História e Audiovisual: pode(res), discursos, linguagens, mitos e mitologias políticas | Temporalidades | 2022

Detalhe de capa de Historia Audiovisual de Rafael Rosa Hagemeyer Autentica 2012
Detalhe de capa de História & Audiovisual, de Rafael Rosa Hagemeyer (Autêntica, 2012)

Trata-se de uma experiência interessante refletir sobre o percurso da Revista Temporalidades, desde sua concepção até a sua atual edição, e perceber como os dossiês temáticos apresentados pela Revista dialogam com perspectivas de naturezas distintas em termos de fontes historiográficas. Por meio da diversidade de temas seus textos trazem, associados a historiografia e debates que proporcionam, percebe-se que, de fato, a Revista Temporalidades cumpre o papel que se propõe.

Fiz parte da equipe de concepção e produção da Revista entre os anos de 2013 e 2014, e hoje, quase uma década depois, me sinto lisonjeado de ser convidado a escrever a apresentação da Revista, sobretudo, diante de um dossiê que me compraz e que também faz parte de minha trajetória enquanto discente do Programa de Pós-graduação em História da UFMG e dos seguimentos de minhas pesquisas. Leia Mais

Homenagem a Pierre Ansart: quais suas herança para pensarmos as linguagens das paixões políticas? | História- Questões & Debates | 2022

Por que um dossiê da revista História: questões e debates homenageia academicamente o sociólogo Pierre Ansart (1922-2016), professor emérito da Université Paris VII-Denis Diderot? Com certeza por ser um sociólogo de prestígio internacional cuja ousadia, compartilhada pelo colega e amigo Eugène Enriquez, introduziu a psicologia no campo da sociologia tradicional. Aqui, entre nós no Brasil, foi decisiva sua contribuição teórica e organizacional ao Núcleo História e Linguagens Políticas: razão, sentimentos e sensibilidades (UNICAMP), criado no Convênio PARIS VII/ UNICAMP em 1991. Ansart, crítico declarado das ortodoxias e adepto das abordagens transdisciplinares, estudou a obra de Proudhon e as utopias políticas projetando suas significações sócio-históricas e em particular suas dimensões emocionais. Apontou questão sensível para historiadores e outros pesquisadores das ciências humanas – o lugar dos sentimentos e das paixões na história e sua relevância para a compreensão do político e sua gestão. Por duas décadas atuou significativamente neste Núcleo onde realizou conferências, participou dos debates e das publicações; na França editou coletâneas de três dos Colóquios aqui sediados: Sentiments et identités: les paradoxes du politique (Les Cahiers du Laboratoire de Changement Social, Paris: Ed.Paris VII, 1998); Le ressentiment (Bruxelas: Bruylant, 2002) e Le sentiment d’humiliation [Press Editions, 2006].

Os artigos se detêm na reflexão sobre a(s) herança(s) de Ansart, ele mesmo se reconhecendo herdeiro de vários outros autores, como legado presente de distintas maneiras nos trabalhos de membros do Núcleo, suscitando a questão: de que herança(s) Ansart e nós somos herdeiros? Herança(s) entendidas como re-afirmação do passado e inscrição na vida por vir, em usos não pre(e)scritos [Derrida; Roudinesco. De quoi demain. Dialogue. Paris: Galilée, 2001]. A iniciativa do dossiê se soma à tradução para o português, por Jacy Seixas, das obras mais conhecidas de Ansart: La Gestion des Passions Politiques (L’Age d’Homme, 1983), lançada em 2019; e Les Cliniciens des Passions Politiques (Éditions du Seuil, 1997), publicada agora em 2022, ambas pela Editora da UFPR. Leia Mais

Homenagem a Pierre Ansart: quais suas herança para pensarmos as linguagens das paixões políticas? | História- Questões & Debates | 2022

Por que um dossiê da revista História: questões e debates homenageia academicamente o sociólogo Pierre Ansart (1922-2016), professor emérito da Université Paris VII-Denis Diderot? Com certeza por ser um sociólogo de prestígio internacional cuja ousadia, compartilhada pelo colega e amigo Eugène Enriquez, introduziu a psicologia no campo da sociologia tradicional. Aqui, entre nós no Brasil, foi decisiva sua contribuição teórica e organizacional ao Núcleo História e Linguagens Políticas: razão, sentimentos e sensibilidades (UNICAMP), criado no Convênio PARIS VII/ UNICAMP em 1991. Ansart, crítico declarado das ortodoxias e adepto das abordagens transdisciplinares, estudou a obra de Proudhon e as utopias políticas projetando suas significações sócio-históricas e em particular suas dimensões emocionais. Apontou questão sensível para historiadores e outros pesquisadores das ciências humanas – o lugar dos sentimentos e das paixões na história e sua relevância para a compreensão do político e sua gestão. Por duas décadas atuou significativamente neste Núcleo onde realizou conferências, participou dos debates e das publicações; na França editou coletâneas de três dos Colóquios aqui sediados: Sentiments et identités: les paradoxes du politique (Les Cahiers du Laboratoire de Changement Social, Paris: Ed.Paris VII, 1998); Le ressentiment (Bruxelas: Bruylant, 2002) e Le sentiment d’humiliation [Press Editions, 2006].

Os artigos se detêm na reflexão sobre a(s) herança(s) de Ansart, ele mesmo se reconhecendo herdeiro de vários outros autores, como legado presente de distintas maneiras nos trabalhos de membros do Núcleo, suscitando a questão: de que herança(s) Ansart e nós somos herdeiros? Herança(s) entendidas como re-afirmação do passado e inscrição na vida por vir, em usos não pre(e)scritos [Derrida; Roudinesco. De quoi demain. Dialogue. Paris: Galilée, 2001]. A iniciativa do dossiê se soma à tradução para o português, por Jacy Seixas, das obras mais conhecidas de Ansart: La Gestion des Passions Politiques (L’Age d’Homme, 1983), lançada em 2019; e Les Cliniciens des Passions Politiques (Éditions du Seuil, 1997), publicada agora em 2022, ambas pela Editora da UFPR. Leia Mais

História e Linguagens: História. Ficção. Literatura | Escrita da História | 2021

O presente dossiê tem como objetivo central fomentar o diálogo e debate entre estudantes e pesquisadores que investiguem fontes e problemas relacionados às dimensões da Literatura e da Teoria da História, bem como suas interações. Para cumprir esse objetivo, toma a oportunidade que a Revista História Escrita propicia ao nosso grupo de trabalho e pesquisa, o História & Linguagens, para criamos espaços como este que estão no cerne de abrangentes e multiformes linhas de contato com a teoria da literatura, a qual, segundo Luiz Costa Lima, tende a ampliar verticalmente e horizontalmente o fazer historiográfico. E ao tomar como ponto de partida a perspectiva de que estes objetos fornecem novas evidências fragmentárias e pistas verossímeis a respeito das formas de sentir e pensar em determinado contexto sócio-histórico se mostram e tornam-se passíveis de tematização crítica.

Nesse sentido, o presente dossiê reuniu trabalhos que dialogam com os fundamentos constitutivos da formatividade literária e da Teoria da História, por meio de análises que concebam a possibilidade de uma escrita da história a partir de um diálogo abrangente, no qual narrativas biográficas e literárias estejam presentes em pesquisas e pesquisadores de várias frentes possíveis. Desde os anos de 1970 Hayden White nos chama a atenção para importância que as estruturas metanarrativas têm para a formação do conceito de história, na mesma esteira, Luiz Costa Lima nos traz a evidência de que o não questionamento teórico entre Ficção e História faz com que o historiador se compreenda como ileso no processo de construção de seu discurso e acarrete um fechamento da historiografia para a possibilidade de reflexão filosófica de si mesma. Leia Mais

Interfaces da arte no universo da história marítima e militar: estética, linguagens e representações |  Navigator | 2019

De longa data a arte relaciona-se ao universo militar. No Brasil, a guerra da Tríplice Aliança contra o Paraguai proporcionou aos artistas plásticos o engajamento na história presente. Foram chamados a produzirem a crônica cotidiana dos acontecimentos do front, ilustrando periódicos com suas gravuras, ou a construírem decorações efêmeras em homenagem à volta dos soldados. Pinturas monumentais, a exemplo do Combate Naval do Riachuelo, de Victor Meirelles, ou da Batalha do Avahy, de Pedro Américo, foram encomendadas, visando perpetuar a glória dos vencedores, reafirmando a força do Império brasileiro. Monumentos aos heróis foram construídos, enquanto algumas poucas pinturas e fotografias insistiram em apontar o custo humano do conflito. As Primeira e Segunda Guerras Mundiais, domínio já do fotojornalismo, não engendraram pinturas grandiloquentes no Brasil, mas alguns jovens soldados registraram em cadernos desenhos reveladores de suas emoções. Além dos conflitos, o cotidiano da vida marítima e militar foram igualmente representados.

Neste dossiê, várias linguagens se cruzam. Pinturas, desenhos, gravuras, cartões-postais, projetos arquitetônicos e canções foram analisados. São pesquisas desenvolvidas a partir de variadas fontes, mostrando forte interesse pela representação da História Militar, em seus múltiplos aspectos. Leia Mais

História, Mídia e Linguagens | Outras Fronteiras | 2020

História, Mídias e Linguagens representam formas pelas quais os seres humanos experienciam o tempo, narram eventos e fatos históricos. Nestes termos, citamos como exemplo a Segunda Guerra Mundial, o 11 de setembro 2001 e a primavera árabe1, ocorrida a partir de dezembro de 2010, eventos simbolicamente construídos em escala planetária, seja pela imprensa ou pela indústria cultural. Mais recentemente, as redes sociais foram determinantes nas eleições nacionais das principais democracias liberais do planeta, impactando assim o tempo político e as democracias representativas. De acordo François Hartog em Regimes de Historicidade2, a plasticidade do sistema capitalista e as mídias se retroalimentam.

Para Jean Noel Jeanneney estudar a História das mídias é compreender a representação que uma sociedade faz de si mesma, seja esta falsa ou verdadeira, bem como as influências dessas representações sobre os rumos em que determinada sociedade caminha, a partir das ações de seus diversos atores políticos. Assim como os atores, os objetos de análise de História das mídias são extremamente diversos e dispersos. Leia Mais

Cultura escrita no mundo ibero-americano: identidades, linguagens e representações / Cantareira / 2019

Segundo Lucien Febvre e Henri Jean-Martin, o livro moderno surgiu a partir do encontro de dois fatores que, apesar de distintos, mantêm alguma ligação. Primeiro, foi necessário que o papel se firmasse enquanto mídia, o que não aconteceu antes do século XIV. Até então, as técnicas empregadas na produção das folhas, faziam com que seu preço fosse alto e sua qualidade inferior, mais frágil e pesado, com a superfície rugosa e repleto de impurezas. Concorrendo com o já estabelecido pergaminho de pele de carneiro, o novo material não oferecia aos copistas um suporte adequado para a transcrição de manuscritos, sugando a tinta, mais do que o necessário, e com possibilidades de duração limitada.[4]

O segundo fator apontado é a técnica de impressão manual, composta pela tríade: caracteres móveis em metal fundido, tinta mais espessa e prensa. Deixando a alquimia das tintas de lado, pela facilidade com a qual era possível produzi-las então, o grande avanço da época foi a composição em separado dos tipos móveis. Para cada signo fabricava-se uma punção de metal duro – composto de uma liga de chumbo, estanho e antimônio que variava de proporção conforme a região –, sob a qual se demarcava a matriz em relevo. Em metal menos duro moldavam-se as imagens em côncavo. A seguir, colocadas em uma forma se podia produzir os caracteres em quantidade suficiente para imprimir uma ou mais páginas. Sob a pressão do torno, o velino – pergaminho de alta qualidade, feito a partir de pele de bezerro ou cordeiro – não resistia à tensão imposta pela placa de metal que guardava os tipos. O papel, por sua vez, forçado à mesma pressão, continha a tinta mais espessa, apresentando uma nitidez regular de impressão. Eis o surgimento da indústria tipografia.[5]

Dos incunábulos impressos na oficina de Johann Gutemberg, em Mogúncia, até o final do século XVIII, o trabalho dos tipógrafos e impressores permaneceu o mesmo, com algumas pequenas alterações. A realização da segunda edição da Encyclopédie, a exemplo, seguia os “ritmos de uma economia agrária”, dependente da sazonalidade dos recolhedores de trapos e dos papeleiros.[6] Segundo Robert Darnton: “No início da Era Moderna, as tipografias dividiamse em duas partes, la casse, onde se compunham os tipos, e la presse, onde se imprimiam as folhas.”[7] Na composição alinhavam-se de forma manual e solitária um a um os tipos, formando linha a linha as placas. No trabalho de impressão eram necessários ao menos dois homens: um deles entintava as formas que estavam encaixadas sobre uma caixa móvel, com a prensa ainda aberta; o outro colocava a folha sobre uma armação de metal, onde eram fixadas as presas, e puxava a barra da prensa, fazendo o eixo girar em parafuso, produzindo uma das páginas. Terminada a resma, a atividade começava novamente, com a impressão no verso das folhas. Uma operação que requeria enorme esforço físico, tanto mais se tratando de uma tiragem grande. [8]

Portanto, até que se introduzissem efetivas mudanças técnicas, o período tratado compreende uma era de manufatura do livro. Entre o trabalho realizado pelos monges nos scriptoria e pelos copistas profissionais, que se instalaram sobretudo ao redor dos grandes centros e das universidades,[9] e a tecnologia adotada em 1814, com a prensa cilíndrica, e da força do vapor, a partir de 1830,[10] existe um intervalo de tempo no qual o trato com o livro é peculiar. Para os homens da época moderna, a relação com este objeto é diametralmente outra, opondo-se tanto daquela adotada pelos medievais, quanto da praticada hoje. O exame cuidadoso dos aspectos físicos era um expediente comum aos leitores do Antigo Regime. À qualidade das páginas era essencial uma espessura fina, de um branco opaco, com a impressão devidamente legível e em caracteres de bom gosto.[11] Uma preocupação material, de consumo, secular.

Junto à difusão dos livros, ocorreu a difusão dos formatos. Pouco a pouco, os pesados in fólio foram dando espaço a novos tamanhos, mais leves e com caracteres menores. Em pleno século XVII, quando a indústria já estava suficientemente estável, os impressores Elzevier lançaram uma coleção minúscula para a época, in-12, o que causou o espanto dos eruditos.[12] A partir de então, as pequenas edições invadiram o mercado com publicações in-12, in-16 e in-18. A predominância da literatura religiosa não cessou, mas o interesse por temas como Literatura, Artes e Ciências, nos circuitos legais, e literatura pornográfica, sátiras, libelos e crônicas escandalosas e difamatórias, que corriam nos circuitos clandestinos, só fez aumentar.[13]

A popularização de material impresso e a diversificação dos temas foram acompanhadas de um aumento do público leitor. A Europa experimentou um crescente processo de alfabetização entre os séculos XVII e XVIII. Analisando países como Escócia, Inglaterra e França, e regiões como Turim e Castilla (Toledo), o historiador Roger Chartier apontou, a partir de assinaturas em registros cartoriais, que a alfabetização demostrou avanços contínuos e regulares nesse período. E, na América, Nova Inglaterra e Virgínia, o movimento seguiu ritmos muito parecidos. Os ofícios e as condições sociais eram fatores determinantes para o ingresso, mesmo que de forma superficial, no mundo da escrita e da leitura. É quase certo que um clérigo, um notável ou um grande comerciante soubesse ler e escrever. Bem como, é quase certo que um trabalhador comum não dominasse essas habilidades.[14]

A imprensa não desbancou de imediato os textos manuscritos. A função e utilização dada à cópia e o público para quem ela se destinava, amplo ou restrito, condicionaram a forma de reprodução durante muito tempo. A sua imposição ocorreu devido à possibilidade de um aumento considerável da reprodução, ao barateamento do custo das cópias e a diminuição do tempo de produção de um livro. Cada leitor individual passou a ter acesso a um número maior de títulos e cada título atingia um número maior de leitores. Estes argumentos, porém, não justificam ou não explicam, por si, as “revoluções da leitura” experimentadas pelo Ocidente na época moderna. A mudança e aprimoramento das técnicas tiveram um papel relevante, mas não são as únicas determinantes.[1]5 Ao mesmo passo em que elas ocorriam, alteravam-se os paradigmas sobre as práticas de leitura e a epistemologia em relação aos livros. A revolução passou por dois movimentos. No final do século XIV, a leitura silenciosa se converteu em prática comum, ganhando um número cada vez maior de adeptos, e a escolástica foi perdendo força, tornando o livro um objeto dessacralizado, um instrumento de trabalho e de conhecimento das coisas do mundo. Segundo Chartier: “Essa primeira revolução na leitura precedeu, portanto, a revolução ocasionada pela impressão, uma vez que difundia a possibilidade de ler silenciosamente (pelo menos entre os leitores educados, tanto eclesiásticos quanto laicos) bem antes de meados do século XV”.[16]

Passou-se, gradualmente, do predomínio de uma forma de leitura intensiva, ler e reler várias vezes um número limitado de obras, decorando trechos, recitando e memorizando com um sentido pedagógico, até outra forma, extensiva. Tornava-se cada vez mais comum possuir alguns livros ou uma pequena biblioteca particular para estudo ou para lazer. Textos curtos, alguns efêmeros, impressos e manuscritos de hora, o comércio ambulante de livretos… em tudo contribuíram para esse novo costume. É sabido que as duas modalidades ocuparam o mesmo espaço de tempo e uma não fez desaparecer a outra, no entanto, as descrições, as pinturas, os escritos e outros testemunhos tendem a sublinhar a vulgarização dessa prática.[17]

Em estudo recente, publicado pelos psicólogos Noah Forrin e Colin M. MacLoad, do Departamento de Psicologia da University Waterloo, no Canadá, constatou-se que a palavra lida em voz alta aparece como uma atividade com “efeito de produção”. Ler e ouvir o que se está lendo, uma medida duplamente ativa – “um ato motor (fala) e uma entrada auditiva autorreferencial” –, faz com que os trechos ganhem distinção, fixando suas marcas na memória de longo prazo. Esta ação, realizada repetidas vezes operacionaliza a memorização de passagens longas.[18] Poemas da antiguidade ou do medievo, possuíam um sem número de versos que eram recitados, em maior ou menor proporção, por diversas pessoas e em diferentes locais. A leitura silenciosa (e extensiva), porém, implica em um vestígio distinto à lembrança, mais próximo da anamnese do que da fixação mnemônica.[19]

O resultado da pesquisa de Forrin e MacLoad pode ajudar a desvendar desencadeamentos que ocorreram no passado e que mudaram nossa relação com o livro. Por um lado, novos gêneros aparecem, uma forma narrativa mais alongada e menos rimada fez sentir sua presença: o romance.[20] Este, possui todos os aspectos necessários para agradar um leitor voraz, que folheasse um volume para seu entretenimento sem a preocupação de decorar passagens, mas, em alguns casos, o efeito foi justamente o contrário. Na lista dos best sellers da época moderna estão Nouvelle Héloise, Pâmela, Clarissa, Paul et Virgine, Souffrances du jeune Werther, Les aventures de Télémaque, dentre outros, novelas com capacidade de prender seus leitores por mais de uma sessão repetidas vezes.[21] Por outro lado, encadernados de caráter mais informativo, como os guias, as enciclopédias, os atlas históricos e geográficos, as cronologias, os almanaques, os catálogos, etc., ganharam cada vez mais espaço. Situação que provocava a queixa dos eruditos, como é o caso do suíço Conrad Gesner, que cunhou a expressão “ordo librorum”, mas não deixou de reclamar da “confusa e irritante multiplicação de livros”, provocada pelo significativo aumento dos números de títulos disponíveis no mercado.[22]

É sob esta arquitetura histórica que debruçam os estudos apresentados para a trigésima edição da Revista Cantareira, compondo o dossiê “Cultura escrita no mundo ibero-americano: identidades, linguagens e representações”. Fisicamente distante das metrópoles europeias, os súditos ibéricos instalados ou nascidos no continente americano não se furtaram a experimentar as consequências dessa nova invenção. Mais do que ler, eles refletiram sobre as ideias trazidas pelos livros e por outros impressos, transportados, muitas vezes, clandestinamente – “sob o capote”. Alguns assumiram uma postura conservadora diante das novidades; outros utilizaram as palavras como motivação para contestar a ordem social, a religião ou as autoridades estabelecidas. A historiografia brasileira avançou significativamente, nos últimos anos, sobre as temáticas abordadas aqui. Portanto, esses textos, ao mesmo tempo em que apresentam novidades relacionadas às pesquisas de historiadores em formação, nível mestrado e doutorado, também caminham por terreno consolidado.[23]

No artigo “A cultura epistolar entre antigos e modernos: Normas e práticas de escrita em manuais epistolares em princípios do século XVI”, Raphael Henrique Dias Barroso aborda os códigos e normas da escrita epistolar que circulavam os ambientes cortesãos do início do Quinhentos. Com base nas obras de Erasmo de Roterdã e Juan Luis Vives, o autor demonstra a presença destes códices nas missivas diplomáticas trocadas entre o embaixador D. Miguel da Silva e D. Manuel, monarca português entre 1469 e 1521.

O segundo artigo, intitulado “A incorporação de elementos da cultura escrita castelhana nas histórias dos códices mexicas dos séculos XVI e início do XVII” de Eduardo Henrique Gorobets Martins, mostra a importância que a cultura escrita possuía nas relações de poder no mundo ibero-americano. Longe de considerar os índios como vítimas passivas da colonização, o autor evidencia como diversos grupos indígenas, que se aliaram aos espanhóis contra os mexicas, se apropriaram da cultura escrita castelhana tanto com o objetivo de reescrever suas histórias a partir de novos vocábulos como se inserir na colonização para obter cargos e privilégios juntos aos espanhóis.

O artigo seguinte, de autoria de Caroline Garcia Mendes, também demonstra a importância da cultura escrita no campo político em um outro espaço: a monarquia portuguesa nos anos seguintes à Restauração de 1640. Intitulado “As relações de sucesso e os periódicos da Península Ibérica na segunda metade do século XVII: imprimir, vender e aparecer nos materiais de notícia sobre a Guerra”, a autora analisou duas dimensões do processo de profusão das notícias impressas em Portugal: a política e a econômica. Para tal, destaca a conflituosa relação entre impressores e cegos no que dizia respeito à circulação dos impressos. Do lado político, enfatiza a importância que certos feitos de alguns personagens adquiriam ao serem difundidos pela cultura escrita. No fundo de tal preocupação, estava a preocupação de se fazer ver diante de todos, especialmente do rei.

Em “Da devoção à violência: a atribuição da mentira como estratégia de discurso na Guerra Guaranítica”, escrito por Rafael Cézar Tavares, o exame recai sobre as estratégias discursivas de ambos os lados partidários dos eventos. Para tanto, o autor analisou três conjuntos documentais difusos: as cartas dos Guarani enviadas aos funcionários coloniais na iminência do enfrentamento; o relatório pombalino escrito já ao fim dos conflitos; e o Cândido de Voltaire, novela em que o protagonista visita o Paraguai no contexto da Guerra. Um estudo relevante acerca de um episódio pouco visitado pela historiografia geral, abordado pela chave da retórica como fonte de análise.

O artigo de Anna Beatriz Corrêa Bortoletto tem como centro a cultura escrita ao avaliar a confecção e a trajetória de um documento do século XVIII redigido por Luís Rodrigues Villares, um comerciante envolvido com a expansão da colonização no atual Centro-Oeste brasileiro. Inicialmente pensado como uma instrução para os comerciantes que atuavam na região, a autora demonstra com tal documento foi ressignificado a partir de sua trajetória e materialidade. Ao fazê-lo, destaca que, atualmente, o documento se encontra num códice com diversos documentos de autoria de Custódio de Sá e Faria, um engenheiro militar que também atuou na América portuguesa do século XVIII, em outras palavras, o documento era importante para a administração colonial. A partir disso, o artigo analisa que, provavelmente, o manuscrito analisado circulou até chegar às mãos do Morgado de Mateus, então governador de São Paulo, cujo um dos descendentes vendeu o códice que hoje pertence à Biblioteca Mario de Andrade em São Paulo que o adquiriu de um bibliófilo com o objetivo de preservar documentos que pudessem responder diversas questões referentes à história do Brasil, ou seja, diferentes temporalidades históricas conferiram diferentes significados ao manuscrito. Natalia Casagrande Salvador, em artigo intitulado “Cultura Escrita para além do texto: percepções materiais e subjetivas do documento manuscrito”, destaca a importância dos estudos da cultura material e da codicologia para a interpretação dos documentos históricos. A partir do Livro de Termos da Ordem Terceira de São Francisco da Penitência de Mariana, nas Minas Gerais, a autora analisa o papel enquanto suporte, os instrumentos e a escrita, o conteúdo e as posteriores rasuras e correções.

O último artigo deste dossiê intitula-se “Entre Livros, Livreiros e Leitores: a trajetória editorial e comercial da Guia Médica das Mãis de Família” escrito por Cássia Regina Rodrigues de Souza. A autora borda os manuais de medicina doméstica por meio do Guia Médica das Mãis de Família, publicado em 1843 pelo médico francês Jean Baptiste Alban Imbert com o objetivo de instruir mães e gestantes. Ao investigar a trajetória editorial e comercial, a fim de discutir os possíveis leitores da obra, a autora demonstra que seu alcance ultrapassou os limites da elite alfabetizada imperial e penetrou, de diferentes formas, na vida de mães recém-paridas, comadres e parteiras.

Por fim, encerra nosso dossiê entrevista gentilmente concedida pela Dra. Ana Paula Torres Megiani, professora da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas e Livre Docente em História Social pela Universidade de São Paulo. Em resposta a quatro diferentes provocações, ela nos contou primeiro sobre sua trajetória e formação, indicando os caminhos que levaram às suas escolhas temáticas e as tendências da historiografia principalmente nos anos 1990. Na sequência, abordou a questão da circulação dos livros manuscritos na época moderna, salientando a recente atenção recebida por essa fonte. Para, então, tratar das influências do desenvolvimento da cultura escrita, entre os séculos XVI e XIX, no mundo iberoamericano como uma das bases de sustentação da administração imperial. E, no último bloco falou sobre os chamados “escritos breves para circular”, atribuição de tipologia documental que, segundo nossa leitura, evidência o surgimento de um novo “regime de historicidade”, como classifica François Hartog, ou uma nova “experiência de tempo”, conforme Reinhart Koselleck.

Esta edição conta ainda com dois artigos livres e uma resenha. O primeiro, intitulado “O materialismo histórico e a narrativa historiográfica”, escrito por Edson dos Santos Junior, aborda o problema da narrativa e do pensamento materialista histórico a partir da obra de Walter Benjamin. No segundo, intitulado “Aleia dos Gênios da Humanidade: escutando os mortos”, Cristiane Ferraro e Valdir Gregory tratam da comunidade conscienciológica sediada em Foz Iguaçu e os lugares de memória do grupo que a compõe. Mathews Nunes Mathias resenhou a obra Coração civil: a vida cultural sob o regime militar (1964-1985): Ensaios históricos (2017), escrita pelo historiador Marcos Napolitano.

Notas

  1. FEBVRE, Lucien; MARTIN, Henri-Jean. O aparecimento do livro. São Paulo: Ed; USP, 2017, p. 76-80.
  2. Evidentemente, o processo histórico não é tão linear e simples quanto esta exposição, apresentando múltiplas inconstâncias. Nossa intenção, porém, objetiva explicar de forma sintética o aparecimento de uma ferramenta que transformou o mundo de variados modos. Para uma exposição mais cuidadosa, cf.: Ibidem, p. 105-108ss
  3. DARNTON, Robert. O Iluminismo como negócio: A história da publicação da “Enciclopédia”, 1775-1800. São Paulo: Companhia das Letras, 1996, p. 14.
  4. Ibidem, p. 176.
  5. Idem.
  6. VERGER, Jacques. Os livros. In: Homens e saber na Idade Média. Bauru, SP: EdUSC, 1999; FEBVRE, Lucien; MARTIN, Henri-Jean. O aparecimento do Livro… Op. cit., p. 59-63.
  7. DARNTON, Robert. O Iluminismo como negócio… Op. cit., p. 189.
  8. Ibidem, p. 150.
  9. WILLEMS, Afonso. Les Elzevier: histoire et annales typographiques. Bruxelles: G. A. van Trigt, 1880, p. 109.
  10. CHARTIER, Roger. As revoluções da Leitura no Ocidente. In: ABREU, Márcia (org.). Leitura, história e história da leitura. São Paulo: FAPESP, 1999, p. 95-98.
  11. Chamamos genericamente de “registros cartoriais”, os documentos analisados por Chartier, cuja tipologia varia de certidões de casamento até contratos comerciais. CHARTIER, Roger. Práticas de escrita. In: CHARTIER, Roger (org.). História da vida privada. Vol. 3: da Renascença ao século das luzes. São Paulo: Companhia das Letras, 1991, p. 114- 118.
  12. CHARTIER, Roger. As revoluções da leitura… Op. cit., p. 22-23.
  13. Ibidem, p. 24.
  14. CHARTIER, Roger. Uma revolução da leitura no século XVIII? In: NEVES, Lucia Maria Bastos P. (org.). Livros e impressos: Retratos do setecentos e do oitocentos. Rio de Janeiro: Ed. UERJ, 2009, p. 93-95.
  15. FORRIN, Noah; MACLEOD, Colin M. This time it’s personal: the memory benefit of hearing oneself. Memory, [s.n.t.].
  16. Utilizamos “anamnese” no sentido expresso por Platão no Fédon, que é o mesmo retomado pela medicina moderna, no qual a experiência é reconstituída pela consciência individual, por meio dos sentidos, como uma ideia; ao contrário da mnemônica, que se refere a um conjunto de técnicas para gravar de forma mecânica um conteúdo.
  17. CHARTIER, Roger. As revoluções da leitura… Op. cit., p. 26.
  18. Ibidem, p. 95-96
  19. BURKE, PETER. Uma História Social do Conhecimento. Vol I: de Gutemberg a Diderot. Rio de Janeiro: Zahar, 2003, p. 97; BURKE, Peter. Problemas causados por Gutenberg: a explosão da informação nos primórdios da Europa moderna. Estudos Avançados, São Paulo, v. 16, n. 44, p. 173-185, abr. 2002, p. 175; CHARTIER, ROGER. A ordem dos livros: Leitores, autores e bibliotecas na Europa entre os séculos XIV e XVIII. Brasília: Editora da UnB, 1994.
  20. Por ser profusa, evitamos listar a produção de historiadores brasileiros. O ato de enumerá-los, mesmo considerando somente os mais relevantes, seria exaustivo e injusto, pois em toda seleção sempre há esquecimentos por descuido ou por cálculo. O leitor interessado, de todo modo, estará bem informado consultando a bibliografia apresentada em cada artigo publicado adiante.

Claudio Miranda Correa – Mestrando do Programa de Pós-graduação em História da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

Gabriel de Abreu Machado Gaspar – Mestrando do Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal Fluminense.

Pedro Henrique Duarte Figueira Carvalho – Mestrando do Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal Fluminense


CORREA, Claudio Miranda; GASPAR, Gabriel de Abreu Machado; CARVALHO, Pedro Henrique Duarte Figueira. Apresentação. Revista Cantareira, Niterói- RJ, n.30, jan / jun, 2019. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

História e Linguagens / Cordis – Revista Eletrônica de História Social da Cidade / 2019

Às interlocutoras e aos interlocutores desta edição,

Os artigos de História e Linguagens da Revista Cordis, n. 23 do Núcleo de Estudos de História Social da Cidade (NEHSC), da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), alinhavam uma seleção de trabalhos tomados pelo viés interdisciplinar no campo das ciências humanas, de modo a exercer possíveis convergências – e por que também não, divergências? – entre debates correntes nas produções contemporâneas, cujas próprias fronteiras epistemológicas são borradas. Assim que a modernidade, seus conflitos e tensões, são um tema caro a esta edição, seja na literatura, no cinema, nos padrões estéticos ou, no limite, nos próprios padrões de civilidade que assinam a virada do século XIX para o século XX em páginas de almanaques, crônicas e padrões de beleza.

O elemento urbano, imagem clássica evocada pela gestação da grande cidade, pelo anonimato e a impessoalidade das multidões, ganham lume frente à iluminação pública do Oitocentos e às novas perspectivas histórico-sociais que engendradas por esse processo. Afinal, em que sentido os aspectos diacrônicos desse “moderno” produzem novos contextos sociais? Essa pergunta ampla é que estrutura a nova edição da Revista Cordis.

No primeiro artigo, “Cidade e história nas lentes do cinema”, Marcelo Florio trabalha o filme “A montanha dos sete abutres” (1951) de Billy Wilder, em que debate a “construção da ruína” tanto pela indústria jornalística quanto pelo indivíduo, e aqui nosso primeiro ponto de tensão com a modernidade, ou seja, a relação entre o sujeito individualizado – e individualista, frente aos interesses coletivos que diriam respeito à sociedade, mas, que sucumbem frente aos interesses privatistas da indústria midiática, específicos de um “campo relativamente autônomo” da vida social, com agentes em disputa nos termos e no sentido de Bourdieu, que Florio recoloca a partir do cinema e da imagem.

No segundo artigo, trabalho “Uma leitura iconográfica dos aspectos socioculturais da Rua do Triumpho por meio da linguagem cinematográfica” de Edinei Pereira da Silva, nos trás uma leitura iconográfica da cidade de São Paulo, com recorte específico do Bairro da Luz, a partir do documentário “Uma Rua chamada Triumpho (1969-70)” de Ozualdo Candeias. O pesquisador toma metodologicamente o cinema como documento a partir das representações sociais.

No terceiro artigo, “A literatura pulp fiction de Patrícia Galvão” – a dita literatura pulp fiction, considerada como gênero menor, forma de entretenimento popular no século XX nos EUA, é retomada por Francisco Carlos Ribeiro e Olga Brites que abordam a penetração desta linguagem na literatura policial brasileira tomando as especificidades da antropofagia cultural na obra de Patrícia Galvão (Pagu), em seus contos publicados na revista Detective, sob o pseudônimo de King Shelter nos anos 40. A crônica surge aqui como expressão estética na linguagem literária dentro da dinâmica e particularidade da estética modernista.

No quarto artigo: “A crônica e a cidade moderna: temporalidades do efêmero”, Leonardo da Silva Claudiano retoma por “uma conversa casual” – para usarmos os termos do próprio autor – as vozes da multidão que ecoam pela cidade mais rápida, mais fugaz e que emerge justamente no século XIX, contada por seus cronistas. O artigo aborda a construção de um cotidiano produzido por novos elementos da modernidade citadina, que entrecruza, por essa perspectiva os eixos: literatura, história e cidade, da crônica como experiência urbana.

No quinto artigo, saímos da crônica para as páginas do almanaque em “Almanaques de Rio Claro: cidade letrada, cidade do progresso (1873, 1895 e 1906)”. Neste trabalho, Arrovani Luiz Fonseca aborda justamente essa experiência do moderno pela perspectiva de mobilidade social – contraposta à sociedade tradicional, e que toma o “Almanaque” como projeto de poder civilizatório, simbolizando a prosperidade da pujante cafeicultura – e aqui ainda na virada do século XX, pela “concepção de cidade letrada” de Angel Rama – e aqui as profissões liberais, a ascensão do intelectual público nascem como projeto civilização a partir do ideário de progresso da “palavra escrita” em contrapartida às ambivalências da cidade Rio Claro.

No sexto artigo, os padrões estéticos de elemento modernos são trabalhados no texto: “Entre fotografias, anúncios e cartões postais: os discursos médicos produzindo imagens de beleza e saúde na Belle Époque paulistana”, de Marcia Barros Valdivia que problematiza os discursos médicos e as práticas eugênicas e higiênicas na construção de determinados padrões estéticos que, gestados ainda no século XIX, remanescem entre os séculos XX e XXI, bem como a circulação de um determinado padrão de beleza acompanhando mudanças éticas e estéticas que são difundidas acompanhando transformações econômicas no contexto da Europa central e das novidades tecnológicas trazidas pelo discurso hegemônico da modernidade, aliás, ponto de crítica da autora.

No sétimo artigo “O eterno retorno: as comissões de frente das escolas de samba do Rio e Janeiro no descompasso da modernidade (2000-2018)”, Elizeu de Miranda Corrêa perscruta os efeitos da modernidade no cotidiano em termos de “segregação institucional” a partir de fontes historiográficas, com as quais o pesquisador apresenta as mudanças decorrentes da introdução de novas tecnologias e, no limite, novos padrões estéticos às comissões de frente das escolas de samba do Rio de Janeiro sob uma influencia direta dos padrões de gosto determinados pelo mercado e consumo na perspectiva de Anthony Giddens. O autor articula o eixo ético-estético no contexto mais recente e tensiona a modernidade de modo crítico aos limites do poder econômico.

Naturalmente que o consumo é tema estrutural da modernidade. Se a expansão econômica acelerou processos e o tempo da vida nas metrópoles, ele criou mercados, especializou setores e profissionais e autonomizou o campo econômico em relação ao próprio Estado. A escolha dos dois últimos trabalhos são os aqui chamados “trabalhos divergentes”. Tratam-se de produções que focam aspectos mais resultantes dessas transformações de caráter morfológico das dinâmicas sociais.

No oitavo artigo: “Patrimônio Cultural Imaterial. A importância social do patrimônio Imaterial conforme sua trajetória” de Maria Luíza Belo Camargo e Veruschka de Sales Azevedo, vemos a relação entre mercado de consumo e padronização, aqui colocados pelo turismo, e a partir das tensões presentes no que tange o patrimônio cultural imaterial e sua regulamentação. Oposição clara entre passado e presente que permeiam uma construção de moderno que funciona como se esquecesse seu passado, ao menos em relação às políticas de patrimônio.

Finalmente, o nono artigo é mais específico de um contexto propriamente mediado pelo consumo, o trabalho “Comunicação para a transformação: empreendedorismo e inovação social no projeto pedagógico no curso de publicidade e propaganda” de Marina Jugue Chinem aborda questões ligadas à comunicação em termos de mercado e circulação monetária, isto é, de um ponto de vista técnico, a partir da publicidade e da comunicação participativa, e nos revela o processo de criação do gosto pelo mercado de consumo

Boa leitura!

Bruno Cuer – Sociólogo, doutorando em Ciências Sociais pela Universidade Federal de São Paulo – Unifesp. Colaborador da Revista Cordis e professor pela Universidade Guarulhos – UnG. E-mail: [email protected]


CUER, Bruno. Apresentação. Cordis – Revista Eletrônica de História Social da Cidade, São Paulo, n.23, 2019. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

História e linguagens: biografia – ficção – teoria da história / Revista de Teoria da História / 2018

Desde que Hans Robert Jauss, em sua conferência O que é e com que fim se estuda história da literatura? (1967), lançou o desafio de pensar a contribuição da literatura para a construção das percepções do mundo social, inúmeros esforços têm sido feitos por pesquisadores comprometidos em superar “o abismo entre literatura e história, entre o conhecimento estético e o histórico”. Os debates e reflexões acadêmicas em torno das relações entre História e Linguagens, em especial a partir de um eixo teórico em diálogo incessante com a Teoria da História, tem se expandido de modo significativo nas últimas décadas, reorientando os olhares da produção historiográfica recente às articulações entre expressões estético-culturais e a experiência temporal. Muitas das questões levantadas concernem, de um lado, às marcas da historicidade inerente às linguagens, ao exemplo da ficção, da autoficção ou da (auto)biografia, e, de outro, às contribuições das linguagens literárias para pensar os elementos constitutivos do fazer historiográfico: suas escritas, seus lugares, suas práticas. Estas e outras indagações norteiam as linhas centrais deste dossiê. Nele, reúnem-se pesquisadores e pesquisadoras de diversas áreas das humanidades, em especial da História e da Crítica Literária, interessados em dialogar com o referencial de pensamento proposto abaixo; com o fito de ampliar os domínios teóricos no interior da instabilidade que tem se formado na dimensão interdisciplinar dos estudos. Leia Mais

História, Linguagens e Movimentos / Projeto História / 2017

A Revista Projeto História, do Programa de Estudos Pós-Graduados em História da PUC / SP tem, historicamente, apostado na pluralidade teórica, temática e historiográfica, com particular ênfase na recuperação da historicidade e das vozes silenciadas. A revista também busca se afastar da endogenia, que muitas vezes marca a vida universitária. Nosso propósito é o de dar voz e vez a pesquisadores de outros estados do país e mesmo de outros países, em particular da América Latina. Nosso compromisso com uma sociedade aberta, democrática e includente não se dissocia do projeto de editorial, marcado pelo pluralismo, diversidade e diálogo com a produção intelectual em curso.

Esse volume da Revista Projeto História, intitulado História, Linguagens e Movimentos, buscou captar um traço decisivo da historiografia contemporânea: a multiplicidades de objetos de estudo. Dois elementos foram priorizados, por um lado as “Linguagens”, com ênfase nos estudos envolvendo as relações entre música, cinema, teatro, literatura e o periodismo. Conectado a isso, o dossiê da presente edição buscou valorizar os movimentos coletivos nos campos cultural, social, político e econômico. Conscientes dos riscos da “história em migalhas”, da hiperespecialização e do academicismo, buscamos aproximar as diferentes esferas da existência a fim de oferecer aos nossos leitores artigos que discutam assuntos diversos, que vão do debate econômico no Brasil do século XIX ao imperialismo norte-americano no Pós-Guerra. Da Igreja no medievo às relações culturais entre o Brasil e Portugal no século XX. Da imigração europeia às sensibilidades literárias em torno da experiência traumática da Segunda Guerra Mundial. Outra ênfase deste número está dedicada às conexões latino-americanas, dos embates entre bandeirantes e indígenas no interior dos impérios ibéricos às conexões entre Brasil e México ou ainda Cuba e Uruguai. Os artigos publicados possuem caráter interdisciplinar, capazes de colocar em diálogo diferentes temporalidades, saberes e tradições. Com esse dossiê, buscamos manter nossa tradição de promover um amplo debate sobre a diversidade historiográfica e a renovação da historiografia.

O artigo do professor Everaldo Andrade, intitulado “Mário Pedrosa e a construção do espaço imperial dos EUA sob o capitalismo monopolista” tematiza a trajetória intelectual empreendida pelo importante pensador brasileiro. O artigo analisa as linhas de força que levaram o país à uma ditadura militar em 1964, num contexto em que o capitalismo norte-americano desempenhou um papel decisivo na implantação de ditaduras no Brasil, bem como em outros países da América Latina, durante a Guerra Fria.

O artigo de Adailson José Rui, “O Caminho de Santiago no século XII: espaço de propagação dos ideais reformistas da Igreja”, discute o uso de fontes do século XII, principalmente do Liber Sancti Iacobi e da História Compostelana como espaço de propagação de ideias que visavam afirmar, entre os peregrinos, o poder do Papa e a centralização da Igreja em Roma. Estas discussões, inclusive o debate sobre o celibato, ensejaram um processo que acabaria por conduzir à reformas na vida da Igreja.

Leandro Mendanha e Silva e Paula Guerra aportam aos leitores da Projeto História o artigo “Encruzilhadas atlânticas: representações sobre Ângela Maria em Portugal, Angola e Moçambique”. No texto, os autores tematizam a maneira como a imprensa portuguesa tratou a passagem de Ângela Maria por Portugal e pelas chamadas “províncias ultramarinas”. As trocas artísticas e musicais nos jornais e revistas portuguesas sobre a relação Brasil-Portugal são importantes contribuições dos autores.

O artigo “A reforma da natureza e da agricultura: o exemplo dos inquéritos e dos congressos agrícolas no último quartel do Império”, de Roberta Barros Meira, investiga o inquérito realizado em 1874 pelos diferentes ministérios (Fazenda, Justiça e Agricultura), bem como os dois congressos agrícolas realizados em 1878. Essa documentação permite acessar o pensamento agrário brasileiro do último quartel do Império. Nesses discursos aparecem demandas nacionais ou regionais relacionadas a diferentes ângulos, como o ambiental, o político e o econômico.

O artigo intitulado “Indígenas, bandeirantes y fronteras coloniales ibéricas en América”, dos professores Hernán Maximiliano Venegas Delgado e Hernan Venegas Marcelo, representa uma contribuição internacional desse volume, pois promove uma análise da ação dos bandeirantes e resistências indígenas, apresentando um balanço da produção historiográfica sobre o tema, tanto em língua portuguesa quanto espanhola.

O texto do professor Ival de Assis Cripa, estudioso da história e cultura mexicana, “Quando a Ficção Se Confunde Com a História, Quando a Vida Parece Ficção: Manuel Benício, Heriberto Frías e suas estratégias originais de sobrevivência Intelectual”, tem como elemento central a análise da produção de dois intelectuais e periodistas – um brasileiro, Manuel Benício e, um mexicano, Heriberto Frías – que cobriram, respectivamente, a Guerra de Canudos e a Guerra de Tomóchic, ocorrida no México em 1892. Nesse artigo, o autor analisa artigos de jornal e obras literárias desses dois jornalistas, buscando refletir, dentro do espirito desse volume e de forma interdisciplinar, o que o autor intitula de “o embaralhamento entre o jornalismo e a literatura”, onde podemos acrescentar, também, a história.

Nessa mesma linha interdisciplinar vinculando história e literatura, temos o artigo “Entre enigmas e traumas: memória, história e literatura em três contos de Bernhard Schlink”, dos professores César Martins Souza e Luis Junior Costa Saraiva, que analisa três contos do escritor alemão Bernhard Schlink – A Menina com a Lagartixa, A Circuncisão e Johann Sebastian Bach em Rügen – vinculados à episódios traumáticos da Segunda Guerra Mundial, o texto apresenta uma discussão importante e atual sobre memória e silenciamento de episódios perturbadores e incômodos.

Finalizando os artigos diretamente vinculados ao tema do dossiê, temos “Quando sahir de caza, arme-te com o signal da Cruz”: instruções para a rotina de um menino cristão em um manual pedagógico português do século XVII”, da professora Giana Lange do Amaral e do professor Fernando Cezar Ripe que promove uma análise interdisciplinar, de um manual pedagógico português do século XVII, articulando uma discussão com a Educação, a Literatura de Comportamento Social, o discurso religioso.

Entre os artigos livres optamos por publicador o texto de Victor Andrade de Melo, Vivian Luiz Fonseca e Fabia Faria Peres, intitulado “Patrimônio esportivo: um tema de investigação”, por tratar de um debate entre o patrimônio esportivo e o processo de patrimonialização no Rio de Janeiro. Para os autores, essas ações contribuem para lançar novos olhares para o passado por meio do esporte impactando a maneira de se conceber a cidade através do estimulo às reflexões sobre o espaço público.

O texto de Almir Félix Batista de Oliveira, chamado “E o patrimônio no livro didático de História?” discute a temática do patrimônio cultural inserida no livro didático de História, em torno dos universos escolar e da sociedade. Para o autor, o papel educativo define a identidade e o caráter das relações passado-presente-futuro. Sendo necessário lembrar que a universidade precisa, cada vez mais, discutir o ensino de história, pois é uma das razões de ser da universidade.

O texto de Mariana Martins Villaça, “Cuba e a esquerda uruguaia: o Encontro da OLAS (Organización Latinoamericana de Solidaridad, 1967) nas páginas de Marcha”, apesar de incluído na seção de artigos livres, também dialoga com o tema do dossiê, ao apresentar uma análise do periódico uruguaio de esquerda Marcha, buscando mostrar “[…] os embates entre as organizações políticas a respeito de quais delas integrariam o Comitê uruguaio para participar do Encontro da Olas (Organización Latinoamericana de Solidaridad) em Havana, em 1967, representando, assim, a “vanguarda” da esquerda uruguaia naquele momento”. Nesse trabalho verificamos uma interessante discussão sobre imprensa, cultura e movimentos.

O último artigo desse volume, de Silvana Seabra Hooper, intitulado Geração e Juventude: O debate sobre a geração AI-5, apresenta uma análise do conceito de “geração” e promove uma discussão sobre as características dos jovens que viveram a violência do Ato Institucional nº 5, em 1968.

O volume conta também com uma excelente entrevista, realizada pela professora Jussaramar da Silva, em junho de 2016, com a jornalista Leneide Duarte-Plon, autora da obra “A tortura como Arma de Guerra – Da Argélia ao Brasil: Como os militares franceses exportaram os esquadrões da morte e o terrorismo de Estado”. Essa entrevista gira em torno de outra entrevista, que a jornalista fez com o general francês Paul Aussarresses. Esse militar atuou no Brasil como adido militar e foi um dos responsáveis pela disseminação, em território brasileiro, da Doutrina da Guerra Revolucionária ou Doutrina de Guerra Suja.

No fechamento do volume, temos a Notícia de Pesquisa, “Boas maneiras para crianças e jovens: O controle dos corpos na civilidade erasmiana no século XVI” de Ana Luísa Pisani com tema diretamente vinculado à proposta desse dossiê temático, através do pioneiro trabalho literário do humanista do século XVI, Erasmo de Rotterdam, em especial o livro de etiqueta direcionado para jovens.

Esperamos que as páginas dessa revista possam contribuir, mais uma vez, para o debate historiográfico através de uma leitura agradável e instigante. A pluralidade e a diversidade deste volume é nossa aposta no debate, na abertura e no diálogo historiográfico, teórico e temático.

Luiz Antonio Dias

Alberto Luiz Schneider

Os editores


DIAS, Luiz Antonio; SCHNEIDER, Alberto Luiz. Apresentação. Projeto História, São Paulo, v.59, 2017. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

 

História e Linguagens / Mnemosine Revista / 2017

História e linguagens, arte e sociedade

Carl Schorske, em seu belíssimo livro Pensando com a História, apresenta aos seus leitores as particularidades de Clio, musa da História, a qual tece o seu tecido com os fios colhidos em outras disciplinas, formando um mosaico único que chamamos de narrativa histórica. Segundo o autor, a habilidade maior desta musa está em saber trançar os materiais colhidos e os conceitos adotados, que não necessariamente foram plantados ou criados por ela, em um tear do tempo que de fato é seu, construído a partir de perspectivas particulares, próprias do seu oficio.

Pensar a história como um campo interdisciplinar não é apenas admitir a possibilidade de se utilizar objetos e conceitos de outras áreas para a construção do conhecimento histórico. Ao contrário, é partir do pressuposto de que o historiador pode estabelecer canais de comunicação a partir das especificidades do seu ofício, fazendo perguntas e estabelecendo interlocuções que o diferencie dos sociólogos, dramaturgos, cineastas, críticos, etc. Sendo assim, eleger um objeto artístico como fonte de uma dada pesquisa requer, por parte dos pesquisadores, o enfrentamento dos desafios teórico-metodológicos inerentes a um espaço de conhecimento que se encontra nas fronteiras entre saberes específicos. Cabe, tal como proposto por Carl Schorcke, tornar “significativas e frutíferas” essas relações, construindo uma trama que permita o enfrentamento de novas e instigantes questões.

Tal reflexão diz muito sobre os trabalhos que serão apresentados nesse dossiê, haja vista que o elemento que os unem é justamente esse olhar múltiplo para o campo historiográfico, compreendendo os homens (tanto os estudados, como os que os estudam) como seres multifacetados, entremeados em diferentes teias de relações, as quais podem (ao menos parcialmente) ser apreendidas a partir das linguagens artísticas outrora construídas por eles. Sob esse prisma, a ideia chave para a compreensão dos mesmos é o de interdisciplinaridade, pensada aqui não apenas como teoria, mas como uma segunda pele que reveste desde a escolha dos temas até a urdidura dos textos.

Neste sentido, o diálogo entre História e Arte pressupõe não apenas encarar o estudo das linguagens e da ficção (em qualquer recorte temporal e espacial) como objetos de pesquisa para o historiador, como também a constante compreensão e desafio do próprio fazer histórico e sua escrita como variantes de perspectivas representacionais, simbólicas, de formação e de contatos com determinados grupos sociais e de estudo. Por outro lado, uma problemática que se apresenta é se debruçar sobre questões da especificidade da análise da obra-de-arte, seja ela cinema, teatro, música, literatura ou artes visuais. Ao prender-se em uma visão mais “panorâmica” da história da arte, as ideias e as diversas obras são estudadas como pontos abstratos que, em conjunto quantitativo, formam o número de produções ao longo da história.

Analisar dessa maneira não significa perder a ligação que elas compõem entre si, mas, sobretudo, compreender suas peculiaridades e as singularidades de seus autores naquele determinado momento de produção. Dessa forma, buscou-se trabalhos que conciliassem, independente da região ou período da pesquisa, esse contato entre o interno e o externo da obra (suas características estéticas e sociais), unindo texto e contexto – para utilizar um termo de Antonio Candido.

Sob esse prisma, parte-se do pressuposto de que a História é um campo múltiplo, que acolhe uma infinidade de possibilidade de temas, bem como de perspectivas teórico-metodológicas. E é justamente essa diversidade e interdisciplinaridade, bem como o rigor intelectual e interpretativo, as marcas que este dossiê busca trazer aos seus leitores. Por isso, para além do eixo principal “História e Linguagens”, tem-se aqui algo mais amplo que é a relação entre cultura e homem, em diferentes temporalidades e espaços.

Em um dossiê que se apresenta com uma amplitude de temas na área das linguagens e da cultura humana em seus artigos, ainda se destaca, em meio aos estudos teatrais, cinematográficos e imagéticos de maneira geral, a valorização precisamente da imagem em si mesma, para além do próprio texto. Em seu ensaio Mundo Imagem, a ativista e escritora americana Susan Sontag nos diz algo realmente muito impactante: o mundo não é texto, é imagem! A colocação da autora choca de imediato, pois ela é diametralmente oposta a proposta de uma sociedade que se entende essencialmente como letrada e que muito valoriza o conhecimento escrito. Esses elementos são centrais numa concepção iluminista e evolucionista para o que se entende como “moderno”, em contrapartida para o “primitivo” e “não racional” que privilegiaria o oral.

Apesar desse “mito” da modernidade, ao observarmos em longuíssima duração diferentes agentes e grupos sociais, o que se percebe é um constante uso e / ou apropriação de imagens para a produção de discursos político-sociais, religiosos e culturais, e esse é um dos principais elementos de contribuição dos artigos aqui propostos, enriquecidos com discussões também sobre música, literatura, entre outros. Nesse ínterim, justamente para abrir o dossiê, propõe-se a disposição do artigo “Happy Birthday, ‘Sgt. Pepper’: as comemorações de aniversário do mais emblemático álbum dos Beatles”, que constrói análises sobre a relação entre música e recepção a partir da problematização da memória musical e da indústria cultural do país através da análise da imprensa brasileira sobre as comemorações desse álbum dos Beatles.

Dialogando teatro, encenação, ator e literatura dramatúrgica, Dolores Puga Alves de Sousa, André Luis Bertelli Duarte e Rodrigo de Freitas Costa formam uma tríade de discussões historiográficas acerca do universo teatral e televisivo da década de 1960 e 1970 no Brasil. Com o artigo “Análise do espetáculo teatral: a encenação de Gota D´água nos anos de 1970 no Brasil”, Dolores Puga avalia as premissas do diretor Giani Ratto, sua trajetória, ideias estéticas e políticas para esse momento histórico no país. Em “Mirandolina – da Estala jadeira de Goldoni à Favorita do Bairro de Vianinha: adaptação televisiva de um clássico italiano da década de 1970”, André Duarte analisa as historicidades tanto do texto original Mirandolina, de Carlo Goldoni na Veneza dos anos de 1753, quanto às adaptações na TV de Oduvaldo Vianna Filho para o Brasil de 1970. Já no artigo “Ruth Escobar e o início dos anos 1960 no Brasil: a atriz luso-brasileira frente aos desafios do engajamento teatral”, Rodrigo de Freitas Costa propõe um debate acerca do teatro engajado nacional a partir da avaliação da trajetória profissional da atriz luso-brasileira Ruth Escobar.

Na leva de análises cinematográficas, têm-se o diálogo tanto entre cinema e teatro, quanto de cinema e religiosidade. O dossiê apresenta, assim, um colóquio entre produções fílmicas brasileiras dos anos de 1960 e 1970. Inicia com o texto “[In]convenções representacionais em Navalha da Carne (1967 / 1969) de Plínio Marcos: Perfomances da Contraviolência”, de Robson Pereira da Silva, que discute o texto teatral de 1967 Navalha da Carne, de Plínio Marcos, e sua adaptação cinematográfica realizada pelo diretor Braz Chediak, em 1969, compreendendo o Brasil dos anos de 1960 para a década posterior com as análises do chamado “milagre econômico” e o estado de exceção. Já Fábio Leonardo Castelo Branco Brito e Edwar de Alencar Castelo Branco apresentam o texto “Estilhaços, diáspora e desterritorialização: vivências juvenis nos super oitos Por enquanto (1973) e Tupi Niquim (1974)”, abordando análises fílmicas de Carlos Galvão sobre as vivências de jovens teresinenses no Rio de Janeiro nos primeiros anos da década de 1970, os quais compartilharam experiências com o poeta e letrista piauiense Torquato Neto em um processo de desterritorialização geográfica e afetiva.

No quesito cinema e religião, o dossiê apresenta o viés cômico da vida de Cristo, pelo olhar do grupo Monte Pyton e sua obra de 1979, no texto “A Paixão de Brian – uma breve análise do filme A Vida de Brian sob o viés da Paixão de Cristo”, de Tami Coelho Ocar, o qual analisa o estudo de Jesus histórico e suas representações. Complementando esse viés, Lair Amaro dos Santos Faria propõe um debate entre várias produções fílmicas que retratam a narrativa da ressureição de Lázaro, exclusiva do evangelho de João, pelo artigo “A ressureição de Lázaro nas telas do cinema”, abordando a diferença significativa entre os públicos do evangelho e da cinematografia.

Na linha de diálogo entre cinema e televisão, Victor Henrique da Silva Menezes ainda enriquece o dossiê com seu texto “Quando (não) há interesse pela ‘Rainha da Bitínia’. Recepções antigas e modernas da virilidade de Júlio César”, que, embora não trabalhe com a perspectiva religiosa, explora análises da antiguidade e suas recepções fílmicas, problematizando as imagens criadas da figura de Júlio César nas películas e abordando questões acerca da virilidade e do masculino.

Em contrapartida, fomentando análises da perspectiva religiosa na imagem feminina, Juliana Batista Cavalcanti – em seu texto “Um Discipulado CoIgual. Repensando a Categoria de a*delfoiVgunai’ka” –, analisa a função das mulheres no movimento cristão e sua atuação missionária nos paleocristianismos, levantando críticas sobre os silenciamentos da temática pela forma como se estabeleceram as traduções para o português. Em diálogo com análises da imagem feminina, María Cecilia Colombani explora, em seu texto “Los vasos “hablan”: lãs mujeres enimágenes. Mismidad y Otredadenlaficción genérica”, a representação da mulher nos vasos de cerâmica do período arcaico e clássico gregos, problematizando a relação do “mesmo” e do “outro” em uma dada cultura.

Ainda na relação historiográfica com a imagem, o dossiê apresenta artigos no diálogo imagem / poder e imagem / moralidade nas artes visuais, a partir de análises de Portugal e Inglaterra entre os séculos XVIII e XIX. Assim se fundamenta o texto de Rodrigo Henrique Araújo da Costa, “Imagens das realezas do Império absolutista português: um estudo da relação entre o poder político da Coroa e as pinturas dos monarcas portugueses (1706-1826)”, que problematiza a questão das propagandas monárquicas a partir da avaliação das figuras retratísticas oficiais dos reis portugueses, nas pinturas, em comparação às trajetórias das nobrezas reais. E, da mesma forma, se configura o texto de Laila Luna Liano intitulado “Luzes e trevas: a moral ilustrada nas imagens de William Hogarth na Inglaterra do século XVIII”, o qual aborda as obras do pintor e gravador inglês William Hogarth (1697-1764) e o pensamento de moral nele suscitado.

O dossiê ainda apresenta outra análise sobre as terras britânicas, no entanto do século XV, abordando a relação entre imagem e morte. No texto “Da Carne ao Alabastro: formas de mostrar o corpo a partir da tumba de Alice de La Pole (Inglaterra, séc. XV)”, Amanda Basilio Santos explora as representações mortuárias a partir da iconografia presente na tumba transi da Duquesa de Suffolk, Alice de la Pole. A imagem ainda está presente em diálogo com a religiosidade no artigo “O medievo e a função das imagens na liturgia: uma breve tradução cultural do culto de São Francisco da comunidade Nova Assis em Capanema do Pará”, de Leonardo de Souza Câmara e Roberta Alexandrina Silva. Nesse texto, propõe-se fazer uma tradução cultural do culto de são Francisco por meio dos objetos litúrgicos na romaria à comunidade Nova Assis em Capanema do Pará em diálogo com o culto ao santo no medievo. Além disso, a perspectiva religiosa é mais uma vez abordada no texto “A Voz Que Grita no Deserto: João Batista Histórico e Seu Movimento”, de Vítor Luiz Silva de Almeida, no qual se analisa criticamente a trajetória de João (cognominado Batista) e seus seguidores inseridos nos movimentos e agrupamentos sociais de resistência na Palestina romana do século I.

Para finalizar a apresentação, o dossiê se fundamenta de artigos que exploram a literatura em suas diversas relações: seja pela perspectiva religiosa em conjunto com sua recepção, seja pela análise literária em conto ou pela estrutura e teoria literária. Em seu texto “Ireneu de Lyon e a Gnose Paleocristã: o uso do discurso performático em AdversusHaereses – século II EC”, Nathalie Drumond Alves do Amaral problematiza a pluralidade de interpretações sobre os ensinamentos de Jesus de Nazaré na realidade do paleocristianismo do século II, analisando o empenho discursivo como os do bispo Ireneu de Lyon, da região da Gália em sua obra Adversus Haereses.

Ao mesmo tempo, em seu texto “O sincretismo cultural nas aventuras de Pedro Malasartes”, Talitta Tatiane Martins Freitas propõe uma reflexão acerca do arquétipo do anti-herói e malandro, por meio da figura de Pedro Malasartese do folclore presente em seus contos. No texto “A descoberta das estórias como superação: Pingo-de-Ouro e Dito”, Mayara de Andrade Calqui parte de uma perspectiva psicanalítica das perdas afetivas e do luto nas estórias de Guimarães Rosa. Fechando o dossiê, no texto “Para além do velho mundo: problemáticas da dramaturgia comparada no Brasil”, Alexandre Francisco Solano explora o debate da formação da Literatura Comparada no mundo e, posteriormente, na América Latina, para apontar dificuldades e caminhos encontrados na comparação entre obras literárias e apresentações teatrais.

Os temas são ricos e múltiplos. Convidamos a todos a desfrutar desta proposta de enlace entre História, Linguagens, Arte e Sociedade. Tenham todos uma boa leitura!

Talitta Tatiane Martins Freitas – Doutora. Professora substituta no curso de História da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS / CPCX). Integrante do NEHAC – Núcleo de Estudos em História Social da Arte e da Cultura. Pesquisadora CNPq do grupo de pesquisa “História Cultural”.

Maria Dolores Puga Alves de Sousa – Professora Adjunta do curso de História da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS / CPCX). Doutoranda em História Comparada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ / PPGHC). Pesquisadora CNPq do grupo de pesquisa “História, Cultura e Sociedade” e do grupo “Universo Dialógico – Grupo de Pesquisa em Cultura, Política e Diversidade”.

Maria Juliana Batista Cavalcanti Miranda Tavares – Doutoranda em História Comparada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ / PPGHC). Pesquisadora e Coordenadora da Coordenadoria Cristianismos do LHER – Laboratório de História das Experiências Religiosas (IH-UFRJ).


FREITAS, Talitta Tatiane Martins; SOUSA, Maria Dolores Puga Alves de; TAVARES, Maria Juliana Batista Cavalcanti Miranda. Apresentação. Mnemosine Revista, Campina Grande – PB, v.8, n.1, jan / mar, 2017. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

A história e seus públicos. A circulação do conhecimento histórico: espaços, leitores e linguagens / História da Historiografia / 2016

 Desde hace mucho tiempo, los historiadores de la historiografía hemos estado atentos a los procesos de producción de conocimiento histórico, a las obras y a los historiadores cuyos aportes se consideraron más relevantes y a las instituciones, grupos y publicaciones que en cada momento fueron reconocidos como referentes de cambios significativos respecto del problema que se plantearon, del enfoque que le dieron a viejos o nuevos temas, de los métodos que utilizaron para abordarlos o de los cambios interpretativos que impulsaron. Hemos estado inclinados a destacar al mismo tiempo la novedad con el rigor de los cultores de un oficio que se ha renovado sin dejar de reconocer sus lazos de familia con antecedentes distantes en el tiempo.

Sin duda, estos temas seguirán estando en nuestra agenda. Sin embargo, el horizonte de cuestiones que orientan la reflexión actual en nuestro campo de estudios se ha ampliado notoriamente al incluir a los lectores, los contextos de lectura, sus gustos e intereses, los medios a través de los cuáles públicos amplios acceden al conocimiento histórico y a las fuentes de ese conocimiento. Nuevas preguntas surgen de dicha apertura: ¿Qué relación ha existido y existe entre el conocimiento del pasado y las diversas formas, espacios, medios y lenguajes a través de los cuales circula en la sociedad? ¿Cómo se difunde el conocimiento histórico en distintos espacios pero también en diferentes contextos sociales, culturales y temporales? ¿De qué manera se construye la imagen –verdadera o falsa- que vastos sectores sociales tienen de su pasado y qué consecuencias tiene para el futuro que se imponga alguna de ellas? Leia Mais

História e linguagens: usos historiográficos / História – Debates e Tendências / 2016

 

MEYRER, Marlise Regina; GODMANN, Glen. Editorial. História – Debates e Tendências, Passo Fundo- RS, v. 16, n. 2, jul / dez, 2016. Acesso apenas pelo link original [DR]

Acessar dossiê

História e Linguagens / Albuquerque: Revista de História / 2016

É com imensa satisfação que apresentamos a@s leitor@s de albuquerque: revista de história o dossiê História & Linguagens, conjunto temático de textos proposto com vistas à socialização e debate de pesquisas referentes ao amplo campo de contato interdisciplinar dos estudos da História e das mais distintas Linguagens, em suas diferentes facetas e suportes.

A História, tomada como forma específica de se conhecer e compreender o mundo, passa por transformações, na medida em que a sociedade se transforma e ela não é outra coisa que não um produto humano. É possível que essa seja uma afirmação óbvia, entretanto, em um período como esse no qual estamos inseridos, tão afeito a naturalizações, talvez não seja algo ruim retomar algumas premissas.

A História tem sido elaborada muito próxima a outras formas de compreender o mundo, por vezes sendo confundida com elas. Não somos @s primeir@s, claro. Na construção das hegemonias no vasto campo do ato de conhecer o mundo as tensões entre pensador@s, suas escolhas, suas incursões até outros campos, são percebidas.

Assim, a História já esteve muito próxima das artes, da filosofia, de outras narrativas e ciências. Num rasgo de necessidade, entretanto, inseridos no processo de cientificização da sociedade ocidental característico de fins do século XVIII e do século XIX, seus artífices buscaram o afastamento. Retirados, se impunham a tarefa de elaborar as fronteiras do campo, acompanhado de seus modos específicos de analisar, compreender e narrar as sociedades humanas no tempo. E isso foi feito.

Entretanto, o interesse em dialogar com outros campos, de nos aproximarmos de outras leituras de mundo e suas ferramentas, tem sido uma constante. As fronteiras, que em um primeiro momento foram tomadas como muros servindo para nos separar, foram sendo modificadas e tornadas zonas de contato. ´

Em diálogo com as Ciências Sociais os conceitos foram ampliados, o conjunto de fontes foi tornado quase ilimitado. Tomar de empréstimo à Antropologia o seu largo conceito de Cultura possibilitou um século de avanços robustos na compreensão das ações humanas no seu embate cotidiano com a natureza e entre sujeitos. Os estudos da psiquê, aqueles da economia, da política e tantos mais foram sendo observados e, em alguma medida, apropriados no fazer histórico e historiográfico.

Quando observamos dessa maneira a elaboração do conhecimento histórico, não causa estranheza que, à medida em que novos objetos foram introduzidos no corpo social, eles foram também tomados como forma de acessar os sujeitos e suas ações, agregados a tantos outros que estavam ali há mais tempo. Historiador@s que utilizam a arte para elaboração de suas interpretações podem ser observados desde o século XIX, a exemplo de Jacob Burckhardt e sua Cultura do Renascimento na Itália.

Na produção histórica brasileira, entretanto, é possível perceber a partir de meados dos anos 1990 o aparecimento cada vez mais frequente de trabalhos elaborados a partir do diálogo com as Linguagens e / ou que tomaram / tomam objetos estéticos como corpus documental, exclusivo ou não.

A difusão de autores como Edward P. Thompson, Raymond Williams, Roger Chartier, entre outros, nos cursos de História, foi um movimento importante, responsável por parte dessa ampliação do paradigma histórico nestas plagas. Mas, a partir de fins dos anos 1990, esse tipo de produção historiográfica se torna mais comum no Brasil, possibilitando um continuado incremento desta zona de contato, alargada.

Assim ansiamos, nesse dossiê, verticalizar reflexões e debater teórica e metodologicamente a relação entre história e as linguagens artísticas, a produção virtual, os movimentos de cultura, em suas diversas temporalidades e feições e representações, e os embates intelectuais que de tais expressões surgem.

O dossiê História & Linguagens foi composto como segue: o texto de abertura é de Janaina Cardoso de Mello, intitulado Os crimes contra mulheres nas fontes do Arquivo Geral do Poder Judiciário em Sergipe (1878-1935): cotidiano de poder, denúncias e impunidade; fruto de pesquisa da autora baseada na análise e cotejamento de cinco documentos encontrados naquele arquivo e que possibilitam a compreensão de um cotidiano de violência contra mulheres e impunidade de seus algozes em Sergipe, na passagem do século XIX para o século XX.

O artigo seguinte, Turismo literário: uma análise sobre autenticidade, imagem e imaginário, de autoria de Fernanda Naves Coutinho, Diomira Maria Cicci Pinto Faria e Sergio Donizete Faria, foi escrito com vistas a ampliar o conhecimento sobre esse segmento turístico, inserindo-o em uma teia ampliada de relações advinda da produção, circulação, ressignificação, apropriação de bens culturais, materiais e imateriais.

Já Alessandro Henrique Cavichia Dias busca compreender o processo de travessia de Sérgio Reis de uma carreira de cantor romântico ligado à Jovem Guarda para o mundo do cancioneiro rural, alterando toda a sua performance, inclusa sua indumentária, mas, sobretudo, no que tange ao próprio ritmo, instrumentação, etc. No artigo “O caminho do sertão”: a construção e a concretização da imagem de Sérgio Reis como intérprete da moderna música rural, Dias analisa como uma nova estética caipira seria elaborada pelo cantor, aproximando campo e cidade.

Ceildes da Silva Pereira & Fernanda Correa Silveira Galli tomam como objeto de análise um dos mais relevantes acontecimentos da história recente do país, a aprovação da PEC 241 / 2016, por meio da qual foram limitados os gastos governamentais pelo prazo de vinte anos. Discursos da / na mídia digital: efeitos de sentido sobre a PEC 241 é a análise das autoras, baseada na Análise do Discurso de linha francesa, sobre a construção discursiva daquele fato.

O texto de Wallace Lucas Magalhães, O imaginário social como um campo de disputas: um diálogo entre Baczko e Bourdieu, volta-se para a compreensão teórica das ciências humanas e sociais a partir dos conceitos de imaginário social (de Baczko) e campo (de Bourdieu), inserindo tal processo nas transformações sociais e intelectuais a partir dos anos 1960 na Europa, considerando o permanente imbricamento entre o real e o simbólico.

O artigo de Elite Borges Lopes, intitulado Comunidade da Ilha do Bananal: auto-organização da população em situação de rua na cidade de Cuiabá-MT, encerra esse dossiê. A autora transita pelas ruas da Ilha do Bananal, no centro da capital mato-grossense, e percebe ali a organização da população em situação de rua por meio de seus arte-fatos. Uma bela análise de vivências expressas também na arte pouco observadas pela academia brasileira, ou, ainda, pouco observada por quem quer que seja.

Esperamos que @s leitor@s apreciem as presentes reflexões que reafirmam os diálogos entre as áreas do conhecimento que elaboram análises sobre as sociedades contemporâneas por meio dos mais distintos suportes e com várias nuances, considerando a produção intelectual e artística como expressão relevante da sociedade global.

Na Seção de Artigos Livres, estão quatro outros trabalhos.

Partindo da interpretação de que, desde o período imperial, notadamente a partir da guerra contra o Paraguai (1864-1870), a fronteira oeste se tornaria objeto de interesse e de políticas do Estado nacional, Carlos Alexandre Barros Trubiliano escreve seus Apontamentos sobre as frentes pioneiras na Zona da Mata Rondoniense (1970-2000).

Eduardo Giavara compreende a fronteira como espaço de tensionamento; considerando essa premissa, no artigo As fronteiras do desconhecido: civilização e barbárie no oeste paulista, analisa os processos migratórios do século XIX e as transformações sociais havidas no oeste paulista em decorrência delas, no período que vai da publicação da Lei de Terras (1850) até a aquele da reorganização política daquela região por meio da chegada dos trilhos na cidade de Salto Grande.

Cesar Magolin, no artigo Política operária no pré-64: história e crítica, busca compreender a construção de uma política operária a partir das formulações do Partido Comunista Brasileiro (PCB), inserindo tal fenômeno no amplo e complexo processo político nacional e internacional que precederia o golpe de 1964.

Finalmente, Isabel Camilo de Camargo analisa o processo de formação de Sant’Ana de Paranaíba baseada no âmbito da história ambiental, considerando os embates e apropriações do corpo social com a natureza no tempo, no artigo intitulado Fontes históricas e a ocupação de Sant’Ana de Paranaíba no século XIX: possibilidades para se pensar a História Ambiental.

Miguel Rodrigues de Souza Netto – Doutor em História pela Universidade Federal de Uberlândia. Docente do Curso de História do Campus de Aquidauana da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. E-mail: [email protected]

Edvaldo Correa Sotana – Doutor em História pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”. Docente do Curso de História do Campus de Aquidauana da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. E-mail: [email protected]

Carlos Martins Junior – Doutor em História pela Universidade de São Paulo. Docente do Curso de História do Campus de Aquidauana da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. E-mail: [email protected]


SOTANA, Edvaldo Correa; MARTINS JUNIOR, Carlos; SOUZA NETTO, Miguel Rodrigues de. Apresentação. Albuquerque: revista de história, Mato Grosso do Sul, v.8, n.16, 2016. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

Linguagens, artes e política: interseções | Temporalidades | 2015

A 16ª edição da revista Temporalidades traz o dossiê “Linguagens, artes e política: interseções”, com a finalidade de contribuir para um profícuo debate acerca do tema e colocar em destaque propostas metodológicas e reflexões teóricas ligadas à arte e à política em interface com a história. A escrita da história está em constante movimento e se adaptando às “demandas” e transformações do seu tempo. A introdução de novos temas, novos objetos e o uso de novas fontes, permitiu aos historiadores a construção de novas metodologias de investigação histórica e novos métodos de produção do conhecimento. O alargamento do caráter interdisciplinar – ou a aproximação com outras áreas do saber – permitiu ao historiador aprimorar ainda mais a produção historiográfica. O presente dossiê, nessa perspectiva, coloca em destaque uma multiplicidade de análises e de fontes a “serviço” da escrita da história e amplia o entrecruzamento de temas, ideias e fronteiras. O dossiê apresenta, em suma, uma pluralidade de enfoques e diversidade de aparatos conceituais nos artigos que o integram. Leia Mais

História e Linguagens / Em Tempos de Histórias / 2011

Apresentação

É com grande satisfação que apresentamos a primeira edição de 2011, com o dossiê História e Linguagens. Primeiramente, gostaríamos de agradecer a todos os colaboradores que enviaram seus trabalhos e aos professores avaliadores que gentilmente se colocaram a disposição da revista Em Tempo de Histórias. Nós do Conselho Editorial, ficamos felizes com a oportunidade de prestar uma pequena contribuição para a troca de conhecimento, gerada com a publicação dos trabalhos enviados por estudantes de pós-graduação e pós-graduados de várias regiões do país.

O fascínio pela visita ao passado não se encontra somente no contato do presente com a alteridade, mas também nas distintas formas abordar esse passado. O dossiê História e Linguagens propõe uma reflexão acerca de algumas formas de linguagens – como a música, a fotografia, o jornalismo e o museu – em sua relação com o tempo, que lhes atribuem sentido e encerram suas possibilidades.

A presente edição está composta por três artigos na seção dossiê, além de outros quatro artigos e uma resenha. Como parte do dossiê: “Da história das ideias à história social das ideias: entre a renovação epistemológica e a prática historiográfica”, escrito por Gustavo Rodrigues Mesquita; “Fotojornalismo como fonte histórica: contribuições da comunicação para a produção historiográfica”, escrito por Eunice Ribeiro dos Santos e “O „Culto da Saudade‟ nas Comemorações do Centenário da Independência do Brasil: A Criação do Museu Histórico Nacional, 1922”, escrito por Júlia Furia Costa.

Na seção de artigos, apresentamos trabalhos de variadas temáticas, o que enfatiza as múltiplas possibilidades metodológicas na construção da narrativa histórica. O trabalho “Empreendimentos comerciais e a “questão indígena” nos sertões de Minas Gerais (1847-1860)”, com a autoria de Weder Ferreira da Silva, pretende discutir o contato entre a Companhia do Mucuri e a sociedade dos índios Botocudo, durante o período do Brasil Imperial.

Camila Gonçalves Silva redigiu o texto intitulado “Contra o „inimigo interno‟ a favor do Governo Militar: Imprensa e Censura em Montes Claros/MG 1964-1985”. Por meio da metodologia da História Oral, a autora se propôs a analisar tanto o perfil da imprensa escrita de Montes Carlos, quanto à presença de censores nas redações dos jornais.

Com o artigo “A industrialização brasileira em perspectiva histórica (1808-1956)”, Felipe Hees discorre a respeito do desenvolvimento industrial no Brasil, abrangendo desde as primeiras iniciativas que visavam incentivar as manufaturas no século XIX até as discussões a respeito do crescimento da economia ocorridas no Senado Federal, na década de 1950.

Entre outras questões, Marcus Vinícius Ramos argumenta que o isolamento do Paraguai na primeira metade do século XIX, pode ser entendido como um dos motivos da ascensão ao poder do ditador conhecido como Dr. Francia, no trabalho “O Ditador Perpétuo José Gaspar Rodríguez de Francia, O Supremo: Um “Príncipe” na Bacia do Rio da Prata?”.

Por fim, Fabiana Francisca Macena contribui com a resenha “Artífices de sua própria história: a Guarda Negra da Redemptora como espaço de construção de identidades e exercício da cidadania” realizada a partir da leitura do livro Guarda Negra: a Redemptora e o ocaso do Império com a autoria de Augusto Oliveira Mattos.

Boa leitura!

Ana Carollina Gutierrez Pompeu

Conselho Editorial

Acessar dossiê

História e Linguagens | Em Tempo de Histórias | 2011

Os estudos culturais vêm crescendo cada vez mais no âmbito da História, por ser o terreno da cultura capaz de contar histórias, representar passados e revelar sujeitos, colocando-nos em contato com as mudanças e permanências no tempo, matéria prima para a pesquisa histórica. A partir da leitura de diferentes linguagens como imagens, sons e escritas literárias, cinema, dentre outras construídas no passado, sociedades são descortinadas, sujeitos apresentados e mudanças percebidas, na medida em que essas linguagens são criações humanas, logo se tornam lugares privilegiados para quem pretende entender dinâmicas socioculturais.

As mudanças ocorridas nos últimos anos na historiografia possibilitaram o aumento considerável na quantidade e na variedade de fontes a serem levadas em consideração, a fim de entender os sujeitos no mundo, pois com base em estudos das formas e circunstâncias dessas criações humanas, o historiador busca entender as concepções de “mundo” dos sujeitos, tudo isso representado nas diversas formas de linguagens, que se apresentam as manifestações culturais. Segundo Certeau, a partir do lugar de que falamos é que se realizam as leituras das fontes, “mas o gesto que liga as ‘idéias’ aos lugares é, precisamente, um gesto de historiador. Compreender para ele é analisar os gestos de produções localizáveis, o material que cada método instaurou inicialmente segundo seus critérios de pertinência” (CERTEAU: 2002; 65). As manifestações culturais estão carregadas de memórias, gestos, ideias que revelam formas de pensar o mundo, assim como as sociedades. Leia Mais

História, Cultura e Linguagens / Albuquerque: Revista de História / 2010

Manter um periódico no Brasil não é tarefa das mais fáceis, especialmente no que se refere a publicações no campo das Ciências Humanas. Apesar de todas as dificuldades impostas aos cursos de história da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, materializadas, sobretudo, na sua pulverização em seis dos dez campi mantidos por essa instituição no interior do estado, o que vem inclusive obstando a construção de um Programa de Pós-Graduação na área, a Revista Albuquerque, graças ao empenho de seus colaboradores, dos membros de seu Conselho Consultivo e de seus editores, tem sustentado o desafio de apresentar à comunidade acadêmica os resultados de estudos de profissionais vinculados ao campo da História e áreas correlatas, do país e do exterior.

O saldo desse empenho revela-se na profícua troca de experiências que os profissionais da área de História da UFMS têm estabelecido entre si, bem como com professores e pesquisadores de diferentes áreas das Ciências Humanas que atuam nas mais diversas instituições de ensino e pesquisa nacionais e internacionais, permitindo não só a abertura de novas possibilidades de estudos, mas a constante ampliação do debate acadêmico, tido pelos editores da Revista Albuquerque como elemento essencial para o amadurecimento do conhecimento histórico.

Exatamente por isso, o periódico, dirigido e organizado por docentes dos cursos de graduação em História da UFMS, tem merecido o apoio de professores das várias instituições que compõem o Conselho Consultivo. Também a coordenação e os pesquisadores atrelados à Base de Pesquisas Históricas e Culturais das Bacias dos Rios Aquidauana e Miranda (BPRAM) assumem, a partir desta edição, papel importante para a manutenção da revista. Criada em março de 2009 como uma Unidade Técnica de Apoio ligada ao Departamento de História do Campus de Aquidauana da UFMS, a BPRAM é hoje um dos órgãos responsáveis pelas atividades científicas e culturais de interesse da UFMS. Entre as suas diversas atribuições constam o estímulo à pesquisa de caráter teórico e empírico visando ao aprofundamento e avanço do conhecimento da ciência histórica e de seus campos correlatos, o apoio e fortalecimento dos grupos e linhas de pesquisa, o estimulo e o apoio aos pesquisadores no tocante à publicação e divulgação de suas produções científicas. Nascidas ao mesmo tempo e agora juntas, a Revista Albuquerque e a BPRAM constituem-se em elementos fundamentais para a expansão da pesquisa histórica na UFMS.

Procurando manter e consolidar sua trajetória de instrumento de divulgação e debate acadêmico entre professores, pesquisadores e pessoas ligadas à produção do conhecimento, e seguindo uma proposta mais específica de sua linha editorial, a seção Artigos deste terceiro número da Revista Albuquerque acolhe importantes trabalhos referentes às regiões platinas e mato-grossenses. Os desdobramentos do encontro entre as cosmovisões do colonizador espanhol e dos indígenas americanos são examinadas por Raúl Prada Alcoreza no artigo Poder, Saber y Subjetividad en los Movimientos Indígenas. Já a memória e cultura das Comitivas, bem como o registro do cotidiano do peão pantaneiro, é tema abordado por Eron Brum em Cenários do Pantanal: o Gado, os Peões e as Comitivas. A seguir, um artigo de Ely Carneiro de Paiva contempla as expedições do explorador alemão Karl Von den Steinen, considerado o iniciador da investigação científica dos povos indígenas da América do Sul no final do século XIX. A seção se encerra com texto Charqueadas: uma alternativa na economia pecuária do sul de Mato Grosso (1880-1930 / 40), no qual Valmir Batista Corrêa e Lúcia Salsa Corrêa analisam papel das charqueadas na economia regional do sul de Mato Grosso.

Trilhando o caminho aberto no número anterior, esta edição da Revista Albuquerque apresenta o dossiê “História, Cultura e Linguagens”, que traz, em sua abertura, o artigo de José D’Assunção Barros intitulado Um caminho percorrido e perspectivas sobre os novos tempos. Nele, seu autor busca compreender a tarefa do historiador no tratamento que dá às fontes polifônicas, baseado no dialogismo inerente à própria forma contemporânea assumida pela narrativa histórica. D’Assunção Barros aponta para as transformações na historiografia a partir de meados do século XIX e, sobretudo, a partir da aproximação entre a História e outras disciplinas do campo das Humanidades no segundo quartel do século XX. Importa ao autor a constituição de uma historiografia dialógica incrementada a partir da absorção das linguagens artísticas como fontes possíveis para a interpretação dos historiadores.

Se este dossiê é inaugurado por uma reflexão de caráter teórico metodológico, ele segue com o estudo de caso apresentado por Marcos Antonio de Menezes em Baudelaire, a mulher e “o amor que não ousa dizer seu nome”. Tal reflexão baseia-se na interpretação de alguns dos poemas de As Flores do Mal, de Charles Baudelaire, especialmente naqueles que apresentam temas antes não atingidos pela leitura do historiador, como o erotismo lésbico. Ali, o historiador se encontra com o crítico literário e a junção de ambos oferece ao leitor uma visão pormenorizada da maneira como a sociedade parisiense de meados do século XIX interpretava os desejos que figuram além da heteronormatividade.

Se a margem social experimentada pelas discípulas de Safo nos é apresentada por Marcos Antonio Menezes, a composição de outra margem acadêmica é proposta por Peterson José de Oliveira. No artigo intitulado Novela: um gênero polêmico, o autor aponta para uma crítica literária canônica que negligenciou tal gênero em seus estudos, considerando-o menor. Para além desta constatação advinda da revisão da bibliografia especializada, Peterson José de Oliveira nos leva para outro campo, aquele do esfacelamento dos gêneros literários na contemporaneidade, ao mesmo tempo em que as convenções nominativas dos gêneros permanecem.

A sessão é finalizada com o artigo Movimento Divisionista e as diversas interpretações na historiografia: análise do Movimento Guaicuru, de Thaís Leão Vieira e Aline Xavier Cana Verde. As autoras se voltam para o Movimento Cultural Guaicuru e a reconstrução que tal movimento – posteriormente à divisão do Estado de Mato Grosso e o surgimento do Estado de Mato Grosso do Sul – faz da memória do indígena Guaicuru e sua distribuição espacial que, em última análise, apontaria para a existência de uma unidade espacial autônoma bem antes da divisão do Estado. Se outros suportes já foram utilizados para construir / compreender uma possível identidade sul-mato-grossense, para Vieira e Cana Verde importam o pensamento e a produção artística aqui estabelecidas nos anos 1980 e seguintes.

O dossiê “História, Cultura e Linguagens” constitui-se, portanto, de trabalhos das áreas de História e Crítica Literária, bem como do encontro das duas áreas, e, ainda, de historiadores que assimilam, em sua produção, as linguagens artísticas como fonte privilegiada de análise, no que se irmanam a um esforço da historiografia brasileira das duas últimas décadas, renovando o campo de interpretação das ações humanas no tempo e no espaço.

Finalmente, a seção Caderno Especial traz o documento intitulado Viagens a Mato Grosso (1887 / 88). Segunda Expedição ao Xingu, por Peter Vogel, traduzido pela Professora Doutora Maria Alvina Krähenbühl.

Esperamos que essa nova edição da Revista Albuquerque contribua para que o espaço por ela conquistado até aqui seja mantido e mesmo expandido.


Editores. Apresentação. Albuquerque: revista de história, Mato Grosso do Sul, v.2, n.3, 2010. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

Cidade e Linguagens / Cordis – Revista Eletrônica de História Social da Cidade / 2008

A Revista Cordis – Revista Eletrônica de História Social da Cidade – é resultado do esforço e dedicação dos integrantes do Núcleo de Estudos de História Social da Cidade (NEHSC), da PUC-SP. No decurso desses mais de 15 anos, o desejo de criar uma revista sempre esteve presente nas nossas discussões. Apenas agora vem a público este primeiro número, neste ano de 2008, onde grandes acontecimentos ocorreram nesta Universidade, nesta cidade, neste país e no mundo.

Como intelectuais que somos, e como historiadores que praticam a ciência do homem, não poderíamos deixar de recuperar algumas questões tão significativas dentro deste número “Cidade e Linguagens”. Gostaríamos de contemplar mais estudiosos desta temática, mas não deixaremos de fazê-lo nos períodos subseqüentes a esta primeira publicação.

A Universidade é o universo da diversidade e, para isso, a nossa proposta acompanha os ditames intelectuais desta prática. O NEHSC homenageia o Homem Cordial já apontado por Sérgio Buarque de Hollanda, além do percurso dos modernistas, que revolucionaram a cultura, caindo no movimento antropofágico, onde a Cidade e suas linguagens praticam a antropofagia social no cotidiano, particularmente na cidade de São Paulo, onde o humano se transformou no desumano, e onde as práticas éticas às vezes extrapolam os sentidos positivos que deveriam se manter.

Os artigos da temática “Cidade e Linguagens” enfocam os passos humanos na construção da cidade e buscam recuperar as singularidades inúmeras de suas caminhadas, como ressalta Michel de Certeau. Nessa perspectiva, os passos humanos constroem espaços, temporalidades e tecem os lugares, onde a metricidade dos sujeitos sociais produz a existência da cidade.

O NEHSC não se fecha na cidade de São Paulo, mas se amplia da Cidade Clássica à Contemporaneidade, onde seus integrantes têm dado contribuições excelentes para a Historiografia Contemporânea com seus trabalhos publicados, suas falas em palestras, e suas aulas metodicamente elaboradas, seja em São Paulo, Salvador, Fortaleza ou Burgos, onde temos desdobramentos e relações acadêmicas.

Os editores científicos e os conselhos editorial e consultivo se sentem honrados e felizes em apresentar neste número 1 pesquisas híbridas de cursos, profissionais, graduandos, pós-graduandos, etc. A diversidade é a competência da Universidade, e aqui se faz concreta.

São Paulo- SP, dezembro de 2008

Yvone Dias Avelino

Marcelo Flório

Editores Científicos


AVELINO, Yvone Dias; FLÓRIO, Marcelo. Apresentação. Cordis – Revista Eletrônica de História Social da Cidade, São Paulo, n. 1, jul. / dez., 2008. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

Arte e Linguagens / Revista Brasileira de História / 1998

O Dossiê que se apresenta neste número da Revista Brasileira de História, Arte e Linguagens, abarca múltiplas temáticas e temporalidades. No artigo de abertura, Arnaldo Contier discute, tendo por base a produção de Carlos Lyra e Edu Lobo, o projeto nacional-popular gestado na década de 1960; em seguida, Marcos Napolitano e Mariana Vilaça analisam o significado estético, social e histórico do tropicalismo e suas interfaces com a indústria cultural.

Com Tereza Aline, entram em cena as peças de Ariano Suassuna, Auto da Compadecida, e de Enrique Buenaventura, La Diestra de Dios Padre. Atentando para a ambientação, tipos, temas, microcosmo social e construção formal, o artigo discute a apropriação e a recriação da herança medieval ibérica no continente americano.

A especificidade da linguagem cinematográfica, por sua vez, é posta em evidência pela análise de uma seqüência de Os Bandeirantes (1940), filme de Humberto Mauro que produziu, segundo Eduardo Morettin, significados e sentidos nem sempre compatíveis com a expectativa de Taunay e Roquette Pinto, seus idealizadores.

Nos textos de Ricardo Marques e Sérgio Norte, a cidade é o personagem central. Com perspectivas bastante diversas, a resistência aos mecanismos de controle e condicionamento é tematizada: a Paris do século XIX versus os planejadores urbanos; a São Paulo do início deste século na percepção poética libertária.

Cândido Grangeiro conduz o leitor aos manuais de fotografias do século passado, atentando para a teia de relações que se estabeleciam entre o fotógrafo e os desejos, sonhos e fantasias do cliente, realçando os aspectos técnicos, estéticos e estilísticos que envolviam a produção de um retrato.

Do século XIX voltamos para a Florença renascentista e a poesia de Michelangelo. O processo criativo e as opiniões do mestre a respeito da hierarquia entre escultura, pintura e literatura são discutidos por Luciano Migliaccio, que ressalta o papel de Benedetto Varchi no processo de cristalização de uma determinada leitura desta lírica.

Annatereza Fabris fecha o dossiê com um texto que aborda a problemática da visualidade nas sociedades contemporâneas, tomada como uma nova escritura, alertando para o fato dos diferentes sistemas de produção de imagens remeterem a discursos peculiares que não se circunscrevem a aspectos meramente técnicos.

A diversidade presente na Seção Artigos não é menor. Bárbara Weinstein discute a recente produção norte-americana a respeito das questões de gênero, destacando os embates teóricos que a tem caracterizado; José Batista Mazieiro volta sua atenção para as representações construídas em torno da prostituição na cidade de São Paulo entre 1870 e 1920.

As relações entre técnica, trabalho e natureza na sociedade brasileira a partir da segunda metade do XIX, a supremacia das artes liberais sobre as mecânicas, a permanência de uma cultura literária e os (des), caminhos da cultura técnica no país são abordados por Hermetes Araújo. O seu artigo permite estabelecer um contraponto com o texto de Cláudio DeNipote que acompanha, por meio dos hábitos de leitura de dois intelectuais da década de 1910, a formação típica do homem de letras no Brasil

As questões que envolvem a posse da terra estão presentes nos textos de Vania Lousada, que estuda os projetos nacionalistas e de reforma agrária dos anos 50, e nas histórias de vida de ocupantes de terra na cidade de São Paulo, analisadas por João Carlos de Souza.

Os dilemas políticos atuais são o mote para Alexandre Hecker discutir a tradição democrática do socialismo brasileiro, por ele identificada ao Partido Socialista.

O presente número da Revista Brasileira de História fornece ao leitor um instantâneo significativo da produção historiográfica atual, em sua vitalidade e variedade de temas e abordagens.

Os recursos financeiros que viabilizaram a publicação foram disponibilizados pelo CNPq, ANPUH-Nacional e os núcleos de São Paulo e Santa Catarina.

Conselho Editorial


Conselho editorial. Apresentação. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.18, n.35, 1998. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê