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Práticas de pesquisa em história | Tania Regina de Luca
Scènes de la vie des arrageois au XVIe siècle – Charles Hoffbauer (Detalhe de capa de Práticas de pesquisa em História | Imagem: Domínio Público
Como iniciar uma pesquisa em História? Qual a diferença entre documento e fonte? O que é método? Qual enquadramento teórico-conceitual devemos utilizar na pesquisa? Como se define um recorte cronológico? E o recorte temático? Como chegar a um problema de pesquisa? Essas são algumas perguntas, entre muitas outras insondáveis, que todo(a) pesquisador(a) de História se faz no momento em que a realidade da pesquisa científica se avizinha. À tais dúvidas que assomam nossas mentes, e que constituem verdadeiros enigmas, a professora Tânia Regina de Luca procura responder em Práticas de Pesquisa em História.
O livro, cabe destacar, integra o projeto da Editora Contexto intitulado “História na Universidade”. O objetivo da coleção, que aborda períodos históricos que vão da Antiguidade à História Contemporânea, passando pela História da África e da Idade Média, entre outros, é divulgar pesquisas acadêmicas para um público amplo, ultrapassando os muros da universidade. Leia Mais
What is Global History? | Sebastian Conrad
El historiador alemán Sebastian Conrad (1966) a lo largo de su carrera ha trabajado en los campos de la historia transnacional y de la historia global. Ello tanto desde la refl exión teórica como mediante la aplicación de sus metodologías en el análisis de casos de estudio concretos. Actualmente detenta la cátedra de historia moderna en la Freie Universität de Berlín, donde también dirige la maestría en Historia Global. En 2018, su trayectoria académica fue reconocida al nombrársele miembro de la Academia Europaea y de la Academia de ciencias de Berlín-Brandemburgo1. En su libro, What is Global History, Conrad se propuso realizar una discusión de alcance teórico sobre este tipo de historia y su práctica, discutiendo, por ejemplo, la política implícita en su ejercicio y los efectos del enfoque global en las categorías utilizadas por los historiadores, como las nociones de espacio y tiempo2.
En su texto, Conrad plantea una defi nición heurística de esta práctica historiográfi ca, concibiéndola como un enfoque diferenciado que exploraría “alternative spatialities, is fundamentally relational, and is self-refl ective on the issue of Eurocentrism”3. Leia Mais
Arqueologia – FUNARI (VH)
FUNARI, Pedro Paulo. Arqueologia. São Paulo: Contexto, 2010, 125p. ALMEIDA, Fábio Py Murta de. Varia História. Belo Horizonte, v. 28, no. 47, Jan./ Jun. 2012.
O livro Arqueologia, do professor doutor Pedro Paulo Funari, livre docente de História da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), é uma composição ímpar, indicado especialmente aos cursos introdutórios de História, Arqueologia e de História da Literatura do Antigo Oriente Próximo. Seu texto tem forma agradável e objetiva; mérito do autor, fruto dos anos de atividade profissional e dedicação ao estudo arqueológico. Assim, pela larga experiência na temática, Pedro Funari busca objetivamente apresentar a Arqueologia tendo em vista o ramo da história cultural, isso com uma linguagem fácil e direta; aponta logo no início da obra que a arqueologia não se compreende apenas pelas descobertas das figuras e das imagens, mas institui-se num campo muito reflexivo, envolvendo tanto a leitura, quanto a prática nos sítios arqueológicos.
Olhando mais detidamente sua obra, Pedro Funari começa informando basicamente o “estado da questão” da ciência arqueológica, definindo seu objeto de estudo e a evolução do pensamento. Para ele, a arqueologia consiste nos conhecimentos dos primórdios, dos relatos das coisas antigas. Só mais recentemente, por conta do campo de atuação e de envolvimento (diálogo) com ciências sociais, é que a arqueologia vem se traçando de forma interdisciplinar. Com ela, não se visa revelar apenas o sentido das coisas e dos artefatos desenterrados, mas configurar que os “ecofatos e biofatos são vestígios do meio ambiente e restos dos animais que passaram sobre apropriação do ser humano”, o que retira a limitação do estudo arqueológico apenas ao passado, mas, também, liga-o ao presente, como o é na arqueologia industrial. Mesmo assim, pensando especificamente na idealização do passado, indica-se que esse pensamento é metodologicamente pautado nas etapas arqueológicas, sempre olhando dados e artefatos. Materiais entre os quais podem ser vistos indicativos das relações sociais que foram produzidos, uma vez que atuam como mediadores das atividades humanas, determinando estereótipos e comportamentos de uma sociedade. Para a atividade é fundamental entender que a partir da “reintegração dos artefatos a um contexto cultural como o nosso e em um invólucro da relação de poder que o artefato produz, o mesmo adquire importância crucial”, portanto, o arqueólogo tem que inserir tais objetos no interior das relações sociais em que foram produzidos, fazendo-os exercer novas funções de mediações. Portanto, é dentro da cultura,1 como desenvolvimento e criação humana, que o objeto transforma-se em artefato, recebendo uma formulação junto à humanidade.
Outro nicho de saberes destacado pelo autor são as formas de pesquisa na arqueologia: indicando um “complexo de técnicas utilizadas pelo arqueólogo, formulações não neutras, que se inserem num complexo de questões metodológicas que derivam das políticas do arqueólogo”. Técnicas, por exemplo, como o desenterramento e a escavação estratificada. Elas teriam evoluído ao longo do tempo dividindo-se em três importantes fases: a primeira, a preocupação com a superposição de níveis de ocupação e com datação relativa aos artefatos; a segunda, com o estudo e registro dos estratos; e a terceira, com a escavação de amplas superfícies, preocupada com o estudo do funcionamento da sociedade que ali viveu. Infelizmente, no Brasil, inicialmente, houve uma “desvalorização do contexto histórico devido às grandes importações de técnicas e ideologias (no caso, arqueológicas), advindas da Europa, ou seja, a valorização de um passado externo ocasionou a desvalorização da memória nativa (indígena)”. Ainda sim, apesar do desenvolvimento exemplar que a arqueologia vem tendo no Brasil, ela está longe de ser valorizada. Percebe-se que recentemente está ocorrendo uma grande reviravolta na pesquisa brasileira e internacional, trazendo um diálogo entre a arqueologia brasileira e a mundial, o que dinamiza o estudo nacional. No detalhe da relação entre a arqueologia e as outras áreas do conhecimento, Pedro Funari mostra que essa ciência não pode ser desarticulada das outras disciplinas. Deve estar relacionada com as demais ciências (como a história, a antropologia, a biologia, a geografia, a física, a arte, a arquitetura, a filosofia, a linguística e a museologia), pois elas são e foram fundamentais para sua evolução, como já indicamos.
No fim, a obra Pedro Funari faz uma explanação e um convite ao aprendizado arqueológico no Brasil. Indica, antes de qualquer coisa, que o arqueólogo deve ter o compromisso com a burocracia regional e responsabilidade social. Também, aponta que deve haver respeito para com a sociedade no todo, desde grupos majoritários até os minoritários. Para ele, a arqueologia é uma ação política2 que, por isso, tem algumas dificuldades de inserção no Brasil, até mesmo por que, como profissão, tem um difícil reconhecimento por não haver uma graduação específica na área. Mesmo assim, existe pós-graduação nessa área de atividade profissional, e pode-se atuar como professor, pois em museus, laboratórios, arqueologia (setor burocrático) de contrato, como maneira de proteger o patrimônio arqueológico, e na gestão turística do patrimônio arqueológico brasileiro. Enfim, algumas áreas podem servir como convite ao estudo e trabalho arqueológico. Merece destaque a gama de projetos e novos horizontes arqueológicos, pois nosso território é um vasto campo de pesquisa sobre as comunidades que aqui habitaram no passado.
Por fim, com vasto conhecimento acerca da ciência arqueológica, não só no Brasil, mas também, em outros países em que realiza suas pesquisas, Pedro Paulo Funari expõe de maneira singular, sucinta e principalmente realista uma ampla visão acerca da arqueologia e do seu desenvolvimento ao longo dos últimos séculos. Sobre a abordagem dos conceitos e objetos de estudos, o livro Arqueologia pode ser encarado como um belo convite ao seu estudo como disciplina acadêmica. Caso os leitores queiram aprofundar os apontamentos apresentados pelo autor, vale a pena à consulta de obras, como, por exemplo, a História do pensamento arqueológico de Bruce G. Trigger3 e algumas obras da vasta bibliografia do professor Pedro Funari.4 Ao fim da resenha, destacamos a admiração pelo esforço do autor que, mesmo em um texto relativamente pequeno, consegue ter riqueza de detalhes e não deixa de enaltecer as questões histórico-metodológicas da disciplina. Por isso, pensamos que cumpriu o objetivo de explorar de forma suscita questões que vem levantado a arqueologia nos últimos anos, bem como exauriu o intento de introduzir suas questões de forma geral. Assim, em termos de historiografia, o autor faz uma aproximação da disciplina de arqueologia junto a um ramo da história, a luz dos termos e conceitos reconhecidos na história cultural. Propriamente, aproxima a variante da nova história cultural, principalmente a estilizada por Roger Chartier, com as questões que vêm levantado os embates da cultura material escavada como as: representações, poder e práticas culturais – ajudando no diálogo história e arqueologia sobre o prisma do conceito simbólico de cultura de Clifford Geertz e de Marshall Sahlins.5 Agora, pensando mais longe, é urgente que as editoras se preocupem em produzir livros desse tipo, sendo relevantes ao nicho dos alunos e aos cursos introdutórios de nível superior. Assim, fica aqui o apelo para a produção de livros e materiais que sejam sucintos e que possam da melhor forma introduzir o estudo dos discentes às cadeiras acadêmico-científicas.
1 A noção de cultura utilizada pelo autor é ligada á história cultural, vista em FUNARI, Pedro Paulo A. e PELEGRINI, Sandra de Cássia Araújo. Patrimônio histórico e cultural. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2006. Quando Pedro Funari utiliza da contribuição decisiva de Roger Chartier, autor que aponta a história cultural relacionada com a “noção de ‘representação’ e de ‘práticas’ (…) tanto os objetos culturais seriam produzidos ‘entre as práticas e representações’, como os sujeitos produtores e receptores da cultura circulariam entre esses dois pólos, que de certo modo corresponderiam respectivamente aos ‘modos de fazer’ e aos ‘modos de ver'”, como cita BARROS, José D’Assunção. O campo da história: especialidades e abordagens. Petrópolis: Vozes, 2004, p.76.
2 Sobre ação política e seu destaque dentro da história política, vide a descrição de Marieta de Moraes Ferreira quando comenta a obra de René Rémond: “Nova História Política (…) ao se ocupar do estudo e da participação na vida política (…) integra todos os atores, mesmo os mais modestos, perdendo assim o caráter elitista e individualista e elegendo as massas como seu objeto central”, RÉMOND, René. Por uma história política.Rio de Janeiro: FGV, 2003, p.7. Assim, a ação política permeia o respeito aos atores sociais de diferentes grupos ligados as redes de poder que constituem a sociedade.
3 TRIGGER, Bruce G., História do pensamento arqueológico. Tradução de Ordep Trindade Serra. São Paulo: Odysses Editora, 2004.
4 Citamos aqui, por exemplo, as duas obras: FUNARI, Pedro Paulo A. Arqueologia e patrimônio, Erechim: Habilis, 2007; e FUNARI, Pedro Paulo A. (org.). Cultura material e arqueologia histórica. Campinas: IFCH/UNICAMP, 1999.
5 Assim para Clifford Geertz e Marshall Sahlins o conceito de cultura pode ser definido como um conjunto de sistemas de signos e significados constituídos pelos grupos sociais. Portanto, para interpretar as culturas, no caso do antropólogo Clifford Geertz significa interpretar: símbolos, mitos, ritos. Agora, partindo de Clifford Geertz, Marshall Sahlins defende que os grupos de uma cultura também “representam” suas interpretações do passado no presente. Vide para isso, GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1978; e SAHLINS, Marshall. Ilhas de história. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1990.
Fábio Py Murta de Almeida – Historiador e mestre em Ciências da Religião pela UMESP. Professor de História da Faculdade Batista do Rio de Janeiro (FABAT) e pesquisador do grupo de Arqueologia do Mundo Bíblico ligado a UMESP Faculdade Batista do Rio de Janeiro. Rua Jose Higino 416, Tijuca, Rio de Janeiro. CEP: 20510-412. pymurta@gmail.com.
Filosofar: Da Curiosidade Comum ao Raciocínio Lógico – WILLIAMSON (RFMC)
WILLIAMSON, Timothy. Filosofar: Da Curiosidade Comum ao Raciocínio Lógico. Lisboa: Gradiva, 2019. Resenha de: PACHECO, Gionatan Carlos. Revista de Filosofia Moderna e Contemporânea, Brasília, v.7, p. 339-341, n.3, dez. 2019.
Uma Nova Introdução à Filosofia
Em Filosofar: Da Curiosidade Comum ao Raciocínio Lógico, Timothy Williamson oferece uma introdução à filosofia acadêmica. É um livro com notável potencial didático. Por exemplo, Williamson começa com um exemplo de como Jean-Pierre Rives, uma lenda do rugby, aplicava em seu arsenal tático as Regras para Direção do Espírito: “ter uma ideia clara e distinta daquilo que se procura alcançar. Então há que decompor cada jogada complexa nos seus componentes mais simples, torná-los intuitivos, e reconstituir tudo a partir daí” (p. 11). O livro se inicia então apontando que a filosofia pode apresentar as aplicações mais inesperadas.
Na introdução o autor aborda rapidamente uma grande gama de assuntos, passa do exemplo citado acima, que evoca Descartes, para a dúvida hiperbólica, da dúvida hiperbólica para a ciência natural, desta para a política internacional. Mas a ideia principal desta introdução, que fará eco no restante da obra, é a relação entre os primórdios da filosofia e os primórdios da ciência. O autor nos lembra que Newton e Galileu reclamavam o título de filósofos naturais, de modo que a ciência é como que uma filha da filosofia. No entanto, alguns desdobramentos no pensamento contemporâneo tendem a mostrar a ciência como uma matricida em potencial.
O segundo capítulo é sobre o senso comum. O senso comum é um ponto de partida. Uma anedota contada por Williamson é muito ilustrativa acerca deste ponto. Digamos que estamos tentando chegar em algum lugar, estamos em uma praça, perguntamos a um sujeito onde fica o tal lugar que queremos ir, e ele nos responde: daqui desta praça é difícil chegar lá. O senso comum é a nossa praça, não importa o quão deslocado ele é, é dele que partimos, não temos opção. Essa “metafísica dos selvagens” – Williamson nos lembra dessas palavras de Russel – obteve notáveis defensores entre os filósofos e possui inclusive um potencial refutatório. Como exemplo, o autor afirma que o senso comum refutou teses como, por exemplo, a da irrealidade do tempo de McTaggart (p. 21). O senso comum, em um certo aspecto, funcionaria como um “freio” da filosofia.
É em grande parte sobre refutações e debates que gira em torno o capítulo três. Willianson nos dá um panorama de um clima potencialmente beligerante nos eventos acadêmico da área de filosofia, seus prós e seus contras. Os apresentadores se “defendem” das ofensivas dos arguidores e o júri seria encarnado na comunidade dos filósofos em geral. Como sói acontecer, o autor aponta que muitas disputas acabam por concordarem em conteúdo e divergir em nas palavras. Com efeito, este fenômeno é o tema do quarto capítulo. Aquim Williamson apresenta uma espécie de paradoxo da clareza, pois, de certa forma, ela não pode aspirar “um padrão mítico de indubitabilidade” , visto que para esclarecermos uma palavra, lançamos mão de outras palavras e, além disso, estariam os presos em questões como a possibilidade de se conceitualizar o conceito de “conceito”.
Este Filosofar também pode ser considerado uma introdução à metodologia filosófica. Assim, os capítulos seguintes apresentam uma série de ferramentas filosóficas. O capítulo cinco discorre acerca de experiência mentais. Aqui ele nos apresenta uma experiência mental do autor budista do século VII, Dharmottara (740-800), onde este antecipou os epistemologicamente revolucionários exemplos de Gettier, e, entre outros exemplos, como do experimento mental acerca do aborto de Judith Jarvis Thomson, o experimento mental dos zumbis de Chalmers e, além disso, nas ciências naturais, os experimentos mentais das esferas de Galileu e a hipotética “cavalgada” sob um raio de luz de Einstein. O livro de Williamson é extremamente imagético, repleto de exemplos e tabelas. Os exemplos exemplos citados, por si só, constituem ferramentas metodológicas do pensar filosófico e reforçam o caráter pedagógico do livro. Além disso, ao passo que apresenta esta série de experimentos mentais, alguns conceitos, mesmo sem ser nomeados são apresentados, como a modalidade e os contrafactuais.
A filosofia é colocada lado a lado com a ciência natural durante toda obra. Assim, muitos tópicos são compartilhados, como as questões dos vieses cognitivos, do sobreajuste em teorias, da dedução e dos princípios lógicos. Williamson discorre sobre a história da filosofia, de uma forma quase amarga, com aqueles acadêmicos que estudam “um filósofo”, claramente defendendo seu “estilo Oxford de filosofar”, isto é, tratar de problemas filosóficos e não de filósofos. “A questão controversa é saber se os filósofos precisam ou não de muito mais conhecimento da história menos recente do seu assunto do que precisam os matemáticos e cientistas naturais nas suas áreas” (p. 114). Williamson irá conceder importância, sim, mas uma importância do que ele chamade“genealogiaintelectual” (p. 115). Assim, para ele há teorias filosóficas que mesmo sendo falsas, possuem sua importância. Em termos gerais, segundo o autor, a história da filosofia estaria para a filosofia atual, como a história da arquitetura está para quem está atualmente visitando uma obra arquitetônica.
Enfim, Filosofar: Da Curiosidade Comum ao Raciocínio Lógico é certamente um fruto do pensamento filosófico contemporâneo de nossa época que poderá ter muita influência na geração futura de pesquisadores. Isto pois, ele se destina a um público amplo, em especial estudantes de graduação em filosofia, mas, ainda assim, por possuir um caráter de divulgação filosófica, pode destinar-se a comunidade em geral. É um livro com viés oxfordiano, o que pode causar desconforto para certos leitores, no entanto, é um livro com uma visão tanto ampla, quanto coerente sobre a atividade filosófica.
Gionatan Carlos Pacheco – Mestre e Bacharel em filosofia pela Universidade Federal de Maria (UFSM). Atualmente realiza doutorado em filosofia na UFSM. E-mail: gionatan23@gmail.com
An Introduction to Zooarchaeology – GIFFORD-GONZALEZ (IA)
Diane Gifford-Gonzalez (esquerda) e Elizabeth Reitz (direita) https://en.wikipedia.org.
GIFFORD-GONZALEZ, D. An Introduction to Zooarchaeology. (Sn.): Springer, 2018. 604p. Resenha de: MONDINI, Mariana. Mucho más que una introducción a la zooarqueología. Intersecciones en Antropología, Buenos Aires, v.20, n.2, ago./dic., p.283-285, 2019.
El reciente volumen de Diane Gifford-Gonzalez (2018) es una referencia fundamental para la zooarqueología. Se trata de una obra muy abarcativa, que estuvo en preparación por veinticinco años, según cuenta la propia autora (Grad 2018), y que trata una multiplicidad de temas de diferente nivel de generalidad. Uno de sus principales valores consiste precisamente en que aborda desde cuestiones epistemológicas que subyacen a todo análisis hasta otras más prácticas con las que el zooarqueólogo debe lidiar. En este sentido, es uno de los trabajos más originales y completos de la literatura zooarqueológica moderna.
Contribuye a ello que se nutre de ejemplos de todo el mundo, incluida la región neotropical y específicamente Argentina, lo que suma cierta familiaridad al tratamiento de los diferentes temas. Además, el libro contiene numerosas ilustraciones que contribuyen a transmitir la información, lo que lo vuelve muy claro y de fácil lectura. El hecho de que cada capítulo incluya sus propias referencias bibliográficas facilita la búsqueda de las fuentes referidas. Además, el volumen cuenta con un detallado índice temático al final.
Diane Gifford-Gonzalez (Department of Anthropology, University of California, Santa Cruz, EEUU) es una de las principales referentes en la zooarqueología y la tafonomía. Ha publicado numerosos trabajos, entre los que se incluyen muchas contribuciones fundamentales sobre la teoría y los métodos de estas disciplinas. Es una de las primeras arqueólogas formadas en el estudio de restos faunísticos, y su perspectiva es ampliamente internacional. Ha llevado a cabo investigaciones en África y Norteamérica, ha brindado seminarios en diversos países y se ha nutrido de las investigaciones realizadas en todos ellos. La influencia de sus siempre renovadas ideas es altamente significativa en la zooarqueología y tafonomía globales, en particular en Argentina, país que visitó en 2007 ( International Council for Archaeozoology [ICAZ] 2007).
El libro consta de cinco secciones que contienen un total de 26 capítulos. Las primeras secciones consisten en una introducción a la zooarqueología y a su historia. Desde aquí se evidencia la perspectiva internacional de la autora, que incluye una historización de la disciplina en diferentes países. Además, es destacable la perspectiva de la zooarqueología en el marco de las grandes preguntas de la arqueología. Otro aporte significativo de esta parte del libro –y que constituye una de las contribuciones más valiosas de la obra– es la síntesis de las consideraciones filosóficas y epistemológicas subyacentes a las investigaciones zooarqueológicas. Además de abordar la naturaleza de la causalidad en los sistemas biológicos y de sistematizar conceptos clave como los de analogía y uniformismo, aquí Gifford-Gonzalez desarrolla su concepción de un abordaje basado en los productos, que es uno de los aportes fundamentales de la autora a los campos de la zooarqueología y la tafonomía. Dicho abordaje es relevante a diferentes modelos y marcos teóricos, ya que el contexto más general, o sea, el nivel inferencial de mayor amplitud, puede ser de diferente naturaleza de acuerdo con la perspectiva que adopte el investigador.
La segunda sección del volumen trata sobre la naturaleza de las evidencias, en particular de los vertebrados. Esta sección incluye un capítulo sobre cuerpos y restos de vertebrados como materiales uniformes, donde se tratan las propiedades de huesos, dientes y otros tejidos animales, y otros capítulos sobre las propiedades intrínsecas de los huesos. Uno de ellos aborda la cuestión de por qué los animales comen animales, y trata temas tales como los requerimientos nutricionales que aportan los alimentos de este origen y sus variaciones. En esta sección también se trata de cómo podemos determinar taxones e inferir tamaño corporal, sexo y edad de los animales a partir de sus huesos y dientes, y la relevancia de estas cuestiones para la zooarqueología, considerando aspectos tales como la distinción de animales silvestres versus domésticos y la inferencia de la estacionalidad de las ocupaciones arqueológicas a partir de los recursos animales utilizados. Atravesando esta sección, como en toda la obra, se tratan los distintos aspectos tafonómicos que condicionan los patrones inferidos en el registro arqueofaunístico.
La siguiente sección trata sobre los abordajes prácticos del análisis zooarqueológico, desde el campo hasta el laboratorio y más allá. Incluye un capítulo sobre recuperación en campo, métodos de laboratorio, registro de datos y curación, donde se abordan todos los pasos, desde el diseño de una investigación hasta la generación de datos y su archivo. Luego se tratan temas centrales en todo compendio sobre zooarqueología, como lo son la identificación, incluidas las decisiones de clasificación y sus consecuencias analíticas, y las unidades básicas de cuantificación y su relación con las preguntas de investigación.
Sigue una sección que presenta una descripción muy detallada de la identificación de procesos causales, efectores y actores (sensu Gifford-Gonzalez 1991), a partir del abordaje basado en los productos. Esta parte incluye un capítulo sobre la fragmentación ósea de origen antrópico, animal y geológico. Otros dos capítulos tratan sobre los efectos de los actores naturales sobre los huesos, incluyendo mamíferos carnívoros, ungulados y roedores, además de reptiles y aves. Aparte de considerar en detalle las trazas de estos diferentes actores, la autora aborda las condiciones bajo las cuales ellas varían. De este modo trasciende los tratamientos meramente descriptivos o metodológicos del tema, como lo hace a lo largo de todo el trabajo. Los dos capítulos siguientes versan sobre los efectos del comportamiento humano en los huesos, y abarcan todas las actividades, desde el corte y la percusión hasta el procesamiento culinario y la conservación, y sus implicancias. Aquí dedica un apartado al omnipresente problema de la equifinalidad, y también uno a la posibilidad de discernir arqueológicamente el descarte derivado de actividades culinarias domésticas. Luego aborda los efectos de invertebrados, de plantas y de procesos geológicos, tanto bioestratinómicos como diagenéticos, en el registro faunístico.
Finalmente, una última sección incluye un rico análisis sobre la inferencia de los contextos de comportamiento, sociales y ecológicos, enfocada en los niveles inferenciales de mayor generalidad. Esta, junto con la tercera, conforma una de las partes más originales de esta comprehensiva obra, e incluye un capítulo sobre el análisis de conjuntos formados por múltiples agentes, un desafío al que todo zooarqueólogo y tafónomo deben enfrentarse. La utilidad de este capítulo yace no solo en que trasciende la más clásica descripción de los efectos de cada actor, o bien de las diferentes trazas más allá del actor que las produce (Fernández-Jalvo y Andrews 2016), para evaluar la complejidad de conjuntos reales, sino que además lo hace con ejemplos concretos. Otro capítulo se centra en el uso de unidades de cuantificación y estadística. Mientras que estos aspectos son tratados en profundidad en otros volúmenes (e.g., Lyman 2008), este trabajo se centra en sus usos en el marco del razonamiento zooarqueológico, en función de los objetivos de la investigación. Los siguientes capítulos de esta sección abordan las problemáticas de la desarticulación de los vertebrados, su dispersión, desmembramiento y transporte selectivo, y específicamente el transporte selectivo mediado por la nutrición; la durabilidad ósea; los perfiles de mortalidad; abundancia de especies y diversidad taxonómica; y las perspectivas de los estudios de isótopos, genética, ecología histórica y conservación, incluyendo las implicaciones de la zooarqueología aplicada. Estos capítulos se nutren, también, tanto de consideraciones teóricas, como de ejemplos concretos que los enriquecen. Los últimos capítulos de esta sección atañen a los marcos interpretativos más generales, y tratan de la relación de la zooarqueología con la ecología del comportamiento y con el estudio de las relaciones sociales, salpicados de cuestiones concretas sobre cómo abordar las grandes preguntas, así como del presente y futuro de la zooarqueología, donde la autora aporta su perspectiva más personal y su visión a partir del largo camino recorrido. En este sentido, su apelación a una documentación exhaustiva de los materiales arqueofaunísticos que estudiamos, que está en la base de cualquier análisis más sofisticado, así como a una descripción explícita de los métodos que empleamos para su análisis, asumen una gran relevancia como criterios que iluminen la zooarqueología de las próximas décadas.
En suma, tal como enuncia el título del volumen, esta comprehensiva obra brinda una introducción a la zooarqueología o, más bien, mucho más que una mera introducción. Ofrece una revisión crítica y bien documentada de la historia y teoría de la disciplina, así como también de una serie de actores y procesos que generan modificaciones óseas, tanto naturales como antrópicas, y sus trazas. Contiene asimismo un compendio actualizado de las estimulantes ideas sobre la naturaleza del registro zooarqueológico y los abordajes más productivos para su estudio desarrolladas por Diane Gifford-Gonzalez a lo largo de décadas, y esta es, en mi opinión, su contribución más valiosa. La autora ha trabajado como pocos la cadena inferencial desde las trazas observables en el registro fósil hasta los niveles inferenciales más generales, incluso desde diversos marcos teóricos, y esa riqueza analítica y claridad argumental atraviesan este volumen. Estos aportes de Gifford-Gonzalez han sido fundamentales en el desarrollo de la zooarqueología y la tafonomía, y constituyen una de las contribuciones más valiosas de esta obra indispensable en la biblioteca de todo laboratorio zooarqueológico.
AGRADECIMIENTOS
Quisiera expresar mi gratitud a Diane Gifford-Gonzalez por compartir su obra conmigo, a Atilio Zangrando por su invitación a escribir esta reseña y a Milena Sesar por contribuir a mejorarla con la edición del manuscrito.
REFERENCIAS CITADAS
Fernández-Jalvo, Y. y P. Andrews 2016 Atlas of Taphonomic Identifications: 1001+ Images of Fossil and Recent Mammal Bone Modification (Vertebrate Paleobiology and Paleoanthropology). Springer, Dordrecht. [ Links ]
Gifford-Gonzalez, D. 1991 Bones are not enough: Analogues, knowledge, and interpretive strategies in zooarchaeology. Journal of Anthropological Archaeology 10 (3): 215-254. [ Links ]
Gifford-Gonzalez, D. 2018 An Introduction to Zooarchaeology. Springer, Cham. [ Links ]
Grad, R. 2018 Prof. Gifford-Gonzalez Releases Text “Twenty-Five Years in the Making”. https://anthro.ucsc.edu/news/news-articles/gifford_gonzalez_textbook.html (22 de junio 2019). [ Links ]
International Council for Archaeozoology (ICAZ) 2007 Newsletter of the International Council for Archaeozoology 8 (2): 3. [ Links ]
Lyman, R. L. 2008 Quantitative Paleozoology. Cambridge University Press, Cambridge. [ Links ]
História medieval – SILVA (S-RH)
SILVA, Marcelo Cândido da. História medieval. São Paulo: Contexto, 2019, 160p. Resenha de: SILVA, Kléber Clementino da. SÆCULUM – Revista de História, João Pessoa, v. 24, n. 41, p. 453-463, jul./dez. 2019.
A vinda a lume do novo livro do professor da USP Marcelo Cândido da Silva, História medieval, pela editora Contexto, deve sem dúvida dar motivo a comemorações por parte de estudantes e professores de história, bem como do mais público interessado. Apesar dos recentes avanços da medievalística em terras tupiniquins, por mérito de pesquisadores como Neri de Barros Almeida, Renato Viana Boy, Johnni Langer, entre outros, sem excluir o próprio autor ora resenhado – que já publicou sua tese doutoral sobre a monarquia franca, um conhecido livro discutindo a “queda” do Império Romano do Ocidente e outro sobre o crime no Medievo – sínteses atualizadas e de qualidade, ao alcance do leitor brasileiro, sobre os dez séculos em que, na periodização tradicional, se alonga a Idade Média são ainda produtos raros. E é precisamente esta a lacuna que a recente publicação procura preencher: uma obra de pequena extensão e linguagem simples, tecida com sólida erudição e rigor acadêmico, revisitando tópicos julgados basilares para o primeiro contato com o campo da medievalística: o debate sobre as migrações germânicas e a “queda” do Império Romano do Ocidente; a dominação senhorial; a Reforma da Igreja; a crise dos séculos XIV e XV, entre outros. A opção pela exposição que combina capítulos temáticos com um discernível encadeamento cronológico, ademais, diferencia o novo texto do já clássico Idade Média: o nascimento do Ocidente, de Hilário Franco Jr., publicado em 1986, cujos blocos temáticos pensam o tempo medieval a partir de “estruturas” (políticas, econômicas, sociais, culturais, etc.), faceta teórico-metodológica recorrente nos estudos daquele professor. Este, aliás, como veremos, não é o único elemento que aparta ambos os estudos. Leia Mais
Quantitative Methods in Archaeology Using R – David Carlson
David Carlson. www.researchgate.net/project/Quantitative-Methods-in-Archaeology-Using-R
Los métodos cuantitativos ocupan un lugar central en la arqueología contemporánea y son objeto de numerosas publicaciones cada año, desde manuales universitarios hasta artículos teóricos y técnicos. Su desarrollo va de la mano del acceso a recursos informáticos cada vez más potentes y versátiles, tanto hardware como software. En el caso de las aplicaciones estadísticas se cuenta con soluciones propietarias y de código abierto. Entre las segundas se destacan lenguajes de programación como Python o R. Aquí haremos foco sobre el segundo de estos lenguajes y sobre un manual de reciente publicación: Quantitative Methods in Archaeology Using R, de David L. Carlson, publicado en 2017 por Cambridge University Press.
Res un lenguaje especializado en análisis estadístico y la generación de gráficas (plots), mantenido, distribuido y documentado por CRAN Project (Comprehensive R Archive Network). Además de la gratuidad, las ventajas de R incluyen flexibilidad y potencia analíticas, la posibilidad de almacenar todos los pasos de un análisis y una biblioteca de paquetes desarrollada por la comunidad de usuarios, que contempla una gama exhaustiva de disciplinas y técnicas. Finalmente, con un dominio mínimo de R es posible crear funciones y paquetes nuevos, existiendo ya algunos específicos para arqueología (e. g. Price et al., 2016).
La principal desventaja de Res que la casi totalidad de las operaciones se realizan por medio de una consola de comandos o de un archivo de código fuente y, por lo tanto, es necesario conocer su sintaxis y la forma en que una función opera sobre distintas estructuras de datos (vectores, listas, data frames). Si bien Rcuenta con una amplia documentación y bibliografía, más tutoriales y foros de discusión de programadores como stackoverflow, hay muy pocos textos introductorios dedicados a su aplicación en arqueología. Quantitative Methods in Archaeology Using R (QMARen adelante) realiza una contribución muy importante a la cobertura de esta vacancia. El autor, David L. Carlson, fue profesor de antropología de la Universidad de Texas A&M hasta 2019 y el manual reseñado es la síntesis de su labor docente al frente de cursos de grado en métodos investigación arqueológica, además de su experiencia investigativa. Previamente, Carlson ya había escrito guías auxiliares de R para manuales introductorios de estadística arqueológica (e. g. Drennan, 2010; Shennan, 1997).
La meta de QMARes brindar una guía práctica a la aplicación en Rde distintas técnicas estadísticas. El manual cubre al menos dos áreas. En primer lugar, introduce el lenguaje R al público inexperto, familiarizando al lector con la instalación, interfaz de usuario, paquetes y librerías, importación de datos, sintaxis, operaciones y conceptos centrales de la programación orientada a objetos (funciones, clases e instancias de objetos, tipos de datos, etc.). A lo largo de los capítulos, a la par que se introducen distintos tipos de análisis, Carlson brinda ejemplos paso a paso de codificación, nuevas librerías y funciones, preparación de datos para análisis o de cómo agregar detalles a las figuras. Cada capítulo cierra con una lista completa de las funciones utilizadas. Segundo, QMAR brinda un arsenal amplio de aproximaciones cuantitativas a los datos arqueológicos. La introducción repasa algunos de los grandes problemas y preguntas de la arqueología. En ella se describen los distintos tipos de medidas utilizadas (dicotómicas, nominales, ordinales, numéricas, etc.), se clasifican los datos cuantitativos de la arqueología en cuatro tipos -de forma, composición, edad y localización- y se reseñan cuatro grandes áreas de los métodos cuantitativos -estadísticas descriptiva, inferencial y bayesiana y aprendizaje estadístico. A partir del capítulo 3 el libro hace un recorrido progresivo que inicia con la estadística descriptiva, la generación de tablas y gráficos, siguiendo con la transformación de datos (distribución, ponderación, escalado, etc.), la contrastación de hipótesis, análisis de correlación, técnicas exploratorias multivariadas, culminando con algunos problemas y técnicas específicas de arqueología, tales como la distribución espacial de hallazgos, seriación y diversidad de conjuntos artefactuales. Al explicar un método, Carlson detalla su base teórica y metodológica, su alcance y cómo interpretar su resultados. Las demostraciones del manual se basan en datasets arqueológicos reunidos en la librería archdata de R, de manera que el lector pueda reproducirlos. Como cabe esperar, QMARno agota el extenso arsenal de métodos cuantitativos disponibles hoy (e.g. estadística bayesiana o ciencia de datos), pero da una base adecuada para abordarlos subsecuentemente. Hay que destacar que QMARes también un recetario; el código de un ejemplo puede ser tomado como base y adaptado a nuestros propios datos y problemas. El código completo de los ejercicios está disponible para bajar desde la página web del autor (https://sites.google.com/a/tamu.edu/dlcarlson/home). Carlson pone también a disposición del público guías auxiliares de R para diversos manuales de estadística. Hay que señalar que de una versión a otra de Ro de sus librerías puede variar la sintaxis de una determinada función, por lo que a veces podemos vernos en la necesidad de modificar un comando.
Es muy probable que en los próximos años seamos testigos de un uso más extendido de R y, probablemente, Python entre los arqueólogos de América Latina. Es por ello que QMAR es un excelente punto de partida.
Carlson, D. L. (2017). Quantitative Methods in Archaeology Using R. Cambridge: Cambridge University Press Drennan, R. D. (2010). Statistics for archaeologists. Springer.
Shennan, S. (1997). Quantifying archaeology. University of Iowa Press.
Carlos Belotti López de Medina – Es doctor en arqueología por la Universidad de Buenos Aires y actualmente se desempeña como investigador en el Instituto de las Culturas (IDECU, UBA, CONICET). Su especialidad es la zooarqueología de las sociedades agroalfareras del Noroeste argentino.
Para citar este texto:
CARLSON, David L. Quantitative Methods in Archaeology Using R. Cambridge Manuals in Archaeology. Cambridge: Cambridge University Press, 2017. Resenha de: BELOTTI, Carlos. Revista de Arqueología Histórica Argentina y Latinoamericana, Buenos Aires, v.2, n.13, p.101-104, 2019.
O que é Educação Histórica – SCHMIDT; URBAN (REH)
SCHMIDT, Maria Auxiliadora M. dos S.; URBAN, Ana Claudia. O que é Educação Histórica. Curitiba: W.A. Editores, 2018. Resenha de: SUKOW, Nikita Mary; URBAN, Ana Claudia. Revista de Educação Histórica, Curitiba, n. 17, p.86-89, jul./dez., 2018.
Organizada por Maria Auxiliadora Schmidt e Ana Claudia Urban, professoras do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFPR e vinculadas ao Laboratório de Pesquisa em Educação Histórica da mesma universidade (LAPEDUH/UFPR), a obra “O que é Educação Histórica” (2018) inaugura uma coleção que se debruça sobre as problemáticas e questões tangentes ao domínio científico da Educação Histórica. Conforme anunciam as autoras, a característica marcante da coleção é a sua construção coletiva levada à cabo por professoras-historiadoras e por professores-historiadores que debruçam-se sobre as pesquisas em ensino de história. Ao longo de seis capítulo, o livro delineia o domínio da Educação Histórica, elencando sua tradição historicamente construída, seu arcabouço teórico próprio, as pesquisas desenvolvidas e sua relação com a vida prática das e dos professores e estudantes.
O primeiro capítulo discute a tradição historicamente construída da Educação Histórica, desde seus primórdios na década de 1960 com a History Education de origem inglesa e seus reflexos nas investigações portuguesas, passando pelas reflexões em Didática da História advindas da Alemanha, até chegar a consolidação deste campo no Brasil.
Após este resgate histórico, os capítulos seguintes discutem a fundamentação teórica das investigações em Educação Histórica. Em “Fundamentos da Educação Histórica”, o arcabouço teórico é trazido à tona, em especial a partir da Teoria e da Filosofia da História esboçadas por Jörn Rüsen. Destaca-se, neste momento ainda, a especificidade das investigações em Educação Histórica desenvolvidas no Brasil, isto é, a da interlocução entre as ideias rüsenianas e a Ciência da Educação – característica que pode ser encontrada nos exemplos de investigações trazidos pelo capítulo. á em “Educação Histórica e a aprendizagem da narrativa”, a narrativa histórica, como um dos elementos da matriz disciplinar da Ciência da História elaborada por Rüsen, é apontada como o foco principal da narrativa histórica. Ancorando-se neste historiador alemão, os e as autores(as) do capítulo ressaltam a teoria de que aprender história é aprender a narrar historicamente. A partir disso, em um primeiro momento, realizam um debate teórico acerca da teoria narrativa esboçada por Rüsen, passando em seguida para uma discussão acerca de pesquisas empíricas que preocuparam-se com a relação entre narrativa e aprendizagem histórica.
Dando continuidade a esta proposta de exemplificar os elementos teóricos a partir de pesquisas empíricas, o capítulo denominado “Pesquisar em Educação Histórica” resgata o histórico das pesquisas em ensino e aprendizagem históricos. Para tal, partem das pesquisas que tinham como referência o modelo memorialístico, pautado na teoria da aprendizagem associacionista que predominaram no início das investigações em aprendizagem histórica. Tal modelo sofre também a influência da teoria da taxionomia de Bloom e dos teóricos ligados à pedagogia construtivista. Em um segundo momento, o capítulo elenca as investigações pautadas pelas teorias piagetianas e os primeiros estudos, desenvolvidos na década de 1970, que tinham como preocupação a aprendizagem histórica dentro de uma perspectiva que levava em conta a lógica particular do desenvolvimento histórico. O capítulo encerra com as investigações que tomaram como perspectiva a History Education, bem como seus desdobramentos que desembocam nas pesquisas desenvolvidas no LAPEDUH/UFPR.
Concluindo a obra, os capítulos finais abordam a interlocução entre a Educação Histórica, a cultura histórica e a vida prática. O capítulo “Contribuições das pesquisas em Educação Histórica para a prática da sala de aula” ressalta uma das características mais significativas das pesquisas em Educação Histórica, em especial em termos brasileiros, qual seja a de manter a relação entre a teoria e a vida prática, ampliando o diálogo entre a Universidade e a Escola Básica. Esta característica deve-se ao fato da maioria dos e das investigadoras (es) ligados à diretamente nas suas pesquisas, que por sua vez, trazem consequências para as suas práticas. Após tratarem desta relação teoria-vida prática, os e as autores(as) trazem três exemplos de investigações que articularam ambos.
O capítulo final, “A Educação Histórica e o professor como investigador social”, mantém a tônica do capítulo anterior. As autoras refletem sobre o papel do professor e da professora investigadores, apontando como a pesquisa tem sido fundamental para o processo de produção do conhecimento histórico em sala de aula, sobretudo quando a História é entendida como um conhecimento científico. Seguindo o padrão dos capítulos anteriores, iniciam elencando como o papel da pesquisa na formação inicial e continuada dos e das professores(as) foi um tema de investigação que surge na década de 1970 na Inglaterra, tornando-se uma preocupação central das pesquisa em Educação no Brasil da década de 1990. Após esta discussão teórica, a importância e o significado dos Laboratórios de Ensino de História na prática dos e das professores(as) é ressaltada, principalmente pela sua característica de aproximar a Universidade da Escola Básica, diminuindo a separação teoria-prática.
Ainda que diversas obras com a temática da Educação Histórica tenham sido publicadas ao longo dos últimos 20 anos no Brasil, faltava uma obra que agregasse os princípios teóricos e trouxesse exemplos de investigações empíricas no tema de maneira objetiva e visando inserir pesquisadoras(es) interessadas(os) nesta campo de investigação. Lacuna esta preenchida pela obra “O que é Educação Histórica”.
Cabe ressaltar que, apesar de possuir este caráter introdutório à Educação Histórica, as discussões encetadas não se resumem a tal, avançando no diálogo teórico e oferecendo referências para o aprofundamento dos e das pesquisadoras(es) interessadas (os). Como anúncio de uma coleção que pretende avançar nas discussões em Educação Histórica levadas à cabo no Brasil, “O que é Educação Histórica” tem como grande mérito organizar de maneira objetiva os principais temas que giram em torno deste domínio científico. A maneira orgânica pela qual está organizado, iniciando pelo seu percurso histórico, passando pelo aporte teórico e encerrando com a relação com a vida prática, bem como o destaque dado às investigações já realizadas e o grande volume de referências oferecido aproximam as e os interessadas(os) a este campo de investigação. Paralelamente, oferecem subsídios para o aprofundamento das discussões e possibilitam o levantamento de novas questões de investigação.
Além disso, outro ponto a ser destacado é o caráter coletivo de sua elaboração, reforçando uma das peças fundamentais dos grupos de investigação ancorados na perspectiva da Educação Histórica, isto é, a busca pelo diálogo entre a Universidade e a Escola Básica. Cabe destacar, portanto, que o livro não foi apenas construído por professoras(es)-investigadoras(es), mas também para professoras(es)-investigadoras (es). Isso porque leva em conta as experiências dos autores e autoras, que preocuparam-se em elencar as questões fundamentais seja para o desenvolvimento de investigações que tomam como parâmetro a Educação Histórica, seja para suscitar reflexões acerca da prática do ensino de História em sala de aula.
Nikita Mary Sukow – Bacharel e licenciada em História pela UFPR, mestranda da linha Cultura, Escola e Ensino do PPGE/UFPR, bolsista CAPES e vinculada ao LAPEDUH/UFPR. E-mail: nikisukow@gmail.com
Ana Claudia Urban – Doutora em Educação pela UFPR, professora do DTPEN/UFPR e do PPGE/UFPR, vinculada ao LAPEDUH/UFPR. Orientadora do trabalho. claudiaurban@uol.com.br
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Teoria social: um guia para entender a sociedade contemporânea / William Outhwaite
Willian Outwaite atuou, por 34 anos, como professor de sociologia, coordenador do Programa de Pensamento Político e diretor do Centro de Teoria e Crítica Social na Universidade de Sussex. Autor de extensa obra sobre teoria social, é professor emérito de sociologia na Universidade de Newcastle, desde 2015.
Com o intuito de apresentar uma síntese da teoria social e o quanto essa ciência pode contribuir para a compreensão das grandes questões do mundo contemporâneo, a obra resenhada divide-se em oito capítulos. No primeiro, intitulado Origens, o autor promove uma reflexão sobre as origens das desigualdades sociais e os ideais, tão presentes hoje, que levaram às revoluções. Em Capitalismo, retoma o pensamento de Marx e Engels para analisar essa controversa forma social e econômica que, na atualidade, molda a vida da maior parte dos seres humanos. Em Sociedade, Outhwaite, objetivando examinar o desenvolvimento das sociedades – das formas simples às modernas – recorre a Herbert Spencer e Émile Durkheim. No quarto capítulo, Origens do capitalismo e teorias da ação social, o autor focaliza as precondições e consequências culturais do capitalismo.
Para introduzir o quinto capítulo e responder à pergunta “Como a sociedade é possível?”, o autor recupera o pensamento de Georg Simmel, cujo interesse por fenômenos culturais inspirou e inspira trabalhos em sociologia sobre a teoria “pós-moderna”. Em A descoberta do inconsciente, Outhwaite discorre sobre como a análise da psique de Freud moldou a compreensão da realidade, delineando as implicações desses estudos na cultura contemporânea. No capítulo Teoria social e política, a maneira pela qual alguns teóricos sociais tentaram explicar a política moderna recebe destaque. Por fim, em Questão pendente, temas relevantes na contemporaneidade que, até pouco tempo, eram negligenciados na teoria social são abordados, tais como gênero, relações internacionais e guerra, raça, colonialismo e crise ambiental.
O primeiro capítulo, concentra-se nas questões propostas por Rousseau e Montesquieu, no século XVIII, sobre a origem das desigualdades nas sociedades e a distinção entre moral e crítica social. Recorrendo a exemplos, o autor ilustra como esses temas permearam debates posteriores. Estabelece, desse modo, um paralelo entre as relações de poder, a histórica e crescente desigualdade social e, em se tratando de desigualdade natural, como nas sociedades capitalistas os olhares se voltaram à equidade. Nesse sentido, ressalta-se como as críticas de Rousseau ao excesso e ao luxo ou, nas palavras desse filósofo do iluminismo, a distinção entre a vontade conectada ao bem público e a vontade relacionada aos interesses individuais é extremamente relevante para a compreensão da política moderna.
Ainda sobre a política moderna, o autor retoma o pensamento de Montesquieu que, em O espírito das leis (1748), enfatiza a necessidade de um legislador, tanto quanto um arquiteto, conhecer bem o terreno antes de elaborar projetos, visto que o terreno pode não suportar o peso do que foi planejado. Em outras palavras, regimes políticos encontrarão solo seguro quando adequados à sociedade, não impostos. A aguda percepção de Montesquieu acerca da interação entre eventos acidentais e causas estruturais de longo prazo é, portanto, um bom ponto de partida para estudos que tem por fim compreender a relação entre o papel dos indivíduos e as estruturas mais amplas da história.
O autor finaliza este capítulo retomando a ideia de Montesquieu acerca do “espírito geral” e sinalizando como a mesma, além de encontrar eco no que Durkheim chamou de “consciência coletiva”, se mostra nuclear nos dias atuais para analisar-se as desigualdades, a democracia e os perigos do conformismo ou, numa expressão de Tocqueville, da tirania de uma maioria.
No segundo capítulo, Outhwaite, promove uma incursão na obra de Marx e Engels. De acordo com esse professor de sociologia, as análises realizadas por esses dois teóricos germânicos sobre os antagonismos das classes e as formas de produção são, até hoje, a forma mais consiste para pensar-se a estrutura social e econômica vigente na maior parte do globo terrestre: o capitalismo.
Começando com conceitos presentes em O capital (1867), é-se apresentado ao que Marx chamou de “valor de uso”, valor de troca”, “fator sensação”, “equivalente universal” e “mais valia”. Outhwaite assinala que a exploração do trabalho assalariado é tão intrínseca ao processo capitalista quanto os conflitos entre os que detêm os meios de produção e os que dispõe da força de trabalho. Lembrando que o lucro decorre do fato dos trabalhadores receberem em seus salários um valor bem distante do equivalente à produção por eles realizada, e os conflitos, por sua vez, resultam desse valor recebido mal suprir as necessidades de sobrevivência de quem detém a força de trabalho.
Ainda na atualidade, a ideia de receber o “valor total de seu trabalho” permanece tão incompatível com a manutenção do sistema capitalista que, em 1995, Tony Blair retirou do verso das carteiras dos trabalhadores a famosa clausula quatro do estatuto do Partido Trabalhista, que reconhecia como justo “Assegurar aos trabalhadores braçais ou intelectuais os plenos frutos de sua indústria e a mais equitativa distribuição possível deles, com base na propriedade comum dos meios de produção, distribuição e troca” (OUTHWAITE, 2017, p. 31).
Outra questão que merece destaque é a crítica de Marx à religião, por promover reflexões sobre a estreita relação entre os antagonismos de classes nas sociedades modernas e as ideologias. Para Marx, a insatisfação com as condições políticas e sociais levava o povo a refugiar-se nas ilusões da religião. Sob esse prisma, ao puxar o fio da religião, desmancham-se as bases que legitimam ideologicamente as desigualdades e a exploração.
Antes de encerrar o segundo capítulo, a autor ressalta como pode-se observar, no pensamento de Marx e Engels, a importância de uma relação harmônica entre seres humanos e, indubitavelmente, como essa necessidade de harmonia deve ser estendida a toda a natureza. Esses elementos abrem espaço para argumentar-se que a obra desses dois teóricos da filosofia e da sociologia, implicitamente, oferece bases para reflexões sobre desenvolvimento sustentável nas sociedades humanas. Tanto que, perto do final do século XX, na esteira do pensamento desses revolucionários socialistas, emergem movimentos anticapitalistas combinados a novos movimentos sociais, abordando temas como a desigualdade de gênero, a exploração baseada na etnicidade e a crise ambiental.
Em Sociedade, ao analisar o pensamento de Herbert Spencer – pioneiro da teoria social evolucionista –, o autor ilustra a problemática presente na ideia de “sobrevivência dos mais aptos”. Desta forma, sugere que para realizar-se um exame, por exemplo, do esgotamento do comunismo, tem-se que considerar um feixe de elementos que perpassam por questões econômicas, ideológicas e culturais.
Ao avaliar o contraste entre o que os teóricos marxistas chamam de ideologia e o que Durkheim nomeia como sistemas de valores compartilhados, Outhwaite lembra que Durkheim, no final do século XIX, em sua obra O suicídio (1897), analisou as diferentes taxas de suicídio e promoveu reflexões sobre o valor das crenças compartilhadas, bem como sugeriu a importância dos laços sociais. Esses estudos instigam questionamentos sobre o modelo globalizado e fragmentado da sociedade em que vivemos.
No quarto capítulo, é apresentado o pensamento contido na obra de Weber, A ética protestante e o espírito do capitalismo (1904-05). Destaca-se a análise sobre o modelo da ética econômica protestante e os quatro tipos principais de ação identificadas por Weber: a ação tradicional, a ação guiada pela emoção, a ação irracional em relação aos fins e a ação racional em relação aos valores.
O autor finaliza o quarto capítulo focalizando no trabalho de Georg Lukács, Theodor Adorno e Habermas as conexões entre as formas de ação social, no nível mais básico, e os processos mais amplos de desenvolvimento social e histórico.
Em como a sociedade é possível, Outhwaite descreve ligações entre comportamentos cotidianos e processos estruturais mais amplos, tendo como base o pensamento de Georg Simmel, Erving Goffman, Harold Garfinkel, e a obra de Norbert Elias, O processo civilizador (1939). Nas palavras do autor, em razão do extenso exame que Simmel realiza das precondições e das consequências intelectuais, culturais e psicológicas da economia monetária em A filosofia do dinheiro (1900), essa obra poderia, sem dúvida, ter por título “sociologia do dinheiro”. Para esse sociólogo alemão, individualismo, nervosismo e economia monetária se relacionam estreitamente com a vida urbana, sendo o desgaste compensado pela atitude blasé.
A obra de Goffman, por sua vez, tem como foco a dimensão da representação no desempenho de papeis sociais, ou seja, de acordo com esse sociólogo norte americano, as pessoas se adequam aos papeis prescritos pela sociedade para não serem excluídas. O pensamento de Harold Garfinkel se aproxima da abordagem de Goffman, já que para o primeiro a manutenção da ordem é produto do trabalho interpretativo dos atores sociais.
Após destacar o paralelo estabelecido por Norbert Elias entre as transformações, nos primórdios da Europa moderna, das estruturas de personalidade e dos comportamentos individuais e a origem do Estado moderno, Outhwaite, recorre a Zygmunt Bauman e Luc Boltanski para expor a magnitude dos desafios da sociedade contemporânea.
Partindo da premissa de que a análise que Sigmund Freud fez da psique moldou totalmente a compreensão que tem-se da humanidade e, consequentemente, da cultura e da sociedade, Outhwaite inicia o sexto capítulo ponderando acerca do papel do recalcamento de pulsões conscientes e inconscientes na construção da cultura humana. Para defender sua tese, recorre às teorias de Freud, Erich Fromm, Herbert Marcuse, Theodor Adorno e Louis Althusser.
Ainda nesse capítulo, o autor estabelece associações entre e as ideias de Freud e as de Marx; entre o modelo de autoridade carismática de Weber e os sentimentos inconscientes – estudados por Freud – de quem segue essa espécie de liderança; e, por fim, entre a ênfase de Freud na regulação e o que Durkheim denominou ausência de normas na sociedade moderna. Destaca-se o impacto da psicanálise na interpretação de textos literários e na análise de produções cinematográficas, em especial, as análises de Hanns Sachs, Gilles Deleuze e Slavoj Žižek.
No capítulo intitulado Teoria social e política, Werner Sombart, Robert Michels e Norbert Elias são referências para o debate sobre o quanto uma concepção do social ou de sociedade pode ter potencial para promover a compreensão de problemas que a abordagem política não consegue alcançar. Outhwaite lembra que esses teóricos sociais propuseram análises significativas da política e, para ilustrar, retoma suas ideias sobre a permanente oposição entre a teoria das elites e a teoria da sociedade de massas; a exposição das massas urbanas às elites demagógicas; a abertura da teoria crítica às questões culturais e à teoria freudiana; a oposição entre as explicações centradas no Estado e centradas na sociedade; bem como sobre as teorias da globalização e suas dimensões econômica, social e cultural.
Sobre as teorias da globalização, finaliza esse capítulo lembrando que essas não podem se deter aos aspectos econômicos, pois envolvem dimensões sociais e culturais mais amplas. Nesse sentido, o autor propõe a reflexão sobre as formas atuais de política democrática em meio a relativa imobilidade das estruturas políticas e os avanços das técnicas de manipulação das massas, destacando o controle exercido pela televisão e ascensão de partidos populistas.
Outhwaite, em Questão pendente, avalia que, apesar da relevância da teoria social, algumas áreas foram tardiamente tratadas pela sociologia, como, por exemplo, as relações internacionais e a guerra. De acordo com pesquisas realizadas por esse autor, a palavra conflito – relacionada à conflito internacional e guerra – pouco aparece nas produções acadêmicas do final do século XX. Além disso, pouca atenção foi dada às noções grosseiras de competição evolutiva aplicadas ao social e aos movimentos “verdes” que, nas palavras do autor, não podem continuar sendo negligenciados pela sociologia.
A teoria pós-colonial tem se mostrado mais forte nos estudos literários que nas ciências sociais e, sobre essa sociologia que emergiu de uma cultura imperialista e desconsiderou o mundo colonizado, o autor afirma ser urgente sua revisão. Considera, também, que os debates em torno da modernidade e pós-modernidade não podem mais ignorar os modos como a democracia foi transformada em algo próximo a um teatro, no qual a política é protagonizada pelos que controlam as finanças e os meios de comunicação.
Para além de proporcionar uma viagem panorâmica pelos tópicos que interessam à teoria social e uma breve abordagem das análises realizadas pelos seus principais pensadores, nesse livro, pode-se avaliar o papel da teoria social e sua possibilidade de iluminar, em conjunto com as ciências sociais e a filosofia, questões latentes no século XXI.
Considera-se que, em um cenário contraditório, de aumento de pobreza, desemprego e exclusão, de violência urbana e de inquestionável expectativa de pertencimento ao mundo, tem-se como escolha a negação de acondicionamento ao existente. Nesse sentido, o conhecimento que advém desse livro pode ser uma excelente contribuição para instigar reflexões sobre e ações direcionadas às possibilidades de construção de, como coloca Gohn e Hamel (2003, p. 118), um “(…) novo modelo civilizatório, em que a cidadania, a ética, a justiça e a igualdade social sejam imperativos, prioritários e inegociáveis”.
Referências
GOHN, Maria da Glória; HAMEL, Pierre. Movimentos sociais e mudanças na democracia. In: ROMÃO, José Eustáquio; SANTOS, José Eduardo de O. Questões do Século XXI, tomo I. São Paulo: Cortez, 2003.
Régia Vidal Santos – Doutoranda em Educação na Universidade Nove de Julho (UNINOVE).
OUTHWAITE, William. Teoria social: um guia para entender a sociedade contemporânea. Rio de Janeiro: Zahar, 2017. 142p. Resenha de: SANTOS, Régia Vidal. Em Tempo de Histórias, Brasília, n.32, p.126-131, jan./jul., 2018. Acessar publicação original. [IF].
A História Refigurada: novas reflexões sobre uma antiga disciplina – JENKINS (RTF)
JENKINS, Keith. A História Refigurada: novas reflexões sobre uma antiga disciplina. Tradução de Roberto Cataldo Costa. São Paulo: Contexto, 2014. Resenha de: ASSIS, Gabriella Lima de. Revista Territórios & Fronteiras, Cuiabá, v. 7, n. 1, jan.-jun., 2014.
Depois de publicar ao longo da década de 1990 obras que discutiram as pro-fundas mudanças pelas quais a história passou enquanto disciplina1, o historiador inglês Keith Jenkins, professor emérito da University of Chichester, escreveu uma no-va obra na qual apresentou os seus argumentos em relação ao discurso da pós-modernidade.
Segundo o próprio autor, a sua intenção nesta nova obra recentemente tra-duzida para o português com o título “A História Refigurada”2 foi apresentar para os estudantes de história que estão empenhados em “fazer história” ou prestes a isso, novos argumentos capazes de trazer frescor a uma disciplina tão antiga por meio da tentativa de refigurá-la diante das abordagens sinalizadas pelo pós-modernismo.
Existem muitas definições diferentes acerca do pós-modernismo3, porém nesta obra Keith Jenkins o compreendeu como “a era da aporia” em que o discurso da história deve ser pensado como uma estética “e não como uma epistemologia objetiva, verdadeira ou fundacional”4. Desta maneira, ao longo do desenvolvimen-to dos argumentos concatenados no livro, o autor mencionou que a sua expectativa com a escrita deste livro não foi a de superar a história pós-moderna, na verdade seu objetivo principal foi trabalhar o discurso da história na direção desse tipo de democra-cia radical e aberta, que entende a impossibilidade de instituir um fechamento histórico/historicizante total do passado, ao mesmo tempo que reconhece que suas formas refiguradas de conceber – ou seja, figurar – as coisas “nunca terão sido boas o suficiente” – e que esta é a mais desejável5.
Com uma escrita intencionalmente polêmica e muito provocativa, Keith Jenkins não omitiu que foi muito influenciado por Jacques Derrida, Hayden White e Frank Ankersmit juntamente com seus respectivos postulados teóricos durante a escrita desta obra. Sem esperar a aprovação dos mesmos, Keith Jenkins afirmou que se beneficiou pessoalmente ao ler todos eles e pretendeu de forma clara expres-sar os méritos de cada um nos três capítulos que compõe seu novo livro.
O primeiro capítulo intitulado “Tempo (s) de abertura” apresenta as contri-buições do teórico francês Jacques Derrida para o pensamento histórico. Da manei-ra como Keith Jenkins nos permite entender, a principal contribuição deste autor foi unir “a demonstração da impossibilidade do fechamento linguístico/discursivo a uma promessa emancipatória e política”6.
A idéia central deste capítulo parece ser a de demonstrar que a abertura ine-vitável proporcionada pelas perspectivas pós-modernas que Derrida ajudou a con-solidar, tem permitido releituras e reescritas do passado fazendo surgir uma história sempre refigurada. Nesse sentido, segundo Jenkins, os trabalhos de Derrida tenta-ram “mostrar, entre outras coisas, a impossibilidade de reduzir ao finito ou ao cog-noscível as infinitas possibilidades do pensar sobre o que a história pode ser”7.
Para Keith Jenkins, ser pós-modernista não é simplesmente aceitar perspec-tivas em múltiplos níveis ou crer na multi-interpretação. Na verdade, da maneira como discorreu Keith Kenkins neste capítulo, o que os pós-modernos problemati-zam não é o conteúdo da história, e sim o status de sua forma.
Novamente lançando mão de Derrida, Keith Jenkins explicou que os senti-dos não são constituídos por signos/palavras autossuficientes. Na verdade, E, de fato, é essa natureza aparentemente fixa do sentido que mui-tas vezes faz com que pessoas pensem equivocadamente que há al-go essencial na linguagem… de modo que, por exemplo, alguns historiadores supõem a existência de algo intrínseco no nome da história que a isentaria de receber sentidos e conotações infinita-mente novos, ao invés de ver que a “história”, como todos os con-ceitos, é um “significante vazio”8.
Ainda no primeiro capítulo Keith Jenkins trabalhou as idéias de “indecidibi-lidade da decisão” e de “aporia” de Derrida, cujas implicações na história podem ser compreendidas na medida em que enxergamos que o passado nada contém de valor intrínseco, nada a que tenhamos de ser leais, nenhum fato que tenhamos que encontrar, nenhuma verdade, problema ou tarefa a resolver, na verdade somos nós que decidimos sobre essas coisas9.
No segundo capítulo chamado “Ordem (ns) do dia” Keith Jenkins demons-trou como pode ser libertador para os historiadores a idéia pós-moderna de que não exista um método histórico ou uma epistemologia que não seja problemática.
Partindo dessa vez das contribuições do teórico norte-americano Hayden White, Keith Jenkins explicou que assim como o passado e a história, os fatos tam-bém são construções interpretativas. Para ele, “isso não significa negar a realidade dos acontecimentos passados, mas argumentar que eles não importam até receber significação no discurso”10.
Neste capítulo Keith Jenkins pode explicar o cerne do pensamento de Hayden White que o tornou um adepto dos pressupostos da história pós-moderna. Para ele, White considera axiomático que as hitsórias – especialmente as história narrativas (embora, provavelmente, todas as histórias se-jam narrativas em suas estruturas gerais) – sejam basicamente fictí-cias. Ou seja, embora possam querer dizer a verdade e nada mais que a verdade sobre seus objetos de estudo e sobre o que recolhem do arquivo, os historiadores não têm como narrar suas descobertas sem recorrer ao discurso figurativo11.
Ainda neste capítulo, Keith Jenkins falou sobre como o holandês Frank An-kersmit partiu de algumas idéias elaboradas por Hayden White para formular a noção de história como proposta, como apresentação e não como representação. Do ponto de vista de Jenkins seria possível concluir que para ambos os teóricos, o mais importante na escrita dos historiadores não está no nível do enunciado mas no da apresentação textual proposta, é esta que estimula o debate historiográfico. Des-ta forma a história seria sempre tão inventada (imaginada) quanto encontrada.
Em “Começar de novo: das disposições desobedientes”, o terceiro capítulo apresentado no livro, Keith Jenkins defendeu uma atitude que podemos considerar pós-moderna. Sem oferecer um mapa ou modelo de ação, o autor faz um elogio as análises históricas que celebram o caráter falho do fechamento.
Em sua análise o pós-modernismo pode ser entendido de maneira positiva por parte dos historiadores profissionais. Do modo como Keith Jenkins escreveu neste capítulo, o pós-modernismo não é uma espécie de moda, tão pouco pode ser resumido como uma interpretação pluralista. Para o autor, O pós-modernismo, como se entende positivamente aqui, é a ob-tenção de uma atitude, uma disposição militante, radical, que fra-giliza não apenas o conteúdo, mas também as formas gramaticais das histórias modernistas sem uma pitada de nostalgia, e oferece, em seu lugar, em suas novas gramáticas e atos de atenção, novas formas de mostrar “o antes do agora” ainda não concebido12 Por fim o autor acrescentou ainda o que ele denominou de “Coda”, para di-zer a respeito das principais implicações do seu pensamento histórico apresentado ao longo desses três capítulos que compuseram a sua nova obra. Firmando os seus posicionamentos bem como as idéias das quais partiu para escrever “A História Refigurada”, Keith Jenkins encerra fazendo algumas afirmações não menos polê-micas que certamente servem para aguçar e incentivar novas produções sobre o assunto.
Jenkins concluiu seu texto dizendo que “a ruptura entre as histórias moder-nas e pós-modernas não é uma ruptura epistemológica”13, a modernidade e a pós-modernidade são mundos diferentes, “todas as histórias são, portanto, do tipo esté-tico, que os pós-modernos levam ao nível da consciência”14.
De maneira geral podemos dizer que neste novo livro, Keith Jenkins estabe-leceu uma avaliação das principais questões levantadas pelo conhecimento históri-co nos últimos anos. Ele defendeu que grande parte dessas questões impactantes para a prática histórica permanece em aberto. Por meio de uma escrita instigante, Jenkins tratou da pós-modernidade trazendo à tona novas reflexões que servem tanto para professores quanto para alunos interessados pelas discussões sobre o pensamento histórico.
1 Cf. Rethinking History (1990) [ A História repensada]; On “What is History!” From Carr and Elton to Rorty and White (1995); The Postmodern History Reader (1997) e Why History! Ethics and Postmodernity (1999).
2 O título original da obra é Refiguring History: New Thoughts on an Old Discipline, trata-se de uma pu-blicação da Routledge de 2003.
3 Entre os teóricos que buscaram uma definição da temporalidade pós-moderna podemos citar: LYOTARD, Jean-François. A Condição Pós-Moderna. 5ª ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1998; JAMESON, Fredric. Pós-Modernismo: A Lógica Cultural do Capitalismo Tardio. 2ºed. São Paulo: Ativa, 2004; BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001; MUNS-LOW, Alun. Desconstruindo a História. Petrópolis: Vozes, 2009.
4 JENKINS, Keith. A História Refigurada: novas reflexões sobre uma antiga disciplina. Tradução de Ro-berto Cataldo Costa. São Paulo: Contexto, 2014, p. 103.
5 Ibidem, p. 14.
6 JENKINS, KEITH. op. cit. p. 48.
7 Ibidem, p. 33. 8 Ibidem, p. 36.
9 Keith Jenkins, op. cit. p. 46.
10 Ibidem, p. 65.
11 Ibidem, p. 67. 12 Keith Jenkins, op. cit. p. 97.
13 Ibidem, p. 100.
14 Ibidem, p. 101.
Gabriella Lima de Assis – Universidade Federal de Mato Grosso. Programa de Pós-graduação em História Av. Fernando Corrêa da Costa, nº 2367 – Bairro Boa Esperança – Cuiabá – MT – 78060-900 E-mail: gabriella.lima@gmail.com.
Didattica della storia. Manuale per la formazione degli insegnanti – PANCIERA; ZANNINI (DH)
PANCIERA, Walter; ZANNINI, Andrea. Didattica della storia. Manuale per la formazione degli insegnanti (1). Firenze: Le Monnier Università, 2006/2013, p. I-VIII, 1-232. Resenha de: FRIGERI, Alessandro. Didactica Historica – Revue Suisse pour l’Enseignement de l’Histoire, Neuchâtel, v.2, p.171-172, 2016.
In Italia, tra la fine degli anni Novanta e la fine degli anni Duemila, vennero istituite le SSIS (Scuole di Specializzazione all’Insegnamento Secondario), che per dieci anni risultarono essere il principale canale di formazione e reclutamento degli insegnanti. In alcune università, attorno alle SSIS, si creò un clima favorevole alla sperimentazione didattica e, in quel quadro, venne rilanciata la riflessione sulle didattiche disciplinari, che nel Paese vantava una significativa tradizione, perlomeno nell’ambito dell’insegnamento dell’italiano e delle scienze umane. Di quell’esperienza – chiusasi senza che le SSIS siano state sostituite da enti di formazione paragonabili e finita dunque con l’affievolirsi delle iniziative volte a valorizzare il tema della mediazione didattica nell’insegnamento – oggi rimangono, per quanto riguarda la storia, alcune importanti tracce: tra queste, degno di nota è sicuramente il manuale scritto da Walter Panciera e Andrea Zannini, docenti presso le università di Padova e di Udine, giunto ormai alla sua terza edizione1.
Il libro ha riscontrato un interesse tra insegnanti e specialisti difficilmente ascrivibile al solo fatto che attualmente è uno dei pochi strumenti di questo tipo presenti sul mercato italiano (non l’unico, d’altronde). A nostro giudizio, vi sono altre due sue precipue caratteristiche che ne spiegano almeno in parte la buona diffusione.
La prima riguarda il suo esplicito taglio manualistico, cioè il fatto che dietro all’opera vi è il dichiarato intento di proporre un testo capace di offrire ai lettori un insieme coerente e completo di informazioni considerate imprescindibili nella formazione iniziale dell’insegnante di storia. In meno di 250 pagine vengono affrontate questioni assai diverse tra loro: si richiamano le peculiarità epistemologiche della disciplina, il metodo in uso tra gli storici, le principali tappe della storia della storiografia; si sintetizzano i principali vincoli della normativa italiana; si ricordano infine i cambiamenti vissuti negli ultimi decenni dalle forme e dagli strumenti della didattica della storia, non omettendo di parlare dell’apporto vieppiù importante delle nuove tecnologie. Si tratta di un’impostazione che ha costretto gli autori a uno sforzo di sintesi notevole, che in alcuni passaggi può non soddisfare pienamente colui che cerca l’approfondimento di questioni qui solo accennate, ma che non può non dirsi riuscito. L’insegnante di storia – che in Italia sovente ha alle spalle una formazione filosofica o letteraria, cioè non specificatamente storica – troverà infatti in questo libro riferimenti a tutto ciò che dovrebbe comporre il suo bagaglio di conoscenze didattiche fondamentali. Egli potrà successivamente, orientato dalle ricche e curate note bibliografiche inserite alla fine di ogni capitolo, intraprendere quei percorsi di sviluppo professionale che, per loro stessa natura, non possono certo basarsi sulla sola lettura di testi manualistici.
Per quanto concerne l’altro ipotizzabile motivo del relativo successo del libro, va a nostro avviso segnalato il fatto che esso fa il punto del dibattito italiano sulla didattica della storia e sulle relative pratiche d’aula con un equilibrio non scontato. In Italia, come altrove, è presente da tempo tra gli “addetti ai lavori” un confronto, fatto di consensi ma anche di divergenze, attorno a modi e finalità dell’insegnamento della storia. Numerosi sono gli argomenti su cui si è sviluppata tale controversia: sull’utilità dei manuali scolastici, sull’apporto che la world history potrebbe dare alla ridefinizione dei contenuti dell’insegnamento, sulla cosiddetta didattica modulare (approccio che propone di non basare più la programmazione didattica sul solo principio cronologico-sequenziale) o sul nodo dell’insegnamento per competenze, solo per fare qualche esempio. Troppo spesso tali diatribe sono state sbrigativamente presentate come uno scontro tra innovatori e fautori della tradizione: Panciera e Zannini non lo fanno. Certo, non si esimono dal toccare molti di questi temi delicati, ma problematizzando le questioni, presentando le diverse posizioni in campo, evitando di aderire acriticamente alle mode passeggere: un approccio che, tra gli insegnanti, è facilmente apprezzato.
[Notas]
(1) Delle numerose pubblicazioni che rendono conto di quella stagione dal punto di vista della didattica della storia vanno citate almeno anche: Greco Gaetano e Mirizio Achille, Una palestra per Clio. Insegnare ad insegnare la storia nella scuola secondaria, Torino: UTET, 2008, che – al pari del libro qui recensito – ambisce a presentarsi come un vero e proprio manuale di didattica della storia, e Bernardi Paolo (a cura di), Insegnare storia. Guida alla didattica del laboratorio, Torino: UTET, 2006, 20122, che sembra essere stato apprezzato a sua volta dal corpo insegnanti. Non si possono inoltre mancare di ricordare i pochi ma pregevoli numeri della rivista Mundus (2008-2010), diretta da Antonio Brusa, e l’instancabile attività dell’associazione Clio ‘92, presieduta da Ivo Mattozzi.172 | Didactica Historica 2 / 2016
Alessandro Frigeri – Scuola universitaria professionale della Svizzera italiana.
[IF]
Saúde coletiva: teoria e prática – PAIM; ALMEIDA-FILHO (TES)
PAIM, Jairnilson Silva; ALMEIDA-FILHO, Naomar de (Orgs.). Saúde coletiva: teoria e prática. Rio de Janeiro: Medbook, 1.ed., 2014, 720pp. Resenha de: FRAGA, Lívia; CARNEIRO, Carla Cabral Gomes. Revista Trabalho, Educação e Saúde, Rio de Janeiro, v.14, n.1, jan./mar. 2016.
É um desafio tentar sumarizar, neste espaço, a contribuição de oitenta coautores à reflexão sobre a saúde coletiva, dentre eles Jairnilson Silva Paim e Naomar de Almeida-Filho, organizadores da obra Saúde coletiva: teoria e prática. Trata-se de uma complexa coletânea que, em seus 45 capítulos, agrupados em sete seções, apresenta uma introdução didática ao conjunto de saberes, estratégias e técnicas que compõem a saúde coletiva. Considerando as limitações deste espaço editorial e o público alvo do livro, optamos por destacar os temas e conceitos centrais abordados por seção, a fim de situar e provocar o leitor a construir seus próprios caminhos de leitura.
Iniciando o volume, na seção I são apresentados os ‘eixos’ conceituais da saúde coletiva como “campo de saberes e práticas sociais,” fundamentais para a leitura dos demais capítulos. Para tanto, são analisados historicamente as diversas iniciativas políticas e os movimentos de ideias e práticas que antecederam e formaram esse campo, suas fronteiras e similaridades. Este percurso perpassa a articulação entre a saúde oletiva, a Reforma Sanitária Brasileira (RSB) e o Sistema Único de Saúde (SUS), destacando a necessidade de aquele campo reafirmar-se e renovar-se a fim de fundamentar a práxis transformadora de sujeitos individuais e coletivos. São apresentados o debate teórico-metodológico acerca do conceito de saúde; necessidades, problemas e determinantes em saúde; e uma densa reflexão teórica sobre os usos da noção de ‘campo’ nas ciências.
Na seção II, o conjunto dos três capítulos situa o leitor nos ‘Modos’ com os quais se estruturam os sistemas e políticas de saúde desde a concepção até a operacionalização no cotidiano dos serviços. Partindo-se do debate entre diferentes conceitos de sistemas, são apresentados os componentes de um sistema de serviços de saúde e reconhecidos os desafios para implantação de sistemas integrados no Brasil e no mundo. Em seguida, o enfoque recai sobre a discussão acerca do ciclo de políticas públicas da saúde, enfatizando-se seu caráter processual, dinâmico e complexo e a importância de profissionais e cidadãos reconhecerem-se como parte desse processo. Por fim, aborda-se a história do planejamento e da programação em saúde no Brasil, demonstrando como esta se constituiu em proposta de modelo assistencial, cujo propósito seria prover a integração de ações individuais e coletivas com efeitos na saúde da população.
“Contextos” é a terceira seção da coletânea, formada por sete capítulos que discutem a conjuntura contemporânea na qual se insere o sistema de saúde do país. Inicialmente, são apresentadas as transformações epidemiológicas da população brasileira no contexto de profundas mudanças políticas, econômicas, sociais e demográficas, iniciadas na segunda metade do século XX. São desvelados os desafios a serem enfrentados, especialmente no que tange às desigualdades socioeconômicas e à garantia do direito à saúde para todos os brasileiros. Expõe-se uma leitura panorâmica do SUS, mostrando o difícil processo de construção de um sistema universal no país e seu quadro atual. Em seguida, faz-se uma análise do sistema de assistência médica suplementar no Brasil, por meio de evidências acerca das convergências e contradições existentes entre o sistema de saúde brasileiro e estadunidense. Atenção especial é dada à dinâmica e à regulação dos planos e seguros de saúde no contexto nacional, às iniquidades e fragmentação geradas pela estrutura de oferta e financiamento do sistema e às principais modalidades de empresas prestadoras de serviços de saúde no país e sua estreita relação com a penetração do capital financeiro no setor. Tais reflexões permitem uma visão comparada entre os sistemas brasileiro, canadense, alemão e estadunidense. Na sequência, discorre-se acerca do Complexo Econômico Industrial da Saúde. A preocupação central dos autores é a discussão da dinâmica de inovação e o papel do Estado no fortalecimento nacional da base produtiva da saúde, além das repercussões desta inovação no acesso equânime da população às tecnologias produzidas. Finaliza-se a seção destacando-se a produção de informação em saúde coletiva e sua importância para a tomada de decisões em nível de gestão do sistema e dos serviços.
A RSB e o SUS são postos em perspectiva na seção IV, denominada “Hemisfério SUS”. Inicialmente, a RSB é apresentada como processo histórico e social, tomando como eixo de análise um ciclo composto de ideia-proposta-projeto-movimento-processo. Recorrendo à história, os autores avaliam três momentos distintos do processo da RSB e os desdobramentos recentes do movimento. A ênfase é dada à agenda dos governos e à atuação e inflexão do movimento sanitário no período pós-constituinte. Somada a isto, focaliza-se a análise das forças políticas e sociais em disputas em distintas conjunturas e a necessidade do desenvolvimento de uma consciência crítica para a sustentação do processo da RSB. Dada a implementação do SUS, os capítulos seguintes se debruçam sobre sua estrutura tecnológica, configuração político-institucional, controle social, gestão e financiamento do sistema, finalizando com a reflexão acerca dos obstáculos para implementação de uma modelo de atenção integral à saúde.
A seção V desta coletânea reúne as estratégias – e seus fundamentos – empregadas para realização das funções sociais de um sistema de saúde, discutidas ao longo da obra, quais sejam: promoção da saúde; prevenção e proteção a doenças, agravos e riscos; e recuperação da saúde de indivíduos, grupos e ecossistemas, assim como para operacionalização dos princípios e diretrizes do SUS. Os objetos desses capítulos são diversos e podem ser organizados em duas subseções. A primeira contém os sete capítulos iniciais, que versam sobre os componentes gerais e a organização dos serviços de saúde a partir de quatro temas: 1) Promoção da saúde, apresentada a partir da perspectiva estreitamente relacionada aos ‘determinantes sociais em saúde’; 2) Atenção à saúde, tema que ocupou maior espaço nesta subseção, central em três dos sete capítulos aqui situados, a partir dos assuntos: a relação entre os três níveis de atenção à saúde (básica, de média e de alta complexidade); a Estratégia Saúde da Família; e a qualidade do cuidado em saúde; 3) Vigilância em saúde, abordada pelo capítulo 23, a partir do foco na vigilância sanitária, e retomada, de forma ampliada, no capítulo 28, junto às campanhas sanitárias e aos programas, na discussão sobre estratégias voltadas à prevenção e controle de problemas de saúde; e 4) Regulação da Saúde, que remete à discussão sobre a relação entre Estado e mercado, com foco no papel da Agência Nacional de Vigilância Sanitária e da Agência Nacional de Saúde Suplementar.
O segundo bloco da seção V consiste em oito capítulos sobre estratégias específicas ao atendimento de necessidades e problemas de saúde de certos subgrupos populacionais (usuários de drogas psicoativas, trabalhadores, crianças e adolescentes) e/ou ao enfrentamento de problemas específicos (doenças transmissíveis, crônicas não transmissíveis; violências interpessoais e comunitárias; saúde bucal e saúde mental). Ainda que esta seção não aborde as demais políticas e programas especiais do SUS – aqueles voltados à saúde da mulher, dos povos indígenas, da população negra, dentre outros – alguns são brevemente tratados na seção III.
Em “Estados da Arte,” oito capítulos apresentam panoramas acerca de questões centrais referentes às disciplinas fundadoras e estruturantes da saúde coletiva (Epidemiologia, Ciências Sociais e Política, Planejamento e Gestão) e de determinados temas desse campo, tais como saúde do trabalhador, trabalho e educação, comunicação em saúde, saúde bucal e sistemas de informação.
No único capítulo que integra a seção de conclusão da obra, “Epílogo,” os autores fazem uma análise de conjuntura da saúde coletiva, apontando tendências e desafios ao campo, estreitamente relacionados ao desenvolvimento socioeconômico brasileiro, no qual é central a desigualdade social abissal e persistente, embora sejam reconhecidos os avanços alcançados nos últimos anos, em função de políticas sociais. Cabe destacar que a crise política, ética e econômica que assolou o país em 2015 atualiza os problemas mencionados de forma contundente e consistente pelos autores, como a permanência da dicotomia público-privado desde a Constituição de 1988, uma tendência ao conservadorismo político e ideológico, e também o acirramento das iniquidades sociais. Indica-se a necessidade da revisão do papel e dos deveres do Estado, que historicamente não tem garantido à população serviços públicos de qualidade, reforçando as desigualdades sociais.
Tendo em vista esses aspectos, a obra é um convite para olhar os princípios conceituais e metodológicos da saúde coletiva, assim como para sua trajetória, lutas, conquistas e desafios. Tal empreendimento é considerado fundamental nos tempos atuais, marcado por tensão e incertezas, mas também por avanços em algumas dimensões da vida social, que precisam ser consolidados, expandidos e/ou reestruturados a fim de se retomar um projeto civilizatório de transformação social.
Lívia Fraga – Fundação Oswaldo Cruz, Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: liviafraga@fiocruz.br
Carla Cabral Gomes Carneiro – Fundação Oswaldo Cruz, Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: carlacgcarneiro@fiocruz.br
[MLPDB]
Manifesto Del nuovo realismo – FERRARIS (ARF)
FERRARIS, Maurizio. Manifesto Del nuovo realismo. Romabari: Editori Laterza, 2012. Resenha de: RIBEIRO, Renato Railo. Aufklärung – Revista de Filosofia, João Pessoa, v.2, N.1, p. 209-218, Abril de 2015.
O presente texto é uma resenha expositiva da obra Manual del Nuovo Realismo, escrita pelo filósofo italiano Maurizio Ferraris e publicada originalmente em italiano pela editora Laterza, em 2012(ISBN: 9788842098928). O Manual já foi traduzido para o espanhol, francês, alemão e inglês, sem possuir ainda tradução paraportuguês1.
Ferraris formou-se, sob orientação de Gianni Vattimo, pela Università degli Studi di Torinoe atualmente leciona nesta mesma universidade, além de ser também professor visitante de universidades europeias e estadunidenses. É editorialista do jornal diário La Repubblica e reconhecido internacionalmente por seus trabalhos desenvolvidos no campo da hermenêutica. Eis algumas de suas obras: Aspetti dell’ermeneutica del Novecento (1986); Storia dell’ermeneutica (1988); Il gusto del segreto (1997, escrita com Jacques Derrida); L’ermeneutica (1998); Introduzione a Derrida (2003). Desde os anos de 1990, porém, o filósofo vem gradualmente se afastando dessa linha de pensamento e adotando o realismo como fio condutor de sua filosofia.
No Manual del Nuovo Realismo o filósofo italiano pretende alcançar dois objetivos: (1) expor, segundo sua visão, as razões pelas quais a filosofia contemporânea teria se inclinado ao realismo; (2) expor sua concepção de realismo. A obra em questão é dividida em quatro capítulos2, sem contar o Prólogo. Neste último, o autor expõe seus pressupostos e a justificativa para a elaboração da obra, enquanto que no primeiro capítulo (“Realytismo”: o ataque pós-moderno à realidade) desenvolve sua argumentação visando alcançar o objetivo (1). Por fim, com os demais capítulos (capítulo 2:Realismo: coisas que existem desde o início do mundo; capítulo 3:Reconstrução: porque acrítica parte da realidade; capítulo 4:Emancipação: a vida não examinada não tem valor), o filósofo visa atingir o objetivo (2).
Começando pelo Prólogo, deste pode-se depreender que Ferraris parte do pressuposto de que, se por um lado, ao longo do século XX, o pêndulo do pensamento teria se orientado ao antirrealismo (diz o autor, em suas várias versões: “hermenêutica, pós-modernismo, ‘reviravoltalinguística’”3), por outro lado, com a virada do século, teria passado apender para o realismo (segundo o autor, em seus muitos aspectos: “ontologia, ciências cognitivas, estética como teoria da percepção”4).
De modo a incluir sua filosofia nesse movimento em direção ao realismo, Ferraris aponta as causas que o conduziram a essa mudança, identificando-as com os efeitos decorrentes daquilo que denomina “dois dogmas dopósmodernismo”5: (a) o de que toda a realidade é socialmente construída e infinitamente manipulável; (b) o de que a verdade é uma noção inútil, sendo a solidariedade mais importante do que a objetividade. Os efeitos ocasionados por esses “dois dogmas”, de acordo com Ferraris, teriam sido: (i) o fortalecimento do populismo em política; (ii) a alienação da filosofia em relação à realidade cotidiana;(iii) a noção de que toda desconstrução (filosófica, política, social) tem valor por si própria.
Assim, a justificativa dada por Ferraris para a escrita do Manifesto– bem como para sua mudança de pensamento, que o motivara elaborar a presente obra – é pautada por seu julgamento acerca da necessidade de se negar os “dois dogmas”, de modo a se evitar tais efeitos. O realismo, assim, é visto por ele como alternativa às diferentes ramificações pós-modernas da filosofia contemporânea e seus “dogmas”.
Porém, de acordo com suas palavras, adotar essa alternativa não significa querer ostentar um monopólio filosófico do real – como se poderia crer, em função da longa história que o termo “realismo” temem filosofia – mas sim
“sustentar que a água não é socialmente construída, que a sacrossanta vocação desconstrutiva que está no coração de toda filosofia digna deste nome deve medir-se pela realidade, caso contrário configura-se como jogo fútil, quetodadesconstruçãosemreconstruçãoéirresponsabilidade”6.
Assim, segundo o autor, caberia à filosofia examinar quais são os aspectos da realidade socialmente construídos e quais não são, de modo a salientar o que pode e o que não pode ser tomado como verdadeiro e extrair daí implicações de natureza cognitiva, ética e política. Neste ponto, o filósofo italiano sentira necessidade de sublinhar o contexto ao qual sua posição se insere, aqui expresso por suas próprias palavras:
Aquilo que chamo de “novo realismo” é de fato antes de tudo o reconhecimento de uma reviravolta. A experiência histórica dos populismos midiáticos, das guerras pós11de setembro e da recente crise econômica conduziu a uma forte descrença naqueles que, para mim, são os dois dogmas do pós-modernismo: o de que toda a realidade é socialmente construída e infinitamente manipulável, e ode que a verdade é uma noção inútil porque a solidariedade é mais importante do que a objetividade. As necessidades reais, as vidas e mortes reais, que não aceitam ser reduzidas a interpretações, têm feito valer seus direitos, confirmando a ideia de que o realismo (assim como o seu contrário) possui implicações não simplesmente cognitivas, mas éticas e políticas7.
No primeiro capítulo, Ferraris sugere que o pós-modernismo teria entrado em filosofia a partir da publicação da obra do filósofo francês Jean François Lyotard, A condição pós-moderna, publicada em1979 e pela qual teriam se difundido a ideia de “fim das ideologias” e a noção de que as “grandes narrativas” (Iluminismo, Idealismo, Marxismo) teriam deixado de “mover as consciências e de justificar o saber e a pesquisa científica”8. Sem desconsiderar as várias manifestações pós-modernistas e seus vários aspectos, desenvolvido sem diversas áreas do conhecimento e das artes, Ferraris aponta o que para ele seria o mínimo denominador comum a todas essas, a saber, o fim da ideia de progresso. No caso específico da filosofia, para a qual noção de verdade é central, insiste Ferraris que “(…) a descrença pós-moderna no progresso comportava a adoção da ideia – que encontra a sua expressão paradigmática em Nietzsche – segundo a qual a verdade pode ser um mal e a ilusão um bem”9, ideia esta que segundo o autor poderia ser resumida na proposição nietzscheana “não existem fatos, só interpretações”.
Maurizio Ferraris frisa não querer atacar diretamente o pós-modernista, pois este é “(…) muitas vezes animado por admiráveis aspirações emancipativas (…)”10. O problema, diz, é o populista, que“(…) tem se beneficiado com a potente, ainda que em boa parte involuntária, ajuda ideológica do pósmodernista”11. Isto porque, em sua visão, com o pós-modernismo (e, como decorrência deste, primado das interpretações sobre os fatos e a superação da noção de objetividade), “(…) não se viu a libertação dos vínculos de uma realidade monolítica, compacta, peremptória (…)”12, tal como seus mentores profetizaram, mas sim o êxito do populismo, “(…) um sistema com o qual (desde que se tenha o seu controle) se pode pretender fazer crer em qualquer coisa”13– o que teria transformado o mundo em um reality.
O filósofo italiano, então, sugere a necessidade de se examinar de perto a concretização (e adulteração) das teses pós-modernistas (os“dois dogmas”) e aquelas que aponta como suas três principais características: aironização, segundo a qual “(…) aferrar-se a teorias é indício de dogmatismo, e que, portanto, deve-se manter um distanciamento irônico em relação às próprias afirmações”14–distanciamento em geral expresso pelo uso de aspas; a dessublimação,“(…) a ideia de que o desejo constitui em quanto tal uma forma de emancipação, já que a razão e o intelecto são formas de domínio”15; a desobjetivação, a ideia de que “(…) não existem fatos, só interpretações, e o seu corolário de que a solidariedade amigável deve prevalecer sobre a objetividade indiferente e violenta”16– o que legitimaria, para Ferraris, a máxima “a razão do mais forte é sempre a melhor”.
Sobre aironização, diz Ferraris que o uso das aspas teria permitido aos teóricos a adoção de uma postura irônica diante de suas próprias proposições e o decreto de que qualquer um que as tentasse suprimir estaria exercendo um ato de inaceitável violência ou ingenuidade, pois trataria como real aquilo que, na melhor das hipóteses, era “real”. De acordo com o autor, essa postura teria impedido o progresso em filosofia, “(…) transformando-a em uma doutrina programaticamente parasitária que remetera à ciência qualquer pretensão de verdade e de realidade (…)”17. Para Ferraris, a origem disso estaria no radicalismo de Nietzsche em sua posição contra a filosofia sistemática, ou mesmo, ainda, naquilo que o filósofo italiano chama de “revolução ptolomaica”18de Kant, por entender que com este último o homem teria passado a ser o centro do universo como mero fabricante de mundos por intermédio de conceitos. Assim, “o pós-modernismo não foi um devaneio filosófico, mas sim o êxito de uma reviravolta cultural que coincide em boa parte com a modernidade, ou seja, a prevalência dos esquemas conceituais sobre o mundo externo”19, o que explicaria o uso de aspas, já que não se estaria ocupado com o mundo mas tão somente com fenômenos mediatos. Neste cenário, à filosofia caberia, na melhor das hipóteses, diz Ferraris, aceitar-se como tipo de conversação ou gênero de escritura – atividade anti-iluminista que, com a cumplicidade da ironia e das aspas, ocasionara, entre outros problemas, “o equívoco de pensadores de direita se tornarem ideólogos da esquerda”20 (quando então cita e comenta Heidegger como caso paradigmático).
De acordo com Ferraris, a dialética que se manifesta na ironização seria a do desejo como elemento que por si próprio constituiria a emancipação humana. Em sua visão, a noção de revolução dos desejos teria se iniciado com Nietzsche e sua revolução dionisíaca, quando o homem trágico, antítese do homem racional representado por Sócrates, fora antes de tudo um homem de desejos. Só que, com o populismo, diz, tal noção teria encontrado verdadeira expressão a partir do desenvolvimento “(…) de uma política ao mesmo tempo dos desejos e reacionária”21– comentando para tal as investigações de Adorno e Horkheimer sobre o mecanismo da dessublimação repressiva, segundo o qual “o soberano concede ao povo liberdade sexual e em contrapartida mantém consigo não só a liberdade sexual mas também as outras”22. Neste cenário, o desejo, no início elemento emancipativo, passaria então a ser elemento de controle social. Afora isso, o anti-intelectualismo se faria presente, já que o enlaçamento entre corpo e desejo favoreceria o antissocratismo (i. e., a atividade racional). E assim, diz Ferraris, a legitimidade de uma categoria fundamental do Iluminismo seria atacada, a da opinião pública, que passaria, citando Habermas, “(…) de espaço de discussão a espaço de manipulação das opiniões por parte dos detentores dasmassmedia”23, momento em que se manifestaria repressão à discordância, cuja perfeição seria alcançada com a incorporação, por parte da coletividade, do hábito de desenhar qualquer atividade crítica.
Sobre adesobjetivação, Ferraris diz ser esta a noção de que a objetividade, a realidade e a verdade seriam maléficas, e a ignorância, benéfica. Essa ideia, segundo sua visão, teria se difundido no pós-modernismo por três reflexões de grande peso cultural: a noção nietzschiana de verdade como metáfora; o recurso ao mito levado acabo por Nietzsche e Heidegger; e a noção presente em parte da filosofia analítica segundo a qual não existiria acesso ao mundo sem a mediação de esquemas conceituais e representações – sobre a qual Ferraris investiga tomando como case studya afirmação de Paul K.Feyerabend segundo a qual não existiria método privilegiado para a ciência, pois as teorias científicas seriam visões de mundo em larga parte incomensuráveis (o que, por consequência, faria com que não fosse tão óbvio assim que Galileu tivesse tido razão em relação àqueles que o condenaram). Neste sentido, a desobjetivação formulada com intenções emancipativas se transformaria em deslegitimação do saber humano e no reenvio da humanidade a um fundamento transcendente (no sentido místico religioso).
A consequência da ação conjunta de ironização, dessublimação e desobjetivação é, para Ferraris, o realytismo, estado em que “vem revogada qualquer autoridade ao real, e em seu lugar se prepara magnificamente uma quase realidade com fortes elementos fabulares(…)”24. Por outras palavras, orealytismo para Ferraris seria o pós-modernismo concretizado pelo populista, cenário em que o real, ao invés de ser investigado com vistas à construção de novos mundos possíveis, seria posto ao nível da fábula (ou equiparado a um realityshow), sendo esta ação considerada como única libertação possível. Diz o autor, então, que dessa forma não haveria mais nada a se construir – e a realidade nada mais seria do que mero sonho.
Para Ferraris, fora contra esse estado de coisas que desde a virada do século viria se desenvolvendo o realismo, tentativa de restituir legitimidade, em filosofia, em política e na vida cotidiana, a uma noção que no pós-modernismo fora considerada ingenuidade filosófica e manifestação de conservadorismo político, a saber: a de realidade. O filósofo italiano oferece, então, a partir deste ponto, sua concepção de realismo, desenvolvendo-a entre os capítulos 2 e 4, baseada em três conceitos: Ontologia, Crítica e Iluminismo.
Por Ontologia Ferraris pretende significar simplesmente que “o mundo tem as suas leis, leis estas que se fazem respeitar (…)”25. Por outras palavras, segundo sua visão existiriam coisas que resistem e permanecem independentemente de esquemas conceituais capazes de avaliálas. Ferraris denomina sua posição de “teoria da incorrigibilidade”26, de modo a reforçar, como faz ao longo do capítulo2, o caráter saliente do real, i. e., a existência de um mundo externo aos esquemas conceituais, e a ideia de que certas coisas diante de nós não poderiam ser corrigidas ou transformadas27. Desta forma, com ontologia e incorrigibilidade Ferraris pretende confrontar o que chama de falácia do ser- saber28, i. e., noção segundo a qual só se poderia dizer como existente aquilo que se pudesse conhecer – o que, para o filósofo italiano, nada mais seria do que expressão da confusão entre epistemologia e ontologia.
Por Crítica Ferraris diz significar a possibilidade inerente ao realismo de criticar e transformar a realidade – como oposição àquilo que, no capítulo 3, chama de falácia do averiguar-aceitar29, segundo a qual a averiguação da realidade necessariamente implicaria na aceitação de existência de um estado de coisas imutáveis. Neste sentido, diz Ferraris que sua Crítica deveria ser entendida tanto no sentido kantiano de julgar o que é e o que não é real, como no sentido marxista de transformar o que não é justo, contrapondo-se assim ao pós-modernismo que, segundo ele, se contentaria em sustentar que tudo é socialmente construído (como forma de se proteger do atrito com o real ausentando-se deste conflito). Logo, se por um lado seria possível afirmar que existem elementos com características alheias a todo e qualquer esquema conceitual capaz de descrevê-las, por outro se poderia afirmar que somente com a reflexão crítica a falsificação pode ser evitada. Com noção de Crítica Ferraris sustenta que “(…) a incorrigibilidade como caráter ontológico resulta central na medida em que não indica uma ordem normativa (…) mas simplesmente uma linha de resistência contra a falsificação e a negação”30. Portanto, o ponto não seria apenas desvalorizar a cética noção de descontinuidade entre fatos e interpretações, mas sim procurar entender o que é e o que não é humanamente construído – algo implícito na seguinte questão: quais os limites dos esquemas conceituais?
Por fim, com a noção de Iluminismo– a qual permite Ferraris citar as expressões consagradas por Kant (“ousar saber” e “sair doestado de minoridade”) como opostas àquilo que chama de falácia dosaberpoder31(noção segundo a qual, tal como explicitada no capítulo4, em toda forma de saber se esconderia um poder negativo, ou seja, o saber serviria não como emancipação, mas como instrumento de dominação) – o filósofo italiano diz não duvidar que a ciência é, muitas vezes, animada “pela vontade de potência”, mas defende que não se deveria, em função disso, duvidar de todos os seus resultados32. Ou seja, o autor concorda que motivações de poder influenciam em muitos casos as conclusões de práticas filosóficas e científicas, mas poder e saber seriam, segundo sua concepção, noções distintas, não equivalentes. Identicamente, não seriam noções equivalentes as de verdade e de dogmatismo, pois salienta que “(…) realidade e verdade sempre foram a tutela dos fracos contra a prepotência dos fortes”33.Segundo o filósofo não faria sentido, assim, abandonar a noção de verdade em nome da noção de solidariedade (tal como desenvolvida por Rorty), uma vez que “(…) o regime nazista é o exemplo macroscópico de uma sociedade fortemente solidária”34. Logo, para Ferraris seria irresponsável desconstruir sem construir algo em seu lugar, e, portanto, ao invés de se duvidar da capacidade humana de conhecer, seria melhor aceitar que só o conhecimento, e não sua deslegitimação, pode emancipar os homens.
Por fim, Maurizio Ferraris oferece uma interpretação particular de que três filósofos tradicionalmente associados ao pós-modernismo (Foucault, Derrida e Lyotard) teriam manifestado a exigência de retorno aos ideais iluministas. Além disso, declara o filósofo italiano:
Julgo fundamental acreditar naquilo que era importante e vivo no pósmodernismo, i. e., a reivindicação de emancipação, que tem início no ideal de Sócrates sobre os valores morais do saber e se assenta no discurso de Kant sobre o Iluminismo – talvez a mais caluniada entre as categorias do pensamento e que merece uma nova leitura na cena intelectual contemporânea diante das consequências da falácia do saberpoder35.
Com isso, o autor pretende reforçar sua crença no conhecimento humano como único meio a se evitar, contra o populismo, a alternativa de “(…) seguir o caminho do milagre, do mistério e da autoridade”36, associando tal crença ao realismo a que vem se propondo desenvolver.
Notas
1 Em espanhol: Manifiesto del nuevo realismo. Trad. José Blanco Jiménez.Santiago de Chile: Ariadna, 2012;Manifiesto del nuevo realismo. Trad.e intr. F. José Martín. Madrid: Biblioteca Nueva, 2013; em francês: Manifeste du nouveau réalisme. Trad. Marie Flusin e AlessandraRobert. Paris: Hermann, 2014; em alemão: Manifest der neuen Realismus. Trad. Malte Osterloh. Frankfurt am Main: Klosternann,2014; em inglês:Manifesto of New Realism. Trad. Sarah De Sanctis.New York: SUNY Press, 2014.
2 Cap. 1:Realitysmo. L’ attacco postmoder no alla realtà; Cap. 2:Realismo.Cose che esistono dall’ inizio del mondo; Cap. 3:Riconstr uzione.Perché la critica incomincia dalla realtà; Cap. 4:Emancipazione. Lavita non esaminata non ha valore.
3 “(…) ermeneutica, postmodernismo,‘ svolta linguistica’ (…)” (2012: ix).
4 “(…) ontologia, scienze cognitive, estetica come teor ia della percezione (…)”(Idem).
5 “(…) i due dogmi del postmoder no (…)” (Ibidem, xi).
6 “(…) sostenere che l’ acqua non è socialmente costr uita; che la sacrosantavocazione decostr uttiva che sta al cuore di ogni filosofia degna diquesto nome deve misur ar si con la realtà, altr imenti è un gioco futile; eche ogni decostr uzione senza r icostr uzione è ir responsabilità”(Ibidem).
7 “Quello che chiamo“ nuovo realismo” è infatti anzitutto la presa d’ atto diuna svolta. L’ esper ienza stor ica dei populismi mediatici, delle guer repost 11 settembre e della recente crisi economica ha por tatounapesantissima smentita di quelli che a mio avviso sono i due dogmi delpostmoder no: che tutta la realtà sia socialmente costruita e infinitamente manipolabile, e che la ver ità sia una nozioneinutileperché la solidar ietà è più impor tante della oggettività. Le necessitàreali, le vite e le mor ti reali, che non soppor tano di essere ridotte ainter pretazione, hanno fatto valere i loro dir itti, confermando l’ ideache il realismo (così come il suo contrario) possieda delle implicazionenon semplicemente conoscitive, ma etiche e politiche” (Ibidem).
8 “(…) che par lava [ a obra de Lyotard] della fine delle ideologie, cioè diquelli che Lyotard chiamava i‘ grandi racconti’ : Iluminismo,Idealismo, Marxismo. Questi r acconti er ano logor i, non ci si credevapiù, avevano cessato di smuovere le coscienze e di giustificare il saperee la r icerca scientifica” (Ibidem, 3).
9 “(…) la sfiducia postmoder na nel progresso compor tava l’ adozionedell’ idea, che trova la sua espressione par adigmática in Nietzsche,secondo cui la ver ità può essere un male e l’ illusione un bene” (Ibidem,4).
10 “(…) il più delle volte animato da ammirevoli aspir azioni emancipative(…)” (Ibidem, 6).
11 “(…) ha beneficiato di un potente anche se in buona par te involontar iofiancheggiamento ideologico da par te del postmoder no” (Ibidem).
12 “(…) non si è vista la liber azione daí vincoli di una realtà troppomonolitica, compatta, perentor ia (…)” (Ibidem, 5).
13 “(…) un sistema nel quale (purché se ne abbia il potere) si può pretenderedi far credere qualsiasi cosa” (Ibidem, 6).
14 “(…) prendere sul ser io le teor ie sia indice di una for ma di dogmatismo, esi debba mantenere nei confronti delle propr ie affer mazioni un distaccoironico” (Ibidem, 7).
15 “(…) l’ idea che il desider io costituisca in quanto tale una for ma diemancipazione, poiché la r agione e l’ intelletto sono for me di dominio”(Ibidem).
16 “(…) non ci sono fatti, solo inter pretazioni, e il suo corollar io per cui lasolidar ietà amichevole deve prevalere sull’ oggettività indifferente eviolenta” (Ibidem).
17 “(…) transfor mandola in uma dottrina programaticamente par assitar ia,che rimeteva alla scienza ogni pretesa di ver ità e di realtà (…)”(Ibidem, 9).
18 “Rivoluzione tolemaica” (Ibidem, 10).
19 “(…) il postmoder no non è stato uma spazzatur a filosofica.È stata l’ esitodi una svolta cultur ale che coincide in buona par te con la moder nità,ossia il prevalere degli schemi concettuali sul mondo esterno” (Ibidem,11).
20 “(…) È in questo clima anti illuministico che (…) si attua l’ equivoco dipensator i di destr a che diventano ideologi della sinistr a (…). Il caso diHeidegger (…) è da questo punto di vista par adigmatico” (Ibidem, 1314).
21 “(…) la cronaca dei populismi ha insegnato come sia possibile sviluppareuna politica contempor aneamente desider ante e reazionar ia” (Ibidem,16).
22 “Il sovr ano concede al popolo liber tà sessuale, e in cambio tiene per sénon solo la liber tà sessuale che ha concesso a tutti gli altr i, ma anchetutte le altre liber tà assunte come pr ivilegio esclusivo” (Ibidem, 17).
23 “(…) da spazio di discussione a spazio di manipolazione delle opinioni dapar te dei detentor i dei massa media” (Ibidem, 19).
24 “Viene revocata qualsiasi autor ità al reale, e al suo posto siimbandisceuna quasi realtà con for ti elementi favolistici (…)” (Ibidem, 24).
25 “(…) il mondo ha le sue leggi, e le fa r ispettare (…)” (Ibidem, 29).
26 “Inemendabilità” (Ibidem, 48).
27 “(…) il fatto che ciò che cista di fronte non può essere cor retto otr asfor mato attraver so il mero ricor so a schemi concettuali,diver samente da quanto avviene nell’ ipotesi del costr uzionismo”(Ibidem).
28 Fallacia dell’ essere sapere.
29 Fallacia dell’ accer tare accettare.
30 “(…) l’ inemendabilità come car attere ontologico fondamentale r isultacentr ale, propr io nella misur a in cui non indica un ordine nor mativo(…) ma semplicemente una linea di resistenza nei confronti dellefalsificazioni e delle negazione” (Ibidem, 66).
31Fallacia del sapere potere.
32 “Indubbiamente il sapere può essere animato da volontà di potenza (…). Da questo, per ò, non segue che si debba dubitare dei r isultati delsapere (…)” (Ibidem, 88).
33 “(…) realtà e ver ità siano sempre state la tutela dei debolicontro leprepotenze dei for ti” (Ibidem, 96).
34 “(…) in gener ale il regime nazista è l’ esempio macroscopico di una societàfor temente solidale al propr io inter no (…)” (Ibidem, 94).
35 “Credo che sia meglio tener fede a ciò che er a impor tante e vivonelpostmoder no, e cioè appunto la richiesta di emancipazione,che prendel’ avvio dall’ ideale di Socrate sul valore mor ale del sapere e si precisanel discor so di Kant sull’ Illuminismo–for se la più calunniata tr a lecategor ie del pensiero, e che mer ita una nuova voce nella scenaintellettuale contempor anea di fronte alle conseguenze della fallaciadel sapere potere” (Ibidem, 112).
36 “(…) prendere la via del mir acolo, del mistero e dell’ autor ità” (Ibidem,112).
Renato Railo Ribeiro – Bolsista de Mestrado (CAPES) do Programa de PósGraduação em Língua, Literatura e Cultura Italianas, Departamento de Letras Modernas da Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (DLM/ FFLCH/USP). Bacharel em Filosofia pela Universidade São Judas Tadeu (USJT) e em Biblioteconomia pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/ USP). E-mail: m@ilto: renatorailo@yahoo.it
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Ciencias sociales y educación infantil (3-6). Cuando despertó, el mundo estaba allí – FELIU TORRUELLA; JIMÉNEZ TORREGROSA (C-HHT)
FELIU TORRUELLA, M.; JIMÉNEZ TORREGROSA, L. (Coordinadores). Ciencias sociales y educación infantil (3-6). Cuando despertó, el mundo estaba allí. Barcelona: Graó, 2015. Resenha de: ROMERO, L. Alberto Polo; GÓMEZ, Gemma Cardona. Clío – History and History Teaching, Zaragoza, n.41, 2015.
El libro que se reseña pretende ser una aportación que ayude a los maestros y maestras en activo, y también a los que se encuentran en su etapa de formación, a trabajar las Ciencias Sociales en el aula desde una perspectiva científica y global. Esta obra aborda diversas cuestiones relacionadas con el reto de una enseñanza-aprendizaje de las Ciencias Sociales de nuestro tiempo para nuestro tiempo. Los niños y las niñas de educación infantil están en una etapa de desarrollo en la que necesitan construir su identidad, conocerse a ellos mismos y la realidad social que les rodea, y en este libro se da respuesta a ello desde las Ciencias Sociales. La educación infantil coherente debe asentar firmemente los cimientos que permitan el desarrollo de toda la posterior trayectoria educativa. Como comentan los autores, el asentamiento de unas buenas bases “pueden ayudar a prevenir problemas posteriores, en momentos en los que intervenir se convierte en una tarea más compleja”. (p. 8).
Atendiendo a la diversidad curricular presente en los territorios en los cuales se distribuye el libro y siendo conscientes de los cambios constantes que sufren las leyes de educación infantil, los autores han estructurado la obra a partir de los cuatro pilares de la UNESCO que aparecen en el Informe Delors (1994). Desde estos pilares se edifican, de la mano, teoría y práctica para reflexionar sobre el papel de la Historia, la Geografía, la Filosofía y el Arte en el desarrollo del aprender a ser, el aprender a conocer, el aprender a hacer y el aprender a vivir juntos en los niños y las niñas de educación infantil.
Al título, Ciencias sociales y educación infantil (3-6), lo acompaña un subtítulo que nos adentra ya, desde la portada, a la filosofía que impregna la obra: Cuando despertó, el mundo estaba allí. Los autores realzan, al largo de los capítulos del libro, la importancia de partir del interés de los niños y las niñas a la hora de promover situaciones de enseñanza-aprendizaje. Los niños y las niñas, argumentan, tienen una capacidad casi innata de hacerse preguntas sobre el mundo que les rodea, y los agentes educativos no deben cortar esas alas, sino estimularlas para que se desarrollen en toda su amplitud.
A este subtítulo le sigue un índice, no menos sugerente si lo analizamos desde esta misma óptica ya que se trata de un cuento. La introducción pierde su nombre tradicional para pasar a llamarse Había una vez;a partir de aquí la sucesión de capítulos siguen la trama Un ser pequeño rompe el caparazón: Aprender a ser, Y mira al mundo sorprendido: Aprender a conocer, La curiosidad lo mueve a andar con seguridad: Aprender a hacer, Y de repente… ¡No está solo!: Aprender a vivir juntos. A modo de conclusión, se clausura el cuento con el capítulo: Ya nada volverá a ser lo mismo.
A su vez, los distintos capítulos referentes a los cuatro pilares de la educación del Informe Delors (1994) siguen una misma estructura de subcapítulos. Inicialmente se argumenta la importancia que tiene ese pilar en cuestión en el desarrollo integral de los niños y las niñas de 3-6 años. Seguidamente, se plantea qué aportan las Ciencias Sociales (Historia, Geografía, Filosofía y Arte) al desarrollo de estos aprendizajes en la etapa de Educación Infantil y finalmente, se ofrecen propuestas didácticas que parten de metodologías socioconstructivistas, como son los centros de interés, el método de investigación del medio y los proyectos de trabajo global.
El ser pequeño que rompe el caparazón: aprender a ser hace referencia a la importancia de educar a las personas para que puedan habitar el mundo y contribuir a su desarrollo. Este capítulo está impregnado de reflexión hacia lo que significa ser un buen ciudadano para acabar concluyendo que frente a la diversidad de respuestas que puede albergar la pregunta, y explicitando que la educación está politizada por las distintas ideologías, para ayudar a los niños y a las niñas a convertirse en buenos ciudadanos debemos darles herramientas para su desarrollo personal y ser autónomos y seguros de sí mismos. Así mismo, también se hace hincapié en la importancia de contribuir en la descentración de los niños y las niñas de educación infantil ya que se encuentran en una etapa de egocentrismo (p. 20). La Filosofía ayuda a pensar cómo somos, la Geografía nos ayuda a ver que somos como somos influidos por el entorno, la Historia nos muestra que hay infinitas historias, no solo una, y el Arte nos habla de diversidad. Las propuestas didácticas entorno a aprender a ser nos plantean trabajar la alegría como centro de interés, el por qué lloramos desde un método de investigación del medio y ¿quién somos? a partir de un proyecto de trabajo global. Estas propuestas, además de trabajar la construcción de la identidad individual de los niños y las niñas, promueven la interacción con los demás para el desarrollo social de cada uno y cada una de ellos.
Cuando el pequeño ser ya ha roto el caparazón, mira el mundo sorprendido: aprender a conocer. En este capítulo se reflexiona sobre la importancia de observar y reivindica la escuela como el espacio cultural de la experiencia humana (p. 35). Los autores señalan también la importancia de aprovechar la curiosidad de los niños y las niñas para poder dar respuestas a todas las dudas que se les plantean sobre su entorno y no perder nunca la satisfacción de aprender. Desde la perspectiva de aprender a conocer el mundo, el Arte nos ofrece visiones poliédricas del mundo; la Historia nos acompaña a preguntarle al pasado para entender el presente y proyectar el futuro; la Filosofía nos propone persensar: percibir, sentir y pensar para conocer; y la Geografía asimila los conceptos curiosidad y conocimiento, como disociables en las realidades sociales que nos envuelven. Las propuestas didácticas que se dibujan en este capítulo nos conducen a la recreación de la prehistoria como centro de interés, el paisaje y los sentidos como método de investigación del medio, y descubrir qué esconde el vacío como proyecto de trabajo global a partir de la obra escultórica de Henry Moore. Conocer el entorno de manera global ayuda a desarrollar una actitud respetuosa y potencia un pensamiento crítico y un compromiso desde una relación afectiva con el medio (p. 47).
La curiosidad lo mueve a andar con seguridad: aprender a hacer nos habla de la importancia de desarrollar habilidades que permitan a los niños y las niñas a vivir, comprender y encarar los cambios y las transformaciones a las que estamos expuestos. Desde una visión sociocultural y constructivista, los autores hacen hincapié en la idea de que los individuos se desarrollan a medida que aprenden y aprenden a medida que se desarrollan para argumentar una educación basada en la acción, entendiendo que la aplicación del conocimiento es la consolidación del aprendizaje y el desarrollo (p. 52). Desde la Historia se puede vivenciar el pasado, y al hacerlo se pueden desarrollar habilidades temporales y creativas (p.53); la Geografía nos ofrece la visión de la participación social activa intrínseca en la conceptualización de pensar geográficamente; desde el Arte se nos invita a ir más allá de los murales, ofreciendo una multiplicidad de opciones plásticas e interpretativas innovadoras y completas, y la Filosofía nos lleva a hacer hipótesis con un planteamiento tan complejo como sencillo: dar respuesta a la cuestión ¿Qué pasaría sí…? Las propuestas didácticas que plantean los autores desde la idea de aprender a desarrollar habilidades son muy variadas: podemos construir un castillo desde la metodología de los centros de interés, excavar el pasado a partir del método de investigación del medio o entender por qué los alimentos se estropean y cómo podemos evitarlo a partir de un proyecto de trabajo global titulado ¡Que no se nos estropee la comida! Mediante la resolución de problemas, los niños y las niñas van desarrollando habilidades que les acompañarán al largo de la vida sin perder la ilusión por aprender.
Llega un momento, en la historia que narra el índice, que el ser se da cuenta de que él no es el único, y es que las Ciencias Sociales no podrían existir sin la consciencia de que los humanos somos animales sociales que vivimos en comunidad a partir de un sistema de leyes y valores. Y de repente… ¡No está solo!: Aprender a vivir juntos reflexiona sobre la importancia de comprender la complejidad de la interdependencia del mundo que nos rodea. Desde una propuesta que contempla la otredad y la alteridad, se plantean temas relevantes como la resolución asertiva de los conflictos, la importancia de comprender al otro en toda su dignidad y los retos de la escuela y la sociedad del siglo XXI en este aspecto. La Geografía nos aporta la necesidad de analizar el espacio y construirlo para que sea un espacio compartido, que fomente la participación ciudadana y que sea sostenible, respetando el medio en el que vivimos; el Arte plantea que el mundo se mira al espejo, porque el arte, según los autores, es un espejo del mundo (p. 70) que permite comprender la complejidad interpretativa de los otros; la Filosofía, en este aspecto, apuesta por la construcción de valores a partir del diálogo, pues en una sociedad conflictiva, el diálogo es la única manera de garantizar la convivencia; finalmente, la Historia plantea que la suma de nuestros “yo” se convierte en “nosotros” argumentando que para vivir juntos, debemos conocer cómo vivían nuestros padres, abuelos, etc. porque conociendo las historias personales de cada uno, podemos conocer las historias colectivas y comprender el presente. Un viaje a la Antártida es el centro de interés que los autores proponen para trabajar el pilar de aprender a vivir juntos; desde la metodología de los proyectos de trabajo global, se plantea una experiencia didáctica que hace referencia a la comunicación sin palabras, en este caso, a partir de la música de Pau Casals; y finalmente, el método de investigación del medio que se sugiere es vivimos en lugares diferentes a partir de la representación de los espacios físicos mediante maquetas y juguetes. Estas actividades promueven la reflexión de las realidades sociales para la construcción de valores a partir del diálogo y la incorporación de la mirada del otro.
Se trata de un libro con una fuerte base teórica y con referentes muy diversos, no obstante, los autores han sabido tratar la información para hacerla comprensiva y ligera. Podríamos decir que el libro se enmarca en un paradigma principalmente postmoderno como muestran citas y alusiones a M. Foucault o S. Zizek. Por lo que refiere a las teorías de aprendizaje en las que se basa, vemos una mezcla ricamente ecléctica, teniendo en cuenta algunos aspectos de la Teoría Clásica de J. Piaget y las teorías de K. Egan, la usan como trampolín para ir más allá e incluir nuevas contribuciones didácticas como las de H. Copper, o las aportaciones en el campo de la psicología del aprendizaje de H. Gardner con las inteligencias múltiples y K. Robinson por lo que concierne a la creatividad y el pensamiento divergente. Además, podemos ver la gran influencia de M. Lipman en el por qué y para qué de la educación que defienden los autores. Al final, las Ciencias Sociales deben contribuir a garantizar las habilidades y libertad de pensamiento de los alumnos y las alumnas que, expresadas mediante el diálogo, sean el motor del cambio social. Por lo que concierne a las metodologías, autores como Déclory, Kilpatrick o Freinet son la base para crear propuestas didácticas innovadoras, realistas, activas, participativas e inclusivas. Así mismo, podemos encontrar citas de currículos de otros países, como por ejemplo de Australia, del cual se incorporan conceptos y contenidos educativos inexistentes aquí, como el sense of wonder, que hace referencia a la capacidad de maravillarse.
Abordar este libro ayuda a tomar conciencia de la importancia de unas Ciencias Sociales para la educación infantil, ya que pueden aportar mucho al desarrollo personal y social de los alumnos y alumnas del siglo XXI. El potencial didáctico recae principalmente en el hecho de potenciar la investigación y la resolución de problemas, de dilemas éticos y morales, el desarrollo de opiniones, la construcción de historias, el uso responsable de las tecnologías y reflexiones sobre la propia identidad. Se trata de una obra muy asentada a su momento y atiende al compromiso de dar respuesta a los cambios sociales que ha representado la sociedad de la información y la comunicación. Las propuestas que se plantean siguen esta línea, ya que son innovadoras por lo que concierne a la forma y al fondo. Así mismo, estas consideraciones se abordan de manera global en toda su dimensión y significación. Al final, los niños y las niñas van construyendo sus primeras identidades a partir del abanico de posibilidades que el mundo les ofrece para establecer su papel más definitivo.
El las conclusiones, los autores comentan que ya nada volverá a ser lo mismo porque cuando te adentras en la aventura del aprendizaje todo cambia. Con mucho entusiasmo hablan del propio aprendizaje que han experimentado escribiendo el libro e insisten en la importancia de vivir las cosas para poderlas contar, la experiencia como anclaje para poder reflexionar sobre la enseñanza de las Ciencias Sociales en la Educación Infantil y, sobretodo, el ejemplo y la coherencia entre los argumentos teóricos y la práctica docente.
Como argumenta la obra, desde esta perspectiva se puede trabajar de manera integral con los niños y las niñas, potenciando una educación intelectual, emocional y social que contribuye al desarrollo de capacidades fundamentales para ayudarlos a desarrollarse y que sean personas activas, imaginativas, competentes y felices. Y en estas páginas, se pueden encontrar algunas claves para ello.
[IF]
História da África – MACEDO (RL)
MACEDO, José Rivair. História da África. São Paulo, Editora Contexto. 2014. Resenha de: FATURI, Fábio; CANTO, Rafael. Revista do LHISTE, Porto Alegre, v.1, n.1, p.181-186, jul./dez., 2014.
Passada mais de uma década de promulgação da lei 10.639/03 que obriga o ensino de história da África e dos africanos nas escolas brasileiras, ainda se encontram barreiras no processo de sua efetiva implantação. Uma destas barreiras é o ainda pequeno número de materiais para embasar os profissionais da educação, sejam eles do nível fundamental ou do médio – ou mesmo universitário – acerca das realidades históricas das sociedades do continente africano. Nesse contexto, o livro História da África do professor e pesquisador José Rivair Macedo, publicado em 2014, entra no círculo de obras obrigatórias para aqueles professores que buscam conhecer as sociedades africanas a partir de um viés que tem por objetivo encontrar uma África sujeito e não uma África objeto.
A obra, que está dividida em sete capítulos, não segue uma perspectiva linear, cronológica respeitando, desta forma, a evolução própria daquele continente. Ela busca dar um panorama geral dos grandes grupos sociais existentes no continente, suas diversas relações com a Europa, a Ásia e dentro do próprio continente, além de tratar da questão da escravidão. Isto sem aprisionar a história tão vasta do continente apenas na questão do tráfico transatlântico de escravos, tema abordado com a devida profundidade no capítulo cinco.
Seria uma pretensão pensar que em um livro de menos de duzentas páginas seja possível resumir a longa história do continente africano, desde o início do processo de hominização até os movimentos de descolonização que marcaram, atualmente, de forma profunda as nascentes nações africanas. Basta pensar na obra monumental da UNESCO, História Geral da África, produzida nos anos 1970 e 1980, mas que só recebeu tradução para a língua Portuguesa em 2010, a mesma possui oito volumes e quase 20.000 páginas e cuja análise possui um recorte temporal semelhante. A capacidade e a qualidade da síntese são, neste sentido, qualidades destacáveis do livro resenhado neste espaço.
História da África serve como um ótimo guia para professores que buscam conhecer as diversas formas de sociedades africanas ao longo da história de uma forma bastante atualizada em se tratando de pesquisas históricas. Apesar da obra não possuir notas de rodapé, que permitam ao leitor buscar o caminho reverso do texto, ao final de cada capítulo o autor buscou referenciar os livros mais indicados para pesquisas futuras. Além de elencar uma grande variedade de filmes, sites e diversas outras formas que permitam ao leitor não só reconstituir a pesquisa em que o livro se embasou como também iniciar sua própria pesquisa.
Uma característica importante da obra é a presença, no corpo do texto, de pequenos trechos das diversas fontes pesquisadas pelo autor. São relatos de viagens e excertos de textos clássicos sobre o tema que se configuram como de leitura obrigatória para os professores que buscam, em sala de aula, apresentar uma “nova” África a seus alunos.
O primeiro capítulo da obra intitulado Pré-história Africana parte de uma sucinta descrição do ambiente natural daquele continente (condições geológicas, climáticas, etc.) que servem para demonstrar a diversidade de ambientes e as dificuldades impostas às populações, que sejam africanas, quer sejam exploradores de outros continentes. Estes elementos são fundamentais para compor as respostas as perguntas: por que o homem surgiu na África? E, por que estes grupos saíram da África?
A exposição desenvolvida pelo autor recupera elementos para demonstrar que mais do que o lugar do surgimento do homem, a África foi o espaço onde a humanidade se desenvolveu e assumiu características transmitidas e compartilhadas por todos os seres humanos do planeta. A análise desenvolvida neste capítulo se estende até a adoção, por parte dos grupos que habitavam aquele continente, da agricultura, da pecuária, substituindo a caça e a coleta. Mudanças que propiciaram o desenvolvimento de inovações tecnológicas, econômicas e sociais e abriram o caminho para subsequentes transformações, como a invenção da cerâmica e da metalurgia. O desenvolvimento destes domínios técnicos que explica o florescimento das primeiras civilizações africanas que serão analisadas nos capítulos posteriores.
No capítulo da obra Os povos da Núbia e do Índico, o autor apresenta as maneiras pelas quais os povos do nordeste e do litoral oriental da África organizaram-se em torno dos grandes rios e oceanos. São sociedades, portanto, em constante interação com povos de diversos espaços geoculturais, contatos e trocas constantes entre o cristianismo e o islamismo. Inicialmente são abordadas as civilizações egípcias e a meroítica, esta última que é, aliás, “a mais antiga civilização negra da África” (p. 25), onde já se fazem presente diversos traços originais das antigas sociedades africanas como, por exemplo, o papel diferencial da mulher na sociedade.
Ainda neste espaço, analisa-se a emergência do estado de Axum e da Etiópia que adotaram o cristianismo e a difusão do islamismo na África, sobretudo na região do Sudão Oriental e nas cidades Suaíli. As últimas linhas do capítulo ocupam-se do Grande Zimbábue, complexo arquitetônico localizado onde atualmente situam-se Moçambique e Zimbábue, que se destaca “por sua dimensão, ostentação e complexidade” (p. 37) e concluindo, a presença europeia na região.
No terceiro capítulo, O eixo transaariano, o autor ocupa-se de analisar as sociedades africanas que se organizaram para se adaptar ao deserto e à savana. Acompanhando, portanto, a evolução histórica destas populações que necessitaram tirar o máximo dos recursos disponíveis nestes ambientes que lhe ofereciam poucas condições para sobrevivência. De forma geral “esses grupos ocuparam deste a faixa litorânea do mar Mediterrâneo até os limites da floresta tropical” (p. 45-46).
A análise parte da islamização do Magreb, percorrendo o desenvolvimento das sociedades no eixo das rotas do Saara, destacando a atuação dos tuaregues. O estado de Gana, “o mais antigo estado negro organizado com ampla área de dominação política e econômica” (p. 52), do antigo Mali, o Império Songai e os estados Hauçá são analisados, sintetizando a diversidade e a riqueza deste cenário histórico da África Subsaariana.
No capítulo O mundo atlântico o autor recupera a experiência histórica deste espaço entre os séculos XVI e XIX, atentando para as mudanças estruturais e as transformações na organização social nas populações localizadas nas regiões banhadas pelo oceano Atlântico. Especialmente, a partir do contato destes povos africanos com mercadores e companhias comerciais da Europa. Contatos que são fundamentais, como demonstra o autor neste espaço, para compreender o processo de dominação europeia do continente.
Destaca-se a exposição do autor a respeito da Confederação Achanti desenvolvida por ele neste capítulo. Um estado que se desenvolveu, onde atualmente localizam-se as repúblicas de Ghana e Togo, as quais se tornariam essencialmente militaristas. Assumiriam a organização administrativa em torno dos amans (estados “confederados”), cuja economia baseava-se na extração de ouro e no lucro advindo do tráfico de escravo que “eram negociados nos fortes do litoral e com os mercadores do Sudão oriental” (p. 79).
Dentre os assuntos mais pertinentes em relação a história do continente africano encontra-se a questão da escravidão, sendo este o eixo para o desenvolvimento do quinto capítulo da obra, O tráfico de escravos. Citada como a maior causa da pobreza atual do continente por diversos autores, o tráfico internacional de escravos é tratado na obra em questão a partir de um ponto de vista que traça uma linha divisória bem determinada entre a escravidão endógena no continente africano e o tráfico internacional de escravos. A partir de análises de autores importantes acerca da escravidão africana como John Thornton ou Paul Lovejoy o autor apresenta as formas de como dava a redução ao cativeiro nas sociedades ancestrais africanas. Além disso, apresenta a forma como os cativos eram alocados nas sociedades africanas, onde apesar de sua condição nunca perdiam a identidade humana, o que irá ocorrer com o tráfico internacional. Essa diferenciação torna-se imprescindível no sentido de entender que não é correto afirmar que os africanos escravizavam africanos para vendê-los como escravos, pois não existia uma identidade coletiva continental. As identidades não ultrapassavam os limites da aldeia ou mesmo da linhagem.
A partir dessa diferenciação o autor mergulha na realidade do tráfico internacional de escravos e seus diversos pontos de análise. As rotas de longo curso, desde as caravanas de mercadores árabe-muçulmanos e afro-muçulmanos que cruzavam o deserto levando cativos, até as embarcações que cruzavam o Atlântico trazendo ao novo mundo os quase 10 milhões de escravizados. É nesse contexto onde os escravos tornam-se “peças” e deixam de ser humanos. “Tornando-se uma categoria social privada de todos os seus direitos e constituindo-se como a base do sistema de exploração econômica” (p.105). O autor analisa também os agentes que participam desse tráfico. Desde os primeiros momentos onde os “lançados” negociavam com as elites ou os principais dos reinos africanos no interior do continente, até o momento onde são constituídas as grandes redes de comércio, conectando diversos atores entre Europa, América e África. Na sequência é possível encontrar as moedas de troca, os valores correspondentes aos diferentes tipos de escravizados e como esse, que era um comércio subsidiário dentro das sociedades africanas, passa a tornar-se o principal meio de entrada de armas de fogo, bebidas alcoólicas desestruturando as pequenas sociedades tribais.
Ao final desse capítulo o autor apresenta ao leitor uma ótima reflexão acerca da diáspora africana, suas diversas faces no novo mundo, seus graves problemas nas sociedades americanas e o rescaldo dessa, que foi a maior emigração da história da humanidade. O autor reflete também sobre a questão da abolição do tráfico de escravos e sua ligação direta com a Revolução industrial.
No sexto capítulo A condição colonial é abordado o período entre os anos 1870 e 1960 onde praticamente todo o continente esteve submetido às nações europeias. Contudo as análises feitas pelo autor procuram salientar os pontos de desenvolvimento e adequação a que as sociedades africanas conseguiram moldar-se para sobreviver ao jugo europeu. Sem, é claro, demonstrar a situação político, econômico e social a que esses povos foram submetidos. Entretanto, essa forma de análise permite que se permita às sociedades africanas tornam-se agentes de seu destino e não apenas meros expectadores dentro do contexto a que foram submetidas. Dentre os pontos importantes analisados nesse capítulo está o da afirmação do Islã dentro das diversas sociedades africanas. Até hoje existe a discussão acerca de que, se foi a África que se Islamizou ou se foi o Islã que se africanizou. O autor apresenta as diversas faces do Islã e sua força dentro do continente. Assunto pouco discutido nas obras que se tem acesso no Brasil. Normalmente a África é vista como um continente de religiões exóticas ou mesmo ligado às religiões afrodescendentes, o que é um grande equívoco, tal é a envergadura do Islamismo nas diversas partes do continente africano. Além desse assunto o autor se propõe a refletir sobre um dos temas mais importantes, em se tratando de estudos africanos na atualidade, o diálogo entre a tradição e a modernidade. Autores como Hampaté Bá, Walter Rodney são utilizados como ferramenta para que se possa repensar a forma como devem ser tratados os estudos africanos. A condição do imperialismo e do colonialismo são temas fundamentais nesse capítulo que traçam um panorama histórico com análises bastante profundas, dada a dimensão da obra. Nessa perspectiva o autor apresenta a situação dos viajantes europeus como Mungo Park ou David Livingstone que adentraram o continente e foram olhos do império, travestidos de naturalistas ou expedicionários. Rivair apresenta os mecanismos de exploração utilizados pelos europeus em suas diferentes formas ao longo desse extenso período. A construção do racismo científico é outro tema explicado pelo autor e que muitas vezes passa despercebido em outras obras dessa magnitude. Por fim, a questão sui generis da África do Sul e seu Apartheid que adentrou o século XX quase o século XXI e mostrou ao mundo já globalizado a face mais violenta da discriminação.
No capítulo que conclui a obra, intitulado Descolonização e o tempo presente, o autor busca apresentar um pouco da situação dos diversos países do continente e sua situação atual traçando uma linha histórica desde o final da segunda guerra mundial até a primavera árabe de 2011. Trabalho extremamente difícil em apenas um capítulo, mas que inicia com as bases do anticolonialismo. Os movimentos messiânicos que buscaram na ancestralidade africana raízes para suas lutas de libertação, a participação dos africanos na guerra junto aos brancos. Nesse contexto o autor apresenta ao leitor nomes importantes na constituição do movimento conhecido como Negritude: Franz Fanon, Aimé Cesaire, Leopold Senghor. A partir daí iniciam-se as análises acerca da descolonização no contexto da Guerra Fria. Nesse momento cada uma das grandes potências busca trazer, da forma que fosse possível, as jovens nações africanas para seu campo de influência. De acordo com o autor, esses estados fragilizados e com pouca estrutura foram cooptados de diversas maneiras e naqueles em que não foi aceito o julgo foram apoiadas ditaduras, que muitas delas viraram o século XXI.
Finalizando o trabalho, o autor ainda propõe uma pequena análise dos estados pós-coloniais ao final do século XX, refletindo acerca das heranças coloniais e da cultura africana. Nesse ponto é possível identificar a importância de utilizar das análises acerca do continente que façam da África sujeito de história e não apenas expectador. Pois aqui é possível ver que apesar de hoje ser o continente mais pobre do planeta suas diversas faces estão encravadas por todos os outros lugares do mundo. Milhares de pequenas Áfricas, como diz o autor, sobrevivem culturalmente ao redor do mundo e através de uma leitura histórica bem aprimorada é possível enxergar uma história do continente africano que fuja dos estereótipos comuns. E que, ao mesmo tempo consegue-se analisar os profundos dilemas a que o continente tem de se deparar no século XXI.
Fábio Faturi – Mestrando em História – PPG História/UFRGS. E-mail: fabio.faturi@hotmail.com
Rafael do Canto – Mestrando em História – PPG História/UFRGS. E-mail: rafael_docanto@hotmail.com
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The Oxford Handbook of World History | Jerry Bentley
Pouco conhecida no cenário historiográfico brasileiro, a denominada História Global tem se desenvolvido com força desde a década de 1980 nos meios acadêmicos europeus e norte-americanos. As perspectivas globais, a busca por efeitos-causa e a explicitação de grandes processos, que nortearam a produção historiográfica inglesa e norte-americana desde as obras de Arnold Toynbee (1955) nos anos 1930 até Immanuel Wallerstein (1974) e William McNeill (1963) nos anos 1970, passaram por um intenso processo de renovação e rediscussão.
O livro organizado pelo Professor da Hawai’i University, Jerry Bentley†1, reúne as mais atualizadas discussões sobre o tema, proporcionando em seu conteúdo uma visão ampla e sistêmica da História Global. Em seu prefácio, Bentley apresenta ao leitor as novas – e as não tão novas – dificuldades e armadilhas dos historiadores globais. Influenciados pelos estudos póscoloniais e pela descentralização do saber acadêmico, ocorrido ao longo do século XX – que descendeu das cátedras europeias às mais variadas partes do mundo – os historiadores globais rejeitaram velhas idiossincrasias das denominadas “Histórias Universais”, como o etnocentrismo e um manifesto “sentido da história” hegeliano, em prol de uma análise de processos, encontros e trocas entre as sociedades, considerando sua fluidez e permeabilidade, espalhados por dilatadas dimensões espaciais e temporais. Leia Mais
Nietzsche: uma introdução filosófica – FIGAL (V)
FIGAL, Günter. Nietzsche: uma introdução filosófica. Trad. Marco Antônio Casanova. Rio de Janeiro: Mauad X, 2012. Resenha de: MERTENS, Roberto saraiva Kahlmeyer. Veritas, v. 59, n. 1, p. 15-19 jan.-abr. 2014.
Em fins de 2012, foi editada a tradução de Nietzsche: uma introdução filosófica, de Günter Figal (Mauad X, 2012). Conhecida do público europeu desde a década de 1990, esta obra de fôlego, a contar dessa data, vem contribuindo com a elevação do nível das pesquisas sobre Nietzsche no exterior. Fenômeno que talvez se explique pela visada peculiar que seu autor joga sobre a filosofia de Nietzsche.
Embora apontado como um dos principais representantes da Nietzsche Forchung alemã (ao lado de Günter Abel e Volker Gehardt), Günter Figal não seria um leitor de Nietzsche no sentido estrito do termo. Formado no caldo de cultura da fenomenologia-hermenêutica, tendo sido aluno de Hans-Georg Gadamer e herdeiro direto da filosofia de Martin Heidegger (a ponto de, atualmente, ocupar a cátedra que pertencera ao filósofo na Universidade Albert-Ludwig, em Freiburg), é inevitável encontrar na interpretação que Figal faz de Nietzsche traços influentes de sua formação.
Muito mais do que exegese do texto nietzschiano, o livro deixa transparecer o esforço de partir da obra do filósofo, e das interpretações estabelecidas na fortuna crítica, para uma aproximação gradual do horizonte significativo do pensamento de Nietzsche. Assim, ao arrancar das posições, visões e conceptualizações que as leituras disponíveis oferecem-nos, Günter Figal reconstrói o cenário no qual o pensamento de Nietzsche fez-se possível, passa em revista crítica as teses consolidadas sobre tal filosofia e, por fim, descreve o que se evidencia a partir de um
Nietzsche livre dos cacoetes de algumas interpretações tradicionais. A tríade reconstrução, revisão crítica e reinterpretação (que delineia o itinerário do livro de Figal) será a mesma que oferecerá estruturação a esta resenha.
O gesto reconstrucionista é particularmente identificado no capítulo inicial. Dividido em três tópicos, no primeiro, intitulado “Sismógrafo”, o autor oferece-nos um verdadeiro inventário da recepção da obra de Nietzsche na contemporaneidade. É digno de nota que tal balanço não se restringe à cena filosófica. Figal indica como o pensamento de Nietzsche infiltrou-se nas ciências humanas e sociais por meio de Georg Simmel e de Max Weber; como os influxos das ideias estéticas do filósofo serviram de inspiração a músicos como Gustav Mahler e Richard Strauss; como o espírito da obra nietzschiana passou à literatura dos irmãos Mann (Heinrich e Thomas), de Gottfried Benn e, em especial, de Ernst Jünger. Valendo-se desta contextualização, Günter Figal indica, a partir deste último, o papel que Nietzsche desempenhara em seu tempo. Em uma época de crise, na qual a filosofia ainda se ressentia da ruína dos idealismos (para os quais Hegel e os hegelianos representavam uma espécie de aristocracia metafísica) e da ascensão bárbara do positivismo, a lucidez de Nietzsche não seria um terremoto, mas o sensor que descreve e interpreta tais abalos, ou, nas palavras de Jünger:
Ele investiga os caminhos possíveis, as rotas mais extremas sobre as quais a razão fracassará. A apreensão intelectual da catástrofe é mais terrível do que os medos reais do mundo do fogo. (…) Partir-se assim era o destino de Nietzsche: hoje é de bom tom apedrejá-lo. Do mesmo modo que depois do terremoto, as pessoas se abatem sobre o sismógrafo. Não obstante, não se pode fazer que o barômetro expie a culpa pelo furacão se não se quiser adentrar as fileiras dos primitivos.1
A metáfora do sismógrafo como indicativa do posto de Nietzsche é apenas uma das muitas tiradas felizes do ensaio de Figal neste momento propedêutico. Os tópicos que se seguem a este (a saber, “Biografia” e “Definições de posição”) reforçam pontos ali esboçados.
Sem a erudição histórica das biografias disponíveis no mercado e com uma condução que nos lembra, em certos lances, os parágrafos biográficos do primeiro volume das preleções de Heidegger sobre Nietzsche, a obra de Figal oferece-nos uma narrativa da vida e obra deste pensador. Do mesmo modo que Andler,2 Figal valoriza a juventude de Nietzsche: seu período de formação filológica na Escola de Pforta, seu convívio amistoso com o mestre filólogo F. W. Ritschl, o desgosto da carreira docente, a amizade malograda com R. Wagner, a maturação das ideias mais tenras da infância em A origem da tragédia e os primeiros fustigos por parte do seu ex-condiscípulo U. v. Wilamovitz-Moellendorff (o filólogo).
Deste bosquejo biográfico, entretanto, o que mais importa é a indicação de que Nietzsche, voluntariamente afastado da universidade e possuindo reduzido um círculo de amizades, volta-se para si tornando-se pela primeira vez presente como pensador por meio de sua escrita. Figal sustenta a tese de que, para Nietzsche, e ao contrário dos demais filósofos, “(…) o que está em questão para ele não é nem mesmo um programa filosófico que pudesse subsistir por si e seria designado por meio de seu nome (…). Nietzsche se retrai ante o desenvolvimento das ideias que poderiam ser aplicadas sem uma consideração da pessoa.”3 Caracteriza-se, assim, a concepção nietzschiana da “vida como literatura”.4
Os pontos de partida para a elaboração do que seria uma escrita de si e um si mesmo como filosofia é o que se encontrará no já mencionado tópico “Definições de posição”. É aí que o comentador (após a revisão literária das interpretações de Nietzsche que fizeram escola: Jaspers, Heidegger, Lukács, Adorno e Derrida) aponta o lugar que o filósofo de Röcken ocupa na história da filosofia: “(…) Nietzsche não pode mais ser pensado agora meramente em contraste com a tradição; se Nietzsche é o filósofo moderno por excelência e ao mesmo tempo pertence à metafísica, isso é uma prova do caráter metafísico da modernidade (…)”4 Tal afirmação causaria certamente desconforto aos acostumados a conceber Nietzsche como o arauto do pensamento não metafísico, convicto opositor da tradição. Entretanto, bem como Heidegger, Figal entende que Niezsche ainda possui ligação com a tradição filosófica justamente por depender de pressupostos e arrolar consequências de ideias e condutas próximas à metafísica.
É nesse momento que a principal tese do livro aparece, tal tese alinha a conduta de Nietzsche à figura paradigmática do Sócrates e liga seu pensamento a Platão. Em que sentido? Resposta: primeiramente, ao contar com a tradição de pensamento ocidental para colocar-se em diálogo com conceitos e questões filosóficas; depois, por sua filosofia tornar-se o que é na medida em que se diferencia da tradição, fazendo desta um outro de si, isto é: na maneira pouco canônica com a qual Nietzsche contempla o mundo e confronta-se com a metafísica, a tradição filosófica experimenta sua alteridade. Mas, para Figal, ainda que a filosofia de Nietzsche desconstrua as bases da metafísica e proponha-se em termos diversos da tradição (Figal não insinua que Nietzsche reproduza Platão), mesmo o “filosofar a marteladas” guardaria vestígios de sua natividade metafísica. Diante do caráter polêmico desta tese, o resumo pálido que esta resenha apresenta (coerentemente a sua proposta de recensão e adequando-se ao espaço que lhe é cabido), não permite que o leitor prescinda da leitura deste terceiro tópico do primeiro capítulo, bem como os diversos momentos adiantados do texto no qual a premissa ganha desdobramentos. É possível, entretanto, concordar com o comentador quanto a seu esforço por caracterizar de maneira mais rigorosa e uniforme a figura filosófica de Nietzsche, descerrar um filósofo “mais estranho, mais espantoso e mais conhecido ao mesmo tempo”.5 A transição do Capítulo primeiro aos próximos deixa transparecer, novamente, uma atitude hermenêutica. Denominado De fora, o primeiro momento apresentava as circunstâncias externas a partir das quais ingressaríamos na leitura da obra em busca de uma compreensão do pensamento de Nietzsche. Destarte, partindo das compreensões prévias que a narrativa biográfica e as interpretações autorizadas oferecem, pode ter início o caminho de intensificação de compreensões da obra-Nietzsche. É isso que se encontra no capítulo segundo, intitulado Tempo, ser e devir. O referido nome explica-se pelos tópicos encontrados nesta seção.
Em tais pontos encontramos a tematização de noções-chave do pensamento de Nietzsche, como o devir, força plástica e arte, apresentadas por meio de citações do autor de Assim falou Zaratustra. A qualificação de Figal enquanto intérprete de Nietzsche evidencia-se desde que nos deparamos com as passagens que o autor escolhe para tematizar (tal seleção, por si só, justifica uma leitura dos tópicos). Num diálogo intrínseco à obra de Nietzsche, e sem fugir ao enfrentamento das leituras mais acatadas, Figal revisa criticamente a maneira com que conceitos, temas e questões decorrentes do pensamento de Nietzsche vêm sendo apropriados. Muito do exercício de interpretação do comentador consiste em desmontar essas interpretações cristalizadas para liberar o interpretado a um horizonte no qual seja favorável a identificação do solo no qual este estaria fundado. Movimento hermenêutico idêntico é o que se repete no terceiro e quarto capítulos.
Aguardado durante toda a leitura, é no último capítulo da obra que o problema do conhecimento aparece. Sob a alcunha de Vida do conhecimento, podemos conferir a distinta interpretação que Figal dedica aos conceitos mais fundamentais do pensamento nietzschiano, ao exemplo: o super-homem (na peculiar opção de tradução como “além-do-homem”), a vontade de poder, o eterno retorno e a psicologia (conceitos homônimos aos tópicos dignos de nota no referido capítulo). Ao apontar estes conceitos como raios para o eixo que o personagem de Zaratustra constitui, Figal pode elucidar o quanto essas noções dão voz a uma doutrina da vida. Importa, entretanto, ao comentarista indicar o quanto mesmo esta doutrina em sua presumida liberdade de pensamento ainda não teria suas bases no solo tradicional do platonismo, este contra o qual o próprio Nietzsche volta-se. Tal tarefa, que parece perpassar inteiramente Nietzsche, constitui uma introdução filosófica, que se torna mais nítida na terceira porção do trabalho.
Ao longo das 248 páginas que dão corpo à tentativa de tornar compreensível a obra de Nietzsche, o livro de Günter Figal – não seria demais assinalar – possui uma linguagem tão didática quanto plástica. Tais atributos discursivos, mais do que um requinte estético, denotam não só a maturidade do pesquisador perante seu objeto de estudo, quanto a preocupação de fazer jus à prosa filosófica do incontestável estilista que foi Nietzsche.
Publicado originalmente na forma de livro de bolso sob o selo da alemã Reclam, a editora brasileira apresenta o livro com arte e editoração elegantes, reservando-lhe lugar especial no interior da Coleção Sapere Aude, que já possui outros títulos referentes a Nietzsche.
Referências
ANDLER, Charles. La Jeunesse de Nietzsche – Nietzsche as vie et as pensée. 3. ed. Paris: Rossard, 1921.
FIGAL, Günter. Nietzsche: Uma introdução filosófica. Trad. Marco Antônio Casanova. Rio de Janeiro: Mauad X, 2012.
HEIDEGGER, Martin. Nietzsche I. Trad. Marco Antônio Casanova. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007.
Notas
Roberto Saraiva Kahlmeyer-Mertens – Doutor em Filosofia pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ. Professor Adjunto na Universidade Estadual do Oeste do Paraná-UNIOESTE. E-mail: kahlmeyermertens@gmail.com.
Argumentation Schemes – WALTON et al (EPEC)
WALTON, D. N., REED, C.; MACAGNO, F. Argumentation Schemes. Cambridge: Cambridge University Press, 2008. 443p. Resenha de: IBRAIM, Stefannie de Sá; MENDONÇA, Paula Cristina Cardoso. Ensaio Pesquisa em Educação em Ciências, Belo Horizonte, v.15, n. 03, p. 255-262, set./dez./ 2013.
O livro “Argumentation Schemes”, escrito por Douglas Walton, Chris Reed e Fabrizio Macagno, publicado em 2008, apresenta uma análise sistemática de esquemas argumentativos e um compêndio com 65 esquemas (por exemplo, argumento de opinião de especialistas, argumento de causa-efeito, argumento de sinal, argumento de analogias, etc.). Segundo os autores, os esquemas argumentativos representam estruturas de argumentos que são tipicamente utilizados no discurso cotidiano, assim como em contextos de argumentação legal e argumentação científica.
Em 1996, Walton havia escrito um livro reunindo 25 esquemas argumentativos. Na obra de 2008, ele e seus colaboradores reuniram os principais tipos de argumentos originários de seus próprios trabalhos e de outros encontrados na literatura. Esses esquemas podem ter natureza descritiva, o que significa dizer que podem ser baseados em dados empíricos ou normativos, isto é, aquilo que se supõe ser um bom argumento para determinado objetivo. Walton não deixa claro se determinado tipo de esquema foi derivado de observações empíricas ou se é idealizado, ou seja, ele não descreve a genesis de seus esquemas, apenas cita exemplos de argumentos reais para alguns e cria exemplos para outros (Blair, 2001).
Apesar de a obra não ter sido dirigida especificamente ao público da educação, em especial, da educação em ciências, é possível perceber a variedade de contextos em que ela pode ser utilizada – o que também pode ser justificado pela formação e atuação diversificada dos autores. Walton, PhD. em filosofia, é pesquisador do Centro de Pesquisas sobre Raciocínio, Argumentação e Retórica (CRRAR) na Universidade de Windsor, no Reino Unido; Reed é palestrante sênior e diretor de pesquisa da Escola de Computação da Universidade de Dundee, na Escócia; e Macagno é doutor em linguística pela Universidade Católica de Milão, na Itália.
Para melhor compreensão do livro analisado, é necessário que o leitor tenha uma noção da visão de argumentação adotada nos trabalhos de Walton (Walton, 1996, 2006). Por isso, optamos, antes de tudo, por pontuar algumas características da visão do autor, apresentadas, principalmente, em uma outra obra sua, que foi publicada em 2006.
Segundo uma visão mais tradicional de lógica formal, ao se avaliar a qualidade de um argumento, devem ser efetivadas as relações semânticas entre as proposições, ou seja, o argumento é entendido com um conjunto de proposições cuja relevância está presente na verdade ou falsidade delas, sendo que o contexto mais amplo do diálogo não é levado em consideração no julgamento da qualidade daquele argumento. A lógica informal, pelo contrário, enfatiza o uso que o argumentador faz das proposições para alcançar um objetivo. O argumento, nessa perspectiva, é uma alegação que, de acordo com os procedimentos adequados do diálogo racional, deve ser pertinente à conclusão do argumentador, contribuindo para prová-la ou esclarecê-la. Sua avaliação se dá no contexto de uso das proposições: o diálogo.
Em consonância com as bases da lógica informal, a nova dialética, sob o ponto de vista de Walton (1999), ocupa-se principalmente dos tipos mais comuns de argumentos do dia a dia, que são fundamentados no raciocínio presuntivo, em vez de ocupar-se dos raciocínios indutivos (a partir de casos específicos se chega a uma generalização) ou dedutivos (a partir de premissas gerais se chega a um caso particular). Além disso, a nova dialética leva em consideração as características contextuais do discurso.
Segundo Walton et al. (2008), a avaliação do argumento no domínio da lógica informal está centrada em argumentos que se configuram como tentativas, na plausibilidade da conclusão e no balanço das evidências em relação às possíveis resoluções. O raciocínio presuntivo se encontra presente em argumentos dessa natureza. Esse raciocínio apoia a inferência sob condições de incompletude e permite que dados desconhecidos sejam presumidos. A conclusão é um tipo pressuposição, aceita em uma base tentativa e sujeita à retratação, caso novas informações estejam disponíveis no processo. Argumentos baseados em raciocínio presuntivo foram, durante muitos anos, caracterizados pelos livros clássicos de lógica como falácias, pela alegação de este ser um tipo de raciocínio muito subjetivo. Entretanto, recentemente, as falácias informais têm sido reconhecidas como formas válidas de raciocínio, dependendo da situação contextual.
Segundo Walton (1999), a nova dialética pode ser utilizada como forma de analisar argumentos falaciosos por se basear em estruturas proposicionais não válidas (pois não se derivam de raciocínio dedutivo e indutivo), mas que representam uma forma coerente de pensar. Na nova dialética, cada caso é único, e um dado argumento necessita ser julgado com relação ao discurso disponível, ou seja, é importante observar qual o objetivo do argumento, pois um mesmo argumento pode não ser relevante em um contexto, mas o ser em outro. De acordo com o autor, o objetivo do argumento se relaciona à sua relevância dialética.
É no contexto da nova dialética que devemos compreender os esquemas argumentativos apresentados na publicação de 2008. Segundo o livro, eles podem envolver quatro tipos de raciocínio principais: indutivo, dedutivo, presuntivo ou abdutivo e falsificável ou anulável. Os três primeiros tipos já foram caracterizados anteriormente. O último tipo é aquele que implica em a conclusão ser retirada de um conjunto de dados válidos, mas que pode ser modificada ou abandonada caso esses dados se tornem falhos.
Um exemplo de esquema argumentativo apresentado no livro é o de analogia, cuja estrutura é apresentada no quadro 1.
Quadro 1: Argumento de analogia. ( p. 256)
Outro tipo de esquema argumentativo é o de sinal, cujo exemplo apresentado na obra é “Isso parece pegada de urso, portanto, um urso deve ter passado por aqui.” (Walton, Reed, & Macagno, 2008, p. 329).
“Argumentation Schemes” é dividido em 12 capítulos. O capítulo 1 consiste em um estudo da arte no qual os autores apresentam o que são os esquemas argumentativos. Por exemplo, o esquema de analogia sustenta que para dois casos similares, as ações ou conclusões afirmadas a partir de um caso também são verdadeiras para o caso similar. Ainda é discutido o papel das questões críticas, que são formuladas para avaliar a força de um argumento em determinado contexto. No caso de esquemas para argumentos presuntivos, apesar de a inferência não ser válida dedutivamente ou indutivamente, ela tem suporte respaldado pela estrutura lógica do esquema argumentativo e pelas questões críticas. Portanto, o esquema argumentativo e as questões críticas são utilizados para avaliar um dado argumento em um caso particular em relação ao contexto do diálogo no qual o argumento ocorre. Um argumento proposto em um caso particular é avaliado pelo julgamento das evidências com relação às possíveis perspectivas de resolução. Se todas as premissas são sustentadas por evidências, a aceitabilidade se move para conclusão, que está sujeita a refutações a partir de questões críticas apropriadas (Walton, 1999). As questões críticas referentes ao esquema de analogia estão apresentadas no quadro 2.
Quadro 2: Questões críticas relativas ao argumento de analogia. (p.256)
Os aspectos presentes no capítulo 1 são fundamentais para a compreensão dos próximos, pois neles os autores aprofundam as discussões de todos osesquemas e das teorias presentes no campo da argumentação. No capítulo 2, é discutido detalhadamente como seria o tratamento do esquema de analogia pensando-se nas diversas linhas de raciocínio; por exemplo, como seria a análise desse esquema pelos livros de lógica e como seria sua ocorrência em situações do cotidiano.
Nos capítulos 3, 4 e 5, são descritos os esquemas tidos como os mais falaciosos, que seriam aqueles nos quais a conclusão está mais relacionada ao apelo emocional ou nos quais a conclusão não é, necessariamente, justificada pelas evidências. São fornecidos exemplos de situações do cotidiano nas quais esses tipos de esquemas estão presentes. Um exemplo é o argumento do tipo posição de conhecimento (A tem razão de presumir que B tem conhecimento de, ou acesso à informação, que A não tem. Então, quando B opinar, A tratará a informação como verdadeira ou falsa).
O capítulo 6 discute a inadequação do tratamento baseado na lógica para os argumentos do tipo enthymemes1 e aborda o uso dos esquemas para análise de argumentos e as suas limitações. No capítulo 7, são apresentados os esquemas argumentativos que possuem caráter de refutação. Um exemplo é o esquema de opinião de especialista (referência a uma fonte externa de opinião especialista que fornece informações), no qual a conclusão advém de uma fonte confiável de conhecimento.
No capítulo 8, é apresentada uma visão longitudinal dos estudos no campo da argumentação, desde a teoria de Aristóteles até as teorias modernas para os esquemas argumentativos, que são aquelas que aceitam os argumentos baseados na lógica informal. Isso permite ao leitor observar como, a partir desses tipos de estudos, os argumentos considerados falaciosos passam a ser aceitos (o que é considerado pelos autores como mudança de paradigma). O capítulo 9 é constituído pelos 65 esquemas argumentativos reunidos a partir da literatura. Eles são apresentados nas formas de suas premissas e conclusões que as seguem.
Os autores trazem, no capítulo 10, um refinamento da classificação dos esquemas, ao buscarem propor um sistema provisório como um dispositivo inicial de triagem para organizar a classificação dos esquemas. O objetivo do capítulo 11 é mostrar uma maneira de formalizar os esquemas por meio de uma comparação entre eles, em forma de estruturas de inferências, e as estruturas da lógica dedutiva e do raciocínio indutivo. No capítulo 12, é discutido como os esquemas podem ser explorados ou trabalhados em quatro diferentes áreas (linguagem, comunicação, raciocínio automatizado e aplicações na computação). Além disso, o software chamado “Araucária” é apresentado. Seu objetivo é mapear as premissas e conclusões para tornar clara a classificação do argumento em um tipo de esquema.
O leitor pode estar se questionando sobre a relação da obra com a educação em ciências. Nesta parte da resenha, buscamos trazer algumas contribuições do trabalho de Walton e colaboradores para o campo de educação em ciências a partir de leituras e de pesquisas que já realizamos. Acreditamos que isso possa contribuir para o uso da obra e para favorecer a reflexão sobre ela.
Verificamos que a aplicação das ideias de Walton na área de educação em ciências é recente. Isso pode ser evidenciado pela ausência de análise dessa
ferramenta por Sampson e Clark (2008) no trabalho de revisão das principais ferramentas metodológicas sobre argumentação empregadas nessa área. Assim, parece-nos que Duschl e colaboradores (Duschl, 2008; Duschl, Ellenbogen, & Erduran, 1999) e Jimenéz-Aleixandre e Pereiro-Munõz (2002) são os precursores do uso dos esquemas argumentativos propostos por Walton. Para Duschl (2008), apenas os esquemas argumentativos de Walton são capazes de atender aos cinco critérios propostos por Sampson e Clark (2008) para examinar a qualidade de argumentos científicos:
- Examinar a natureza e qualidade das conclusões. Instrumentos analíticos devem se focar nos tipos de conclusões propostas pelos estudantes e na habilidade de coordenar as conclusões com as evidências disponíveis.
- Examinar como (ou se) as conclusões são justificadas. Estudantes necessitam aprender a prover evidências empíricas, bem como perceber qual tipo de evidência é necessária para justificar um argumento.
- Examinar se uma conclusão apresenta evidências necessárias. Estudantes tendem a focar em padrões de dados, sendo que costumam dar prioridade a partes de evidências que sustentam suas crenças pessoais.
- Examinar como (ou se) o argumento tenta levar alternativas em consideração. Como mais de uma conclusão pode explicar um fenômeno, estudantes necessitam aprender a como desafiar a fraqueza de explicações alternativas.
- Examinar como referências epistemológicas são usadas para coordenar conclusões e evidências. Estudantes necessitam aprender a como justificar/avaliar os caminhos pelos quais as evidências são coletadas e interpretadas.
De acordo com Duschl (2008), um exame mais minucioso do discurso argumentativo revela que afirmações frequentemente fazem “apelos” para proposições específicas, como apelos para autoridade ou para analogia. Segundo o pesquisador, a análise do conteúdo ou foco dos “apelos” levaria a uma aproximação dos critérios epistêmicos utilizados para estabelecer e justificar a qualidade e força do argumento (‘o que conta’) – o que justifica a afirmativa do autor apresentada no parágrafo anterior.
Duschl (2008) utilizou nove dos 25 esquemas propostos por Walton (1996) para analisar a instrução de estudantes imersos no projeto SEPIA2 e um grupo controle. Os esquemas selecionados por ele foram aqueles que, em sua opinião, apresentavam relação com características do raciocínio científico (sinal, compromisso, posição de conhecimento, opinião de especialista, evidência-hipótese, causa-efeito, correlação-causa, analogia). A partir dos gráficos apresentados por Duschl (2008), é possível perceber que o projeto SEPIA estimulou o desenvolvimento de raciocínio presuntivo dos estudantes. Isso foi evidenciado a partir de maior número de argumentos desenvolvidos pelos estudantes participantes do projeto SEPIA e de maior número de apelos a todos os esquemas. Esses resultados são bastante favoráveis, pois evidenciam que o projeto SEPIA atingiu um de seus objetivos: favorecer o desenvolvimento de um tipo de raciocínio inerente à ciência.
Jiménez-Aleixandre e Pereiro-Munõz (2002) trabalharam com o uso conjugado das ferramentas de Toulmin e Walton. Elas apresentam um estudo de caso envolvendo a tomada de decisão e argumentação no contexto de gerenciamento ambiental de um pântano em um curso de Geologia e Biologia ministrado a alunos de 17 a 21 anos pela segunda autora do trabalho. O objetivo geral era analisar se estudantes podiam atuar como produtores de conhecimento em processos de tomada de decisão. Para isso, seus argumentos foram comparados aos produzidos por um especialista (engenheiro responsável pelo projeto) no sentido de perceber se os estudantes utilizavam (i) conhecimento conceitual relevante (em termos de justificativas); (ii) diferentes fontes de informação e autoridade; e (iii) critérios para julgamento de opiniões.
Ao utilizar a ferramenta de Walton, as autoras procuraram explorar o processamento crítico de diferentes fontes de informação e autoridade. Para tal, elas usaram as questões críticas introduzidas por Walton (Qual é o status do especialista? Há consistência da proposição do especialista com proposições de outros especialistas e evidências?) que seriam mais relevantes para avaliação de esquemas de argumentos de especialistas.
Observou-se, nesse trabalho que, nas primeiras aulas, os alunos não acreditavam que podiam ser capazes de contestar a posição de especialistas devido ao status de autoridade dessas figuras, ou devido ao não domínio de conhecimentos relevantes ao tema. Porém, à medida que as aulas foram transcorrendo e que dados, tanto sobre a área quanto sobre o projeto, foram apresentados, os estudantes passaram a se sentir capazes de contestar a opinião das autoridades à luz de evidências e opiniões de outros especialistas. Nesse caso, a ferramenta se mostrou adequada para avaliar ‘o que conta’ para esses alunos como uma boa fonte de informação e uma autoridade digna de confiança. Ao mesmo tempo, a ferramenta parece ter auxiliado os alunos a perceber que as ideias de especialistas não são “verdades absolutas”, podendo ser contestadas, desde que essa contestação seja adequadamente fundamentada.
No Brasil, Correa, Mozzer e Justi (2010), fundamentados no esquema e em questões críticas de argumento de analogia de Walton (1996), tinham como objetivo perceber a validade dos argumentos elaborados por um grupo de alunos solicitados a explicar os aspectos submicroscópicos do processo de dissolução de permanganato de potássio em água, sob agitação. A análise realizada nesse trabalho exemplifica como uma questão crítica associada a um esquema argumentativo de analogia (por exemplo, “existe alguma diferença entre as situações que minaria a situação pensada?”) pode ser utilizada para perceber se há necessidade de reformular o argumento ou o raciocínio analógico. Segundo esses autores:
“Ao estimular estudantes a utilizar as questões críticas de Walton quando envolvidos num processo de argumentação, podemos possibilitar-lhes um ensino sobre o “pensar bem” em oposição ao ensino sobre “o que pensar”.” (Correa, Mozzer, & Justi, 2010, p.12)
Recentemente, desenvolvemos um trabalho (Ibraim, Mendonça, & Justi, 2013) em que utilizamos os 65 esquemas argumentativos propostos por Walton et al. (2008) para analisar argumentos de estudantes de Ensino Médio que foram entrevistados quanto a um problema de caráter científico. Nesse trabalho, categorizamos os 65 esquemas e apresentamos exemplos de cada um dos 27 esquemas encontrados nos argumentos dos estudantes. A partir da análise de dados, constatamos que os argumentos se relacionavam diretamente ao contexto no qual eles eram formulados. Percebemos a viabilidade do uso dos esquemas argumentativos de Walton para analisar argumentos em relação à distinção dos componentes do argumento segundo o padrão de Toulmin (2006). Atualmente, estamos utilizando os esquemas argumentativos para analisar argumentos de professores de Química em formação inicial.
Considerando que nesta resenha conseguimos destacar os principais aspectos da obra analisada e evidenciar como as ideias apresentadas por ela podem ser utilizadas na área de educação em ciências, convidamos o leitor a explorar a obra em questão visando aumentar os subsídios teórico-metodológicos para análise de situações argumentativas ocorridas no contexto de ensino de ciências.
Referências
Blair, A. (2001). Walton’s Argumentation Schemes for Presumptive Reasoning: a Critique and Development. Argumentation, 15, 365-379.
Correa, H. L., Mozzer, N. B., & Justi, R. (2010, 20 a 23 de abril). A nova dialética e os esquemas de argumento de Walton: um estudo sobre sua aplicabilidade no estudo de argumentação em sala de aula de ciências. Artigo apresentado no XV Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino, Belo Horizonte.
Duschl, R.A. (2008). Quality Argumentation and Epistemic Criteria. In: S. Erduran & M. P. Jiménez- Aleixandre (Eds.), Argumentation in Science Education: Perpectives from Classroom-Based Research (pp. 159-170). Dordretch: Springer.
Duschl, R.A., Ellenbogen, K., & Erduran, S. (1999, 11 a 15 de Abril). Understanding dialogic argumentation among middle school sience students. Artigo apresentado no The Annual Conference of American Educational Research Association, Montreal.
Ibraim, S. S., Mendonça, P.C.C., & Justi, R. (2013). Contribuições dos esquemas argumentativos de Walton para análise de argumentos no contexto de ensino de ciências. Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências, 13(1), 187-216.
Jiménez-Aleixandre, M. P., & Pereiro Muñoz, C. (2002). Knowledge producers or knowledge consumers? Argumentation and decision making about environmental mangement. International Journal of Science Education, 24(11), 1171-1190.
Toulmin, S. (2006). Os usos do argumento (2. ed.). São Paulo: Martins Fontes.
Walton, D. N. (1996). Argumentation Schemes for Presumptive Reasoning. Mahwah: Erlbaum.
Walton, D. N. (1999). The new dialetic: a method of evaluating an argument used for some purpose in a given case. Protosociology, 13, 70-91.
Walton, D. N. (2006). Lógica Informal: manual de informação crítica. São Paulo: Martins Fontes.
Walton, D. N., Reed, C., & Macagno, F. (2008). Argumentation Schemes. Cambridge: Cambridge University Press.
Notas
1 São esquemas argumentativos nos quais a conclusão é inferida tanto pelas premissas explícitas quanto pelas implícitas. Por exemplo, dizer que Bob não tem telefone fixo porque seu nome não está na lista telefônica, pressupõe que é sabido que o nome de todas as pessoas que possuem telefone fixo constam da lista telefônica (premissa implícita).
2 Avaliação da educação em ciências através de portfólios. O objetivo geral do projeto é o desenvolvimento de raciocínio científico.
Stefannie de Sá Ibraim – Licenciada em Química pela Universidade Federal de Ouro Preto, Mestranda do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Minas Gerais E-mail: stefannieibraim@uol.com.br
Paula Cristina Cardoso Mendonça – Licenciada em Química, Mestre e Doutora em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais, Professora do Departamento de Química da Universidade Federal de Ouro Preto. E-mail: paulamendonca@iceb.ufop.br
[MLPDB]
“Nominalism”. The Oxford Handbook of Metaphysics – SZABÓ (ARF)
SZABÓ, Zoltán Gendler. “Nominalism”. The Oxford Handbook of Metaphysics. Editado por Michael Loux e Dean Zimmerman. Oxford: Oxford University Press, 2005, p. 11-45. Resenha de: CID, Rodrigo. Argumentos – Revista de Filosofia, Fortaleza, n.10, jul./dez. 2013.
Com relação ao “entidades”, o autor nos fala sobre pensarmos as entidades como objetos. O objeto seria o referente de um termo singular, diferentemente da função, que é referente de um termo geral. Uma entidade assim pensada teria de ter condições de identidade determinadas, pois os objetos em lógica têm eles próprios condições de identidade determinadas.
E, finalmente, com relação ao “abstrato”, Szabó nos fala de algumas concepções de abstracta, aceitando apenas a última no resto do texto. A primeira concepção é de que aquilo que é abstrato nos é dado por abstração daquilo que é concreto (embora o que tenhamos em mente seja apenas uma representação concreta daquilo que é abstrato). O problema dessa visão é que ela parece implicar dependência ontológica do abstrato com relação ao concreto. E isso é estranho para vários objetos abstratos, como proposições, tipos de enunciados, geometria, entre outros. A intuição que está envolvida aqui é que falta algo nas entidades abstratas que têm nas entidades concretas.
O problema então seria encontrar o que é que lhes falta, pois não é nada claro o que falta a eles – já que, por exemplo, os fótons não têm massa em descanso, os buracos negros não emitem luz e os pontos no espaço não têm extensão.
Uma outra ideia é que os objetos abstratos são (p. 17-18): “(i) imperceptíveis em princípio, (ii) incapazes de interação causal e (iii) não localizados no espaço-tempo”. O problema aqui é que pode-se logicamente defender que entramos em contato causal com objetos abstratos, como proposições, por exemplo. E é também defensável que percebemos os objetos abstratos nas coisas, tal como defende o realismo extremo dos universais, no qual há apenas feixes de universais. Szabó abandona os dois primeiros critérios e utiliza o termo abstrato levando apenas (iii) em consideração e tendo em vista que pode haver entidades concretas apenas temporalmente, mas não espacialmente, localizadas – como almas cartesianas.
O nominalista crê que esses objetos, os abstratos, tal como os monstros fantasiosos, não existem. Como, ainda assim, os abstratos são muito úteis nas ciências, o nominalista quer preservar o vocabulário dos abstratos, sem se comprometer ontologicamente com eles, reduzindo-os a concreta. Ele realiza tal coisa por meio da construção de uma paráfrase sistemática das frases sobre objetos abstratos a frases que não dizem respeito a abstracta. Um exemplo seria parafrasear “Há uma boa chance de chover mais tarde” para “Está parecendo que vai chover mais tarde”. Neste caso parafraseamos uma frase sobre chances em uma frase sobre a aparência das coisas. O problema da paráfrase é que não está claro por que haver uma paráfrase que não fala sobre abstracta indica que tanto a paráfrase quanto a frase parafraseada não têm compromisso com abstracta em vez de indicar que ambas têm. A paráfrase não vence a disputa ontológica, mas ao menos mostra que seu usuário consegue fazer sentido de sua própria posição.
Uma objeção séria ao nominalista é que ele não consegue parafrasear frases como “há entidades abstratas”, pois se houver uma paráfrase para tal frase, o nominalista não conseguirá formular a sua própria posição e nem a posição rival. É possível falar de uma outra interpretação, bem complexa, para essa sentença e para algumas outras de dentro das matemáticas. Mas é difícil teoricamente ter de aceitar que a interpretação de sentenças seja algo não transparente ou velado ao falante.
Algumas razões pelo nominalismo, diria o autor, são (a) a aceitação do fisicalismo, (b) a economia ontológica e (c) o argumento do isolamento causal.
E algumas razões contra seriam (d) o argumento da indispensabilidade e (e) o argumento fregeano.
A primeira razão pelo nominalismo vem da ideia de que se tudo é físico, então não pode haver coisas que não estejam no espaço-tempo. Essa ideia é problemática justamente pelas localizações do espaço não serem elas mesmas coisas com localizações, de modo que não precisamos aceitar que o fisicalismo implica a inexistência de coisas sem localização espaço-temporal. Tudo vai depender da abrangência de “físico”, que é um assunto profundamente problemático. Poderíamos dizer que só é físico o que é implicado por nossas melhores teorias. Porém, nesse caso, números e conjuntos seriam entidades físicas. Poderíamos tentar dizer que físico é o que está sujeito a leis. No entanto, há leis que tratam de abstracta, como a lei dos gases ideais. Podemos também tentar dizer que físico é o que entra em interação causal. Mas é debatível o que do objeto ou do evento entra na interação causal.
Outra razão seria a economia ontológica: poder-se-ia dizer que abstracta são supérfluos para os propósitos explicativos. O problema disso é que várias teorias científicas parecem quantificar sobre abstracta e, mesmo que forneçamos paráfrases, ainda teremos de decidir se a explicação da teoria reconstruída é preferível à não reconstruída (p. 29). Além disso, simplicidade, na qual se funda a economia ontológica, é variável: simplicidade em algumas partes traz complexidade a outras.
A terceira razão pelo nominalismo seria o argumento do isolamento causal. Ele nos diz que, como abstracta não têm posição espaço-temporal, não podem ter efeito causal em nós. Sem efeito causal, não há como ter nem conhecimento (parte epistêmica) e nem referência (parte semântica) dos mesmos.
A resposta a isso é muito parecida com uma que já vimos, que é dizer que não precisamos assumir que abstracta não têm efeito causal, pois pode-se assumir que as abstracta dependente de concreta têm efeito causal. O ponto então seria explicar como obtemos conhecimento e fazemos referência a objetos abstratos independentes dos concretos. Ou defender que não é necessário que haja interação causal para que obtenhamos conhecimento ou para que façamos referência a abstracta. Que não precisamos de interação para fazer referência a objetos, isso a referência por meio de descrição já nos mostra. Mas não é tão claro como poderíamos obter conhecimento de coisas necessárias as quais não entramos em contato causal.
Uma dificuldade para o nominalismo é o argumento da indispensabilidade (p. 34). Ele nos diz o seguinte: (1) a matemática é indispensável à física; (2) a matemática tem compromisso ontológico com abstracta; (3) logo, a física tem compromisso ontológico com abstracta; (4) não temos razões para rejeitar a física; (5) logo, não temos razões para rejeitar a existência de abstracta. As duas soluções nominalistas para este argumento são negar (1) ou (2). Se negarmos (1), teremos o programa em física de mostrar como pode haver uma física sem matemática, coisa que Hartry Field tentou mostrar, ao reformular sem quantificação sobre números a teoria gravitacional de Newton. Sua teoria nos diz que as sentenças matemáticas existenciais são falsas e que na verdade elas são apenas úteis para expressar as paráfrases nominalistas verdadeiras. Negar (2), por sua vez, exige do filósofo um programa semântico de paráfrase sistemática de toda a linguagem matemática que quantifique sobre abstracta.
Outra dificuldade para o nominalista é o argumento fregeano (p. 37). Ele é o seguinte: (A) “2+2=4” é verdadeiro; (B) “2” em “2+2=4” é um termo singular; (C) se uma expressão funciona como um termo singular numa sentença verdadeira, então deve haver um objeto denotado por tal expressão; (D) logo, deve haver um objeto denotado por “2”; (E) logo, há um objeto denotado por “2”. É possível que o nominalista argumente que “2” não é um termo singular genuíno. Entretanto, dados critérios sintáticos e inferenciais e dada a primazia da sintaxe sobre à ontologia, “2” é de fato um termo singular. É possível também que se objete a (C), tal como fez Field ao nos dizer que os juízos das matemáticas são falsos, embora sejam úteis para expressar as paráfrases nominalistas verdadeiras.
Uma posição possível intermediária ao nominalista é aceitar o ficcionalismo e dizer que as sentenças matemáticas são verdadeiras nas matemáticas, embora nada seja dito com relação a fora das matemáticas. Quando perguntamos se há abstracta, nos diria o ficcionalista Carnap, podemos estar querendo fazer uma pergunta interna ou externa ao sistema linguístico em causa.
Se for interna, sua resposta é trivial. Se for externa, seria uma questão sobre se devemos adotar uma teoria comprometida com abstracta. Carnap não pensava que havia razões para preferir um sistema linguístico em vez de outro. Quine discordaria disso, já que pensa podermos fornecer razões para a escolha entre tais sistemas.
Finalmente, Szabó termina seu texto indicando algumas outras posições intermediárias, entre nominalismo e anti-nominalismo.
Rodrigo Cid – Doutorando em Filosofia pelo PPGLM-UFRJ. E-mail: rodrigorlcid@hotmail.com
Introdução a Schopenhauer – BOSSERT (V-RIF)
BOSSERT, Adolphe. Introdução a Schopenhauer. Tradução de Regina Schöpke e Mauro Baladi. Rio de Janeiro: Contraponto, 2011. Resenha de: DALCOL, Mônica Saldanha. Voluntas – Revista Internacional de Filosofia, Santa Maria, v.3, n.1/2, p.359-361, 2012.
Adolphe Bossert é um reconhecido especialista em literatura alemã e publicou diversos livros sobre alguns dos maiores nomes que a constituem, como sobre Goethe e Schiller. Com uma linguagem sutil e uma atenção especial a detalhes da vida do homem de gênio que foi Schopenhauer, Bossert elabora sua Introdução a Schopenhauer (traduzida recentemente no Brasil por Regina Schöpke e Mauro Baladi) em vista de uma apresentação geral dos conceitos norteadores dessa filosofia. Contudo, o livro não recai num reducionismo psicológico, isto é, não pretende “justificar” as formulações filosóficas com base em dados da vida particular do grande filósofo alemão. Conforme observa a tradutora da obra, Regina Schöpke, Bossert parte do pressuposto de que não se pode tratar vida e obra de um pensador de forma separada e, ao longo do livro, demonstra-nos como esta inseparabilidade é importante para o caso de Schopenhauer. Assim, por meio dessa obra temos contato com o homem severo que foi Schopenhauer e com os principais aspectos de sua filosofia, de forma clara e objetiva. Bossert apresenta alguns dos principais conceitos presentes na obra magma de Schopenhauer, O mundo como vontade e como representação, tais como: a primazia da Vontade, o papel desempenhado pela racionalidade, a problemática do caráter, a herança platônica das Ideias; o belo, a afirmação e a negação da Vontade.
O livro possui o total de trinta e dois capítulos e os assuntos de cada um deles obedecem a uma linha cronológica. Neles encontramos transcrições de cartas entre Schopenhauer e algumas pessoas de sua convivência, como as correspondências tumultuosas com a mãe, e, por outro lado, a imensa estima e cumplicidade de sua irmã Adele. As cartas trocadas entre Schopenhauer e sua irmã são vistas por Bossert, por exemplo, como “um verdadeiro capítulo da filosofia pessimista” (p. 279). No que diz respeito aos aspectos do seu pensamento, Schopenhauer é, segundo Bossert, o filósofo que recusa o lugar comum da razão como essência do homem. O ser é caracterizado por um impulso incessante e irracional – a Vontade. Como afirma o autor, “a Vontade é o grande demiurgo; ela é o artesão do universo em sua totalidade e a faculdade primária em cada indivíduo; ela é a criadora do corpo que ela anima” (p. 24). Dessa forma, ao traçar um panorama geral dos principais conceitos schopenhauerianos, Bossert dedica-se a apresentar alguns elementos presentes na metafísica da Vontade, tendo como ponto de partida a proposição de que os fenômenos são as manifestações de uma única Vontade em suas diversas formas.
O autor aborda a Vontade em sua afirmação e em sua negação. De forma resumida, quando a afirmação da vontade de um determinado indivíduo avança sobre a vontade de outro, temos a representação do egoísmo. Pode-se afirmar que esse egoísmo se deve ao fato de que o ser humano está inserido no cenário do princípio de individuação e não reconhece a essência da Vontade nos outros seres. No caminho oposto a esse egoísmo está a doutrina moral desenvolvida por Schopenhauer, reconhecendo que o ser humano também se identifica com os outros seres, sejam eles humanos ou animais. Como afirma Bossert, “uma libertação momentânea, um antegozo da libertação completa por meio da supressão do querer viver, será a derradeira palavra da moral de Schopenhauer” (p. 204). Na contemplação artística também encontramos o estado de negação momentânea da Vontade, o apaziguamento do sofrimento, que é caracterizado por Schopenhauer como o estado de pura contemplação. E, por fim, temos o grau mais elevado de negação da Vontade mediante sua total negação (abnegação), a ascese que possibilita a saída do ciclo incessante da Vontade.
No que concerne aos primeiros passos da recepção da filosofia de Schopenhauer, Bossert nos mostra como o pensamento singular de Schopenhauer não foi acolhido pelo grande público universitário e que todas as tentativas empreendidas pelo filósofo para inserir-se no fervor da época fracassaram. No segundo semestre de 1820, Schopenhauer começa a lecionar na Universidade de Berlim. O curso chamava-se “Filosofia universal” (gesammte Philosophie) e abarcava temas de lógica, cosmologia, teoria das artes e dos costumes (p. 121). Schopenhauer ministrava suas aulas no mesmo horário das lições de seu arqui-inimigo Hegel. O grande público lotava os cursos ministrados por Hegel, e o filósofo da Vontade contava com pouquíssimos alunos, o que o levará a suspender os cursos para o próximo semestre, já que o número de inscritos chegava a ser insuficiente. Bossert percebe o enfrentamento do pensador com os três maiores filósofos da época, Hegel, Fitche e Schelling, como fator que também contribuiu em grande parte para o desprestigio dele em relação a seus contemporâneos. Não obstante o fato de Schopenhauer não ser acolhido pela academia, existiram interessados em sua obra, pessoas que posteriormente se tornariam seus primeiros discípulos. Esses não eram propriamente estudantes de filosofia, mas magistrados, poetas, comerciantes e advogados. Bossert ressalta alguns nomes, como Frie [DR] ich Dorguth, Johann August Becker, Adam von Doss e Julius Frauenstädt.
Schopenhauer obteve um reconhecimento de sua filosofia, embora tardio ou quase póstumo, como afirma o autor. Em termos institucionais, somente em 1857 sua doutrina passou a ser estudada em algumas universidades, como em Iena, em Bonn e em Breslau. Passaram-se quase trinta anos da primeira tentativa de conquistar o público universitário, porém, tal tempo parece pequeno diante de tamanha confiança. Como afirma o próprio filósofo, “o metal do qual meu livro e eu somos feitos é muito raro neste planeta, e terminarão por reconhecer seu valor: vejo isso muito claramente, e é preciso muito tempo ainda até eu crer que esteja me iludindo. Que me ignorem por mais dez anos, nem com isso minha confiança será abalada” (p. 123).
Apesar de Schopenhauer ser conhecido como um filósofo pessimista por excelência, nesse livro somos surpreendidos quando Bossert nos chama atenção para as “sinuosidades” do pensamento do pensador, já que – segundo o autor – encontramos, através de seus fundamentos, “elementos de um otimismo mais nobre, mais generoso, mais verdadeiramente filosófico” (p. 358). Destaquemos a seguinte passagem:
Qual é, para ele, a verdadeira forma de vida moral? É a renuncia ao querer viver individual, a abdicação do egoísmo, a imolação do eu, a morte voluntária no sentido espiritual da palavra. Se essa regra de conduta se tornar lei universal, segundo a expressão de Kant, o que resultará disso? Uma sociedade na qual não haverá mais eu e não eu, em que cada um irá considerar sua sorte como intimamente ligada à de seus semelhantes; uma sociedade onde todos os membros viverão, por assim dizer, apenas uma vida coletiva. Quem poderia desejar um mundo melhor? (p. 358).
Dessa forma, a obra de Bossert, ao mesmo tempo em que nos oferece um cenário geral dos principais conceitos da filosofia de Schopenhauer, bem como alguns dos principais momentos que dizem respeito à vida particular do pensador, não deixa de acenar para problemáticas específicas, o que pode ser tomado como um convite para pesquisas que nelas se detenham. Por um lado, a obra pode exercer um fascínio para aqueles os iniciantes na leitura do pensador alemão, visto que Bossert apresenta de modo sucinto e claro os principais conceitos schopenhauerianos. Por outro lado, o livro pode interessar também àqueles que já estão familiarizados com a filosofia de Schopenhauer e, mesmo se conhecedores de importantes biografias ou se são especialistas, podem desfrutar de uma leitura e de uma versão peculiar sobre o pensamento do filósofo.
Mônica Saldanha Dalcol – Mestranda em Filosofia pela UFSM. E-mail: monica.dalcol@yahoo.com.br
[DR]
Handbook of South American Archaeology – SILVERMAN; ISBELL (C-RAC)
Michele Hanks (direita) e SILVERMAN Helaine Silverman (esquerda) em 2014. www.youtube.com.
SILVERMAN, Helaine Silverman; ISBELL, William H. (Ed.) Handbook of South American Archaeology. New York: Springer, New York, 2008, pp. 1191. Resenha de: MEGGERS, Betty J. Chungara – Revista de Antropología Chilena, Arica, v.43 n.1, p.147-157, jun. 2011.
The Handbook of South American Archaeology is a landmark not only because of its continental coverage, but because it is the first multi-authored volume in English since the 7-volume Handbook edited by Julian Steward and published by the Smithsonian Institution more than half a century ago. Two other multi-authored overviews have been published in the interim, but both are in Spanish and consequently have received minimal attention from US archeologists. All the authors in Prehistoria Sudamericana: Nuevas Perspectivas (Meggers 1992) are natives of the countries they discuss and continental coverage is even, all countries represented by one or two Chapters except for Brazil, which is represented by six. All except five of the 26 Chapters in Formativo Sudamericano: una Revaluación (Ledergerber-Crespo 1999) are SouthAmericans and national coverage is also relatively even, ranging from three to five Chapters for most countries.
In this Handbook, more than half of the authors are foreign and the geographical coverage is uneven. Although some parts of the continent provide a general overview of regional cultural development, specifically northern Chile (Chapter 48), South American pampas and campos (Chapter 14), the Guianas (Chapter 16), and Venezuela (Chapter 23), most Chapters focus on part of the local sequence, among them early occupations in the Southern Cone (Chapter 4), on the north coast of Chile (Chapter 3), and in the Peruvian highlands (Chapter 9); preceramic coastal adaptations in Peru (Chapter 10) and southern Brazil (Chapter18); the Formative period on the coast of Ecuador (Chapters 5, 24) and in the Titicaca Basin (Chapter 28); chiefdoms in Brazil (Chapter 19), Colombia (Chapters 21, 22), and highland Ecuador (Chapter 27); regional polities in Ecuador (Chapters 25, 26) and south coastal Peru (Chapter 29), and states and empires in the central Andes (Chapters 31, 36, 39, 40). Cultural development in the Amazon basin is discussed in Chapters 11, 12, 20, 33, 46, 47. Earthworks are described in lowland Bolivia (Chapter 11), on the coast of the Guianas (Chapters 13, 16, 17), and in eastern lowland Ecuador (Chapter 15). Three Chapters provide overviews of plant domestication (Chapter 7), animal domestication (Chapter 8), and the peopling of the continent (Chapter 2). Other specialized topics include the khipu (Chapter 41), ancestor images (Chapter 51), and trophy heads and human sacrifice in the Andes (Chapter 52).
Although the emphasis varies, the temporal and spatial distributions of settlements, artifacts, subsistence, burials, ritual features, and other cultural remains are described and interpreted in most of the chapters, often in the context of the impact of environmental fluctuations. Treatment is typically even-handed and objective, changes in interpretation as a result of new evidence are often described, and when experts disagree, the relative merits of their views are assessed. Interpretations of the social significance of architectural features, settlement pattern, site density, luxury goods, and other archeological remains are limited to general categories (elite, commoners, specialists). No effort is made to identify linguistic affiliations except in Amazonia. The existence of Chapters describing comparable levels of social complexity in different regions, such as the emergence of chiefdoms in the highlands of Colombia, Ecuador, and Peru, makes it possible to evaluate the impact of environmental differences on cultural adaptation.
The astute reader will notice a significant contrast between the content and interpretations in the Chapters on the Formative Period of coastal Ecuador and on Amazonia and those on the rest of the continent. In part, this reflects the fact that archeological evidence is limited primarily to pottery, both regions being characterized by warm humid climates in which stone is rare and perishable materials, including most artifacts, architectural features, human skeletal remains, and subsistence remains rarely survive. However, the discussions of these two regions also suffer from another deficiency; namely, the abandonment of traditional theoretical approaches for interpreting the archaeological record.Also, in contrast to the other chapters, these authors do not discuss the substantial evidence that disagrees with their views although it is unfamiliar to most archaeologists. Consequently, I appreciate the opportunity to explain the implications of their approach both for reconstructing prehistoric cultural development in the tropical lowlands and for the future of archaeology as a scientific discipline.
Criteria for Evaluating Cultural Similarities
Like biologists, who use genetic criteria to distinguish common ancestry from evolutionary convergence and independent development to explain morphological similarities in plants and animals in widely separated regions (such as columnar cacti in the southwestern US and northwestern Argentina), and geologists who use chemical composition to differentiate similar appearing rocks and minerals, archaeologists have traditionally used details of decoration on pottery to distinguish diffusion from independent invention. Pottery is ideal for this purpose because it can be decorated using an essentially unlimited number of techniques and motifs without affecting the utility of the vessel, making independent duplication of identical decoration unlikely. Several Chapters in this Handbook use differences in pottery to identify the origins of contemporary populations, but this criterion is ignored by James Zeidler (Chapter 24) in interpreting the origins of the Valdivia and Machalilla ceramic traditions on the coast of Ecuador and by Eduardo Neves (Chapter 20) in reconstructing the origin of pottery in Amazonia. Another widely accepted theoretical position involves identifying intrinsic environmental limitations and intermittent climatic fluctuations and estimating their impact on cultural complexity. Contrary to Sandweiss and Richardson (Chapter 6), who state that “understanding climatic change and natural disasters is critical to reconstructing cultural trajectories in the Andes” (p. 101), the authors of the Chapters on Amazonia (especially Chapters 11, 12, 33, 46, and 47) argue that “disturbance caused by human activities is a key factor in shaping biodiversity and environmental health” (p. 158). The consequences of ignoring these traditional approaches become evident when the evidence is examined.
The Origin of New World Pottery
The archeology of coastal Ecuador was essentially unknown prior to the 1950’s when Emilio Estrada began his fieldwork. He identified three Formative ceramic traditions, which he named Valdivia, Machalilla, and Chorrera. His definitions of Valdivia and Machalilla were expanded by subsequent fieldwork by Meggers and Evans and detailed descriptions were published in 1965 in Volume I of the Smithsonian Contributions to Anthropology. Although he had no archaeological training, Estrada recognized that the diagnostic decoration of the three traditions was distinct, implying different antecedents, and searched the literature for similar complexes in the Andes and Mesoamerica without finding any significant resemblances. Being brainwashed by graduate training, we did not think of looking outside the Americas, but Estrada had no such inhibitions and wrote us one day that Valdivia decoration looked to him a lot like Jomon. We were able to get funding to go to Japan in 1963 and traveled from Tokyo to southern Kyushu armed with photographs of Valdivia sherds to compare with pottery from Early and Middle Jomon sites. The closest resemblances we found were concentrated in collections from Ataka, Sobata, and Izumi on the west coast of Kyushu dating from the Early Middle Jomon Period.
Valdivia pottery appears about 6,000 BP on the coast of Ecuador with no local antecedents and the decoration is diverse in technique and motif from the beginning. The Meggers, Evans & Estrada 1965 Smithsonian monograph contains 26 plates that illustrate the same range of variation in technique and motif in broad-line incised, zoned incised, zoned punctuate, pseudo corrugated, multiple drag-and-jab, shell combed bands, overall shell scraped, finger grooved, excised, rocker stamped, drag-and-jab punctuate, and cord impressed decoration from Valdivia and Jomon sites. A photograph of a distinctive early technique consisting of a row of finger-tip impressions on the interior of the shoulder producing a low boss on the exterior, which we did not encounter during our visit to Kyushu, was sent to us recently by a Japanese colleague. In spite of the diversity and identity of the duplications between Valdivia and Jomon decoration, Zeidler asserts that “technological convergence or parallelism would seem to be a more parsimonious explanation for the beginnings ofValdivia pottery than transpacific diffusion from the Jomon culture” and that “early trade… may have spread the idea of pottery making from antecedent ceramic complexes in the Amazon basin” (p .462). In accord with his acceptance of an Amazonian origin for Valdivia pottery, Zeidler considers that “Lathrap has persuasively argued that Valdivia represents a tropical forest culture pattern… whose ultimate origins are linked to early population dispersals from the Amazon basin” (p. 462). He does not specify what these similarities are and the absence of evidence for sedentary communities earlier than Valdivia anywhere in the eastern lowlands, as well as the absence of any similarity between the environments of the two regions, make this theory unpersuasive.
These alternatives not only dismiss the significance of the duplication of multiple arbitrary features of abstract decoration for inferring cultural relationship, but fail to recognize the magnitude and diversity of other evidence supporting the Jomon origin of Valdivia pottery. Pottery was invented in Japan at least 14,000 years ago and by 6,000 BP had diversified into regional styles that differ more from one another than Kyushu Jomon does from Valdivia. A few years ago, another ceramic complex contemporary with Valdivia was discovered at San Jacinto on the north coast of Colombia that has decoration resembling the Jomon Flame Style on the west coast of Honshu, famous for its elaborate castellated rims decorated with zigzag appliqué, cord impression, and modeling. Like Zeidler, Augusto Oyuela-Caycedo (Chapter 22) denies a transpacific introduction in spite of the absence of local antecedents, the unique character of the decoration, and the contemporaneity of the Jomon and Colombian ceramic complexes (see Meggers 2005).
Since watercraft was available in Japan from at least the Paleolithic and its use for deep-sea fishing is documented by faunal remains in shell middens, why is there no earlier evidence of transpacific voyages? Given the antipathy of archaeologists to the possibility, it is likely that clues have been ignored, but the timing of the Valdivia-San Jacinto introductions can be explained by the catastrophic eruption of Kikai volcano off southern Japan about 6,300 BP, which deposited 40 cm of ash on Kyushu and lesser amounts as far north as central Honshu, causing landslides and slope erosion, decimating the population, and covering the land and the ocean with pumice. The impact of the eruption on the Jomon population is reflected in the density of one habitation site per 100 km² on Kyushu versus one site per 10 km² on the northern island of Hokkaido and one site per km² on Honshu during the Middle Jomon Period.Any fishing boats at sea would have been trapped in the pumice and swept north by the Black Current across the Pacific and down the west coast of the Americas as far as Ecuador. There, survivors would have encountered people living much as they did in Japan, but lacking pottery.
The ceramic evidence for prehistoric transpacific immigrants from Japan is also supported by epidemiological and genetic similarities between Japanese and prehistoric Andean populations that could not have evolved independently or been introduced across the Bering Strait. Among them is the human T-cell leukemia virus HTLV-1, which is transmitted between adult males and females by sexual contact and between nursing mothers and infants. The highest occurrence of carriers today is in Japan, where it reaches 6% in Kyushu; in the Americas, it is restricted to the Andean area. Jomon influence may also be reflected in the sudden adoption of permanent settlement during the Valdivia period on the coast of Ecuador and other intangible innovations, but the assumption of the independent invention of pottery discourages investigation (Raymond, Chapter 5).
In contrast to Zeidler’s denial of any relationship between the identical decoration of Jomon and Valdivia pottery, he accepts the “convincing arguments that the Machalilla ceramic style evolved directly out of the Late and Terminal Valdivia ceramic style” (p. 466), in spite of the absence of any shared characteristics. Machalilla pottery is decorated by double-line incision, embellished or nicked shoulder, black-on-white painting, fine zoned hachure, incised or punctated and red zoned, and narrow or wide red bands, none of which occur in Valdivia. Vessel shapes are also different, including bowls with angular shoulders and jars with stirrup spouts. He does not specify what “convincing arguments” favor local development and the overlap between the initial Machalilla and terminal Valdivia dates leave no space for such a drastic transformation. Nor does he mention the similarities noticed by other archaeologists between Machalilla and several highland Ecuadorian complexes.
A similar discrepancy exists in the acceptance by Zeidler and other authors of the Handbook (Neves, Oliver, Rostain, Isbell) of the pottery from the Taperinha shell midden on the middle Amazon as the earliest in the Americas, in spite of the lack of association between the pottery and the radiocarbon dates (Roosevelt et al. 1991) and the absence of any similarity between Valdivia decoration and that on the three sherds from Taperinha. The lower half of the deposit consists of amorphous shell and is separated from the upper half by a clearly defined sterile layer that implies long-term abandonment of the site. The upper half consists of irregular overlapping strata. All of the dates are from the lower half and most of the pottery is from the upper half. The few sherds encountered below the sterile layer can be attributed to intrusion via pits dug by iguanas or armadillos that frequent the mound. The eleven AMS dates obtained from below the sterile layer extend from 7,090 ± 80 to 6,300 ± 90 BP, making them a millennium earlier than the initial Valdivia and San Jacinto dates and compatible with their preceramic context.
Assuming that Taperinha pottery is earlier than Valdivia and San Jacinto, Roosevelt argues that it could not be derived from them, but she does not consider the possibility that it might be affiliated with a later complex. In fact, the decoration on the only three sherds she has illustrated, consisting of “feathered” incision, zoned parallel lines, and double-line incision, is diagnostic of the Barlovento Phase on the north coast of Colombia, which extended from about 3,600 to 2,800 BP. The most reasonable interpretation of the archaeological evidence is the migration of a few families from a Barlovento site to the central Amazon and their settlement on the abandoned shell midden of Taperinha. The absence of any other sites with similar pottery along the Amazon testifies to their failure to introduce pottery making to the indigenous population.
Whereas accepting an association between the pottery and the radiocarbon dates from Taperinha is a dead end, identification of its Colombian origin raises the question of what motivated the immigrants to leave their homeland. The ceramic sequence on the Caribbean coast of Colombia is the best documented in South America as a result of detailed investigations and publications by Gerardo Reichel-Dolmatoff (1985) and Carlos Angulo Valdez (1981) and the chronology of change in decoration is well defined. The history of climatic fluctuations is also well documented and indicates that parts of the region suffered episodes of drought during this period that affected traditional subsistence resources and stimulated dispersal to adjacent regions (Sanoja and Vargas 2007). The appearance of Barlovento-related pottery on the middle Amazon adds important evidence to the reconstruction of this event.
Amazonia: Anthropogenic Landscape or Counterfeit Paradise?
Although the unique environment of theAmazonian Basin and its limitations for the development of permanent settlements and intensive agriculture have been documented by geologists, paleoecologists, climatologists, botanists, and other natural scientists for decades, Erickson insists that “Rather than adapt to or be limited by the Amazonian environment, humans created, transformed, and managed cultural or anthropogenic (human-made) landscapes that suited their purposes ” (Chapter 11, p. 158) and that “archaeologists have demonstrated that much of Amazonia was occupied by dense populations of urbanized societies practicing intensive agriculture that significantly contributed to creating the environment that is appreciated today” (p. 161). He contrasts this approach, which he calls “historical ecology,” with cultural ecology, which he claims “treats the environment as a static, fixed, often limited resource to which humans adapt” (p. 165) and identifies me as “the main spokesperson” of the latter approach (p. 162).
The goal of historical ecology is to “carefully document and analyze the evidence within its temporal and spatial context for insights into original logic, design, engineering, and intentionality of human actions” (p. 159). The principal authorities he cites, in addition to anonymous “scholars” and “archaeologists,” are William Denevan, a geographer; William Balée, an ethnobotanist; Peter Stahl, a faunal specialist, and Donald Lathrap, an archaeologist who did his doctoral research 50 years ago on the Ucayali. Erickson’s own Amazonian experience is limited to the Llanos de Mojos in eastern Bolivia. The only Amazonian archaeologists mentioned are Eduardo Neves, Michael Heckenberger, and Anna Roosevelt.
Defining “Amazonia”. Amazonia is defined by geographers and ecologists as the portion of tropical lowland South America below 1,500 meters elevation, where the average difference in annual temperature does not exceed 5ºF, rain falls on 130 or more days of the year, and relative humidity normally exceeds 80%. Typical vegetation consists of rainforest, with small enclaves of savanna where soil conditions inhibit plant growth.
Erickson expands the definition to encompass “the entire region drained by the Amazon River and its tributaries” (p. 158). This allows him to cite any kind of archaeological evidence up to the highland headwaters of all the tributaries to support his contention thatAmazonia is a “domesticated landscape,” regardless of the characteristics of the soil, climate, elevation, topography or vegetation. The principal evidence he provides for the creation, transformation and management of domesticated, engineered, humanized landscapes is the existence of anthropogenic forests, large permanent settlements, earthworks, and Amazonian dark earth (ADE).
Anthropogenic Forests. According to Erickson, “Countering the view of Amazonian forests as pristine and natural, historical ecologists show that these forests are, to a large degree, the cultural products of human activity” (p. 175). He contends that “Rather than adapt or respond to the environment, Amazonian people created, transformed, and managed those very environments in which they lived and thrived through their culture” (p. 165); “The long-term strategy of forest management was to cull non-economic species and replace them with economic species” (p. 175); “Much of what was originally misinterpreted as natural change due to climate fluctuations is now considered anthropogenic” (p. 175) “Many game animals ofAmazonia would have a difficult time surviving without a cultural and historical landscape of human gardens, fields, orchards, and agroforestry” (p. 176). “Through the domestication of landscape, native people shaped the landscape as they wanted it and made it work for them” (p. 177).
Whereas Erickson provides neither examples nor references to support these interpretations, botanists, ecologists, and climatologists have published hundreds of articles and dozens of books linking past and present changes in the composition of rainforest vegetation to climatic fluctuations and identifying environmental factors responsible for contemporary biodiversity. For example, an inventory of patches of secondary forest visible on Landsat images across the Brazilian Amazon indicates that they are similar in origin to recent blowdowns confirmed north of Manaus, rather than remnants of cultivated fields (Nelson et al. 1994). Analysis of pollen cores in the rainforest of French Guiana where no archaeological sites have been encountered indicates that “the tropical rain forest, thought to have remained stable since the last glacial event, has in fact undergone deep modifications” (Charles-Dominique et al. 1998:296). After reviewing the paleoecological record, Bush and Silman (2007:457) conclude that “we see no evidence suggesting that large areas at a distance from rivers or in the less seasonal parts of Amazonia were substantially altered by human activity”. According to Piperno and Becker (1996:202, 207), analysis of phytoliths and macroscopic charcoal from soils near Manaus indicates that “closed forest has existed in the area since at least 4,600 yr BP. Vegetational changes and fires appear to be the result of climatic drying that may have affected large areas of the Amazon Basin over the past 5,000 to 7,000 years. Thus, it appears that this one sector of Amazonian terra firme forest was never significantly altered by humans”. Identification of fossil pollen in two sediment cores in eastern lowland Ecuador also implies the persistence of moist tropical rain forest throughout the Holocene and provides no evidence for human impacts or land use (Weng et al. 2002). Finally, cores from lake districts in eastern Peru and eastern Brazil do not support the contention that all of Amazonia is a built landscape (Bush and Silman 2007).
Large Permanent Settlements. Erickson states that “Archaeologists [unidentified] have demonstrated that much ofAmazonia was occupied by dense populations of urbanized societies practicing intensive agriculture that significantly contributed to creating the environment that is appreciated today” (p. 161). Although he asserts that “Traditional communities had large, open, clean plazas and streets along which houses were arranged in linear, grid, radial, or ring patterns” (p. 166), he mentions only Santarem and the Sangay site in eastern Ecuador, neither of which has this configuration. Based on the description of a modern Bari communal house in eastern Colombia that was constructed using 750,000 fronds from 125,000 palms, he estimates that a pre-Columbian population of 6.8 million forAmazonia would have required 1,360,000 communal houses “in a single moment,” which would have had to be replaced every 10 years. Huge additional amounts of wood would have been needed for cooking fires, palisades, watercraft, and artifacts. Even though admitting that “A community’s permanent transformation of the environment for these basic needs and infrastructure is staggering,” he asserts that “these communities were stable, long-lived, and sustainable despite this impact” (p. 166-167). He [Erickson] gives no archaeological example and the modern caboclo house and associated clearing he illustrates (Figure 11.2) bear no resemblance to traditional indigenous dwellings.
None of the other proponents of the existence of large permanent settlements has supported their interpretation by archaeological evidence. No systematic excavation has ever been done in Santarem to identify dwellings or features that might reveal how much of the area was simultaneously occupied and the estimate of a population of 100,000 is based on the dimensions of the terra preta. The only well documented investigations are on Marajó, beginning with Evans and Meggers in 19481949, followed by Roosevelt and Schaan (Chapter 19). Although Roosevelt has estimated a population of one million for the island, Schaan has reduced this substantially based on her evidence that the maximum population of the Camutins, the largest group of habitation mounds, would have been only about 2,000 (p. 347). A decade of survey and excavation on the left bank of the lower Solimões has identified several periods of occupation, but the size and permanence of each settlement are not clear (Neves, Chapter 12).
Extensive survey along the principal tributaries of the Amazon during the past 30 years by Brazilian archaeologists, which the historical ecologists do not cite, produces a very different picture of prehistoric settlement behavior. Beginning before 2,000 BP, when pottery making became sufficiently widely distributed for detecting habitation sites, the subsistence and semi-permanent settlement behavior characteristic of surviving indigenous tropical forest communities had been adopted. (see below for discussion).
Earthworks. According to Erickson, “Many Amazonian cultures were impressive mound builders” (p.168), citing constructions on the Llanos de Mojos in Bolivia, the Llanos del Orinoco in Venezuela, Marajó, Sangay in eastern Ecuador, and the Guayas Basin, none of which is rainforest and the last of which is not in Amazonia. Although he asserts that raised fields constitute the “most impressive example of landscape engineering at a regional scale,” he mentions only those in lowland Bolivia (p. 171). He also contends that “all Amazonian societies use elaborate networks of paths and trails and roads between settlements, gardens, fields, rivers, resource locations, and neighbors” and that “Some advanced Amazonian societies built impressive formal roads, causeways, and canals of monumental scale” (p. 173), but the only examples he describes are on the Llanos de Mojos.
With the exception of Marajó and the Açutuba region in the central Amazon, all the earthworks are outside the limits of Amazonia as traditionally defined. Roads, causeways, and canals are limited to the Mojos. Raised fields are also in marginal locations, among them the coast of the Guianas. Paths in the forest quickly disappear if not used regularly. Evidence that the construction of mounds, causeways, ridged fields, and other kinds of earthworks does not require a large organized labor force is provided by Erickson’s own experience. When he revisited a village on the Llanos de Mojos after several years, he found a new causeway 12 feet wide, 3 feet high, and half a mile long that had been constructed by members of the small local community in a week.
Amazonian Dark Earth (ADE). The most sensational recent discovery is the existence of patches of fertile black soil in many parts of the lowlands.According to Erickson, “Scholars believe that these soils were created specifically for permanent farming” (p. 171) and “are capable of continuous, high yields and are associated with dense populations, large permanent settlements, and complex society” (p. 163). “ADE was probably used for settlement, house gardens, and permanent fields rather than slash-and-burn agriculture, the common practice today”; “ADE is an excellent example of landscape domestication below the ground” (p. 171). Since it is assumed that slash-and-burn agriculture “depends on metal axes and machetes to efficiently clear primary forest. [and] These tools were unavailable until after 1492, Pre-Columbian farmers, using digging sticks and stone axes probably continuously cultivated fields and practiced agroforestry rather than clear primary forest” (p. 163). The allegation that slash-and-burn agriculture would have been unproductive prior to the acquisition of metal axes is invalidated by its global distribution during millennia prior to the invention of metallurgy and survival in remote regions today.
Furthermore, the assumption that Amazon Dark Earth was created intentionally and would have solved the problem of intensive agricultural production for large sedentary populations is not supported either by observation of current practices or by archaeological evidence.
Agronomic, pedological, and ethnographic research on the productivity of food plants on ADE has been conducted by Laura German (2003) among caboclos along the Rio Negro and Rio Urubú in Central Amazonia. Comparison of the yields of bitter manioc, pineapple and star nut palm with those of 10 other New World crops and 10 Old World crops on ADE and on local soil revealed higher yields for the three Amazonian crops on the natural soil. She asserts that “linkages between intentional agricultural intensification and Black Earth formation, and between Black Earth and an increase in human carrying capacity, have been insufficiently established” and concludes that “Observations on the degradation caused by continuous cultivation clearly show that in the absence of ongoing cultural amendments, the carrying capacity of these [black earth] environments would not be significantly greater than that of adjacent sites” and that “the suggestion that these richer pockets of soil made possible the transition to a more sedentary life style is as yet untenable” (German 2003:327, 313).
With regard to slash-and-burn agriculture, Weischet and Caviedes, the authors of the leading synthesis, The Persisting Ecological Constraints of Tropical Agriculture (1993) specify that “a differentiation should be made… between natural conditions that are unalterable and those that can be compensated for by man” (1993:41) and conclude that “On the basis of ecological reasoning it can be proven that this particular mode of rotating food crop and forest or bush fallow [i.e shifting cultivation] is a specialized adaptation to the environmental conditions of the tropics which not even modern agrotechnology has been able to replace” (1993:275). They also state that the “unveiling of certain persistent myths about tropical fertility […], by now widely known and dismissed” and explaining “how these myths could be perpetuated and fundamental laws that govern the tropical environments ignored for so long ” are crucial for sustainable exploitation of Amazonia (1993:281). Unfortunately, the Chapters by Erickson and others in this Handbook indicate that these myths have gained rather than lost their credibility among anthropologists.
The Unique Environment of Amazonia
Amazonia differs from all other tropical forest environments in combining great geological antiquity with abundant rainfall and constantly warm temperature. The Brazilian and Guayana shields preserve some of the most ancient terrestrial landscapes on the planet, which millions of years of chemical and physical weathering and erosion have reduced to inert granite and white sand. Whereas in temperate regions more than half of the organic carbon, some 90 percent of the nitrogen, and the most important minerals are contained in the soil where they remain available to the vegetation, in Amazonia most of the nutrients and all of the calcium are stored in the biomass. According to Weischet and Caviedes, “This is an ecologically decisive difference with far-reaching consequences” (1993:62). “The part of the forest above ground works like a filter system in that the nutrients supplied by the rain are used several times before they arrive at the soil surface… Only with the decomposition of the different members of the subcycles does a certain portion of the nutritional elements finally reach the soil surface. Here, a substantial nutrient loss is essentially prevented by another agent known as the mycorrhizas” (1993:130). The interspersed distribution of plants of the same species with different nutrient requirements and the rapid disintegration and uptake of litter rescue nutrients that reach the soil so successfully that “as long as the forest is undisturbed, no net loss of macronutrients through outwash occurs as proven by the fact that (1) the autochthonous black-and clear-water streams of the tropical lowland forests may best be likened to slightly contaminated distilled water, and, (2) the waters of small creeks in virgin forest areas contain even less macronutrients than rain-water” (1993:276).
In addition to infertile soil, Amazonia is characterized by the absence of a dormant season, which makes the vegetation continuously susceptible to decimation from pathogens. Their dispersal is minimized by the heterogeneous distribution of wild plants of the same species in the forest, which is replicated by the interdigitation of crops in indigenous fields. Only palms have the ability to maintain large uniform stands.
Archaeological Evidence of Population Density
Whereas no systematic stratigraphic excavations have been undertaken in habitation sites in any of the regions identified by Erickson as “occupied by dense populations of urbanized societies practicing intensive agriculture” (p. 161), archaeological surveys along the principal tributaries of the Amazon and ethnographic evidence demonstrate that patches of ADE are the product of intermittent occupation of habitation sites during hundreds of years, and were never cultivated prehistorically.
Archaeological survey conducted along a 240 km sector of the Rio Jamarí, a tributary of the upper Madeira in southwestern Brazil, identified 121 sites representing 16 preceramic occupations, 16 lithic workshops, 89 ceramic sites, 8 campsites with pottery, and 2 Neobrazilian sites. All the ceramic sites are terra preta (ADE). Unselected surface collections of pottery were made at 42 sites, and one to nine stratigraphic excavations in 10 cm levels were made at 22 sites. Classification and seriation identified five ceramic phases representing the same pottery tradition and permitted construction of a relative chronology that is complemented by 137 radiocarbon dates. The initial ceramic phase, the only one distributed throughout the region, was introduced ca 2,400 BP. By about 1,500 BP, it had differentiated into two phases that occupied contiguous territories characterized by differences in aquatic resources. Each of these was replaced by a later phase of the same tradition about 700 BP (Meggers and Miller 2006).
Comparison of the locations of the ceramic sites with their phase affiliations shows that only 6 were occupied during three successive phases. Seventeen were occupied during two phases and 26 were occupied intermittently during a single phase. All the phases were divided into two moieties distinguished by minor differences in the presence or relative frequency of a rare pottery type and most sites were occupied and reoccupied by the same moiety. When reoccupied by a different moiety or a different phase, the new house was adjacent to rather than on top of the earlier refuse, increasing the surface dimensions of the site. Although there is no visible stratigraphic evidence of the abandonment and reoccupation implied by the discontinuities in the seriated sequences, they are supported by large differences in the radiocarbon dates from successive levels in the same excavation. At RO-PV-35, for example, dates from consecutive 10 cm levels in four excavations distributed across the site are in chronological order but differ by 1500, 900, and 120 years and dates from the same depth in different excavations also differ by hundreds of years. Similar discrepancies between the dates from consecutive 10 cm levels have been identified at 14 other sites, contrary to what would be expected if these sites had been continuously occupied.
The number of sites allocated to each phase and their distribution within the territory provide other clues to settlement behavior. For example, the 14 sites occupied during the Jamarí Phase, which lasted ca 800 years, are widely separated giving the impression that the territory was under populated. A different interpretation is suggested by comparison with the settlement behavior of a modern Yuqui community in eastern Bolivia. Their territory is divided into a nuclear area about 10 km in diameter, where the village is located and most of the hunting is performed, and a peripheral ring about 5 km wide, which is hunted infrequently and serves as a source of replacement for game removed from the nuclear area. This allocation provided sustainable subsistence for a population of ± 100 during 22 years, but is now being compromised by the intrusion of colonists from the adjacent region into the peripheral area. Projecting the diameter of the nuclear area around the locations of the sites of the Jamarí Phase reveals that the boundaries of all but four overlap, and that three more would also overlap if the surrounding ring were included, supporting the interpretation of intermittent occupation based on the seriated sequences.
Another independent estimate of sustainable population density has been provided by biologists concerned with the growing impact of commercial hunting on the survival of preferred species of mammals. Combining age of reproduction, number of progeny, longevity, impact of other predators, and natural death rate for each species permitted estimating the maximum number of individuals per km² that could be eliminated sustainably. Converting the result into biomass and dividing the total by the nutritional requirement of a human consumer produced estimates between 0.2 and 1.0 persons per km² for sustainable hunting. The similarity between these estimates and those ranging between 0.2 and 1.5 per km² provided by ethnographers for the population densities of 12 contemporary indigenous Amazonian communities that maintain their traditional behavior is unlikely to be coincidental.
Historical Ecology Versus Environmental “Determinism”
Cultural ecologists, erroneously labeled “environmental determinists,” assume that humans, like all other biological organisms, are subject to natural selection and evolutionary drift, but that unlike other animals these affect not only their biological features but also their cultural behavior. Among the impediments to applying evolutionary theory to the interpretation of archaeological remains, especially pottery, is the absence of a standard classification. In contrast to other categories of phenomena (rocks, stars, plants, animals, soils, etc.), where evidence is ignored unless it conforms to the recognized definitions, every archeologist is free to select whatever criteria he or she prefers and interpret them at will, making comparison possible only at a very general level of similarity. The opportunity to change this situation was provided in Brazil in 1964 by the creation of the Programa Nacional de Pesquisas Arqueológicas (PRONAPA) on the coast, followed in 1976 by the Programa Nacional de PesquisasArqueológicas na Bacia Amazônica (PRONAPABA). The participants in these programs adopted standard criteria for collecting, classifying, describing, and interpreting pottery that permitted identifying endogamous communities and the temporal and spatial distributions of their constituent sites.
When the PRONAPA began, we accepted the traditional view that although the samples from surface collections and stratigraphic levels were unselected, they were not random and thus irregularities in the trends in seriated sequences were attributable to sampling error rather than to differences in behavior. As the number of seriated sequences composed of levels from excavations in multiple habitation sites increased, comparison showed that the principal undecorated types, which normally accounted for 90% or more of each sample, usually displayed consistent trends of increasing or decreasing relative frequency, whereas one or more of the decorated types often exhibited minor fluctuations throughout the seriation. On the possibility that these might have cultural significance, the levels were separated into two seriations based on the difference in relative frequency. Comparison of the locations of the sites included in each sub-seriation showed that the majority were different and when they were the same, the portion of the site occupied was different. Since the differences in relative frequency were minor (typically ± 5%), they would not have been apparent to the potters, making the most obvious explanation the impact of evolutionary drift on the products of women isolated by matrilocal residence.
The impact of evolutionary drift on cultural behavior not subject to adaptive constraints has frequently been reported by ethnologists, including minor differences in the relative frequency of the decoration on pottery made for domestic use by women in different communities and by those in the same community isolated by matrilocal residence. For example, among the Shipibo, intensive interaction among women in the same and little between those in different houses ensures that girls learn from their mothers, creating a different micro-style in each community. Among the Bororo, the village is divided among two moieties that exhibit slight differences in decoration and vessel shape. Among traditional potters in Guatemala, where the household is also the unit of production and girls learn from the oldest relative, each local group has a distinctive style. An experiment conducted decades ago, in which a sequence of potters was told to copy the preceding vessel, demonstrated minor unconscious modifications.
Other interpretations based on archaeological evidence and confirmed ethnographically include matrilocal residence, endogamous communities, permanent territorial boundaries, reoccupation of sites by the original community or moiety, avoidance of earlier sites by later communities both for settlement and cultivation, and low population density.
The assumption that ADE is the product of permanent residence is invalidated by the archaeological evidence for abandonment and reoccupation of all but the smallest habitation sites wherever systematic survey has been conducted along the tributaries of the Amazon. The avoidance of previously occupied locations by subsequent occupants of the region detected by the seriations is explained by the ethnographic evidence that prehistoric sites are neither cultivated nor reoccupied by traditional indigenous communities today because they are recognized as cemeteries and the spirits of the deceased are respected.
The existence of detailed reconstructions of settlement behavior along the principal tributaries of the Amazon since about 2,000 BC makes it possible to evaluate the credibility of the prehistoric population density and social complexity inferred by the historical ecologists not only with the archeological record, but also with independent climatic and ethnographic evidence. In the case of the Jamarí sequence, for example, comparison of the durations of the five ceramic phases with the radiocarbon dates indicates that the replacements occurred ca 1,500, and 700 BP. Examination of other well dated sequences across the lowlands shows additional discontinuities on the Llanos de Mojos and the lower Orinoco ca. 1,000 BP. The coincidence between the timing of these replacements and the impact of mega-Niño events implies that the associated episodes of aridity depleted subsistence resources sufficiently to force people to abandon their villages and revert to hunting and gathering until conditions returned to normal. Whereas the relatively brief durations of the mega-Niño events limit their identification in Amazonian pollen cores, the reduced intensity of the 1,000 BP event in Amazonia is clearly documented archaeologically by the absence of discontinuities in the tropical forest sequences.
Although minor El Niño droughts leave no archaeological imprint, the climatic record indicates that they occur at intervals of about seven years between the catastrophic events. Observations of the impact of a brief El Niño episode in 1983 on the rainforest of Barro Colorado Island in Panama indicate that their consequences can be dramatic. Thirty-three out of 37 moisture-demanding species of plants declined significantly and the abundance of small shrubs fell by 35% during the following 13 years. “The failure of many plants to flower or fruit during an abnormal weather cycle [… ] in 1970-1971 and the resultant famine and death among frugivores testify to the subsistence stress longer episodes would have inflicted on humans”. The description of the impact of the 19721973 drought on a Yanomami community in southern Venezuela is equally dramatic. Fires set to prepare new gardens spread to adjacent clearings, destroying the producing crops. Adjacent vegetation remained nonflammable, however, and the population reverted to hunting and gathering until normal rainfall returned. “Working harder than normal, they remained constantly hungry but survived” (Meggers 2007a:135, 143).
Similar brief El Niño droughts would have impacted Amazonia between major events in the past and would have stimulated the adaptive behavior among indigenous communities documented by ethnologists. Children learn at an early age to identify all wild plants from a leaf, seed, or branch, as well as their uses and the animals that pollinate or feed on them. Adults continuously search for new edible plants. They avoid some edible tubers until those usually consumed fail and possess detailed knowledge of ecological relationships among flora and fauna. Short-term and permanent taboos against consumption of deer and tapir are widespread, although they are the largest terrestrial mammals. The likelihood that caymans were tabooed at least in the lower Tapajós region is suggested by their critical role in the aquatic food chain (Fitkau 1970). It seems likely that prehistoric communities reverted to hunting and gathering, like the Yanomami, during these episodes and enhanced their knowledge of the biota and their chances for survival. The discontinuities in the archaeological record indicate that this knowledge and the cultural measures that promote sustainable exploitation of the environment were insufficient to overcome the detrimental impact of mega-Niño droughts.
Erickson’s assertion that “archaeologists have demonstrated that much of Amazonia was occupied by dense populations of urbanized societies practicing intensive agriculture that significantly contributed to creating the environment that is appreciated today” (p. 161) is being discredited not only by the archaeological evidence, but also by the increased abundance and variety of paleoclimatic evidence. For example, numerous pollen cores have produced detailed records of intermittent droughts along the Brazilian coastal strip, which correlate with human abandonment of vast areas during the Mid-Holocene there, as well as in the Guianas and Eastern Colombia (Meggers 2007b). Geological, ecological, palynological, and climatological investigations in French Guiana pro-vide a detailed reconstruction of environmental change during the past 8000 years and a marine core from the Cariaco Basin off the coast of Venezuela documents four episodes of severe drought between AD 760 and 910. Analysis of lake sediments in the Carajás region of northeastern Brazil indicates that the major cause of perturbations in the tropical forest during the Holocene was climate change that modified the water balance. The RAINFOR network of 136 permanent plots in old growth forest throughout the Amazon created 25 years ago provides daily records of temperature and rainfall that may reveal local fluctuations that will be helpful in interpreting archaeological evidence (Phillips et al. 2009). Paleoclimatologists concerned with reconstructing paleoenvironmental climatic changes in eastern Brazil during the Holocene have recently suggested that “humans might be regarded as good paleoenvironmental markers for the Holocene. In this light, we propose that archaeological data should be better explored, and regarded as a valuable basis for paleoenvironmental inferences” (Araujo et al. 2005/2006:28).
Taking advantage of these kinds of opportunities for collaboration requires that archeologists adopt standard criteria for collecting, classifying, and interpreting their data. The territorial distributions of the ceramic traditions identified by the PRONAPA on the coastal strip more than forty years ago have been expanded by more recent investigators, but their failure to classify the pottery and apply quantitative analysis and seriation has prevented the kinds of social and settlement interpretations obtained from the survey of the Jamarí and other rivers in Amazonia.Although the ceramic traditions recognized in Amazonia decades ago are criticized by several authors in the Handbook, they have not supplied the archaeological evidence necessary to suggest alternatives. Hopefully, this will change.
The Founder Effect and Evolutionary Drift
Pottery is ideal for tracing cultural contact because it can be decorated in an essentially infinite number of techniques and motifs without affecting the function of the vessel. Some similarities, such as depiction of the same birds or animals, can be attributed to independent invention, and a few duplications in a long series of abstract elements can be dismissed as accidental. Multiple independent duplications of the same combinations of techniques and abstract motifs, such as those between Jomon and Valdivia, are unknown.
The evidence that the decoration on pottery is subject to unconscious evolutionary drift, that each endogamous community develops a distinctive ceramic configuration, that members of a community will possess a slightly different proportion of the diagnostic traits, and that dispersal of a segment of the ancestral population is consequently subject to the founder effect makes it possible to demonstrate that the initial ceramic complexes in lowland SouthAmerica are derived from Valdivia-San Jacinto antecedents. The earliest offshoot identified thus far is the Monagrillo Phase, decorated with incisions ending in a punctation, small excised zones, a band of short vertical incisions, parallel incised lines, and zoned punctuate, which appeared in adjacent Panama ca 4,500 BP (Meggers 1997). The second dispersal, represented by the Waira-jirca Phase in the north highlands of Peru beginning ca 3,800 BP, exhibits a different set of the ancestral traits, including undulating and double-line incisions, rings with a central punctate, bands containing closely spaced vertical lines, and equilateral crosses. The Ananatuba Phase, which appeared at the mouth of the Amazon about 3,400 BP, contains some of the same diagnostic traits as the Waira-jica Phase, including the ring with a central punctation, undulating incisions, and the equilateral cross, as well as parallel lines and feathered incisions. The decoration of the Barrancas Phase that arrived on the lower Orinoco ca. 2,900 BP consists of small excised zones, rings with a central punctation, incisions terminating in a punctation, miniature biomorphic adornos, and small vertical handles adjacent to the rim. It is noteworthy that several of the same ancestral techniques occur in most of the regions, whereas others do not. The differences are exactly what can be predicted based on the founder effect and evolutionary drift.
The Future of Scientific Archaeology
The most notable contrast in this volume is between the theoretical perspectives of the US authors working in Ecuador and Amazonia and those working in other parts of the continent. Denial of the existence of adaptive constraints on cultural development, the impact of evolutionary drift, and the importance of cultural diffusion distorts their interpretations of the archaeological record. It also prevents archaeology from making a significant contribution to the reconstruction of climatic and environmental change in the tropical lowlands since the beginning of the Holocene, and especially during the past four millennia.
The contrast between the detailed reconstruction of settlement and social behavior along the Jamarí in southwestern Amazonia based on applying evolutionary theory to the interpretation of the archaeological evidence, especially the characteristics of the pottery, and the vague temporal and spatial correlations among habitation sites occupied during the early Formative Period on the coast of Ecuador is striking. The Jamarí data permit identifying endogamous territories, matrilocal residence, village movement, contemporary settlements, and reoccupation of sites, as well as the impact of intermittent severe droughts that leave no permanent imprint on the biota. Even when radiocarbon dates can be obtained for past climatic events, they are less precise than those from archaeological contexts, which can also provide more specific identification of the locations and severity of their impact.
The negation of the evidence for cultural diffusion, particularly obvious in the refusal to consider the Jomon origin of the earliest pottery in Ecuador and Colombia, is another remarkable rejection of traditional cultural interpretation. The fact that pottery can be decorated using hundreds of different arbitrary techniques and motifs has always made it a primary tool for differentiating independent invention from common ancestry. The probability of independent duplication of the decoration on Jomon, Valdivia, and San Jacinto pottery is nil. Similarly, the presence of several of these motifs in the initial pottery complexes in Panama, at the mouth of the Orinoco and the mouth of the Amazon, and the north highlands of Peru testifies to migrations at different times from the northwestern part of the continent attributable to otherwise invisible fluctuations in the local climate.
Its geographical isolation prior to European colonization makes prehistoric South America a unique laboratory for examining the relationship between temporary and permanent environmental conditions and cultural development. In contrast to the rest of the planet, most of which has been continuously occupied since the early Paleolithic, it remained isolated from the continuous biological and cultural interactions that affected the course of history throughout Europe and Asia. Whereas the latter regions are dominated by temperate climates and fertile soils, deserts are mild, and forests and plains blend into one another, South America has large unbroken extents of distinct environments, including barren deserts, treeless plains, dense rainforest, snow-capped mountains, highland basins, and sea coasts that extend from tropical to subarctic latitudes. Large sectors of all these regions remain free from significant disruption by cities, roads, mechanized agriculture, and other kinds of modification that have altered the original characters of the landscapes in most of the Old World and destroyed archaeological evidence of conditions in the past. Isolation from modern encroachment has also permitted indigenous populations in many parts of the continent to pursue their traditional ways of life, providing examples of tangible and intangible behavior that can be compared with the archaeological evidence.
Suddenly much of this picture is changing. Rampant globalization is attracting foreign invaders, who have the technology to make drastic modifications in topography and biota, destroying the cultural configurations that maximize sustainable exploitation of unique environmental constraints, especially in the tropical lowlands. Their impact has eliminated key species from the food chain, interrupted the closed system of nutrient transfer that protected the infertile soil from further depletion, and disrupted the rainfall regime. Unfortunately, the insistence by the historical ecologists that prehistoric humans learned to “domesticate” the landscape to suit their needs is even less true today than it was in the past. I urge readers of this Handbook to take seriously the potential of archaeology to make a significant contribution to our understanding of prehistoric cultural adaptation in this unique and fascinating part of the world.
References
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Betty J. Meggers – National Museum of Natural History, Smithsonian Institution, Washington DC, USA.
[IF]
História da África: uma introdução – LOPES; ARNAUT (RHR)
LOPES, Ana Mónica; ARNAUT, Luís. História da África: uma introdução. Belo Horizonte: Crisálida, 2005. Resenha de: SILVA, José Alexandre da. Revista de História Regional, v.16, n.1, p. 304-310, Verão, 2011.
Desde 2003, quando o Presidente Lula sancionou a lei nº 10.639, vários títulos dedicados à história afro-brasileira e africana têm surgido no mercado editorial brasileiro. O conteúdo da referida lei torna obrigatório o ensino de História Africana e Afro-brasileira nas escolas públicas e particulares de nosso país. Nesse sentido, ela cria uma demanda de materiais que sirvam de subsídio para professores da Educação Básica, alunos de graduação e a quem mais interessar. Uma das formas em que o mercado editorial vem respondendo a essa necessidade é trazendo a público livros de caráter introdutório.1 Uma dessas obras é História da África: uma introdução.
De autoria de Ana Mónica Lopes, africana nascida em Lubango, doutora em História das Culturas, e Luís Arnaut, professor de História da África na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Este livro de dimensões modestas visa introduzir o leitor ao conhecimento acerca da história da África. Não obstante, cumpre seu papel construindo um panorama do continente amparado em pesquisadores brasileiros e africanos e, seu principal mérito, traz as principais concepções historiográficas acerca do continente africano.
A conquista dos movimentos negros que representa essa lei, a nosso ver, passa por alguns dilemas. Embora algumas unidades da federação organizadas com suas Secretarias de Educação, oficialmente possuam um discurso no sentido de efetivar a lei, é outra história afirmar que ela seja de fato levada até seu objetivo final, a sala de aula. Quando se fala de história africana, logo nossas lembranças escolares nos remetem à história da escravidão, com as imagens de negros em ambiente de trabalho ou sendo açoitados. Pensando na história da África, o conteúdo escolar mais recorrente é o das navegações do século XVI, quando portugueses e holandeses contornam o continente. Essa visão repousa na representação do dominador, civilizado e possuidor de um aparato tecnológico mais sofisticado, o europeu. Em contrapartida, temos a representação do africano submisso, colonizado e destituído de objetos que remetam à ideia de tecnologia. Assim, a visão mais difundida da África continente torna-se um obstáculo.
Ao longo do tempo, esses elementos presentes nos materiais escolares e nas salas de aulas, se cristalizaram em nosso imaginário. Romper com a narrativa do negro vitimizado vindo de um lugar desconhecido pode ser um passo essencial para que os afrodescendentes se assumam como tal. Entretanto, também é importante lembrar que construir uma narrativa na qual os africanos e os afro-brasileiros figurem de forma digna não significa fomentar ódio racial ou um país cindido entre brancos e negros.2 Nosso país é composto por várias etnias, e que cada uma tenha sua história não implica em animosidade entre as mesmas.
Já na introdução da obra, os autores justificam a necessidade de seu livro apresentando a questão de como os professores ensinarão a seus alunos algo que não aprenderam nos bancos da universidade, considerando que nos cursos de licenciatura o continente aparece como secundário e marginal em relação a alguns processos históricos. No primeiro capítulo, são abordadas as várias construções acerca da ideia de África, em fontes como os textos de Heródoto, Plínio e a cartografia medieval, desde o período da Antiguidade, passando pela Idade Média e Moderna. No geral, prevalece a noção de “território de monstros”, continente associado ao “Bestiário” e região de “clima inóspito”.
O segundo capítulo questiona o termo África que, utilizado de forma genérica, como identidade estabelecida pelo europeu, para todos os habitantes do continente não permite uma matização de suas diferenças físicas, culturais e sociais, tendo sido utilizado como sinônimo de atraso. Os autores pontuam que os habitantes da África devem ser pensados como membros de civilizações e culturas que realizaram migrações, trocas culturais com outras civilizações e com padrões de sociabilidade que tornam inadequadas sua caracterização pela ótica ocidental. Há que se destacar a importância da reflexão empreendida pelos autores sobre os conceitos de raça, etnia e formação humana.
No capítulo 3, intitulado “Religiões”, Lopes e Arnaut traçam um perfil do continente africano no que tange a essa questão. A introdução das religiões monoteístas, como o cristianismo e o islamismo, é analisada de forma atenta pelos autores, os quais destacam que esta última se encontra na melhor posição para se tornar a religião do continente, devido ao seu ritmo de crescimento. No que se refere às religiões nativas, consideramos importante citar:
“[…] tentam responder às mesmas indagações que as demais religiões. Apresentam um deus superior que criou o universo e, em algumas, verificamos a presença de entidades menores […] Outro elemento importante é a ligação com os ancestrais […].” 3
O quarto capítulo trabalha a questão de como as diferentes tradições intelectuais se posicionaram diante do continente africano. A concepção hegeliana de negação de história para a África prevaleceu favorecida pela noção, superada, de se considerar o que é histórico vinculado ao surgimento da escrita. Nos dias de hoje, acredita-se que a humanidade está vinculada ao princípio da ereção corporal que possibilitou pensar outros registros, iconográficos e artísticos, como fontes de pesquisa. Os autores também mencionam a importância de alguns centros de pesquisa, que mesmo estando atrelados ao colonialismo europeu, deram uma contribuição importante para aspectos da história e geografia africana, assim como a realização do projeto História Geral da África coordenado pela na década de 1960.
O quinto capítulo versa sobre as organizações políticas. Nele, os autores trabalham com categorias de império e reinos e classificam a organização política dos povos africanos em três fases distintas até o período da colonização.
Uma se estende até o século VI da era cristã, marcada pela constituição de grandes culturas na faixa mediterrânea e na extensão do Nilo. Uma segunda até o século XV, marcada pela presença islâmica. A terceira fase vai até 1880 e é caracterizada pela presença europeia no continente.
O capítulo 6 é referente ao fenômeno que chamamos também de neocolonialismo. Até o final do século XIX, o contato dos europeus com o continente africano estava mais restrito ao litoral. Com as independências das nações latino- -americanas, voltaram sua atenção para continente que até então funcionava principalmente como repositório de escravos, partilhando-o entre si. As explicações mais comuns para esse fenômeno são realizadas a partir da perspectiva europeia, com a concentração de capital e formação de monopólios nos países colonizadores.
O livro aqui analisado traz uma perspectiva diferente, amparada na teoria da dimensão africana. Segundo essa, uma expansão do capital privado desencadeou uma ocupação militar no continente africano frente à ação de resistência dos habitantes nativos à colonização. Os europeus de fato tiveram motivos de ordem econômica para essa expansão, mas os povos do continente africano também estavam passando por transformações antes da presença europeia, de modo que a resistência dessas populações ao domínio comercial desencadeou o domínio militar. Essa resistência é categorizada pelos autores em: primária, primária retardada e intermediária. Em suas palavras: A resistência primária foi uma reação direta à ameaça representada pelos invasores europeus. Os reis buscavam através dos diversos meios disponíveis, tanto militares quanto diplomáticos, conter a invasão, ou pelo menos impedir que resultasse na extinção dos reinos. Após os europeus já terem estabelecido sua presença e sua autoridade no território africano, desenvolveu-se a resistência primária retardada.
Apesar da diferença da presença ou não do europeu, as duas resistências são chamadas de primária, na medida em que traduzem um confronto entre povos distintos […] A resistência intermediária revela uma acomodação entre as antigas estruturas africanas e as novas estruturas coloniais. A partir da década de 1920, assistimos a uma acomodação e a um ajustamento à nova situação na qual os africanos e os europeus participam, de forma assimétrica, é verdade, da mesma configuração social.4 O domínio colonial é tema do capítulo 7. Lopes e Arnaut explicam o êxito do domínio militar dos europeus com cinco razões: superioridade militar e logística; maior estabilidade; maiores recursos materiais e financeiros; maior conhecimento do continente; e o avanço da medicina tropical. As primeiras e principais preocupações dos europeus foram no sentido de coagir mão de obra para abastecer os portos com produtos nativos e expropriação da propriedade da terra em favor dos colonos.
A violência, o extermínio biológico e cultural são apenas algumas das facetas da colonização europeia na África. Lopes e Arnaut destacam outros elementos que necessitam ser considerados ao se analisar esse processo histórico. A colonização europeia trouxe transformações significativas para os africanos tais como: a urbanização, propagação da educação formal e formação de uma nova identidade. Esse último elemento foi fundamental no processo de luta pela independência dos países africanos. Essas independências são tema do capítulo 8, no qual os autores problematizam a forma como a temática é apontada nos livros didáticos. O termo independência é apresentado como forma de pensar o processo de fim de domínio de nações europeias sobre o continente africano, em contraposição ao termo descolonização.
Essa última designação, também utilizada por professores de História em sala de aula, elimina vestígios da luta africana nesse processo e fortalece uma visão etnocêntrica do processo histórico em questão.
Também destacamos a importância de um item ao final livro que apresenta uma lista de filmes cuja temática é África. Os comentários que acompanham cada filme podem bem auxiliar professores numa eventual escolha para trabalhar com seus alunos. Nesse mesmo item, também pode ser encontrada uma cronologia detalhada das independências africanas, trazendo dados como ano, data, chefe de governo, principais partidos e fatos ligados ao evento. Na sequência, encontra-se uma considerável lista de sugestões bibliográficas agrupadas em torno de grandes temas que podem servir como roteiro de um estudo mais aprofundado. Também observamos a presença de alguns erros gráficos que esperamos sejam corrigidos em edições posteriores.
A obra ora resenhada cumpre bem seu papel de introduzir ao conhecimento de história da África. Pode ser bastante útil tanto a professores do Ensino Fundamental e Médio, bem como a acadêmicos das Ciências Humanas e ao público em geral. Trata-se de um trabalho introdutório que oferece ao leitor um panorama historiográfico, e não meramente informativo, do tema abordado, a África, o que pode ser destacado como ponto forte da obra. Outro elemento que merece atenção diz respeito à forma como os autores abordam o impacto da colonização europeia no continente não de forma maniqueísta, colonizador versus colonizado, mas como elementos que integram um processo histórico que cotidianamente desafia os africanos na busca de novos rumos para o seu continente.
Notas
1 Sobre algumas dessas obras traçamos algumas reflexões: SILVA, José Alexandre. África e Brasil Africano para a sala de aula. Históriae-História. In: http://www. historiaehistoria.com.br/materia.cfm?tb=resenhas&id=21; _____ Ancestrais: uma introdução à História da África Atlântica. Revista África e Africanidades. Ano I – n. 4 – Fev. 2009. In: http://www.africaeafricanidades.com/documentos/ Ancestrais_uma_introducao_a_historia_da_Africa.pdf
2 Este argumento é defendido por alguns autores, entre os quais destacamos: MAGNOLI, Demétrio. Uma Gota de Sangue. São Paulo: Contexto, 2009. Ver: SILVA, José Alexandre. Históriae-História. In: http://www.historiaehistoria. com.br/materia.cfm?tb=resenhas&id=60
3 LOPES, Ana Mónica; ARNAUT, Luís. História da África: uma introdução. Belo Horizonte: Crisálida, 2005, p. 30-31.
4 LOPES, Ana Mónica; ARNAUT, Luís. História da África: uma introdução. Belo Horizonte: Crisálida, 2005, p. 64.
José Alexandre da Silva – Professor de História da Secretaria de Estado de Educação do Paraná, e mestrando em educação pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). E-mail: sjosealexandre@ymail.com.
Seguir regras. Uma introdução às Investigações Filosóficas de Wittgenstein – DALL’AGNO (D)
DALL’AGNOL, D. Seguir regras. Uma introdução às Investigações Filosóficas de Wittgenstein. Pelotas: Ed. UFPel, 2011. Resenha de: FILHO, Eduardo Ferreira das Neves. Dall’agnol sobre Wittgenstein e seguir regras. Dissertatio, Pelotas, v.34, 2011.
No Tractatus Logico-Philosophicus, Wittgenstein adverte que os pensamentos ali expressos possivelmente só sejam entendidos por quem é capaz de pensar por si próprio. Ao mesmo tempo, destaca que as verdades dos respectivos pensamentos são irretocáveis e definitivas, pois resolvem os problemas filosóficos e mostram, ao bom entendedor, que em verdade não é importante resolvê-los. Essas ideias associadas à força perlocucionária do discurso tractariano anunciam um término à Filosofia (a um modo de fazer Filosofia, o que não deixa de ser o caso, em certo sentido), e criam a ilusão de que pouco se tem a fazer depois de Wittgenstein, podendo suscitar certo quietismo filosófico.
É interessante notar que parte dos leitores de Wittgenstein mantém postura quietista mesmo diante da insuficiência das ideias contidas no Tractatus, insuficiência essa reconhecida pelo próprio Wittgenstein, o que o levou a mudar pela segunda vez os rumos da filosofia contemporânea com a organização das Investigações Filosóficas, publicadas postumamente. Manterse em uma perspectiva quietista é, como eu gostaria de colocar a questão, discutir Wittgenstein, seja de que período e respectivo pensamento for, descrevendo os pensamentos desse autor, nada mais, nada menos, em um trabalho de exegese, ou seja, descrever aquilo que parece definitivo, e que pode, no máximo, necessitar de clareamento e organização.
Darlei Dall’Agnol, em seu livro Seguir Regras: Uma introdução às Investigações Filosóficas de Wittgenstein, recentemente publicado na Coleção Dissertatio de Filosofia, (Pelotas, 2011), nos apresenta uma coletânea de doze trabalhos que publicou anteriormente. Neles desafia o tipo de quietismo filosófico que destaquei discutindo e esclarecendo bem questões importantes do pensamento de Wittgenstein (algumas vezes buscando pontos de partida às ideias wittgensteinianas, ainda que possamos criticar algumas interpretações que realizou, como é natural), pensando e escrevendo bem com, mas sobretudo a partir de Wittgenstein, servindo-se das reflexões deste filósofo para esclarecer e tentar resolver alguns problemas filosóficos recorrentes, na maior parte dos casos no campo da filosofia moral.
Aquele que se fixar em demasia no título poderá supor que o livro de Dall’Agnol se constitui em um manual, um esclarecimento inicial das Investigações pela via de um problema central que é sempre referido pela fortuna crítica: seguir regras. Não é o caso de que o livro seja introdutório.
No livro, o leitor não encontrará primeiros passos para compreender pensamentos de Wittgenstein. As reflexões de Dall’Agnol têm sentido diferente: elas remontam percursos intelectuais decorrentes de uma série de pesquisas que desenvolveu sobre Wittgenstein e que foram reorganizadas (como chama a atenção na Apresentação do livro) para que os trabalhos (já publicados) pudessem ser reunidos em formato de livro. Em todos os capítulos do livro Dall’Agnol revela seu modo de fazer filosofia: trabalhar com ‘problemas’, e não somente escrever sobre História da Filosofia.
Podemos suspeitar que haja certa dissonância entre o título do livro e o conteúdo de alguns dos capítulos. No entanto, em uma reflexão que realiza com Wittgenstein, tácita ou expressamente o pano de fundo argumentativo de Dall’Agnol (em todos os capítulos) se desenvolve sobre a convicção de que a linguagem é uma atividade guiada por regras, regras gramaticais no sentido profundo (o que não cabe esclarecer aqui), e essa é certamente uma característica marcante em todos os pensamentos do filósofo vienense bem registrados por Dall’Agnol para seus próprios propósitos de pesquisa em filosofia prática, de modo geral, e particular no campo ética.
Tomada desse modo a ‘arquitetura’ do livro, isto é, tendo como pano de fundo a questão de seguir regras (então por ora resolvida a questão do título), seria compreensível que o subtítulo indicasse ser o livro ‘uma introdução às Investigações Filosóficas de Wittgentein, ainda que uma introdução sui generis, isto é, como resultado do percurso intelectual ‘wittgensteiniano’ de Dall’Agnol e suas observações sobre seguir regras. No entanto, alguns capítulos não tratam diretamente das Investigações Filosóficas, mas estão relacionados ao Tractatus ou a outras obras de Wittgenstein posteriores às Investigações, por exemplo, ao Da Certeza, utilizado por Dall’Agnol para tentar dissolver o Paradoxo de Moore, dissolução que pretendo comentar adiante. Por que, então, um subtítulo que nos fala de uma introdução às ‘Investigações’ tão somente, visto que o problema de seguir regras tem eco na filosofia wittgensteiniana de modo geral? Dall’Agnol, na Apresentação, diz que o livro presta uma homenagem aos 60 anos de falecimento de Wittgenstein, e pretende fazê-lo discutindo temas de sua filosofia tardia, particularmente temas das Investigações Filosóficas. Isoladamente, essa afirmação não é elucidativa para se compreender o subtítulo, nem tampouco as razões para o compêndio, as quais são elencadas por Dall’Agnol logo a seguir.
Porém, adiante, no primeiro e segundo capítulos, por exemplo, Dall’Agnol mostra-se atento à discussão de como se deve compreender a filosofia de Wittgenstein: ou sustentando-se interpretações que separam realmente “dois” Wittgenstein, o do Tractatus e o das Investigações, ou se devese dar crédito (e a essa posição Dall’Agnol parece estar filiado) àqueles que sustentam ser o conjunto da obra de Wittgenstein uma continuidade. A questão não é rejeitar a existência de diferentes etapas no pensamento de Wittgenstein (inclusive, como se especula recentemente, há quem sustente a hipótese da existência de um ‘terceiro’ Wittgenstein, identificado nas anotações dos últimos anos de sua vida, particularmente no Da Certeza), mas sustentar que existem fios condutores que estão presentes em todo o percurso intelectual deste autor. Ao mesmo tempo em que identifica essa característica do pensamento wittgensteiniano, as próprias pesquisas de Dall’Agnol (as que estão contidas no livro) se apresentam como uma continuidade, como é observado no final do livro com a tese do cognitivismo prático (construído a partir da assunção do saber-como, importante para o Wittgenstein das Investigações).
Apesar de reconhecer, como fiz acima, que existe certa unidade no livro de Dall’Agnol construída sobre o leitmotiv seguir regras, acredito que seria improdutivo que eu tentasse encontrar uma (s) característica (s) marcante (s) das reflexões de Dall’Agnol que me permitissem dizer o ‘quanto’ ele defende posições genuinamente wittgensteinianas, ou mesmo o contrário.
Isto por vários motivos, entre eles pelo fato de que, como já me ative a dizer anteriormente, Dall’Agnol não tem postura filosófica quietista, pôde pensar com e a partir de Wittgenstein; por não ser natural pensar que exista uma ‘escola wittgensteiniana’ (e o próprio Wittgenstein tinha ojeriza a ter seguidores, como se comenta); e o que é evidente: pelas várias ideias discutidas que, apesar de envolverem o aspecto de seguir regras, são desenvolvidas em diferentes direções, o que necessitaria, por si só, de um exame de doze capítulos de certo modo independentes. Por isso, escolho dois capítulos apenas para apresentar ao leitor. Em ambos Dall’Agnol defende perspectivas originalíssimas. Uma delas me interessa em particular1.
Para Dall’Agnol, o tema que está entre os “principais pontos de continuidade no pensamento de Wittgenstein” (p. 12) é o sentido ético das obras de Wittgenstein. Assim, os capítulos em que se discute o Tractatus, particularmente o primeiro – “Sobre aquilo de que não se pode dizer, deve-se falar”-, servem como pontos de partida para sedimentar essa percepção sobre a obra de Wittgenstein.
No primeiro capítulo, Dall’Agnol pretende esclarecer alguns malentendidos correntes em interpretações do Tractatus, particularmente no que diz respeito à introdução do sentido completo da obra por meio de certa ‘lei ética’ encontrada em seu Prefácio: “o que se pode em geral dizer, pode-se dizer claramente; e sobre aquilo de que não se pode falar, deve-se calar”. No capítulo resume reflexões que realizou e estão publicadas em seu livro “Ética e Linguagem”(nas edições de (1993; 1995 e 2005), bem como foram apresentadas em comunicação no vigésimo sétimo Simpósio Internacional sobre Wittgenstein (2004), com o título “What we cannot say, we can and must speak about”.
Levantando a pergunta “sobre o que se deve calar?” (realmente), tenta desfazer o seguinte paradoxo: normalmente a resposta a essa pergunta parece contraditória, visto que o próprio Wittgenstein em TLP 6.421 destaca que as proposições da ética não podem ser colocadas em palavras, mais ainda em TLP 7, onde nos diz que ‘Sobre aquilo de que não se pode falar, deve-se calar”. Ou seja, o Tractatus parece ter sentido ético, se tomamos como ponto de partida a ‘lei ética’ contida no Prefácio; e, parece haver uma lei ‘ética’, ao final, que rejeita a própria ética ou o próprio sentido ético da obra, aparentemente destacado no Prefácio. Deste modo, haveria, além de um paradoxo, uma contradição eminente na obra. Como essa tensão pretende ser resolvida, para Dall ‘Agnol? Retomando a distinção wittgensteiniana entre dizer e mostrar, Dall’Agnol ressalta que os limites daquilo que se pode dizer, de acordo com o Wittgenstein do Tractatus, com sentido, é dado pelo que se pode figurar; todas as sentenças que não podem ser figuradas, não serão nem verdadeiras, nem falsas, não corresponderão a nenhum estado de coisas possível. Quando se tenta dizer alguma coisa sem obedecer a ‘lei’ da representação linguística, constrói-se pseudoproposições. É o caso das proposições da ética, que só podem, a seu turno, ser mostradas e não podem ser ditas. Mas, podemos falar de proposições morais? Sim, é o que sustenta Dall’Agnol. Baseado na distinção entre dizer e mostrar, Dall’Agnol sugere uma distinção entre dizer e falar: Algo é ‘dito’ quando representa um estado de coisas possível, de acordo com a regra da figuração; algo é falado quando expressa alguma coisa sem cumprir as condições de sentido, ainda que construindo pseudoproposições. E justamente a proibição de falar sobre proposições dessa natureza, como proposições que dizemos morais, não cabe aqui. Elas não podem ser ditas, se dizer é compreendido com pretensões figurativas, mas podem ser faladas, pois pertencem, como Dall’Agnol sustenta, ao domínio do místico, a esfera das coisas que não dizem que o mundo é, mas que ele existe. Podemos, pois, falar do sentido da vida, mesmo que o sentido da vida não se constitua em um fato, não esteja sub judice das condições de verdade aplicadas às proposições empíricas.
O contraste apontado por Dall’Agnol entre juízos morais e éticos é elucidativo. Ambos não são genuínas proposições, não podem ser verdadeiros nem falsos, mas os primeiros são sem sentido, enquanto que os segundos contrasensos, pois tentam dizer aquilo que só pode ser mostrado, carregando uma pretensão, como destaca Dall’Agnol, metafísica. O ‘calar-se’ proposto por Wittgenstein requer, como compreende o autor do livro Seguir Regras, ser distinguido segundo suas pretensões de verdade: deve-se calar quando não se pode dizer, quando se tem pretensões cientificistas sobre as questões de natureza moral; se não há pretensão de verdade e fundamentação da moral, pode-se falar, e nos mantemos no domínio das expressões comuns da moralidade humana2. A implicação da análise faz Dall’Agnol sustentar a tese de que o Wittgenstein do Tractatus, assim, sustenta uma epistemologia moral não-cognitivista.
Conclui Dall’Agnol que o paradoxo apontado acima é só aparente. A tese 7 do Tractatus refere-se a uma proibição às filosofias da moral, não à moralidade cotidiana e seus ‘problemas’. Também a aparente contradição é dissipada, visto que Wittgenstein não parece abolir a moralidade, mas tenta limitar o discurso cientificista sobre a moral, realizado em teorias éticas.
Assim, o silêncio tractariano diz respeito a um calar-se em sentido lógico filosófico sobre questões que envolvem a moralidade; não é um calar-se em sentido trivial, devemos falar sobre muitas questões morais, denunciando calúnias, malfeitos de toda a natureza, sob a pena de, caso contrário, assumirmos um silêncio imoral3.
Mas, nem toda a análise de Dall’Agnol sobre seguir regras tem (aparentemente) repercussões imediatas sobre o campo da moral. No décimo primeiro capítulo do livro, propõe-se a esclarecer as regras de uso dos verbos epistêmicos crer e saber, com isso, oferecendo uma dissolução ao Paradoxo de Moore (PM). O que tem de ser explicado é o que há de absurdo em pensamentos e asserções de sentenças tais como a) ‘Está chovendo, mas não creio’ ou b) ‘Está chovendo, mas creio que não está’, cuja diferença lógica é ressaltada pela fortuna crítica, inclusive oferecendo-se, em muitos casos, explicações ou soluções diferentes para cada caso. Também, alguns autores tentam explicar por que esse ‘paradoxo’ acontece apenas qiando o verbo crer é conjugado na primeira pessoa do presente do indicativo, e não acontece quando o crer é conjugado em terceira pessoa, no passado ou no futuro.
Dall’Agnol, em sua análise, não discute esse ponto em particular, mas se concentra sobre a ‘absurdidade’ das sentenças Moore-paradoxais4.
Após sintetizar outras tentativas wittgensteinianas de dissolução do PM, a primeira observação importante para compreendermos como Dall’Agnol constrói a argumentação que leva à sua dissolução do PM é a de que o verbo ‘saber’ teria semelhanças de família, em Wittgenstein, com compreender, entender, cujo uso possível faria com que o austríaco não rejeitasse a definição tradicional de conhecimento para determinado jogo de linguagem (do conhecimento, desse modo compreendendo a importância dessa ‘definição’ em um dado contexto): ter conhecimento é ter crença, verdadeira e justificada5.
Wittgenstein, em seus últimos escritos, publicados após a sua morte com o título de Da Certeza, exatamente no parágrafo 177 afirma que “aquilo que sei, acredito” (WIIGENSTEIN, Da Certeza, s/d, Lisboa: Edições 70, p. 61). Para Dall’Agnol, essa frase mostra que Wittgenstein estava preocupado em estabelecer as regras desse uso particular do verbo saber, indicando a correta aplicação, em consequência, do verbo crer.
Sentenças Moore-paradoxais seriam absurdas, pois, se “Saber=df acreditar e ter evidências adequadas que justifiquem a crença; crer=df ter a pré-disposição de aceitar a verdade de uma proposição mesmo sem evidências suficientes” (p.165), então o primeiro conjunto seria a manifestação de que ‘sei que p’, e, no segundo conjunto, nego ter o conhecimento de p, pois nego a crença em p (no caso de 1), ou afirmo a crença no contrário (no caso de 2). Seria correto asserir, por exemplo, ‘Creio que está chovendo, embora não o saiba’, mas não ‘Sei que está chovendo, mas não creio’. Ou seja, tanto no caso de 1, como no caso de 2, não cumpri corretamente o uso dos verbos crer e saber; assim, “o Absurdo de Moore é simplesmente um mau uso de verbos epistêmicos” (p. 165).
Ora, a dificuldade maior na tentativa de dissolução ao PM oferecida por Dall’Agnol é justamente ter de mostrar que sempre, em uma asserção de sentença Moore-paradoxal, na primeira metade da conjunção há uma alegação de algo forte como conhecimento, ou seja, sempre ao asserir p alguém está asserindo ‘eu sei que p’, ainda que o contexto seja apropriado para uma pessoa (pretender) sustentar conhecimento, no sentido tradicional do termo. Sem esse passo, fica permitido imaginar uma série de situações em que as pessoas não alegam ‘saber’ uma dada proposição, mas apenas possuem crença sobre ela, ainda não têm condições de assegurar o conhecimento de p, apesar de sua asserção ocorrer, como já disse, em um cenário ‘epistêmico’. E, se esse for o caso, então voltamos ao princípio: ter de explicar a razão da absurdidade de asserções de sentenças Moore-paradoxais6. Em uma situação dessas, na ausência de condições para assegurar ‘conhecimento’ sobre uma dada proposição, ainda que o quisesse, a pessoa descumpriu alguma regra, isso é correto dizer, mas será importante dizer qual regra efetivamente ela descumpriu (então, algo mais sobre a lógica da asserção deve ser trazido ao debate).
Caso seja verdade que possamos construir cenários nos quais o PM se dissipa mediante diferentes recursos, por exemplo, em certas asserções que parecem ser ‘contradições disfarçadas’ (como o fizeram alguns dos autores que defenderam uma posição expressivista, tentando mostrar que sempre a asserção de ‘eu creio que p’ é idêntica a asserção pura e simples de p) – e também aqui, em Dall’Agnol, para o qual o problema deve ser respondido unicamente na esfera de um jogo de linguagem do saber, devemos sempre procurar explicar a situação que nos parece mais espinhosa, e que foge a cenários exclusivos: quando há uma tensão entre as crenças que declaro em primeira pessoa e das quais ‘duvido’ em terceira pessoa. Aqui está o ninho das vespas menos indolentes de Moore, parafraseando o Wittgenstein de Cultura e Valor7.
Como eu disse antes, não analisei o ‘quanto’ Dall’Agnol é mais ou menos ortodoxo no livro em suas interpretações wittgensteinianas dos problemas discutidos. Parece que no caso de sua dissolução wittgensteiniana do PM, a ortodoxia é o caso. Cabe ao leitor do livro tirar suas próprias conclusões a respeito disso, tanto na leitura desse capítulo, quanto dos demais capítulos nos quais Dall’Agnol se ocupa de outros problemas.
Certamente encontrará uma série de investigações que devem ser levadas adiante, pois, como eu mencionei acima, Dall’Agnol desafia qualquer quietismo filosófico e nos faz (re) pensar sobre muitas questões relevantes relativas a seguir regras na filosofia de Wittgenstein.
Notas
1 O chamado “Paradoxo de Moore” foi meu tema de investigação na pesquisa de mestrado e de doutorado, esse sob orientação de Darlei Dall’Agnol..
2 Recentemente, interpretando o Da Certeza, Daniéle Moyal-Sharrock, em Understanding Wittgenstein’s On Certainty (New York: Palgrave Macmillan, 2007), discutindo a não-proposicionalidade de algumas proposições, faz exatamente essa distinção, entre dizer e falar, anteriormente apontada por Dall’Agnol.
3 Chamando a atenção para esse tipo de regra, Dall’Agnol parece abrir terreno à discussão posterior sobre a interpretação de se o ‘segundo’ Wittgenstein, das Investigações Filosóficas, é cognitivista ou não-cognivista no que diz respeito à ética, o que parece ser sugerido ao final do capítulo e ao final do livro com a proposta do cognitivismo prático, que mencionei acima. Tratar dessa questão com cuidado foge às pretensões de análise aqui. Essa menção, no entanto, é oportuna para se notar que a pesquisa de Dall’Agnol, apesar de tratar de seguir regras em outras obras de Wittgenstein que não nas Investigações, tem o propósito de compreender a filosofia de Wittgenstein como continuidade, discutindo criticamente os resultados das mudanças de perspectiva realizadas pelo autor até a sua morte em 1951, particularmente com reflexos sobre as questões envolvendo a moralidade.
4 Dall’Agnol apresenta o problema e, após, reconstrói a análise que o PM recebeu de Moore para contrastála com sua dissolução wittgensteiniana do PM, apresentada adiante (Cf. as páginas 153 – 160).
5 De acordo com Dall”Agnol, Wittgenstein “não recusaria completamente a definição tradicional de conhecimento” (p. 164), mas a estaria relacionando a um uso do verbo saber, que tem semelhanças de família com compreender.
6 E, temos de lembrar que uma pessoa pode duvidar de que saiba sobre p apenas ‘pensando’, e não asserindo p. Desse modo uma solução ao PM deve ser simultânea a um ‘pensamento’ de proposição Moore-paradoxal e sua respectiva asserção (e a pessoa deve saber as razões pelas quais seu ‘pensamento’ é incorreto).
7 Por isso, é duvidoso que possamos construir cenários em que asserções de sentenças Moore paradoxais possam ter sentido e não ser absurdas. Por exemplo, se digo ‘(Sei que) Minha tia faleceu e não acredito’, como afirma Dall’Agnol, inconformado com sua morte. Nesse caso, pois dificilmente estamos em posição de saber a correta intenção de falantes em asserções. O problema está na conjunção. Se eu tivesse dito ‘Minha tia faleceu. Não acredito’, certamente não haveria aí qualquer absurdidade.
Eduardo Ferreira das Neves Filho – Universidade Federal de Pelotas. E-mail: eduardofnfilho@yahoo.com.br
Platão – TRABATTONI (RA)
TRABATTONI, Franco. Platão. São Paulo: Annablume, 2010. Resenha de: SANTOS, José Trindade. Revista Archai, Brasília, n.5, p.143-146, jul.2010.
1. Que leva um professor de Filosofia Antiga a escrever um livro de introdução a Platão? Penso que, em primeiro lugar, o dirige aos seus alunos, e só depois inclui no seu projeto os alunos dos outros. Mas, creio que ninguém se decide a escrever uma obra introdutória a Platão e ao platonismo se não for movido por uma ideia. No caso de Franco Trabattoni, defendo que essa ideia foi mostrar que o Mestre da Academia é um pensador anti-dogmático.
Entre alunos e manuais, a voz corrente encara Platão como o arquétipo do filósofo dogmático. Teorias que defendem a existência de Ideias inteligíveis desvalorizando a experiência sensível, que afirmam que o conhecimento não passa de reminiscência, que uma flor só é bela porque participa da Beleza, que há “para além da essência”um bem que tudo rege, só podem ser entendidas como construções ideológicas sustentadas dogmaticamente. E, de fato, quem substitui a leitura dos diálogos pela memorização das “teorias”platônicas só pode ler Platão dogmaticamente.
Não importa aqui apurar quem são os responsáveis por essa opção didática, se alunos, professores ou manualistas; nem esse pensamento terá passado pela mente do Autor quando esboçou a presente obra. Sua intenção terá sido, sim, mostrar que Platão pode ser lido como um pensador anti- dogmático, deixando ao leitor a decisão sobre se deve ser lido por esse viés.
1.1 Por isso, o Autor começa por apontar que, ao contrário do que ocorreu com a generalidade dos filósofos, o Mestre da Academia compôs todo o seu Corpus na forma dialógica. Essa opção há muito constitui tópico de debate e um mistério. Mas este é adensado pela circunstância de – podendo fazê-lo! –, enquanto filósofo, Platão se excluir de participar nas disputas e investigações que, por escrito, legou à posteridade.
É como consequência desta sua decisão que o registo escritural do “seu pensamento”ficará para sempre como uma obra aberta, sujeita e recomposições periódicas. É ainda por essa razão, agravada pela variação das perspectivas pelas quais é abordada em diversas épocas e culturas, que a reinterpretação da obra platônica – entre nós imposta pela sua inclusão nos currículos escolares – tem sido constante desde a Antiguidade.
Nos últimos dois séculos, as tendências da crítica convergiram em três perspectivas concorrentes. Unitaristas, evolucionistas e analíticos propõem três visões da obra platônica, consoante se concentram na definição da unidade ideológica do Corpus, no fio evolutivo extraído da análise cronológica da sua produção, ou simplesmente optam por abordar cada diálogo como uma peça autônoma, abstendo-se de o relacionar com o Corpus platônico.
2. Reconhecida a inutilidade do debate sobre os méritos relativos destas três tendências, a partir de meados do séc. passado outras se afirmaram, apoiando-se em critérios têcnicos, temáticos, estilísticos ou de outra natureza. É neste grupo que o Autor da obra em apreço se incluiu, ao optar por esboçar uma estrutura problemática que, de forma não evidente, se apoia numa leitura evolucionista do pensamento platônico.
2.1 Após um capítulo introdutório (15 pp.), dedicado a questões de composição e interpretação do pensamento platônico, a análise do Corpus acha- se organizada em três partes de desigual extensão (não assinaladas no texto).
Os capítulos II a IV (43 pp.) condensam a temática ética e política nas duas linhas polêmicas que atravessam os diálogos “socráticos”, orientando a crítica para os alvos fornecidos pela cultura tradicional e pela sofística. Passado um breve capítulo que abre para questões epistemológicas (13 pp.), a II parte da obra (131 pp.) concentra-se no estudo da metafísica e epistemologia dos diálogos sobre as ideias (ênon, Fédon, Fedro, Banquete, Crátilo, República). Focando a temática da alma, a análise conduz o leitor, através da consideração do amor e das propostas educativas, à teoria ética e política da República. Começa então a III parte (117 pp.), concentrada, primeiro, nos “diálogos dialéticos”(Teeteto, Sofista: cap. XI), depois no “problema do bem no homem e no cosmos”(Filebo, Timeu: cap. XII), finalmente, no “último pensamento político de Platão”(Político, Leis: cap. XIII).
A obra é rematada por um breve apêndice (não identificado como tal) que debate a substância das “doutrinas orais”(cap. XIV), ao qual se seguem bibliografias diferenciadas e um índice de citações (onde falta a paginação).
2.2 Embora praticamente toda a produção platônica seja coberta, os diálogos recebem tratamentos desiguais. Enquanto a obra “socrática”– à qual é concedida atenção passageira –, é abordada topicamente, a problemática dos diálogos “metafísicos”é estudada em profundidade e extensão. No entanto, só na III parte cada diálogo tratado é abordado separadamente, sendo concedida atenção pouco usual à última produção escrita atribuída ao filósofo: As leis.
Esta assimetria serve as intenções do Autor, que nunca deixou de visar os interesses de três públicos muito diferentes. Ao público leigo oferece uma visão global do pensamento platônico, a um tempo rigorosa e acessível. Aos estudantes proporciona a compreensão da unidade e diversidade do platonismo escrito, perpassada por muitas visões e interpretações originais dos problemas postos pela leitura dos diálogos. Finalmente, aos professores fornece um guia de leitura que, destacando o essencial do acessório, separa os programas de pesquisa da sua concretização nos textos e ilumina o sentido do estudo aplicado e profissional dos diálogos e da filosofia platônica.
Na simplicidade com que deve ser apresentado um trabalho introdutório, há muita reflexão sobre a obra do filósofo, que reflete o conhecimento da diversidade das interpretações que tem recebido da parte dos comentadores. Por isso, a opção entre expor as doutrinas e criticá-las é sempre ultrapassada com critério, de modo a não deixar de fora nada que a tradição comentarista recente considere relevante. Por fim, sem se substituir à leitura dos diálogos, a obra ajuda o leitor a trabalhá- los furtando-se a aprisioná-lo na teia dogmática das “doutrinas”, resumidas para consumo escolar, deixando-o entrever os anseios e projetos que conferem sentido à composição dos diálogos.
2.3 A I parte trata o grupo “socrático”(no qual parte do Teeteto é oportunamente incluída) como um projeto crítico da cultura grega e do movimento sofístico. Sem se comprometer ideologicamente, o A. deixa o leitor entrever que o conflito com a abordagem autonômica corrente, substanciada pela generalidade dos interlocutores de Sócrates, é explicado pela adesão de Platão à proposta axiológica heteronômica do bem (33-34).
Após o capítulo que separa os diálogos “socráticos”dos dedicados à exposição da teoria das ideias, os três seguintes são dominados pela temática da “alma”, abordada das perspectivas complementares do indivíduo, da cidade e da teoria do “amor”. Neste ponto, é oportuno empreender um excurso.
2.3.1 Desde os registros tanto do início da atividade filosófica grega – fixados por Aristóteles –, quanto da Literatura (veja-se: Homero Ilíada I,3-5), a primeira preocupação dos Gregos é com a vida, particularmente na sua relação com a morte. Textos de diversas proveniências evidenciam a plena consciência de que “o que vive”não é o corpo, mas essa entidade chamada “alma”, que “anima”o corpo, até ao momento em que sai, deixando-o “inanimado”.
Esta problemática apresenta implicações religiosas que a nossa cultura integralmente reconhece e aceita. Mas a dificuldade de compreensão atual da posição platônica sobre a alma reside no fato de esta transbordar para terrenos de todo estranhos à nossa cultura: o político (República, Político, Leis), o cósmico (Timeu, Leis X), o cognitivo (psíquico/psicológico/formativo: Mênon, Fédon, República V-VII) e o antropológico (Banquete, Fedro, Timeu).
A diferença de contexto cultural que nos separa dos Gregos deixa o leitor desarmado perante a abrangência da noção grega de alma, reagindo com estranheza a concepções como as da criação e transmigração das almas e da reminiscência, esquecendo que com elas o filósofo dialoga com os seus conterrâneos e companheiros de pesquisa.
2.4 O A. aborda esta questão a partir do Fédon, considerando sucessivamente os argumentos da reminiscência e da participação, ao estudo dos quais associa o Crátilo e – num lance arriscado – a Carta VII.
Passa em seguida à seção epistêmica da República (VI-VII) para construir o interface da temática da alma.
O seu objetivo é chegar ao primeiro braço da concepção platônica da educação, que complementa com a definição do vínculo unificador do psiquismo individual e coletivo na teoria do amor e na construção da cidade justa. Mas o foco da sua preocupação são as questões epistemológicas que o remetem aos “diálogos dialécticos”.
Não é possivel prestar aqui atenção ao fino recorte dos argumentos com que interpreta separadamente: o problema da opinião verdadeira, no Teeteto, e as críticas de “Parmênides”à doutrina das ideias, coroada com uma magistral, embora sintética, análise do sentido das hipóteses sobre o uno e o múltiplo, no Parmênides.
Na sequência, a análise aborda o Sofista, encarado como a obra em que Platão reformula a sua “doutrina das ideias”, mediante a análise dos “cinco gêneros máximos”e a proposta da dialética.
Quase como epílogo, o A. volta à temática da alma, no Timeu, antecedida por aquilo que entende como sinais da influência pitagórica, no Filebo, e seguida pela teoria sobre a construção do cosmos. Havendo ainda lugar para voltar a prestar atenção àquilo que o A. designa como o projeto político de Platão, no Político e nas Leis, a obra termina com uma sucinta, porém, inspiradora avaliação das “doutrinas orais”atribuídas a Platão.
É um trabalho que ficará como um modelo de clareza, concisão e rigor, que se espera mereça a atenção do estudioso de Platão tanto dentro da Escola, como docente e discente, quanto fora dela, como homem de cultura. Pois está mais que provado pela crítica de todos os tempos que, se poucos são os que concordam com as soluções propostas por Platão, todos se reúnem e debatem em torno dos problemas que o filósofo legou à Humanidade.
4. Faltará apenas mostrar como o A. provou o anti-dogmatismo de Platão. Em primeiro lugar, num enfoque que equilibra as visões da filosofia e da cultura, nunca adota uma visão reducionista da leitura dos textos filosóficos, expressa quer em bem ordenados resumos, quer na enumeração das teses e teorias que a Escola registra como “doutrinas”.
Fica deste modo desfeito o nó górdio atado por quantos tentam reduzir a dogmas os argumentos que o filósofo propôs, com a intenção de apresentar a sua visão crítica da realidade, tal como ela se mostra aos homens, no espaço do seu mundo e no tempo da sua vida. O A. nunca esquece que, com a excepção da reminiscência, as “teorias platônicas”não passam de objetos didáticos expostos em manuais e exigidos pela avaliação do estudo.
Finalmente, com as interpretações parciais e global que propõe, Trabattoni assume com determinação e competência o risco de relacionar teses avançadas em diálogos distintos. Sabendo bem que este risco é corrido por quem se aventura a interpretar Platão, o A. não ignora que essa opção nunca é inviabilizada pelo próprio filósofo, que por vezes se não coíbe de sugerir relações intra- dialógicas.
José Trindade Santos – Professor da Universidade Federal da Paraíba e do Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa.
Introdução aos Estudos Culturais – MATTELART; NEVEU (PL)
Os franceses Armand Mattelart (professor de ciências da informação e da comunicação da Universidade Paris VIII) e Érik Neveu (professor de ciência política) se propõem em sua obra, Introdução aos Estudos Culturais a trazer o leitor ao cenário de discussão sobre os “Estudos Culturais”, analisando o conceito de cultura e suas diferenciações e transformações ocorridas desde a segunda metade do século XX até a atualidade. Considerada pelos franceses como “disciplina marginal”, uma vez que dissocia-se da análise da cultura letrada, os “Estudos Culturais” trazem uma proposta de visão crítica da cultura, percebida como instrumento de reorganização da sociedade. Para os autores: “(…) a questão central é compreender em que a cultura de um povo, e inicialmente, a das classes populares, funciona como contestação da ordem social ou, contraditoriamente, como modo de adesão às relações de poder” (MATTELART, 2004, p. 14). Leia Mais
História y teoria social | Peter Burke
Historia y teoria social, de autoria de Peter Burke, é um livro que tem como objetivo principal discutir as aproximações e contribuições da teoria social para os historiadores, a utilidade da história para os teóricos sociais e as contribuições da história e da sociologia na produção do conhecimento do social.
A obra é dividida em seis capítulos. No primeiro encontram-se questões que perpassam as relações entre a história e a sociologia, as quais, segundo o autor, apesar do interesse comum – o estudo do social -, nem sempre foram boas vizinhas, pelo fato de que historiadores e sociólogos, dentro dos limites de suas concepções e do exercício de sua ciência, construíram visões estereotipadas. Historiadores questionam o caráter científico da prática dos sociólogos, alegando que estes não vão além de suposições genéricas, descontextualizadas no tempo e no espaço, apenas classificatórias dos indivíduos. Já os sociólogos falam do historiador como um profissional que coleta informações e faz uma exposição da história, sem embasamento em uma teoria ou método. Leia Mais
Manual Interlat. Comprensión escrita en portugués, español y francés | Gilda Tasara Chávez e Patricio Moreno Farías
Interlat es una bella obra, que acusa rigurosidad, compromiso y amor por parte de todas las personas involucradas en su realización. Su motivación se encuentra en EuRom 4, novedoso método para la enseñanza simultánea de portugués, español, italiano y francés, editado en Florencia, en 1997, e impulsado por las Universidades de Provence, Lisboa, Salamanca y Roma. Interlat se suma, pues, a los proyectos desarrollados en Europa, siendo ahora Chile también uno de los propulsores del método de intercomprensión que posibilita una comunicación exitosa entre personas de distintas lenguas, expresándose cada una en la suya.
Los autores Tassara y Moreno, explican que Interlat se remite a la comprensión de escritos en tres lenguas: portugués (por ser Brasil una indiscutida potencia latinoamericana), español (lengua emergente y propia de la América hispana) y francés (por la influencia de la cultura del país galo en el mundo de la educación en particular). En efecto, tal como los mismos autores lo expresan, todo conduce a pensar que será “en torno a estos tres ejes -e l español y el portugués como lenguas continentales, y el francés como idioma latino de formación humanista- que América Latina debiera construir su futuro en materia de política lingüística”. Leia Mais
Palmares, ontem e hoje | Pedro Paulo Funari
Escrito a quatro mãos, o ensaio Palmares, ontem e hoje é mais uma das primorosas narrativas da coleção Descobrindo o Brasil, editada pela Jorge Zahar Ed. Calcado num dos temas mais consagrados da nossa historiografia, o texto de Pedro Paulo Funari e Aline Viera de Carvalho aborda com maestria e originalidade as principais questões que envolvem a saga palmarina desde o período de formação do quilombo até as descobertas mais recentes no campo da arqueologia.
Fugindo das tradicionais e – por que não dizê-lo? – esquemáticas abordagens introdutórias aos episódios marcantes da nossa história, os autores apresentam o quilombo de Palmares como um problema historiográfico, ou seja, um fato histórico que foi e continua sendo constantemente reescrito por historiadores, sociólogos, arqueólogos e antropólogos. Tal honestidade profissional demanda naturalmente um convite ao leitor a compreender os meandros da escrita da história e a produzir suas próprias idéias sobre os fatos tratados. É isso que os autores literalmente fazem ao mostrar como o estudo da história implica na discussão da relação passado e presente, dado que dela resulta o discurso do historiador. Leia Mais
Nachklassische Romane und höfische “Novellen” | Helmut Birkhan
Como produto de suas aulas ministradas durante o semestre de inverno de 2003- 2004, Helmut Birkhan apresenta ao público leitor o quinto volume da série História da antiga literatura alemã à luz de textos escolhidos, um manual dividido em oito volumes que contém, de maneira sucinta, porém bem embasada lingüística, literária e historicamente as principais obras escritas e ou compiladas no espaço germanófono continental durante a Idade Média. Neste número, o autor preocupa-se em discutir sobre textos menos conhecidos dos germanistas, tanto de língua alemã quanto estrangeiros.
À guisa de introdução ao volume, Birkhan circunscreve a época de sua análise, isto é, mais ou menos entre 1200 e 1300. O erudito austríaco abarca neste volume as obras, cuja temática se prende à Antigüidade ou a Bizâncio. É interessante notarmos que normalmente nos curricula universitários dos cursos de língua e literaturas de língua alemã muito pouco espaço é dado à produção literária em alemão anterior ao século XVIII [1], menos ainda ao período de tempo abarcado pela pesquisa do autor de Romances pós-clássicos e “novelas” corteses.
A partir de uma discussão sobre o desenvolvimento dos conceitos metodológicos referentes às obras, primeiramente classificadas como “epigonais” e hoje em dia como pós-clássicas, Birkhan (2004, 10) discute e afirma a existência de “novos juízos valorativos em favor daquelas obras anteriormente difamadas”. Do mesmo modo são apresentados romances menos conhecidos com temática arturiana, mitológica [2], poemas com forma similar à das canções de gesta, alguns excertos de romances de amor e romances de aventura, trechos de quatro “novelas” em versos e, por fim, trechos de um drama medieval em médio-alto-alemão.
Como este volume, de número 5, integra a série História da antiga literatura alemã à luz de textos escolhidos e devido à temática ser circunscrita ao período cronológico visto no volume precedente, o autor prescinde de informações de cunho histórico-social, optando, pois, por uma análise das obras à luz das informações retiradas dos próprios textos, o que configura uma escolha metodológica, em nosso ver, pertinente, na medida em que sua análise literária traz consigo os elementos culturais da época em questão.
Aspecto importante para facilitar a apreensão dos dados acadêmicos sobre as obras e momento histórico estudados é a preocupação do autor em apensar ao fim do volume uma série de reproduções de iluminuras, fotos, capas de fac-símiles e páginas de manuscritos, quadros genealógicos, esboços arquitetônicos e até mesmo uma discutível partitura do Titurel de Wolfram. No trabalho com a Idade Média, para nós brasileiros distante e praticamente alheia ao nosso passado, é fundamental a disponibilização da maior quantidade possível de dados, a fim de tornar menos incompleto o painel do objeto que estudamos.
O cuidado de Helmut Birkhan não apenas com a apresentação do conteúdo, porém com sua efetiva e merecida valoração está expressa no comentário da última capa do volume, que traduzimos:
“O livro é dirigido àqueles que querem uma introdução na criação romanesca medieval (em especial no romance arturiano). Serão analisadas aquelas obras, que freqüentemente são desqualificadas como romances de aventuras, as quais, porém, são extremamente interessantes sob uma perspectiva psicológica, da ciência da cultura e sob várias outras.”
No tocante às obras em mittelhochdetusch com reminiscências da Antigüidade Clássica são arrolados autores como Herbort von Fritzlar, Albrecht von Halberstadt, Konrad von Würzburg, dentre outros. Um texto que nos chama a atenção pelo seu quase total desconhecimento pelos medievistas brasileiros é Eraclius, de Otte, de quem não há praticamente informação alguma. A obra, de datação provável entre 1190 e 1230, apresenta temática bizantina. Birkhan inicia sua análise com um resumo do texto, entremeado com comentários da mais variada ordem acerca da originalidade do fazer poético de Otte, composição da obra, intertextualidade e informações de cunho histórico contidos no conto.
Com relação aos temas arturianos encontram-se listados e discutidos pelo pesquisador de Viena os seguintes títulos: [3]
1 O Lanzelet de Ulrich von Zatzikhoven
2 O romance de Segremors em médio-alto-alemão
3 Os “fragmentos de Titurel” de Wolram von Eschenbach
4 Titurel mais recente de Albrecht – Merlin de Albrecht von Scharfenberg [4]
5 O Lancelote em prosa
6 Diu Crône [5] de Heinrich von dem Türlin
7 O casaco
8 O Wigalois de Wirnt von Grâvenberc [6]
A matéria mitológica, presente por exemplo em Gauriel e Muntabel, de Konrad von Stoffeln, traz o universo das fadas e elfos [7] ao leitor moderno, no que personagens humanos se envolvem sentimentalmente com seres pertencentes ao mundo místico. Nesse momento podem ser inferidos comentários intertextuais com relação ao Tannhäuser, romance em alemão do século XIII sobre um cavaleiro, que decide se dedicar exclusivamente ao amor venal, optando por viver com Vênus, depois de desventuras no mundo social perfeito da cavalaria cristã.
As canções de gesta, embora de tradição mais antiga no continente europeu e de influência predominantemente francesa, foram bem representadas entre os séculos XII a XIV no espaço germanófono. Uma outra vertente da produção de gesta liga-se às sagas com a personagem Guilherme – em francês Guillaume d´Orange – 8, cujos primeiros textos remontam à primeira metade do século XII! Em alemão, a obra Willehalm de Wolfram von Eschenbach tematiza essa personagem e dentre todas as outras é a mais conhecida.
Os romances de amor e de aventura, bem como as novelas corteses em verso e como também o drama medieval são analisados através de exemplos textuais, nos quais Birkhan atenta pra detalhes lingüísticos, exegéticos e filológicos das obras.
Na História da antiga literatura em alemão à luz de textos escolhidos – parte V: romances pós-clássicos e “novelas” corteses há a versão completa de todos os fragmentos textuais para o Neuhochdeutsch, moderno-alto-alemão, o que acreditamos ser de capital importância não apenas para o leitor germanofalante, porém principalmente para os discentes de língua portuguesa, interessados em acompanhar a evolução histórica do idioma alemão, investigar suas características e ter, com isso, facilitado seu acesso às fontes primárias.
Por fim, se lembrarmos que as aulas de Saussure serviram de base à Lingüística Moderna e guardando as devidas proporções, somos de opinião de que a obra de Helmut Birkhan ora resenhada se inscreve dentro daquelas que podem se constituir entre nós como marco para o início de uma tradição de pesquisa com textos quase que totalmente desconhecidos, conferindo à Medievística Germanística e à Filologia Germânica o velho motto latino Labor omnia vincit. O trabalho tudo vence!
Notas
1. Para um maior detalhamento sobre o assunto cf. BRAGANÇA JÚNIOR, Álvaro Alfredo. Deutschsprachige Literatur des Mittelalters – Beispiel einer methodischen Perspektive zur Behandlung von älteren Texten im Literaturunterricht. In: WIESINGER, Peter et alii. Akten des X. Internationalen Germanistenkongresses Wien 2000. Bern: Peter Lang, 2002. Jahrbuch für Internationale Germanistik, Reihe A, Volume 57, p. 203-209.
2. Trata-se neste caso de contos, cujos temas giram ao redor de problemas no casamento de seres humanos com seres femininos da “baixa mitologia”, como fadas e elfos. Cf. BIRKHAN, 2004, p. 159.
3. Não nos esqueçamos de que no volume
4. são trabalhados textos arturianos vistos pelo cânone como modelares, acompanhados por uma concisa, mas eficiente listagem com dados sobre o surgimento do mito e sua comprovação histórica. Cf. BRAGANÇA JÚNIOR, Álvaro Alfredo. Literatura romanesca da época dos Staufer. In: SILVA, José Pereira da. (Org). Revista Philologus. Rio de Janeiro: CiFEFiL, 2005. Ano 11, nº 32, p.156-159.
4. A obra de Scharfenberg é vista por Birkhan como continuação da estruturação estrófica temática de Titurel. Cf. BIRKHAN, 2004, p. 99-100.
5. Em português, “A coroa”.
6. Para a listagem completa remetemos o leitor interessado a Birkhan, 2003, p.5.
7. Convém lembrar que elfos pertencem à mitologia germânica, diferenciando-se de duendes, de fundo celta.
8. Orange, aqui, é uma cidade do provençano Departamento de Vaucluse, cuja etimologia provém do galoromano Arausio. Cf. BIRKHAN, 2004, p. 195.
Álvaro Alfredo Bragança Júnior – Departamento de Letras Anglo-Germânicas Faculdade de Letras Programa de Pós-Graduação em História Comparada UFRJ. E-mail: alvabrag@letras.ufrj.br
BIRKHAN, Helmut. Geschichte der altdeutschen Literatur im Licht ausgewählter Texte. Wien: Edition Praesens, 2004. 296 Seiten. Band 12, Teil V: Nachklassische Romane und höfische “Novellen”. Resenha de: BRAGANÇA JÚNIOR, Álvaro Alfredo. Romances Pós-Clássicos e “Novelas” Corteses. Brathair – Revista de Estudos Celtas e Germânicos. São Luís, v.5, n.2, p. 114-116, 2005. Acessar publicação original [DR]
Uma introdução à filosofia- PAVIANI (V)
PAVIANI, Jayme. Uma introdução à filosofia. Caxias do Sul: Editora da UCS, 2014. 107 p. Resenha de: RODRIGUES, Maria Inês Tondello. Veritas, Porto Alegre, v. 60, n. 2, p. 401-404, maio-ago. 2015.
Propondo uma viagem à História da Filosofia, a obra Uma introdução à filosofia (EDUCS, 2014, 107 p.), de autoria do professor e pesquisador Jayme Paviani, evidencia a presença constante de conceitos e questões filosóficas na ciência e nas atividades humanas. Ao iniciar cada capítulo, o autor faz uma citação que se aproxima do tema a ser abordado. Num texto que trata de Filosofia, não poderiam faltar referências a pensamentos filosóficos como os de Platão, Aristóteles, Agostinho, Descartes, Kant, Hegel, Nietzsche, Heidegger, Wittgenstein, Husserl, Jauss, Habermas, Merleau-Ponty, Popper, Gadamer, Levinas, Deleuze, Foucault, entre outros.
Jayme Paviani nasceu em Flores da Cunha, em 4 de junho de 1940. Em 1951 iniciou os estudos no Seminário Nossa Senhora Aparecida em Caxias do Sul, cidade que adotou desde então. Em 1999 recebeu o título de cidadão caxiense. Licenciado em Filosofia, Bacharel em Direito e Doutor em Letras, exerce a docência há quase cinquenta anos. Foi professor na Unisinos e na PUCRS, há mais de quatro décadas atua na Universidade de Caxias do Sul, atualmente estando vinculado aos Programas de Pós- Graduação Mestrado em Filosofia e Mestrado em Educação. Escreveu mais de vinte livros relacionados à filosofia e seus pensadores; no ano de 2002 publicou o livro de crônicas O pomar e o pátio, e reuniu seis livros de poemas no volume As palavras e os dias. É autor, ainda, de inúmeros capítulos de livros, artigos e ensaios em revistas científicas.
Usando uma linguagem acessível e bastante didática, Paviani desenvolve sete capítulos, além da apresentação, todos com um foco singular e sugestivo para uma busca por aprofundamento. No primeiro capítulo, A filosofia e o filosofar: propostas pedagógicas, o professor propõe uma reflexão acerca da função e da presença da filosofia na história e na sociedade. Esclarecendo que a filosofia precisa justificar sua natureza, cita seis aproximações para pensar sobre sua origem, natureza e função: o que é a filosofia; como ter acesso à filosofia; porque, o que e para que pensamos; o que é o homem; filosofia e ciência andam juntas; e reconhecimento de si no outro.
No segundo capítulo, A história da Filosofia: o texto e sua recepção, estabelece relações entre a obra literária e a obra filosófica. Relaciona a teoria da recepção de textos, aplicada à história da literatura com o entendimento da história da Filosofia. Esclarece que uma metodologia recepcionista requer adaptações e implica em mudanças de procedimentos.
Tratando de examinar como a obra é e foi recebida, “possibilita examinar as concretizações das ideias e dos conceitos filosóficos no tempo e no espaço” (grifo do autor, p. 31). A recepção tem carência em seu método que é parcial e incompleto, exigindo outros procedimentos científicofilosóficos, por isso tem seu ponto forte na interpretação. Sugere o uso deste instrumento da recepção para experimentar o ato de filosofar, integrado nas diferentes leituras oferecidas pelos textos filosóficos.
Conhecimento e linguagem: os acessos à realidade, o terceiro capítulo inicia dizendo que “conhecimento, linguagem e realidade são conceitos, âmbitos e dimensões de um fenômeno complexo e objeto de investigação de diferentes disciplinas consolidadas na história da filosofia” (grifo do autor, p. 37). O autor cita a questão ontológica que envolve concepção metafísica e realidade, indagações do humano que questionam as dimensões do ser; a questão epistemológica que analisa o conhecimento, sua origem e desenvolvimento. Fala da dialética e da lógica e das relações entre ciências e teorias da verdade. A linguagem é condicional para o avanço dos estudos do conhecimento, por isso traz leituras e conceitos definidos por diferentes pensadores, entre eles: Humboldt e a linguística, Wittgenstein e um conjunto de atividades, Husserl e um sistema de sinais reinterpretáveis, Heidegger e a analítica existencial.
O capítulo, Ética, educação e sociedade: o elo indissolúvel, pelo próprio título demonstra no tema central sua necessidade de analisar o agir humano que exige uma postura crítica. O autor explicita as relações entre ética e moral, ética e pós-modernidade, ética e educação e a escola e a educação moral. Contudo, percebo como foco principal desse capítulo, o estudo das teorias éticas, entre elas as da tradição ocidental e as tendências das teorias contemporâneas. Resumidamente, porém de forma clara, expõe a ética das virtudes, de Platão; a ética do dever, de Kant; e a ética consequencialista, de Bentham e Mill dentro das teorias tradicionais.
Nas tendências das teorias apresenta o discurso, de Habermas e Apel; a alteridade, de Levinas e Ricoeur; a responsabilidade, de Hans Jonas; a finitude, de Heidegger; a imanência, de Deleuze e Guattari; o cuidado de si, de Foucault; a autenticidade de Charles Taylor; e a justiça de Rawls.
No quinto capítulo, A gênese da biopolítica: vida nua e estado de exceção, é estabelecida uma relação entre vida e política por meio de quatro subitens. Vida, poder e biopolítica trata da vulnerabilidade da vida e do poder exercido sobre a vida das pessoas, traz um pouco de história para mostrar que as transformações sociais não acontecem de forma rápida. Vida nua e homo sacer analisa as diferenças entre vida animal e humana refletindo sobre pensamentos e atitudes. A política como uma ética trata da rede proposta pelas relações entre filosofia, ciência, ética e política sugerindo que “a função da biopolítica é a de recolocar a vida biológica no centro dos cálculos do Estado moderno” (p. 73). O bando e o campo de concentração, diz que “a política é a passagem do viver para o viver bem” (p. 74) refletindo sobre o conceito de “bando” e usando o termo “campo” a partir da realidade dos campos de concentração nazistas. O autor nos remete a pensar sobre consciência como tarefa da filosofia e da ciência.
O artístico e o estético: dimensões entrelaçadas é o capítulo em que afirma a necessidade de relação entre os dois conceitos. Inicia com uma revisão histórica para propor pensar sobre o estético e o artístico, o estético e o ético, o artístico e o técnico, a metafísica do belo e a vivência da arte e do belo. Qual o significado de arte, de beleza, de estética, se “o próprio ser humano traz consigo um rastro de mistério” (p. 90). Sugere um pensar de forma diferente os conceitos e remete a analisar conflitos e relações entre o natural e o artístico.
Para finalizar, Filosofia e Literatura: traços comuns e diferenças, traz aproximações e distanciamentos entre os textos filosóficos e os literários.
Analisando especificamente a linguagem escrita, Paviani trata filosofia e literatura como realizações autônomas e distintas ressaltando suas especificidades. O filósofo, o escritor e o texto é o tópico que analisa as diferenças entre as formas de escrita que podem identificar o tipo de texto. Traços literários na obra filosófica e traços filosóficos na obra literária são os títulos que analisam as características de cada tipo de obra. Estilo e filosofia mostra que o escritor tem forma de escrever e de se expressar, assim a linguagem usada estabelece seu modo de pensar.
A prosa do mundo fala do livro inacabado de Merleau-Ponty; com o mesmo título, o autor “mostra que o escritor se concebe numa linguagem estabelecida” (p. 101).
Uma introdução à Filosofia é um livro bem escrito e com uma linguagem clara como é apontado pelo autor que essa forma de comunicação deve ser. Demonstra coerência entre o texto escrito e o conteúdo apresentado.
Segue uma sequência na relação que estabelece entre os conceitos fundamentais e as sistematizações do conhecimento. A obra traz, como indica o título, uma introdução ao estudo da Filosofia sem aprofundar qualquer questão. Contudo, indica as diversas possibilidades de aprofundamento sugerindo as interligações entre as formas de pensar o conhecimento. Por isso, o texto pode ser endereçado aos leitores que tenham interesse nesse saber que ganha espaço no meio educacional e na forma de pensar a pesquisa científica.
Para concluir, trago o pensamento descrito pelo professor Paviani que, para entender o saber humano é preciso estudar filosofia e para isso é necessário ler os clássicos. Com certeza, isso é fundamental. Contudo, nessa obra o autor alcançou seu objetivo, descrito na apresentação: “abrir as portas ao leitor para que ele perceba a riqueza de aspectos desse saber teórico, distinto do saber comum vizinho da ciência e da tecnologia” (p. 7). A partir de Uma introdução à Filosofia, o leitor se lançará num emaranhado de questões que lhe encaminharão a novas buscas. As portas se abriram, vamos entrar…
Maria Inês Tondello Rodrigues – Mestranda em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação, Mestrado em Educação, da Universidade de Caxias do Sul, com pesquisa na Linha de História e Filosofia da Educação. Possui Licenciatura em Pedagogia e Especialização em Educação de Jovens e Adultos – EJA, ambas pela Universidade de Caxias do Sul. Endereço postal: Programa de Pós-Graduação em Educação Universidade de Caxias do Sul Rua Francisco Getúlio Vargas, 1130 – Cidade Universitária 95070-560 Caxias do Sul, RS, Brasil.
Mittelhochdeutsche, vor – und frühhöfische Literatu | Helmut Birkhan
Atualmente, onde cada vez mais é incrementado o diálogo interdiscursivo, interdisciplinar e interepistemológico, percebe-se a necessidade de revitalização de estudos de base diacrônica, que procurem ajudar ao homem contemporâneo entender os processos e mecanismos de desenvolvimento social, no que a linguagem literária possui uma forte participação como repositório cultural. Consoante essa assertiva, pesquisadores de História, Literatura, Antropologia, Arqueologia, dentre outras ciências, devem procurar o estabelecimento de Grupos de Trabalho Integrados, os quais, com a utilização das metodologias específicas de pesquisa, contribuem para uma melhor apreensão do objeto comum em análise. Talvez, nesse momento, no campo dos estudos germânicos ligados a uma proposta de Germanística Intercultural, encontre-se na Medievística Germanística a episteme necessária que integralize uma junção de lingüistas, teóricos das literaturas germanófonas, historiadores – para apenas citar alguns profissionais – com o intuito de trazer ao homem do século XXI as riquezas do homem medieval expressas em seus textos. [1]
Um dos mais respeitados eruditos, professor catedrático da Universidade de Viena, germanista, celtólogo e medievalista, Helmut Birkhan lega-nos uma série de oito Studienbücher – livros de iniciação ao estudo universitário -, publicada pela Editora Praesens, a saber: parte I –Literatura em antigo-alto-alemão e em antigo-saxão; parte II – Literatura em médio-alto-alemão pré-palaciana e em seus primórdios corteses; parte III – Trovadorismo e poesia sentenciosa da época dos Staufer; parte IV – Literatura romanesca da época dos Staufer; parte V – Romances pós-clássicos e “novelas” corteses; parte VI – Épica heróica da época dos Staufer e no início dos Habsburgos; parte VII – Trovadorismo, poesia sentenciosa e contos versificados da última fase dos Staufer e dos primeiros Habsburgos.[2] Pelo exposto através dos títulos, Birkhan pretende fornecer aos estudantes de Germanística manuais de iniciação à literatura medieval em alemão, conjugando a isso em sua obra elementos de ordem histórica, em nosso ver indispensáveis para uma melhor compreensão da época estudada.
O texto é dividido em capítulos, que sempre são precedidos de uma contextualização histórica sobre as dinastias, de onde as obras são provenientes, i.e., os sálios (p.8-14) e os Staufer (p.130-135). Posteriormente têm-se comentários elementares sobre os principais textos, de ordem religiosa no tocante aos sálios (p.18-109) e acerca das duas obras consideradas como “literatura histórica”, (p.109). Ao apresentar a primeira delas, a Canção de Anno, Birkhan demonstra quão indispensável é a união entre discurso literário e contexto histórico no mundo medieval:
“A Canção de Anno é a primeira epopéia contemporânea em língua alemã. Ela reúne história da humanidade, história cristã da salvação e história mundial com uma apresentação tipológica da vida do bispo Anno de Colônia.”(p.109)
Ao tratar da segunda, a Crônica dos Imperadores, (p.117-129) o estudioso austríaco discorre sobre as características da obra, desde a transmissão do texto, com dados sobre o compilador ou autor da obra, tece comentários sobre a datação da mesma e sobre as fontes para a sua composição com alguns excertos textuais.
Se durante o período dos Sálios há a predominância de uma literatura religiosa, vêse, por outro lado, o início da afirmação de um tipo de escrita, que se centra nas práticas e costumes, no modus vivendi e modus cogitandi dos bellatores. Canções, Lieder, que descrevem heróis da Antigüidade e suas façanhas, Alexandre, Rolando, temas que lidam com o Oriente, Flôre e Blanscheflûr, assim como as épicas trovadorescas Duque Ernesto e Rei Rother e epopéias trovadorescas lendárias [3], Oswalt, Orendel e Salomão e Markolf, configuram esta nova arte da palavra, que tem na corte seu modelo.
Como por nós mencionado em resenha previamente feita [4], Birkhan não se preocupa com uma introdução ao seu texto, mas sim arrola a bibliografia por ele analisada. Já que os fragmentos textuais estão em médio-alto-alemão, estágio segundo do desenvolvimento do idioma alemão, não há a versão para o Neuhochdeutsch, o que demonstra a natureza da obra voltada para alunos e estudiosos nativos. Entretanto, por considerarmos o trabalho meritório, ficaria aqui uma sugestão para a preparação de um glossário com os principais termos do médio-alto-alemão em alemão moderno, à guisa de facilitação para o pesquisador estrangeiro.
No que diz respeito à organização do volume, nota-se a observância ao aspecto cronológico, que leva o leitor a relacionar mais seguramente o mundo das idéias e o mundo dos homens em mudança nos séculos XI e XII.
Preocupações com o conteúdo (p.42 et alii) e com a paráfrase de excertos originais (p.39-40 et alii) perpassam a obra, com o intuito de fornecer as informações lingüísticas, estilísticas e literárias básicas sobre os textos. No entanto, os Anexos merecem comentário à parte.
De significativa importância para a visualização das informações transmitidas, os Anexos colocam à disposição mapas lingüísticos, excertos de manuscritos, documentos e testemunhos em runas e língua alemã. Uma genealogia dos otônidas, sálios e Staufer, além de um gráfico sobre os romances alexandrinos medievais em alemão, latim e francês completam o quadro, que une Iconografia, Arqueologia, Língua e Literatura a partir do mundo germânico pagão até à época abarcada no volume.
Neste volume há uma presença ínfima de textos em língua latina, o que corroboraria o vernáculo como língua de prestígio dentro do fazer artístico no Sacro Império. Como o título da série prende-se à Geschichte der altdeutschen Literatur im Licht ausgewählter Texte, História da antiga literatura em alemão à luz de textos escolhidos, tal seleção nos induz à pergunta, não formulada na Parte I: quais os critérios para selecionar e indexar determinados textos em detrimento de outros? Cremos que o cânon, aliado à experiência docente do pesquisador, tenha sido os fatores decisivos para a escolha. Somos, outrossim, de opinião que o autor deveria discorrer a respeito em uma reedição da obra.
Por fim, Mittelhochdeutsche, vor- und frühhöfische Literatur, volume II da série supra citada, apesar da linguagem mais simples, é extremamente útil, organizada com precisão e muito bem fundamentada, prestando à Medievística Germanística uma valiosa ajuda para tornar contemporâneo o medievo germanófono, daí ser para nós indispensáveis as palavras anônimas
Quidquid homo nescit, vix discit, quando senescit.
O que o homem desconhece, dificilmente aprende quando envelhece!
Notas
1. Cf. BRAGANÇA JÚNIOR, Álvaro Alfredo.Resenha de BIRKHAN, Helmut.Geschichte der altdeutschen Literatur im Licht ausgewählter Texte. Wien: Edition Praesens, 2002. 217 Seiten. Teil I: Althochdeutsche und altsächsische Literatur.. In: KESTLER, IZABELA (Org.) Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2005. Volume IX (no prelo).
2. A parte VIII ainda não foi publicada.
3. Epos, no original, equivalendo à epopéia clássica, ao narrar a história de um herói ou coletividade
4. Cf. nota ii.
Álvaro Alfredo Bragança Júnior – Departamento de Letras Anglo-Germânicas Faculdade de Letras Programa de Pós-Graduação em História Comparada UFRJ. E-mail: alvabrag@letras.ufrj.br
BIRKHAN, Helmut. Geschichte der altdeutschen Literatur im Licht ausgewählter Texte. Wien: Edition Praesens, 2002. 217 Seiten. Band 7, Teil II: Mittelhochdeutsche, vor – und frühhöfische Literatu. Resenha de: BRAGANÇA JÚNIOR, Álvaro Alfredo. Brathair – Revista de Estudos Celtas e Germânicos. São Luís, v.5, n.1, p. 141-143, 2005. Acessar publicação original [DR]
Curso de literatura inglesa | Jorge Luís Borges
Originário de aulas ministradas na Universidade de Buenos Aires durante a década de 1960 [1], o livro ainda mantém um interesse vivo pelas valiosas conclusões que Borges sugere de seus conhecimentos em fontes manuscritas e impressas de línguas germânicas. Os sete primeiros capítulos – ou aulas – referem-se aos períodos da Antigüidade e Idade Média. Neles, o professor explicita sobre as técnicas poéticas, as características e os princípios da literatura dos antigos saxões e dos escandinavos. Também demonstra em suas aulas que o panorama político europeu, especialmente da Inglaterra, foi muito favorecido pelas invasões nórdicas. É justamente neste aspecto que Borges revela muito mais que uma simples admiração por estes povos, identificando as personagens com um passado glorioso e heróico: “Os Vikings talvez tenham sido a gente mais extraordinária entre os germanos da Idade Média. Foram os melhores navegantes da sua época (…) à maneira de muitos escandinavos cultos, não era apenas guerreiro mas, além disso, era poeta” (p. 22).
Simplificadores do moderno idioma inglês, os antigos escandinavos possibilitaram a consolidação do futuro império britânico, segundo as mesmas idéias de Borges (pp.100-102).[2] Essa visão heróica e gloriosa dos bárbaros pode ser percebida pelo espaço concedido à análise dos épicos anglo-saxões, como Beowulf e das sagas islandesas. Para o escritor, o período em que viveram estes aventureiros não era simplesmente uma época de desordem e caos, mas um momento extremamente propício para a formação de estruturas literárias complexas: “uma época bárbara mas que propendia à cultura, que gostava da cultura”(p.20). Assim, podemos incluir os estudos teóricos de Borges como a culminação de um processo de recuperação da imagem do bárbaro que teve início no século XVIII e que foi essencialmente centrada na literatura.
Ao contrário do Renascimento e sua revalorização da cultura clássica, o Setecentos foi marcado pelo ressurgimento dos estudos da literatura dos povos da Europa Setentrional, especialmente os de origem Celta e Germânica [3]. Manuscritos foram traduzidos e publicados nas línguas modernas, obras teóricas surgiram, novos poemas e narrativas foram criadas ao estilo das arcaicas. Esta adaptação e reinterpretação literária esteve atrelada à concepções de fundo nacionalista, tão em voga na época. Os intelectuais, na realidade, estavam preocupados em resgatar valores tais como identidade social e demarcar as origens do que eles então definiam como sendo suas nações. A literatura servia diretamente tanto como marco simbólico desta consciência nacional, como um instrumento de propaganda dos valores antigos que deveriam ser resgatados.
Um caso especialmente estudado por Borges diz respeito ao Ciclo Ossiânico [4]. Durante o século XVIII, a Escócia procurou criar uma identidade diferenciada da Inglaterra (de origem histórica anglo-saxônica), mas que o mesmo fosse alternativa ao passado Celta comum aos irlandeses. James Macpherson [5] foi incumbido de recolher lendas na Escócia, de origem irlandesa mas que foram alteradas e sintetizadas para que sua região tivesse uma identidade nacional própria. O resultado foi a obra Fingal: Ancient Epic Poem in Six Books (1762), que fez grande sucesso em toda a Europa pré romântica. [6] O Ciclo Ossiânico também conhecido como Ciclo de Finn apresenta narrativas supostamente ambientadas no século III d.C. O ciclo de narrativas traz longas composições muito populares entre as gentes simples da Irlanda durante a Idade Média. Essas narrativas de cunho popular em muito se assemelham as narrativas do Ciclo Arturiano ou Bretão [7] compostas a partir do século XII principalmente na França. Esses dois ciclos de narrativas mais se aproximam do que se distanciam pois, além do caráter popular e folclórico de suas narrativas têm em comum as aventuras de suas personagens. Os Fiannas são considerados uma espécie de guarda de elite do grande rei da Irlanda. Entre as suas tarefas estão o recolhimento de impostos e a proteção dos mais fracos. As incumbências dos Fiannas são praticamente as mesmas dos Cavaleiros do Távola Redonda, fiéis servidores do rei Artur. Muitas das aventuras narradas no Ciclo Ossiânico podem ser comparadas com as do Ciclo Arturiano. Acreditamos que a semelhança narrativa mais próxima seja uma aventura vivida pelo próprio Finn, na aventura amorosa intitulada Diarmaid e Grinné. Grinné é uma jovem que vai ser entregue como concubina para o rei Finn mas ela se apaixona por Diarmaid, jovem cavaleiro e fiel servidor de Finn. Sabendo da paixão dos jovens o rei Finn finge que desistiu de manter a jovem como concubina, mas durante uma caçada ele constrói uma armadilha para que Diarmaid morra. Ao perceber a trama de morte inevitável Grinné não consegue avisar seu amado e, ao vê-lo morto deixa-se morrer ao seu lado. Essa “aventura” é o arquétipo da mais conhecida narrativa do Ciclo Arturiano, Tristão e Isolda, onde os jovens incapazes de concretizarem seu amor em vida se deixam morrer para que o sentimento sobreviva após a morte e possa se consumar. O tema do amor que só é possível se concretizar após a morte sempre trágica ou violenta dos amantes é recorrente na literatura ocidental desde a Antigüidade e para os românticos foi um tema profícuo, não só pelo fascínio que ele exercia e que foi representado tanto na prosa como na poesia dos autores dessa escola literária, mas que inspirou também pintores e escultores que representaram com beleza as malezas arquitetadas por Eros e Tanatos.
A narrativa de Tristão e Isolda que tem a sua matriz em Diamaid e Grinné teve desde o século XII muitas versões. No século XII Béroul e Thomás de Inglaterra compuseram duas das mais conhecidas e estudadas versões, Gottfried de Estrasburgo no século XIII compôs uma versão mesclando elementos da cultura celta com a cultura germânica e que no século XIX serviu de inspiração para Richard Wagner compor a sua versão da tragédia dos amantes. E, por fim no século XIX, Joseph Bédier, filólogo francês estabeleceu uma versão onde mescla elementos das três narrativas medievais mas que se iguala em beleza e elementos fundamentais para se estudar a força do mito do amor eterno que sobrevive após a morte.
O amor dos jovens Diarmaid e Grinné e Tristão e Isolda é um sentimento puro, que se encontra em seu estado “natural”, ele ainda não foi corrompido por convenções sociais, podemos dizer que, grosso modo, esse sentimento é algo sentido apenas por bárbaros, pessoas que não receberam o refinamento social devido e é por essa mesma razão que os românticos – tanto escritores como pintores – tão avessos às convenções vão eleger o “amor bárbarico” como um dos principais temas de suas obras, representando assim toda a sua rebeldia e insatisfação com as leis, padrões e moldes sócio- culturais vigentes. [8]
Além deste caráter puramente estético, no século XIX a imagem do bárbaro foi reforçada como incentivo nacionalista, mas desta vez com cada região tendo os seus próprios mitos literários. Os países da Escandinávia utilizaram seu patrimônio cultural dentro de especificidades regionais, onde os sentimentos patrióticos incorporaram elementos da literatura, história e mitologia dos tempos pagãos. Especialmente o historiador e poeta Erik Geijer no livro Svenka folkets historia (História dos povos suecos, 1836) utilizou a sociedade dos antigos nórdicos como um modelo social perfeito, onde a harmonia do povo e de seus líderes foi quebrada pela chegado do cristianismo e do feudalismo.[9] O “espírito” dos tempos passados era refletido na arte decorativa, no interior das casas e dos edifícios, nos jornais, na vida cotidiana e nas idéias políticas, sempre em consonância com o progresso tecnológico e social dos tempos modernos.[10] A poesia e a literatura romântica da Escandinávia refletiam diretamente os mitos nórdicos com ideologias políticas do presente. Obras literárias como a famosa Frithiofs Saga (1825) de Esaias Tegner, apesar de conter heróis medievais, possuem comportamentos e valores condizentes com a realidade histórica vivida pela Suécia do Oitocentos.
Concedendo especificidade ao contexto inglês, Borges examinou em suas aulas um conjunto de artistas que resgataram a imagem bárbara durante o final do século XIX, a Irmandade Pré-Rafaelita. [11 ]Os temas preferidos do grupo eram a mitologia arturiana, temas medievais e escandinavos. Os principais escritores pré-rafaelitas que Borges analisou foram Dante Gabriel Rosseti [12] e William Morris [13]. Rosseti foi um dos fundadores do movimento e peça fundamental para entender a principal ideologia artística reinante na época vitoriana. Segundo Borges, a valorização de temas medievais visava essencialmente a busca da nobreza no passado. Em uma época onde a tecnologia, o urbanismo e a industrialização tomavam grande vulto na Inglaterra, os artistas voltam-se para a busca do belo – idealizada nas figuras femininas de Isolda, Guinevere e Morgana – e no herói, principalmente no rei Artur, Tristão e Lancelot. Tanto estas figuras femininas quanto masculinas pertencem ao ciclo arturiano, um conjunto de narrativas de origem Celta, que foram mescladas aos princípios cristãos do comportamento cavalheiresco da Idade Média, como já vimos. Com isto, temos duas formas básicas da imagem do bárbaro realizada pelos artistas pré-rafaelitas: de um lado, o bárbaro (herói pagão), que é resgatado em sua forma pura, de um ponto de vista estético e histórico.[14] De outro lado, o herói pagão que foi cristianizado e moldado pelo cavalheirismo medieval, principalmente na forma dos personagens arturianos.
Um dos principais idealizadores do herói pagão foi o poeta William Morris. Além de tradutor de várias Sagas e epopéias escandinavas, o artista escreveu poemas narrativos resgatando o que Borges denomina de “consciência do germânico” dentro da História e arte inglesa.[15] Em um deles, The Earthly Paradise (1870), a mitologia nórdica é apontada diretamente como elemento nostálgico e nobiliárquico da sociedade inglesa: “Oh Breton, and thou Northman, by this horn/Remember me, who am of Odin’s blood”.[16] Ou seja, aqui o narrador apresenta o rei inglês como descendente direto do deus Odin, o principal do panteão germânico. Um resgate literário dos valores simbólicos das antigas sociedades, em plena Inglaterra vitoriana. Em outra obra, Sigurd the Volsung (1876), a importância do herói pagão de origem escandinava foi ainda mais acentuada. Baseado em manuscrito islandês homônimo, este poema épico enfatizava a tragédia, a derradeira morte do principal personagem. Esta característica essencialmente romântica, também seria muito comum ao movimento pré-rafaelita com a predileção iconográfica dos artistas pelas narrativas trágicas de Tristão e Isolda [17] e da morte de Artur.[18] Mas não podemos nos esquecer que os próprios deuses germânicos também eram essencialmente trágicos, pois ao contrário da mitologia clássica (onde todas as divindades são imortais), eles teriam um final, durante a batalha de Ragnarök. Explicando a existência de telas como Odin (1870) e Freyr (1870), por Edward BurneJones,[19] onde as duas divindades apresentam um olhar melancólico, ambas olhando para baixo e numa atmosfera de extrema tristeza. Outro momento trágico resgatado por este movimento artístico é o funeral, que surge ao final do poema Sigurd, de Morris (com a morte do herói e o suicídio de Brunhilde na pira funerária) e na famosa tela de Francis Dicksee, Funeral of a Viking (1893).
A imagem literária do homem e também da mulher bárbara que foi construída durante os séculos seja na literatura como nas artes plásticas, em muitos momentos não foi uma imagem negativa, mas procurou exaltar determinadas virtudes que para os jovens idealistas românticos estavam um tanto esquecidas. Ao nos expor com maestria e bom humor aspectos tanto da literatura inglesa como da efervescência cultural que foram os séculos XVIII e XIX na Inglaterra, Borges nos oferece também novas perspectivas de análises de fontes importantes não só para uma maior compreensão das letras, mas das representações de figuras que ainda hoje povoam nosso imaginário e nos encantam!
Ao apresentar suas aulas durante um período conturbado da história latino-americana, Borges não ensinou apenas nomes, autores e características literárias, ele concedeu aos seus alunos uma aproximação com a literatura germânica – e repete o feito com os seus leitores de hoje – de se encantarem com a beleza das letras compostas em um momento especial, onde resgatar a imagem e o espírito dos bárbaros não era somente uma fonte de inspiração e um modelo estético mas sim uma admiração pelo espírito de liberdade e de criatividade.
Notas
1 O livro foi organizado por Martín Arias e Martín Hadis, através de transcrições das aulas ministradas por Borges na Universidade de Buenos Aires.
2 Muito da imagem que o teórico transmite em suas aulas na década de 1960 provinha do cinema: “E eles, enquanto isso, vêem como os vikings vão desembarcando. Podemos imaginar os vikings com seus elmos ornamentados com chifres, ver chegar aquela gente toda” (p. 60). Essa representação dos guerreiros nórdicos portando chifres com ornamentos córneos surgiu durante o início do Oitocentos, produto de uma arte romântica e nacionalista, promovendo o resgate viril e poderoso dos Vikings. Posteriormente, essa fantasia popularizou-se nas histórias em quadrinhos, literatura e cinema. Conf. LANGER, Johnni. The origins of the imaginary Viking. Viking Heritage Magazine, University of Gotland/Centre for Baltic Studies, Visby (Sweden), n. 4, 2002. Borges deve ter estruturado este estereótipo em filmes como Príncipe Valente (1954) e romances populares, dos quais cita The Long Ships (do original Röde Orm, 1945, versão inglesa da década de 1950).
3 Designamos literatura de origem Celta toda produção literária originada do folclore ou tradição oral e transcrita após o século VIII em países como a Irlanda (Celtas irlandeses), Escócia (Pictos e Escotos), País de Gales, Bretanha inglesa e francesa (Bretões) e França (Gauleses). A de origem germânica refere-se aos países escandinavos e Islândia (Vikings), Alemanha (Germanos antigos) e Inglaterra (Anglosaxões). Borges realizou um estudo clássico sobre literatura germânica: BORGES, Jorge Luís & VAZQUES, Maria E. Literaturas germanicas medievales. Buenos Aires: Falbo Librero, 1965.
4 “Le Cycle de Finn, ou Cycle Ossianique, est le cycle consacré à la province du Leinster. Mais il déborde de loin les frontières de ce petit état et se retrouve, très florissant, dans l’Écosse tout entière. C’est le Cycle de Finn, transmis par la tradition orale depuis de siècles, que Mac Pherson a connu et quíl a répandu dans toute l’Europe. Car Fingal n’est autre que le nom romantique de Finn et Ossian celui de Oisin (= le Faon). Finn est le roi. Mais à la différence de Conchobar, il n’exerce pas une autorité légale sur l’Irlande ou sur une troupe de véritables nomades, de guerriers errants, qui sont passés à la posterité sous le non de Fianna (Fenians). Ces Fianna ont vraisemblament eu une existence historique, au temps du roi suprême Cormac Mac Airt, c’est-à-dire à la fin du IIe. Siècle de notre ère. Ils constituaient une sorte d’État dans l’État, et ils furent souvent en froid, nom seulement avec le roi suprême mais aussi avec les différents rois de provinces ou de tribus sur le territoire desquels ils exerçaient leurs talents”. MARKALE, Jean. L’épopée celtique d’Irlande. Paris: Payot, 1993, p. 159.
5 “James Macpherson nasceu nas Highlands da Escócia, nas Terras Altas da Escócia, nas serras da Escócia, no ano de 1736, e morre em 1796. (…) Macpherson nasce e se cria num lugar agreste ao norte da Escócia, onde ainda se falava um idioma gaélico, isto é, um idioma celta, afim, naturalmente, ao galês, ao irlandês e à língua bretã levada à Bretanha – antes chamada Armórica – pelos bretões que se refugiaram das invasões saxãs do século V” (Borges, 2002: 157-8).
6 “Como Macpherson não queria que os personagens fossem irlandeses, fez de Fingal, pai de Ossian, rei de Morgen, que era a costa setentrional e ocidental da Escócia (…) Macpherson foi acusado de falsário (…) Atualmente, não nos interessa se o poema é ou não é apócrifo, mas o fato de que nele já está prefigurado o movimento romântico” (Borges, 2002: 166). Uma das pinturas mais famosas inspiradas na obra de Macpherson é Ossian na margem do Lora invocando os deuses ao som de uma harpa, de Grançois Gérard (sem data). Nesta composição, temos os elementos chaves do romantismo europeu: atmosfera de mistério e horror, elementos ruinísticos, atmosfera onírica, e é claro, os elementos advindos da mitologia Celta. Conforme: WOLF, Norbert. A pintura da era romântica. Lisboa: Taschen, 1999.
7 “O Ciclo Bretão, no qual se destacam os feitos do rei Artur e dos Cavaleiros da Távola Redonda, as aventuras de Galvain, Lancelot, Tristão e Isolda, Parcifal e a Demanda do Santo Graal, tem origem céltica. Na História Britonum, de Nennius, obscuro historiador latino do século VIII, Artur aparece como herói dos celtas britânicos contra os invasores anglo-saxões. As versões autenticamente célticas da lenda estão no Mabinogion, coleção de narrações na língua do País de Gales; aqui a figura de Artur e dos Cavaleiros já perdeu todo o caráter histórico, achando-se inteiramente transformados pela vivíssima imaginação céltica, nutrida de lendas de feiticeiros, fadas, florestas encantadas, castelos misteriosos, espectros. O Mabinogion na sua forma atual, foi redigido só no século XIV; os seus heróis célticos já têm a feição de cavaleiros franco-normandos. Para o mundo não céltico, a mesma transformação foi operada pelo ‘historiador’ Geoffrey of Mommouth, cuja fantástica História Regum Britanniae que foi escrita entre 1135 e1138; parece que Geoffrey pretendeu criar, intencionalmente, um pendant inglês da geste francesa. O último retoque, enfim, foi de natureza religiosa. Deu-se sentido cristão a certos episódios do ciclo, e como episódio final apareceu, em vez da viagem do rei Artur para a ilha de Avalon, paraíso dos celtas, a Demanda do Santo Graal e a transformação da Távola Redonda de grupo de cavaleiros aventurosos em irmandade de cavaleiros místicos”. CARPEUAUX, Otto Maria. História da Literatura Ocidental. Volume I Rio de Janeiro: Alhambra, 1978, 2ª edição, p. 140.
8 LE BRIS, Michel. Barbares romantiques, Norsemen et Saxons. In: GLOT, Claudine & LE BRIS, Michel (orgs.). L’Europe des Vikings. Paris: Éditions Hoëbeke, 2004, p. 162-165. Na literatura francesa do século XIX, o Viking torna-se o herói romântico perfeito: aventureiro, sem nenhum temor, feroz, galante e essencialmente, livre. “Un personnage, dont le nom est déjà intervenu plusieurs fois, rassemble ce que le XIXe siècle a voulu mettre, en ce sens, sous le mot viking: c’est celui du roi de mer. L’expression seule suffisait déjà à déchaîner imaginations et passions: iéal aristocratique mêlé à tous les parfums de l’aventure, lois de l’héroïsme et de la brutalité (…) Le Viking, c’est l’homme libre”. BOYER, Régis. Le mythe Viking dans les lettres françaises. Paris: Editions du Porte-Glaive, 1986, p. 83-103.
9 LÖNNROTH, Lars. The Vikings in History and legend. In: SAWYER, Peter. The Oxford illustrated history of the Vikings. London: Oxford University Press, 1999, p. 238.
10 Além disso, cada país escandinavo resgatou a memória dos tempos Vikings dentro de um referencial próprio, condizente com a realidade política então vigente (p.ex., a Suécia de 1814 a 1905 foi unida com a Noruega, ao mesmo tempo em que mantinha uma grande rivalidade com a Dinamarca).
11 Em inglês Pre-Raphaelite Brotherhood, grupo de artistas britânicos fundado em 1848 e dissolvido cerca do ano 1853. Movimento de reação ao convencionalismo da arte vitoriana, que buscava através da inspiração literária e simbólica, mitológica ou bíblica, restituir à pintura a pureza alcançada antes de Rafael, ou seja, no século XV. Seus representantes mais famosos foram Dante Gabriel Rosseti, W. H. Hunt, J. E. Millais, F. Brown, E. Burne-Jones e William Morris. O pintor brasileiro Eliseu Visconti chegou a ser influenciado pelo movimento. Conf. Grande Enciclopédia Larousse Cultural. São Paulo: Nova Cultural, 1998, vol. 19, p. 4772. A Irmandade Pré-Rafaelita fundou uma revista chamada The Germ (O Germe) para divulgar suas idéias, pinturas e poesias. BORGES, op. cit., p. 284. Para uma crítica estética deste movimento artístico ver: GOMBRICH, Ernest H. A história da arte. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1979, p. 404. Para o teórico Arnold Hauser, os pressupostos do pré-rafaelismo residiam em seu caráter poético/literário, espiritualista, histórico e simbólico: “(…) são idealistas, moralistas e eróticos envergonhados, como a grande maioria dos vitorianos (…) une um realismo que encontra expressão num deleite em ínfimos detalhes, na reprodução prazenteira de cada folha de grama e de cada prega de saia (…) exageram os sinais de perícia técnica, talento imitativo e perfeito acabamento”. HAUSER, Arnold. História social da arte e da literatura. São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 840-842.
12 Dante Gabriel Rosseti: pintor, desenhista e poeta inglês (Londres, 1828 – Kent, 1882). Filho do escritor napolitano Gabriele Rossetti, exilado por suas opiniões políticas. Foi um dos fundadores da confraria prérafaelita. Seus quadros (Ecce ancilla Domini, 1850; O sonho de Dante, 1871) e poesias (A moça eleita, 1850) inspiram-se em lendas medievais e temas da poesia primitiva inglesa e italiana. Grande Enciclopédia Larousse Cultural. São Paulo: Nova Cultural, 1998, vol. 21, p. 5137.
13 William Morris: poeta, artista e ativista político inglês (Essex, 1834 – Hammersmith, 1896). Inovador da estamparia e xilogravura. Escreveu poesias narrativas como The Life and Death of Jason (1867) e The Earthly Paradise (1868), poemas pós-românticos, medievalistas. Traduziu a Eneida (1876) e a Odisséia (1887) e interessou-se pelas literaturas escandinavas. Grande Enciclopédia Larousse Cultural. São Paulo: Nova Cultural, 1998, vol. 17, p. 4090.
14 O herói pagão sobreviveu na literatura arturiana sob a forma do mago Merlin, um druida (sacerdote dos Celtas) que ainda mantinha seus poderes sob o surgimento do cristianismo. Este personagem arturiano também recebeu diversas representações pelos pré-rafaelitas durante o Oitocentos: O engodo de Merlin (1874), de Edward Burne-Jones; Merlin e Nimue (1870), de Gabriel Rossetti. Também as representações de feiticeiras, fadas e druidas fizeram sucesso na arte vitoriana: Morgan Le Fay (1864), de A. Sandys; Os druidas trazendo o azevinho (1890), de George Henry e A. Horned.
15 Segundo Borges, a literatura inglesa havia esquecido suas raízes germânicas. Foi com o romantismo que essa vertente foi redescoberta, algo impensável com Shakespeare e totalmente consciente no caso de William Morris e os pré-rafaelitas. BORGES, op. cit., p. 356-357.
16 “Ó bretão, e tu Normando, por este chifre/Lembre-se de mim, que sou do sangue de Odin”. Texto original retirado de BORGES, 2002: 359.
17 A personagem Isolda foi muito representada pelos pré-rafaelitas, especialmente Burne-Jones, Rosseti, Morris e Francis Dicksee. A imagem de Isolda resgata muitos dos valores da mulher pagã, em meio à sociedade cristã das primeiras versões literárias. O seu amor impossível com Tristão inspirou o romance de Shakespeare, Romeu e Julieta. Contemplação, redenção e tragédia tornaram-se as características essenciais do movimento pré-rafaelita. Sobre o tema ver: CAMPOS, Luciana de. Uma leitura de Tristão e Isolda à luz da crítica feminina. Brathair 1 (2), 2001: 11-18 (www.brathair.cjb.net); CAMPOS, Luciana de. Em busca da bela dos cabelos de ouro: um estudo da representação da mulher/rainha Celta em Tristão e Isolda de Béroul. Tese de doutorado em Teoria Literária (Linha de pesquisa: História, Cultura e Literatura). Unesp/São José do Rio Preto, 2005.
18 Praticamente em todo o movimento pré-rafaelita, o rei Artur é quase sempre representado morrendo ou já morto na ilha de Avalon: L’morte d’Artur (1860) de James Archer – as rainhas choram ao lado de seu corpo próximo à praia; O rei Artur em Avalon (1894) de Edward Burne-Jones – o corpo do trágico rei repousa sobre uma ilha da costa da Bretanha, velado por nove rainhas. Para uma discussão historiográfica acerca de fontes literárias arturianas, consultar: ZIERER, Adriana. Artur: de guerreiro a rei cristão nas fontes medievais latinas e célticas. Brathair 2 (1), 2002: 45-61 (www.brathair.cjb.net).
19 Sir Edward Burne-Jones: pintor e desenhista inglês (Birmighan 1833 – Londres 1898). Aluno de Rosseti, uma das figuras marcantes do pré-rafaelismo; sua obra mistura mitologia antiga, lendas medievais e a religião cristã. Grande Enciclopédia Larousse Cultural. São Paulo: Nova Cultural, 1998, vol. 5, p. 996.
Referências
BORGES, Jorge Luís & VAZQUES, Maria E. Literaturas germanicas medievales. Buenos Aires: Falbo Librero, 1965.
BOYER, Régis. Le mythe Viking dans les lettres françaises. Paris: Editions du Porte-Glaive, 1986.
CAMPOS, Luciana. Uma leitura de Tristão e Isolda à luz da crítica feminina. Brathair 1 (2), 2001: 11-18 (www.brathair.cjb.net).
_____ Em busca da bela dos cabelos de ouro: um estudo da representação da mulher/rainha Celta em Tristão e Isolda de Béroul. Tese de doutorado em Teoria Literária (Linha de pesquisa: História, Cultura e Literatura). Unesp/São José do Rio Preto, 2005.
CARPEAUX, Otto Maria. História da Literatura Ocidental. Volume I. Rio de Janeiro: Alhambra, 1978, 2 ª edição.
DABEZIES, André. Mitos primitivos a mitos literários. In: BRUNNEL, Pierre (org.). Dicionário de mitos literários. Rio de Janeiro: Zahar, 1997.
GOMBRICH, Ernest H. A história da arte. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1979.
HAUSER, Arnold. História social da arte e da literatura. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
LANGER, Johnni. The origins of the imaginary Viking. Viking Heritage Magazine, University of Gotland/Centre for Baltic Studies, Visby (Sweden), n. 4, 2002.
_____ Rêver son passé. In: GLOT, Claudine & LE BRIS, Michel (orgs.). L’Europe des Vikings. Paris: Éditions Hoëbeke, 2004.
LE BRIS, Michel. Barbares romantiques, Norsemen et Saxons. In: GLOT, Claudine & LE BRIS, Michel (orgs.). L’Europe des Vikings. Paris: Éditions Hoëbeke, 2004.
LÖNNROTH, Lars. The Vikings in History and legend. In: SAWYER, Peter. The Oxford illustrated history of the Vikings. London: Oxford University Press, 1999.
MARKALE, Jean. L’époppé celtique d’Irlande. Paris: Payot, 1993.
WAWN, Andrew. The Vikings and the victorians: inventing the Old North in 19Th-Century Britain. London: D.S. Brewer, 2002.
WOLF, Norbert. A pintura da era romântica. Lisboa: Taschen, 1999.
ZIERER, Adriana. Artur: de guerreiro a rei cristão nas fontes medievais latinas e célticas. Brathair 2 (1), 2002: 45-61. (www.brathair.cjb.net)
Johnni Langer – Professor da UNICS, PR. E-mail: Johnnilanger@yahoo.com.br
Luciana de Campos – Professora Mestre. Doutoranda em Letras/UNESP. E-mail: fadacelta@yahoo.com.br
BORGES, Jorge Luís. Curso de literatura inglesa. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. Resenha de: LANGER, Johnni; CAMPOS, Luciana de. Brathair – Revista de Estudos Celtas e Germânicos. São Luís, v.5, n.1, p. 144-150, 2005. Acessar publicação original [DR]
Introdução às Relações Internacionais: temas, atores e visões | Cristina Soreanu Pecequilo
O número de cursos de Relações Internacionais no Brasil, tanto de graduação quanto de pós-graduação, cresceu rapidamente nos últimos anos. A ampliação da área acadêmica das Relações Internacionais do Brasil reflete a necessidade de formar profissionais habilitados a lidar com questões internacionais, uma demanda tanto da iniciativa privada quanto de órgãos públicos nas mais diversas esferas. Entretanto, como em qualquer área que cresce rapidamente, existem muitos desequilíbrios e carências, verificados principalmente no ensino de graduação em Relações Internacionais.
O livro da Profª Cristina Pecequilo dedica-se a fazer uma introdução às Relações Internacionais, partindo de experiências concretas de ensino e pesquisa na área, durante as quais a autora se deparou, por parte de alunos e professores, com um grande conjunto de dúvidas e dificuldades. Tal conjunto era composto de indagações que englobavam temas como o ponto de partida do estudo das Relações Internacionais, as questões sobre o exercício da profissão e a bibliografia adequada para o ensino. Do ponto de vista teórico, a autora busca mapear os principais conceitos, fundamentos e teorias das Relações Internacionais, indicando as várias possibilidades analíticas de interpretação. Leia Mais
Fundamentos da Prospecção Mineral – PEREIRA (RBG)
PEREIRA, Ronaldo Mello. Fundamentos da Prospecção Mineral. [Sn.]? Editora Interciência, 2003. 168p. Resenha de: JOST, Hardy. Revista Brasileira de Geociencias, v 34, n.1, p.157, 2004.
Hardy Jost – Co-Editor da RBG.
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History Fair Workbook: A Manual for Teachers, Students and Parents – KOSTY (CSS)
KOSTY, Carlita. History Fair Workbook: A Manual for Teachers, Students and Parents. Lanham, Maryland and Oxford: Scarecrow Press, Inc. 2002.171p. Resenha de: SENGER, E. Canadian Social Studies, v.39, n.1, p., 2004.
This is a book about studying and delivering information about history. It guides parents, teachers and students through the fascinating and engaging process of developing a meaningful topic, proceeding through logical steps of research, and compiling the historical information into a format that will excite and interest students, and others who become involved in the project. While the book is based upon a program called National History Day that was developed by the University of Maryland at College Park, many features of it can be adapted to a regular Social Studies or History classroom at virtually any level.
For those American teachers who choose to follow the History Fair process from their local level to possibly regional and national levels, this text provides a clear and useful framework. The History Fair Project has been running for years, and Kosty provides seven years worth of past and upcoming themes: 2002 Revolution, Reaction and Reform in History
2003 Rights and Responsibilities in History
2004 Exploration, Encounter and Exchange in History
2005 Communication in History: The Key to Understanding
2006 Taking a Stand in History: People, Places, Ideas
2007 Triumph and Tragedy in History
2008 The Individual in History (p. 17).
Used in conjunction with the History Fair Project these themes furnish a solid basis from which to build the students’ projects and focus their research. For teachers who do not wish to participate in the competitions, these themes could supply a focus for a unit or a whole program.
Through the use of samples, blackline masters and suggested resources in this book, any Social Studies teacher could enhance the delivery of her or his curriculum and engage students more fully in their learning. For example, online contact information is given for the official National History Day organization at www.nationalhistoryday.org. The Annual Curriculum Book and National History Day Rule Book are both available at this website and give easy access for teachers, parents and students.
The subtitle of the book is A Manual for Teachers, Students and Parents and specific sections are directed at each of these groups. A large focus seems to be empowering students to take more control of their own learning; as Kosty puts it The goal is to encourage, not discourage (p. 15). This is clearly sound pedagogical theory and practice, and the ideas, samples and classroom ready materials found in this book will make learning about history more enjoyable and meaningful for everyone involved. By clearly laying out how parents and teachers can help their kids, and how the students can help themselves, Kosty reinforces the goal of encouraging everyone to learn.
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History Fair Workbook is a valuable tool for teachers. In addition to the materials already mentioned, it includes samples of the following documents to facilitate planning a history project and/or the delivery of regular Social Studies material: Letter to Parents (p. 21); Group Project Contract (p. 23); Timeline Rules Summary (p. 25); and Teacher’s Checklist (p. 28). There is also an assortment of blackline masters for every step in the process: choosing topics, the research process, evaluation scoring sheets, referencing, writing thesis statements, and even certificates to recognize participation and achievement.
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E. Senger – Henry Wise Wood High School. Calgary, AB.
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Introducción a la Arqueología Histórica | Charles E. Orser Junior
Este é o principal manual introdutório de Arqueologia Histórica, síntese da experiência de um pesquisador com uma formação múltipla e profunda em Arqueologia, História e Antropologia. O grande mérito da obra é a capacidade de apresentar, historiar e conceituar o desenvolvimento dos principais aspectos teóricos, técnicos e políticos da Arqueologia Histórica, “uma subdivisão autônoma da Arqueologia” com pouco mais de trinta anos de existência.
Para Orser Jr., “a grande maioria dos arqueólogos diria hoje que seu campo de investigação compreende tanto a história como a antropologia, como outras disciplinas relacionadas, incluindo por exemplo a geografia histórica e cultural, a economia política e a cartografia. Assim mesmo, a Arqueologia Histórica não é nem história, nem antropologia, nem sequer uma conjunção das duas. Simplesmente é um amplo campo de investigações que combina um grande número de abordagens”. Sua principal atenção é dirigida às “manifestações materiais de um mundo em rápida transformação depois de 1500 D.C.”. Trata-se, em suma, do “estudo arqueológico dos aspectos materiais – em termos históricos, culturais e sociais – dos efeitos do mercantilismo trazidos da Europa ao final do século XV e que continuam em ação até hoje”. Leia Mais
Introducción a la Antropología – RODRIGUEZ (RCA)
RODRIGUEZ, Mario Orellana. Introducción a la Antropología. Santiago de Chile: Ediciones SEK y CPU, 2001. Resenha de: HERNÁNDEZ, Roberto. Revista Chilena de Antropologia, n.16, p.188-192, 2001/2002.
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Les manuels de pédagogie. 1880-1920 – ROULLET (CC)
ROULLET, Michèle. Les manuels de pédagogie. 1880-1920. Paris: PUF (Education et For- mation), 2001, 187p. Resenha de: HEIMBERB, Charles. Le cartable de Clio – Revue romande et tessinoise sur les didactiques de l’histoire, Lausanne, n.1, p.212-214, 2001.
Tiré d’une thèse de doctorat en sciences de l’éducation, l’ouvrage de Michèle Roullet sug- gère fortement, et à juste titre, de distinguer les intentions exprimées par les théories péda- gogiques et les réalisations concrètes en la matière. Etudiant un corpus de manuels pédagogiques utilisés dans les écoles normales françaises du tournant du siècle, il donne à voir l’état de ces « vérités moyennes » qui per- mettaient alors d’aboutir au brevet d’ensei- gnement primaire. Il rend également compte de la naissance officielle de deux sciences humaines complémentaires, la psychologie et son corollaire pratique, la pédagogie.
Alors que l’on a assisté récemment à une sorte de réhabilitation partielle des manuels scolaires, Michèle Roullet rappelle qu’ils ont souvent donné lieu à un trop-plein d’infor- mations lié au souci de leur auteur de faire bonne figure auprès de ses pairs. Et qu’ils ont été vertement dénoncés pour leur faculté d’éliminer les contradictions et de produire un discours consensuel, lisse et conforme. Or, ces caractères se trouvent encore accentués dans les manuels qui ont pour objectif de former des enseignants.
L’étude des avertissements ou préfaces de ces ouvrages montre que leurs auteurs déclarent volontiers n’avoir pas écrit un manuel ; c’est dire qu’ils se méfient a priori de cet outil prescriptif. En outre, des récits historiographiques portant sur la pédagogie sont souvent la forme masquée d’une légiti- mation des intentions du présent, de véritables histoire-écran procédant d’une téléologie justificative qui est peu productrice de sens. L’histoire est ainsi le vecteur d’une véritable leçon de choses, elle est mise au service de la pédagogie républicaine, mais elle n’est guère encline à démontrer la com- plexité des problèmes affrontés et des évolutions engagées.
La nouvelle science de l’éducation se pré- sente alors comme parfaitement rationnelle, elle est considérée comme le fruit d’une évo- lution linéaire vers le progrès. Elle manie pourtant les affirmations contradictoires avec une certaine légèreté et cache mal les limites critiques de ses propositions. En outre, elle a recours à des termes qui seront repris plus tard par Jean Piaget : l’accommo- dation et l’adaptation permettraient par exemple aux maîtres d’ajuster les contenus à présenter en classe pour faire en sorte qu’ils puissent être bien assimilés par les élèves. Ce qui implique alors une grande responsabilité de ces maîtres quant à choisir les différents contenus de leurs leçons.
Affirmant une rationalité libératrice, la nouvelle science pédagogique s’appuie notamment sur les procédés de l’induction et de la déduction pour concrétiser ses pro- pos, en insistant surtout sur l’induction qui obilise davantage l’observation que la démonstration. Elle va du particulier au plus général et suppose en tout cas de croire que tout objet s’inscrit dans un ordre stable qu’il s’agit de retrouver; que tout dépend de lois générales puisque tout ce qui arrive a une fin. Quant à la psychologie qui est mobilisée auprès des futurs enseignants, elle se veut avant tout rationnelle et suscep- tible d’affirmations fortes, mais en laissant toutefois la place à des dynamiques plus individuelles.
La plupart des manuels s’ouvrent sur le thème de l’éducation physique et affirment ainsi la nécessité d’éduquer le corps. Quant à l’éducation intellectuelle proprement dite, elle doit partir du jeu et d’activités concrètes pour permettre à l’enfant de faire des expé- riences. Mais elle doit surtout, au nom de la quête du juste milieu, privilégier le dévelop- pement de la Raison et contenir celui de l’imagination dans de justes proportions. Cela dit, l’école républicaine insiste surtout sur l’éducation civique et morale qui forme la volonté plutôt que le jugement. Or, la séparation de l’Eglise et de l’Etat en matière d’écoles publiques consiste d’abord à les ins- crire dans le climat intellectuel positiviste alors dominant. Toutefois, la laïcisation sco- laire est marquée par une forte ambiguïté et c’est souvent un discours religieux qui est tenu en réalité sous l’apparence de la rationa- lité. L’usage très fréquent de mots à caractère religieux – « vocation», « apostolat », etc. – pour évoquer le champ scolaire en témoigne largement. Ainsi, jusque-là, l’éducateur pen- sait que l’éduqué ne devait pas être façonné sur son propre modèle parce qu’il avait déjà reçu une autre empreinte divine. Désormais, c’est un Dieu rationalisé qui laisse les hommes devenir ce à quoi il les aurait prédestinés, ce qui justifie beaucoup mieux leur inégalité.
Mais cette conception nouvelle place les dis- cours des pédagogues dans le champ de l’idéologie. En d’autres termes, l’éducation morale de l’école républicaine vise à former des hommes libres, mais libres de se sou- mettre à la Raison ; elle est donc inculcatrice.
Les méthodes pédagogiques qui sont déve- loppées sont aussi très révélatrices. On trouve déjà à cette époque des formules comme « apprendre à apprendre » ou des éloges de la méthode active. Mais, encore une fois, l’autonomie qui est ici recherchée consiste d’abord en une capacité de maîtriser ses désirs et de vouloir développer pleine- ment ses connaissances. Elle est d’ailleurs conçue comme devant progresser sous l’in- fluence décisive et la conduite déterminée du maître. En outre, il s’agit davantage de valo- riser l’effort que le tâtonnement, une expé- rience objective qu’une démarche subjective de recherche. Enfin, l’effort et le plaisir devraient pouvoir se conjuguer dans le cadre d’une pédagogie qui évitera les difficultés inutiles et tiendra compte de la marche natu- relle de l’esprit.
La question du langage pédagogique est enfin analysée par Michèle Roullet dans ce contexte particulier où l’inductivisme sug- gère une toute-puissance de la description. Or, en confondant cette description avec l’exhortation morale, on risque de ne plus comprendre les métaphores utilisées par les pédagogues anciens. Ainsi la métaphore pédagogique risque-t-elle de n’être plus réduite qu’à une prétendue lecture de la réa- lité et l’injonction morale confondue avec une représentation du fonctionnement psy- chique. Les pédagogues qui s’expriment dans ce corpus de manuels destinés à de futurs enseignants aimeraient certes bien pouvoir ddévelopper leur propre langage, mais ils n’en sont pas vraiment capables et se méfient par- fois du caractère peu rationnel de la méta- phore. Leur langage procède tout de même d’une profusion d’informations, d’un usage marqué de métaphores horticoles autour de la notion de germination (une « naturalisa- tion des phénomènes psychologiques », selon l’expression de Michèle Roullet), d’assertions particulières qui sont répétées inlassable- ment, de la référence à des noms illustres, d’un usage multiplié des adjectifs, le tout s’orientant vers l’affirmation d’un certain modernisme. Cette rhétorique abuse de for- mules qui suggèrent l’innovation des choix autant que la neutralité des faits sur lesquels ils se fondent. Mais elle reste encore, à cette époque, plutôt hésitante et modérée.
Cette étude est très intéressante, mais elle n’échappe pas complètement aux défauts d’une histoire de l’éducation qui pourrait être mieux contextualisée. Par exemple, le court chapitre sur l’éducation physique aurait pu se référer à la fois à l’hygiénisme de la société de la fin du XIXe siècle et à son militarisme croissant dans la perspective nationaliste alors dominante. Et il aurait été utile de définir davantage ce fameux « moment Compayré» qui est convoqué tout au long de l’ouvrage non pas seulement à travers ce qu’il a apporté à l’évolution de la pédagogie, mais aussi en interrogeant son et très enrichissant. Elle nous invite à la fois à nous méfier des usages publics – et téléolo- giques – de l’histoire de l’éducation et à prendre bien conscience de ce que pourrait être la force critique d’une véritable histoire qui affronte la complexité et les inévitables contradictions des discours pédagogiques. De ce point de vue, elle nous rappelle que certaines options font partie depuis fort longtemps de l’éventail des intentions nova- trices des pédagogues. Et qu’un certain lan- gage de l’innovation peut être observable à travers le temps, comme une sorte d’inva- riant (« les mots, des invariants qui évoluent » nous dit une belle formule utilisée à la page 154), mais sans avoir beaucoup d’effet. Elle nous incite aussi, en insistant sur le poids des mots et le sens de leur utilisation, à nous inspirer des contradictions, des tâton- nements et des modes de pensée des péda- gogues anciens dont elle a étudié les ouvrages pour appréhender avec un sens cri- tique plus appuyé certains discours pédago- giques d’aujourd’hui. Ainsi nous interpelle- t-elle sur le sens réel d’un engagement pédagogique qui reste évidemment néces- saire, mais qui gagnerait à être bien plus rigoureux, notamment pour ce qui concerne son langage et sa rhétorique. Ce qui consti- tue un beau défi.
Charles Heimberg, Institut de Formation des Maîtres (IFMES), Genèveorigine et sa fonction dans le cadre des mutations de la société de l’époque, du tournant du siècle et de la Troisième République française, en rapport notamment avec les deux principales catégories de finalités sco- laires, d’ordre économique et politique.
La lecture de l’ouvrage de Michèle Roullet représente finalement un exercice fort utile et très enrichissant. Elle nous invite à la fois à nous méfier des usages publics – et téléolo- giques – de l’histoire de l’éducation et à prendre bien conscience de ce que pourrait être la force critique d’une véritable histoire qui affronte la complexité et les inévitables contradictions des discours pédagogiques. De ce point de vue, elle nous rappelle que certaines options font partie depuis fort longtemps de l’éventail des intentions nova- trices des pédagogues. Et qu’un certain lan- gage de l’innovation peut être observable à travers le temps, comme une sorte d’inva- riant (« les mots, des invariants qui évoluent » nous dit une belle formule utilisée à la page 154), mais sans avoir beaucoup d’effet. Elle nous incite aussi, en insistant sur le poids des mots et le sens de leur utilisation, à nous inspirer des contradictions, des tâton- nements et des modes de pensée des péda- gogues anciens dont elle a étudié les ouvrages pour appréhender avec un sens cri- tique plus appuyé certains discours pédago- giques d’aujourd’hui. Ainsi nous interpelle- t-elle sur le sens réel d’un engagement pédagogique qui reste évidemment néces- saire, mais qui gagnerait à être bien plus rigoureux, notamment pour ce qui concerne son langage et sa rhétorique. Ce qui consti- tue un beau défi.
Charles Heimberg – Institut de Formation des Maîtres (IFMES), Genève.
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La Europa atlantica en la Edad del Bronce. Un viaje a las raices dela Europa occidental – PRIEGO (PR)
PRIEGO, M Ruiz-Galvez. La Europa atlantica en la Edad del Bronce. Un viaje a las raices dela Europa occidental. Barcelona: Editorial Crítica 1998, 399p. Resenha de: ARANDA, Luis. Panta Rei – Revista de Ciencia Y Didáctica de la Historia, Murcia, n.4, p. 1998.
La autora recoge, en ocho capítulos, seis años de duro trabajo que han dado como resultado unamuy interesante obra sobre el modo de vida de las comunidades del II milenio a.C. ubicadas geográficamente en el extremo occidental de nuestro continente europeo. El libro ofrece valiososenfoques interpretativos muy novedosos que suponen un mayor acercamiento a la realidad histórica.
E igualmente importante y destacado es el tratamiento conferido a la Península Ibérica, merecido encualquier caso, pues tanto su estratégica posición geográfica (es la cabeza de puente entre el Mediterráneo y el Atlántico) como su especial desarrollo sociocultural en estos momentosconcretos, hacen inevitables menores llamadas de atención. En este sentido me permito aplaudir a laautora, que no duda en trascender del título de su libro, y dedica las páginas que sean necesariaspara analizar lo que está ocurriendo en el Mediterráneo, pues con ello ayuda a comprender losprocesos acaecidos en la fachada atlántica.
El enfoque de la obra queda definido por Ruiz-Gálvez en el primero de los capítulos: se trata de unenfoque estrictamente historicista (no antropológico), pero no ligado por eso al estudio tipológico cultural de las sociedades, sino al estudio de esas sociedades en sí mismas. Por supuesto, la cultura material no queda por ello desdeñada, pero no es la base de la exposición de la autora. El caminopara expresar dicha exposición se apoya en el análisis de fuentes, mas no sólo fuentesarqueológicas, como cabría esperar para un libro de Prehistoria, sino también fuentes escritasmedievales e incluso modernas, eddas y sagas escandinavas o mitología griega. Método de trabajodiscutible, aunque no exento de lógica.
Los capítulos fuertes del libro son el 5, el 6, y el 7 (“Las relaciones atlánticas de la PenínsulaIbérica. I: Los primeros contactos”, “II: El auge de los intercambios”, y “La transición BronceFinal/Edad del Hierro: ¿transformación o continuidad?”, respectivamente), pues es en ellos endonde la profesora vierte sus conocimientos sobre interacción entre comunidades, procesos decambio, cultura material, etc. Los capítulos precedentes constituyen la base conceptual necesariapara la aprehensión de dichos conocimientos. Creo por esto que el esquema estructural de la obraresponde a un buen criterio metodológico. Así, los capítulos 1 y 2 (“Bases teórico-metodológicas” y”Circuito atlántico y comercio”) sirven para explicar términos: qué es el Bronce Atlántico, qué es elBronce Inicial con respecto al Bronce Final, qué cronología tiene; o qué es comercio y quéintercambio, qué es el don, qué importancia tiene la mujer en las relaciones grupales e intergrupales,etc. En este sentido, Ruiz-Gálvez va citando varias propuestas de algunos autores y asume para sílas que más le convienen.
En los capítulos 3 y 4 (“Vías y medios de transporte” y “Los condicionamientos físicos”), la autorase define braudeliana cuando afirma que el medio hace al hombre y que, por tanto, la geografíaocupa un papel primordial en el devenir diario de las comunidades humanas, llegando en ocasionesal más evidente determinismo. Con especial atención, según la tónica presente en toda la obra, a laPenínsula Ibérica, se hace un análisis de las posibilidades de contactos entre las comunidades delBronce, y se alcanza la conclusión de que las condiciones imperantes en aquella época (en materiatanto de medios de transporte como de acceso a los recursos naturales) son similares a lascaracterísticas de los países preindustriales del siglo XIX, o incluso del XX, para el caso de algunas regiones aisladas. De ahí emanan dos ideas: las fuentes medievales y modernas pueden ser tenidasen cuenta; el conservadurismo de las sociedades campesinas es fortísimo, hace 20 años y hace 4000años.
El nexo central en torno al cual gira todo el libro, y en especial, los tres capítulos centrales, es el siguiente pensamiento: el comercio es la causa fundamental -que no única- de los cambios quetienen lugar en el seno de estas sociedades prehistóricas. Y ello por dos razones: porque conlleva laintegración entre distintas comunidades, con la transmisión de ideas y habitantes que eso supone; yporque genera competencia política y social dentro de cada grupo. Este comercio, o mejor, intercambio, se establecería en dos niveles: objetos de prestigio, bienes de subsistencia, aunque em algunos casos ambos niveles se entrecruzarían, resultando entonces que el control de ciertos recursos especiales llevaría consigo la ostentación de un determinado status superior. Ruiz-Gálvezse refiere al ganado y a la sal, dejando un poquito de lado la cuestión de la posesión de la tierra, quetiene también su importancia, no obstante, sobre todo en las transiciones respectivas del Cobre alBronce (c.2300), y del Bronce al Hierro (c. 1200-750). Para la autora, la ganadería, favorecida porun clima idóneo, generaría redes de intercambio (marcadas por estelas, ídolos-guijarro, ídolosmenhir) que supondrían una territorialidad, y automáticamente, daría lugar a la aparición de alguien(en singular o en plural) que controlase dicho territorio. Este nivel de desarrollo económico y socialresultó atractivo a los comerciantes mediterráneos (sobre todo en el ámbito ibérico) y su influenciaderivó en una aceleración del sistema, que no en un surgimiento del mismo. Ruiz-Gálvez explicaeste proceso con la llamada teoría de los sistemas mundiales de Sherratt, diferenciando un centro,una periferia, y un margen, que van evolucionando y participando cada vez más en losintercambios.
El capítulo 8 (“Tiempos largos y tiempos cortos”) no es más que una relación entre arte, evidenciafuneraria y etnicidad con procesos más o menos largos y lentos. Los tiempos cortos serían losmomentos puntuales (p.e., crisis), los tiempos largos hablarían del mundo de las innovaciones y delas mentalidades, parafraseando a Le Goff.
Hasta aquí la obra de Marisa Ruiz-Gálvez. Creo que sería muy interesante añadir un aspecto que meparece relevante, como es la cuestión ideológico-religiosa a estos grupos del Bronce atlántico, pesea ser tremendamente difícil de observar en grupos prehistóricos. La profesora se excusa: “confiesohumildemente mi incapacidad y mi falta de formación para captar e interpretar debidamente talesaspectos a partir del registro arqueológico.
Quiero destacar también el acierto de la autora al incluir un práctico y muy útil glosario de términos arqueológicos. Sin embargo, en lo referente al repertorio bibliográfico, lo considero excessivamente conciso, pues creo que admitiría más obras, aunque Ruiz-Gálvez lo considere “excesivo para um manual”.
Luis Aranda
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Manual das organizações internacionais | Ricardo Seitenfus
Dentre os oito Estados “cristãos” que se reuniram no Congresso de Viena, em 1815, cinco indiscutivelmente dominavam o chamado “concerto europeu”, que presidiu ao nascimento da Europa pós-napoleônica, estabeleceu novas regras de convívio entre as “nações civilizadas” e determinou, em grande medida, como seria moldado o mundo burguês que emergia da primeira Revolução Industrial. O equilíbrio persistiu durante todo o longo século XIX e apenas seria rompido em virtude da “segunda Guerra de Trinta Anos” em que parece ter vivido a Europa na primeira metade deste século.
Cinco grandes países continuavam a dominar, no final do século XX, o inner circle do poder mundial e a determinar, via monopólio da arma nuclear, o curso da vida no planeta. Entretanto, do ponto de vista quantitativo, ao menos, o cenário é mais populoso: partindo de apenas 50 Estados independentes em seu ato constitutivo, o sistema onusiano evoluiu para cerca de 190 países membros. Do ponto de vista qualitativo, por outro lado, a mudança é substancial: no lugar da antiga diplomacia secreta dos príncipes e dos agentes dos reis, temos uma real diplomacia parlamentar exercida em mais de 350 organizações, interestatais e não-governamentais, constituídas em dezenas de foros econômicos, políticos, técnicos e culturais, nas quais as armas da crítica substituiram a crítica das armas. O poder talvez não se tenha tornado menos concentrado hoje do que 180 anos atrás, mas ele já não pode mais legitimamente ser exercido de forma crua e direta, devendo obrigatoriamente passar, mesmo no caso da superpotência remanescente, por diferentes instâncias de discussão e de encaminhamento de soluções aos problemas multifacéticos enfrentados pela humanidade. Leia Mais
Manual de Historia de Cartagena – (PR)
Manual de Historia de Cartagena. Murcia, 1996. 415p. Resenha de: NAVARRO, David Munuera. Panta Rei – Revista de Ciencia Y Didáctica de la Historia, Murcia, n.2, p.175-176, 1996.
David Munuera Navarro
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Human osteology. A laboratory and field manual – BASS (RCA)
BASS, William M. Human osteology. A laboratory and field manual. 3ed. Columbia: Special publication, n.2 of the Missouri Archaelogical Society, 1987. Resenha de: CONSTANTINESCU, Florence. Revista Chilena de Antropologia, n.12, p.233, 1993/1994.
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A Pesquisa em História / Maria P. Vieira, Maria R. Peixoto e Yara A. Khoury
A História caracteriza-se pela longa luta do homem para compreender o meio em que vive e aluar sobre ele. A época atual tem evidenciado uma maior valorização da consciência dos fatos históricos. Deste modo, todas as manifestações humanas, quer de cunho literário ou provenientes da herança de uma memória coletiva, contém informações que devem ser estudadas e pesquisadas. Enfim, tudo o que o homem produz, ou produziu, torna-se objeto de reflexão e questionamento para o historiador.
É neste sentido que o livro encaminha a discussão sobre o papel dos documentos e da experiência humana dentro dos ramos da pesquisa, dando ênfase às etapas a serem seguidas no trabalho de um pesquisador. Nota-se, com isso, a preocupação das autoras em definir o papel do historiador frente aos fatos históricos: desde a descoberta cuidadosa e exaustiva das fontes, até à crítica da documentação, problematização e incorporação das mesmas à interpretação da história, Este livro propicia uma leitura bastante instrutiva aos profissionais que atuam na área de ensino e, principalmente, aos iniciantes na carreira acadêmica, interessados no campo da pesquisa como complemento à sua formação. Assim, apesar de sintética, a obra apresenta um conteúdo permeado por exemplos que ilustram o assunto e facilitam o entendimento do tema proposto.
Dentro da perspectiva e finalidade da obra, um primeiro ponto que despertou nosso interesse diz respeito à utilização das fontes históricas como objeto de estudo do historiador. Segundo as autoras, “…os registros da experiência humana não estão só nesses arquivos, museus e centros, mas por toda parte, ao alcance de todos”, (p. 28, grifos nossos). Gostaríamos de evidenciar, neste contexto, que esta frase engloba toda a postura inovadora em relação ao documento histórico, permitindo ultrapassar a concepção estreita de que as fontes históricas restringem-se ao texto escrito. Subentende-se, então, com este argumento, que principalmente o pesquisador brasileiro, cujo acesso a documentos oficiais quase sempre enfrenta dificuldades, pode beneficiar-se de outros registros (literatura, cinema, música, etc.) como fontes ou “materiais de suporte” para o desenvolvimento de sua pesquisa.
Porém, sentimos na obra a falta de maiores referências e indicações sobre as pesquisas realizadas fora dos centros acadêmicos. Também não houve, por parle das autoras, a preocupação em esclarecer de que modo atuam os historiadores que se dedicam à pesquisa em centros de documentação não oficial. Afinal, em nosso país, os vestígios da Historiografia vinculada aos antigos Institutos Históricos ainda não desapareceram inteiramente.
Outro ponto, com relação à pesquisa, que a nosso ver ficou sem esclarecimentos corresponde à atuação das instituições financiadoras de pesquisa, como a FAPESP e o CNPq, e todo o difícil processo pelo qual passa o pesquisador iniciante para conseguir uma bolsa de estudos. Na realidade além de métodos, o historiador necessita de condições, tanto no plano subjetivo quanto econômico, para desenvolver seu projeto de pesquisa.
Não podemos deixar de ressaltar uma sugestiva contribuição a nível de metodologia: a orientação, dada pelas autoras, a respeito dos cuidados que o pesquisador deve tomar com uma série de problemas (de ordem metodológica e prática) que se colocam durante a elaboração de sua pesquisa. Ressaltamos, aqui, a importância deste aspecto para o sucesso de uma pesquisa, pois a deficiência técnica, a insuficiência metódica e teórica, e até mesmo o ensino universitário podem ser responsáveis pela debilidade deste trabalho.
Também, através dos exemplos fornecidos pela experiência das autoras, destacamos um aspecto muito bem abordado, que é a reflexão sobre a interação do historiador com o meio social em que vive. No horizonte desta ótica, fica-nos explícito o importante papel da subjetividade e da influência do ambiente histórico e social na seleção dos fatos pelo historiador.
Finalmente, em último aspecto a destacar é a importância desta obra, não somente dentro da área de pesquisa, mas também na área educacional.
Sob este prisma, a leitura deste livro traz, sem dúvida, grande contribuição para professores de 1º e 2º graus, pois uma inquietação que ainda paira sobre as cabeças de muitos profissionais é a de estimular os alunos a se interessarem pela História. Desta forma, passando por discussões sobre os objetivos da História enquanto ciência e, conseqüentemente, sobre o historiador e seu papel social, as autoras debatem a pesquisa e fazem um balanço bem objetivo da prática do historiador e das concepções de ciência nelas embutidas. Com isso, contribuem para uma atualização dos professores nos rumos da historiografia.
As autoras propõem, também, que a análise seja guiada pela percepção de que a História é uma “experiência vivida integral e socialmente”, dentro de um “campo de possibilidades”, e não um conhecimento pronto e acabado, sobre fatos sujeitados pelos métodos de pesquisa e interpretação. Assim, o livro induz à reflexão conjunta de alunos e professores e aponta direções para resgatar a unidade entre ensino e pesquisa. E esse pode ser um bom caminho para responder ao desafio de “fazer com que os alunos se interessem pela história”.
Desta maneira, contendo análises úteis sobre o processo de pesquisa (dentro de uma perspectiva de reflexão e indagação), esta obra apresenta um amplo painel dos espaços de estudo do historiador. Não é apenas mais um manual ou um receituário de informações, mas um livro informativo, cuja consulta torna-se necessária para os que desejarem enveredar pelos caminhos do ensino da disciplina e da pesquisa histórica.
Luciana S. Melo – Pós-graduando em História Social no Departamento de História /USP.
VIEIRA, Maria do Pilar; PEIXOTO, Maria do Rosário; KHOURY, Yara Aun. A Pesquisa em História. São Paulo, Ática, 1989. (Princípios – 159). Resenha de: MELO, Luciana S. História, São Paulo, n. 123-124, p. 143-219, ago/jul., 1990/1991. Acessar publicação original. [IF]
A Pesquisa em História / Maria P. Vieira, Maria R. Peixoto e Yara A. Khoury
VIEIRA, Maria do Pilar; PEIXOTO, Maria do Rosário; KHOURY, Yara Aun. A pesquisa em História. São Paulo: Ática, 1987. Resenha de: SILVA, Marcos Antônio da. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.9, n.19, n.15, p.259-263, set.1989/fev.1990.
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Arqueologia – FUNARI (RBH)
FUNARI, Pedro Paulo Abreu. Arqueologia. São Paulo: Ática, 1988. Resenha de: LÓPEZ, Marcelo Castro. Ampliando os Estudos Clássicos. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.9, n.18, n.15, p.259-263, ago.1988/set.1989.
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