspectos altamente meritórios da análise de Armitage como simpatizo fortemente com a abrangência temporal e espacial de sua proposta, bem como com o esforço dela decorrente de domínio de bibliografias especializadas voltadas a realidades específicas (embora veja como incômoda a devastadora primazia de obras publicadas em inglês). Bibliografias que a maioria dos historiadores, lamentavelmente, ainda continua a tratar isoladamente. É difícil praticar uma escrita da história verdadeiramente não-nacional, não-provinciana, de larga duração e de escopo global; e não há forma mais adequada de entender o mundo de finais do século XVIII, ou o de começos do XXI.

Por isso, pode-se dizer que o problema que acima destaquei é, em parte, inevitável, pois diz respeito à ideia de que fenômenos como as Declarações de Independência – mas também pensamentos e ações políticas em movimento, as modificações substantivas na composição dos Estados europeus, e a formação dos Estados nacionais delas decorrentes inclusive na América, na África e na Ásia – configuram, em escala mundial, realidades comuns, que precisam ser estudadas em conjunto porque só assim podem ser devidamente compreendidas. E é na ocorrência de uma Declaração e na sua trajetória posterior que Armitage vislumbra uma história digna de ser contada.

Se os elementos que fundamentam esse vislumbrar são eloquentes, menos o é a base de estabelecimento dos nexos que nos permitiriam falar de uma “história das declarações de independência”, ou, para nos mantermos fiéis aos termos do autor, de uma história global “da Declaração de Independência” (de 1776); nexos que fariam dessa(s) história(s) cortes válidos para entender o mundo (ou os mundos) atravessados por ela(s), e por ela(s) parcialmente explicados.

Se há, efetivamente, uma irradiação de um paradigma simultaneamente de concepção e de ação política, com todas as variações que tal paradigma comporte, há algo na ordem de uma escala territorial que não apenas possibilita esse trânsito do paradigma – e, portanto, sua existência como tal – mas também sua suposta capacidade de incidir sobre tempos e espaços variados, embora muitas vezes (nem todos) cronologicamente próximos.

Aqui, retomo outro trabalho de Armitage, elaborado em conjunto com Sanjay Subrahmanyam, e que abre uma interessante coletânea de textos dedicados a manifestações de uma chamada “era das revoluções” em diferentes regiões do globo entre os séculos XVIII e XIX: (The Age of Revolutions in Global Context, 1760-1840, de 2009). Aqui, os autores defendem uma chamada “transitive global history”: isto é, uma história concebida a partir de diferentes pontos equivalentes, sem um centro único, mas que partiria da percepção da ocorrência de fenômenos equivalentes ou semelhantes em todos eles (o que não seria o caso, obviamente, da “história global” da Declaração de 1776 proposta em Declaração de Independência, que arrancaria, sim, de um único ponto). Juntos, Armitage e Subrahmanyam encontram, então, ocasião para reaproveitar uma metáfora anteriormente já utilizada pelo último em parceria com Serge Gruzinski, e que concebe o trabalho desse tal historiador “global” com o de um eletricista, cuja tarefa consistiria em conectar os pontos de uma ligação geral, e que se encontrariam indevidamente desligados.

Inegavelmente, tal metáfora é não apenas inusitada, mas também engenhosa: parece dar conta, por exemplo, da irradiação das declarações de independência, portanto das conexões de um circuito que colocaria 1776 no mesmo caminho de 2007, que levaria a eletricidade do disjuntor dos Estados Unidos da América do século XVIII (o centro de tudo) para, por exemplo, Kossovo e Sudão atuais, passando por um grande número de pontos de distribuição. No entanto, a serventia dessa explicação parece depender estritamente de seus próprios pressupostos. Pergunto: como fundamentar a “conexão”, não entre artefatos de natureza semelhante, como são algumas (repitamos, algumas) das declarações de independência – talvez os fios, os circuitos e as tomadas da metáfora do eletricista – mas entre, por exemplo, declarações de independência e guerras; dinâmicas identitárias e formação de Estados nacionais; mutações conceituais e relações mercantis; formas de pensamento/ação políticas e estruturas cotidianas de existência social? Um livro com um governo, uma batalha com um jornal?

Tomo aqui, evidentemente, exemplos de fenômenos que, nos contextos referidos por Armitage, compõem realidades das quais as declarações de independência são parte, mas parte muito parcial. Não se trata, contudo, de antepor à conexão de coisas semelhantes uma história de todas as coisas; mas sim de questionar a legitimidade de uma escolha em termos de sua capacidade de explicar algo mais do que aquilo que nela está já desde seu princípio. O que escapa a essa história de declarações de independência, mas que parece ser essencial na compreensão de uma história da qual essas declarações são parte importante?

Penso em três casos mencionados por Armitage: a “declaração” do Peru, de 28 de julho de 1821; os eventos relativos ao Brasil, de 07 de setembro de 1822; e o que foi chamado de “Declaração de Independência do Uruguai”, de 25 de agosto de 1825. Ora, o que podemos dizer sobre tais exemplos? Em primeiro lugar, que a “declaração” do Peru foi imposta por um San Martín chefe de um exército invasor, e que pouco tempo duraria no poder do antigo Vice Reino que agora ruía; em segundo, que poucos são os atuais historiadores da independência do Brasil que consideram com seriedade o 7 de setembro como um marco do ano de 1822; e finalmente, que a “declaração” de 1825 não criou um “Uruguai”, menos ainda “independente”. Em todos os casos, no entanto e sem dúvida, alguma intenção, algum padrão comum de ação política; mas o que essas “declarações” explicam efetivamente sobre o fim do Vice Reino do Peru e do Reino do Brasil? São elas comparáveis às dos Estados Unidos e da França, ou às dezesseis de Venezuela e Nova Granada entre 1810 e 1816? Talvez devêssemos isentar Armitage da responsabilidade de discutir, com algum pormenor, todos os casos por ele mencionados, não fosse meu entendimento de que tais distorções são decorrentes de sua própria concepção de “história global”. Afinal, segundo ela, tudo que a ela pertence deve, de algum modo, se adequar a um padrão inicial, definido pelo seu marco irradiador: os Estados Unidos da América.

Aprofundemos tal objeção pontualmente. A edição brasileira de Declaração de Independência, em clara sintonia com propósitos mercadológicos perfeitamente explicáveis (ainda que não necessariamente justificáveis), incluiu, em sequência à coletânea de declarações já mencionada, um “Apêndice” relativo ao Brasil (p.201-214). Dele constam quatro peças: o famoso decreto do governo do príncipe regente Pedro de 03 de junho de 1822, convocando uma assembleia constituinte e legislativa para o Brasil; uma carta do mesmo príncipe (que ainda não era, portanto, “Pedro I”, como consta do livro) ao rei João VI, de 22 de setembro de 1822; a ata de aclamação (aí sim) de Pedro I Imperador do Brasil, de 12 de outubro de 1822; e o tratado assinado em 25 de agosto de 1825, pelo qual Portugal reconheceu formalmente a independência do Brasil. Ora, a que servem tais documentos, neste livro? Nas palavras do autor, como o Brasil, “caso particular na América, não teve uma declaração de independência inspirada naquela dos Estados Unidos”, o que supostamente caracterizaria um “processo sui generis”, tais documentos poderiam estimular “o estudo comparado (de acordo com os objetivos do livro) com os outros processos emancipatórios aqui ilustrados” (p.201). E assim, o que não se adequa ao pressuposto do livro – os Estados Unidos como centro irradiador de uma “história global”, é confinado à categoria de aberração. O que coloca Armitage em perfeita sintonia com um dos tópicos mais tradicionais – e hoje mais contestáveis – da suposta singularidade da história do Brasil no panorama não apenas americano, mas também mundial. O que ganhamos reconduzindo à independência do Brasil essa interpretação tão convencional quanto míope?

O problema aqui se converte no da legitimidade do recorte. Se a “história global” da “Declaração de Independência”, bem como da modalidade indicada por tal expressão no plural, realizada por Armitage é legítima, útil e importante, ela parece servir também para obliterar realidades que apenas enganosamente se enquadram no seu padrão. Pouca coisa se explica do Peru, do Brasil e do Rio da Prata oriental por essas “declarações”; e como exceções à suposta regra, o corte adotado corre o sério risco de incentivar a retirada da cena dos contextos doravante considerados excepcionais.

Na minha leitura, os elementos frágeis da concepção de uma “história global” tal qual praticada por Armitage, assim como seus muitos e inegáveis méritos, demandam um escopo teórico que seja capaz de explicar não apenas quais realidades se conectam, mas fundamentalmente porque elas podem se conectar, e como o fazem. Um escopo teórico que nos permita superar os insolúveis problemas decorrentes da reificação de um método ou de uma concepção “global” de história, da qual Armitage é tributário e, ao mesmo tempo, formulador.

É bem verdade que vivemos tempos não apenas de forte consciência de uma “globalização”, mas igualmente de uma persistente crise de paradigmas teóricos, de perene desprestígio da reflexão teórica, sobrepujada por um empiricismo fácil e sedutor, bem como de pesquisas hipertrofiadas e isoladas, incapazes de propor generalizações (sempre elas, perigosas, temerárias, mas imprescindíveis…). Assim, e na contramão de tais atitudes, o que encontramos em Declarações de Independência já é mais do que o bastante para merecer aplauso; no entanto, não parece o suficiente para assegurar saídas para alguns dos impasses desses tempos.

No cenário historiográfico atual, poucos historiadores pareceriam tão capazes como David Armitage de caminhar nessa direção; de preferência, realizando uma avaliação propositiva da serventia ou não de categorias anteriormente usadas (muitas vezes abusadas) pelas ciências sociais – como, por exemplo, “sistema-mundo”, capitalismo” e “longa-duração”– e que desapareceram quase que por completo nas atuais elaborações em torno de uma “história global”. Basta de imputar ao autor, no entanto, objetivos e interesses que não necessariamente são os dele: limitemo-nos, por fim, a reconhecer Declarações de Independência como uma obra forte, por muitos motivos altamente meritória, e certamente encorajadora de tarefas às quais ela pode, simultaneamente, pautar e servir de ponto de partida.

João Paulo Pimenta – Professor no Departamento de História da Universidade de São Paulo (FFLCH/USP – São Paulo/Brasil). E-mail: [email protected]


ARMITAGE, David. Declaração de Independência: uma história global. São Paulo: Companhia das Letras, 2011. 264p. Resenha de: PIMENTA, João Paulo. O que é uma “história global”? A propósito de um livro de David Armitage. Almanack. Guarulhos, n.6, p.153-157, 2º semestre de 2013.

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Esboços | UFSC | 1994

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Esboços: histórias em contextos globais (Florianópolis, 1994-) tem como principal objetivo contribuir para o debate em torno da História Global. Nesse sentido, a revista publica artigos, entrevistas e resenhas, em português, inglês e espanhol, que fomentem a reflexão em torno das abordagens transculturais, das múltiplas integrações, das histórias conectadas, transnacionais, comparadas, marítimas, do sistema mundo, dos processos em micro e macro escala, entre outros enfoques próprios da História Global.

A revista é uma iniciativa do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Santa Catarina.

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