Historia y memorias, relaciones entre arte e prisión /Revista de Historia de las Prisiones/2022

Este dossier reúne reflexiones sobre arte y prisión. Propone pensar las formas en las que el arte permite recrear/ reinventar las relaciones sociales en el espacio carcelario y más allá de él. Movidos por la preocupación, por lo que nos inquieta en relación a la existencia de las prisiones, el grupo a cargo de organizar este dossier formuló algunos problemas clave para animar a investigadores, artistas y activistas a reflexionar sobre sus aportes. ¿Qué espacios existen en las prisiones para la literatura, la fotografía, la pintura, el cine o la artesanía? ¿Cómo nacen y se desarrollan los proyectos artísticos en prisión? ¿Cómo puede ayudar el arte a mantener o incluso reinventar los lazos identitarios previos a la prisión? ¿Puede el arte ayudar a crear nuevos espacios identitarios en prisión? ¿Cómo conduce la producción artística a la investigación y cómo se expresa artísticamente? ¿Cómo puede el arte conducir a una reflexión política y ética sobre la prisión? ¿El uso del arte en las instituciones de privación de libertad tiene una historia? ¿Qué roles se le atribuían al arte en estas instituciones? ¿De qué manera la prisión es permeable a los movimientos artísticos y, por el contrario, de qué manera la propia institución Arte se desestabiliza y se recrea a partir del quehacer artístico dentro de espacios marginados, como las cárceles? Leia Mais

Arte, ciencia y tecnología en la Argentina y América Latina: perspectivas situadas | Cuadernos de Historia del Arte | 2022

En las últimas décadas, en parte impulsadas por los movimientos decoloniales y otras propuestas de revisión crítica de la modernidad occidental llevadas a cabo por el posestructuralismo, los feminismos y los posthumanismos críticos, entre otros, las producciones estéticas latinoamericanas han ganado terreno en los circuitos internacionales de producción, exhibición e investigación en arte, no sólo renovando la antigua pregunta por la identidad latinoamericana, sino también movilizando nuevas tensiones y negociaciones en torno a la noción misma de lo contemporáneo.

La conformación de un circuito internacional del arte, se sabe, no es nueva. Tampoco es nueva la instrumentación de tales instancias de formación, producción, exposición y crítica de arte como zonas estratégicas de intervención política en un sentido amplio. Trabajos ya clásicos de Anna María Guasch,3 Andrea Giunta4 y Diana Wechsler,5 entre otrxs, han dado cuenta de que los canales trazados entre bienales, ferias, residencias y demás programas internacionales de arte contemporáneo constituyen espacios públicos en los que se instalan temas, se visibilizan problemas, se establecen formas privilegiadas de abordarlos y, asimismo, se moviliza no sólo un ostentoso mercado de obras asociado a los carriles de consagración de artistas sino que en ellos también se modulan las identidades y pertenencias locales y regionales de acuerdo a un arreglo de participación planetaria. Este escenario ha venido progresando desde las exposiciones industriales del siglo XIX, mediante el circuito de bienales inaugurado en Venecia en 1895 e incluyendo las ferias y residencias más recientes; así, ha resultado en la conformación de un mapa mundial de encuentros y eventos que, hacia los años ’80 y ’90, experimenta una reorganización que torsiona su condición inter-nacional hasta redefinirla como “global” y que abandona el signo de lo moderno/posmoderno hacia la conformación de un ámbito caracterizado por lo “contemporáneo”. Leia Mais

Arte, política e cultura |  Almanack | 2021

Alphonse Mucha Política e Cultura
Detalhe de capa de Alponse Mucha: msterworks | Alphonse Mucha, 2007

Os registros visuais e audiovisuais de eventos, personagens e processos históricos relacionados às Independências e à formação de identidades nacionais nas Américas, vem merecendo o estudo e questionamento de pesquisadores brasileiros e estrangeiros.

As imagens, para além das representações e sentidos que lhes são atribuídos por seus autores, possuem enorme capacidade de gerar efeitos, de promover e propor intervenções sociais, o que alarga os circuitos de produção, circulação e atualização em que geralmente são inseridas. É fundamental, então, reconstituir e contextualizar historicamente não só as práticas artísticas e formais de que são o resultado mais aparente como, sobretudo, sua dimensão narrativa e o peso por ela desempenhado na construção e introjeção de conceitos e interpretações sobre as “comunidades imaginárias nacionais”, como as denominou Benedict Anderson, forjadas no Brasil e na América, desde o século XIX5. Leia Mais

História, arte e patrimônio cultural: interlocuções na construção do conhecimento histórico | História em Revista | 2021

Trouxas ensanguentadas Artur Barrio Política e Cultura
Trouxas ensanguentadas, de Artur Barrio | Foto: Bolsa de Arte

Arte, Patrimônio Cultural e História. Diálogos interdisciplinares que são a base do presente dossiê da História em Revista. Diferentes campos da História têm trabalhado em consonância com as mais diversas expressões artísticas, assim como com diferentes abordagens do patrimônio cultural. Nesse sentido, foi de interesse da publicação, pesquisas que se estruturam a partir do patrimônio cultural e das artes, sejam aquelas que compreendem as manifestações dessas áreas enquanto fontes históricas, sejam aquelas que problematizam os processos de criação ou de reconhecimento patrimonial.

O patrimônio cultural, para além de fonte de pesquisa histórica em suas acepções tangíveis e intangíveis, é também um aparelho político e ideológico que engendra relações de poder, conflitos e interesses de grupos sociais e dos Estados. Portanto a análise dos processos de patrimonialização, da criação e aplicação das políticas públicas para o patrimônio e dos embates em torno dos contextos de governança nacional e internacional da cultura também são elementos que interessam à História. Leia Mais

Patrimonio, arte y política. Producción simbólica y prácticas patrimoniales y de representación | Sophia Austral | 2021

Referências deste dossiê

[Patrimonio, arte y política. Producción simbólica y prácticas patrimoniales y de representación].  Sophia Austral. Punta Arenas, v. 27, 2021. Acessar dossiê

Arte e Política: raça, gênero e nacionalidades | Faces de Clio | 2021

É com enorme satisfação que apresentamos a edição número treze da Revista Faces de Clio com o dossiê “Arte e Política: raça, gênero e nacionalidades”, contando com 12 artigos ligados à temática do dossiê e 5 artigos livres. Temos a proposta, nesta edição, de apresentar discussões que contribuam nas pesquisas e reflexões acerca da complexa e estreita relação da arte com a política. Novamente apresentamos pesquisas que se detém sobre os mais diferentes suportes, desde o videogame, a ópera e a literatura, passando pela performance, pela dança, arquitetura e pintura. No presente dossiê reunimos artigos ligados à temática da raça, do gênero e das nacionalidades, pensados todos, claro, através e, a partir, da arte!

Este é o terceiro volume da Revista Faces de Clio publicado durante a pandemia do coronavírus e gostaríamos de agradecer à equipe da Faces de Clio por todo empenho em continuar com as atividades da revista diante de um cenário desolador da pandemia e do desmonte da pesquisa e da ciência no Brasil. É na resistência que encontramos formas de continuar sobrevivendo e lutando por um país mais justo e igualitário. Agradecemos também aos pareceristas que contribuíram com a revista e nos ajudaram a manter a qualidade de nossa publicação. Leia Mais

Mulheres e criações artísticas na História: tramas e poderes / Dimensões / 2020

A historiadora da arte Gisela Breitling escreveu em capítulo publicado na coletânea Estéticas Feministas a seguinte frase: “De repente, me dei conta de que era sobretudo um problema de linguagem, de falar ou de sufocar, de um discurso artístico que tentava quebrar um voto de silêncio de mais de mil anos” (1986, p. 214). Ela vinha tentando responder à pergunta de como as artistas mulheres estavam elaborando, na esteira dos movimentos de emancipação dos anos 1970, um discurso próprio, ou seja, uma estética que ela chamou feminista. Essa nova linguagem irrompeu como uma força vital e criativa que levou as mulheres a colocarem questões com a ousadia de respondê-las, sendo esta disposição parte de um lento processo subversivo de desconstrução de representações e de um lugar social feminino estagnados na sociedade. Contudo, para a autora, ao passo que o problema de linguagem foi identificado, paradoxalmente, outro se impôs, revelando a tragédia oculta “da falta de tradição artística das mulheres, bem como de sua história silenciada” (1986, p. 214). No seio dessa contradição, as artistas desbravaram possibilidades de expressão, buscando novas imagens de si mesmas, principalmente, e como consequência, começaram a encontrar o caminho para abalar a falsa universalidade do masculino. Leia Mais

Arte e política: Estado e nacionalismo / Faces de Clio / 2020

A Revista Faces de Clio, periódico discente ligado ao programa de pós graduação em história da Universidade Federal de Juiz de Fora, tem o prazer de apresentar a sua mais nova edição “Arte e política: Estado e nacionalismo”. Essa edição foi toda construída, desde a escolha do tema, o recebimento de artigos, avaliação dos textos até a diagramação dos arquivos, durante a pandemia do Coronavírus e a crise sanitária, política e social que estamos vivendo. Por esse motivo, reconhecemos e agradecemos o esforço de toda a nossa equipe e dos pareceristas que colaboraram para manter a qualidade da revista. Diante do complicado momento que enfrentamos, a Faces de Clio reforça o seu compromisso com a ciência e com a defesa da Universidade pública, ressaltando a importância de combatermos o negacionismo, o autoritarismo e as falsas notícias.

O presente dossiê apresenta vinte artigos que versam sobre o tema das relações e disputas entre a arte e política, com a temática mais ligada à utilização da arte pelo Estado e como instrumento de construção de nacionalismos. Partindo dos mais diferentes suportes artísticos, da música à história em quadrinhos, dos mais diversos espaços geográficos e períodos históricos, os textos apresentam grande contribuição historiográfica e cultural.

Abrimos a edição com o artigo do Álvaro Saluan da Cunha que busca apresentar alguns aspectos observados na coleção de gravuras e textos intitulada “Quadros historicos da guerra do Paraguay” e nas imagens e notícias da Guerra que circularam em periódicos como a Semana Illustrada e A Vida Fluminense, que foram úteis, não só para informar o povo da Corte, mas também para a consolidação da memória e do imaginário popular sobre o conflito.

Em seguida, ainda no campo da história militar, o artigo da Bárbara Tikami examina a relação entre a Marinha Brasileira e um determinado conjunto de quadros pintado por Eduardo de Martino, um oficial da Marinha Italiana que renunciou a sua carreira castrense para se dedicar a atividade artística após chegar a América do Sul.

Carlos Cesar de Lima Veras, em seu artigo, “Deus e o Diabo em Bacurau” tem por objetivo realizar uma análise acerca dos usos da história em duas produções cinematográficas brasileiras: Deus e o Diabo na Terra do Sol, filme de 1964 dirigido por Glauber Rocha, e Bacurau, filme de 2019 dirigido por Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles.

Continuando com a leitura, Carlos Conte Neto realiza um relato da recepção de Uivo e de outros textos beats na sociedade norte-americana dos anos 50 e 60, em seguida, aponta indícios de como essa literatura reverberou em Portugal durante a ditadura do Estado Novo, onde também provocou reações adversas, mas inspirou poetas. O artigo tem o objetivo de evidenciar aproximações entre a poesia ginsberguiana e os textos de alguns poetas portugueses da segunda metade do século XX.

Deivid Fernando Franco, em seu artigo “Do desencanto a desilusão: Rock e política nos anos 80” discorre sobre a relação entre rock e política, por meio da análise de letras de músicas e de entrevistas cedidas por artistas às mídias da década de 80. Buscou-se perceber se existem posicionamentos políticos nesses discursos e como se deram as relações entre política e rock nos quadros da redemocratização brasileira.

Em “Tancredo em Charges: A representação do humor gráfico na redemocratização (1985)”, Fábio Donato analisa charges publicadas em um conjunto de periódicos durante o período de transição da ditadura civil-militar no Brasil, selecionando periódicos da chamada grande imprensa.

A pesquisadora Fernanda Arouca, se propõe a analisar os trabalhos dos caricaturistas Calixto e Storni, integrantes da revista O Malho, que tiveram como tema a Grande Guerra, e a identificar o discurso sobre o conflito veiculado em um contexto no qual a propaganda e a censura da imprensa foram determinantes para o desdobramento do conflito.

Continuando a leitura, o autor Fernando Cardoso, pretende articular a memória visual e a política cultural imbricadas no painel figurativo “Capela dos fundadores” do artista curitibano Sérgio Ferro, com o que Fraçois Hartog denomina de os sintomas presentistas: memória e patrimônio.

Em seguida, Indaiá Demarchi Klein, busca compreender a presença da obra O Lago dos Cisnes (1887), originaria do período czarista, durante o regime soviético até o seu uso em turnês internacionais, como propaganda ideológica.

Janine Figueiredo de Souza Justen em seu texto “Imagens como tomadas de posição: Uma análise da caricatura política na revista O Malho (1902-1906)” propõe-se investigar as relações editoriais, ideológicas e estilísticas estabelecidas entre as imagens publicadas n’O Malho e seus produtores no contexto do “Bota-Abaixo” (1902-1906).

Leandro Martan Bezerra Santos faz uma reflexão sobre disputas de poder, narrativa, espaço e proeminência no campo musical, a partir da análise das composições do cantor Belchior. Para isso relaciona os trabalhos de Belchior com outros artistas da Tropicália e Pessoal do Ceará, além de tratar sobre a relação deste com a indústria musical.

No artigo “Arte, política cultural e cooperação teuto-italiana no Rio de Janeiro da Era Vargas”, Liszt Neto tem como base os interesses e estratégias comuns utilizados pela política cultural alemã e italiana no Rio de Janeiro ao se estabelecerem nas Américas. A partir disso, o autor estuda como a colaboração no campo artístico e cultural teve influência direta nas atividades da Pro Arte, associação de artistas e amantes das artes alemãs no Brasil.

Já Luciana da Costa de Oliveira realiza um estudo sobre o artista Pedro Weingärtner (1853-1929), atentando-se principalmente as pinturas sobre os espaços da imigração no Rio Grande do Sul e as atividades dos gaúchos, procurando problematizar as indagações que estiveram no entorno da construção da pintura Rodeio, finalizada no ano de 1909 e produzida a partir de uma encomenda do governo do Estado do Rio Grande do Sul.

Em “Napoleão como Filoctetes: Apropriação de um mito grego em uma caricatura antinapoleônica”, Mateus Dagios apresenta um caso de reapropriação do mito de Filoctetes na caricatura antinapoleônica, Nicolas Philoctète dans l’Îsle d’Elbe (1814-1815), que compôs um Napoleão ferido e abandonado, a partir da mistura da antiguidade, discurso nacional e caricatura.

O artigo escrito por Mikaela Moreno Vasconcelos Araujo, “Pintura Histórica na Amazônia: O vernissage de 1908 como Hauptmomente da história na Amazônia”, reflete sobre a Amazônia enquanto capital da borracha, na qualificação de uma Petit Paris. A autora destaca o projeto artístico-civilizador do intendente e mecenas que idealizara uma representação épica da história da nação, aos olhares pintores-historiadores da Europa do século XIX. A partir deste contexto, o artigo salienta a narrativa visual pintada por Theodoro Braga e Antônio Parreiras acerca da Amazônia.

Com intuito de analisar as representações do presidente Ronald Reagan (1911-2004) na história em quadrinhos “Batman, o Cavaleiro das Trevas” (1986), roteirizada por Frank Miller, Millena Barbosa de Carvalho, traz uma discussão sobre as possíveis relações entre este gênero textual e o contexto de sua produção, a década de 1980 nos Estados Unidos.

Em tempos de pandemia do vírus Covid 19, Pablo Lemos Lucena se propôs a pensar sobre as condições precárias dos entregadores que trabalham com aplicativos. O autor associa as imagens e vídeos feitas destes entregadores com autores como Achille Mbembe e Vladimir Safatle ou sobre arte política, arte como tomada de posição a exemplo de Georges DidiHuberman e Hall Foster, a fim estabelecer um diálogo sobre diversos aspectos, como o tempo, a impermanência, além das contradições e fraturas presentes em nossa sociedade.

A autora Paola Pascoal apresenta uma abordagem sobre a relação entre a criação de uma arte nacional e a própria formação da nação brasileira, a partir da análise da ressignificação dos resquícios da cerâmica arqueológica Marajoara, na primeira metade do século XX, que foram utilizados como fonte original da verdadeira arte brasileira.

A fim de realizar uma discussão sobre a consagração da baiana e dos balangandãs como um elemento da identidade nacional na Era Vargas, a autora Sura Souza Carmo faz uma análise das ações de fortalecimento do Estado, que na década de 1930, valorizaram as atividades artístico-culturais para reforçar o nacionalismo e unidade nacional.

No trabalho “Ingênua e frouxa substância humana: A Moreninha na encruzilhada entre Miroel Silveira e João Apolinário (1969)”, Thales Reis Alecrim, busca investigar o programa da peça A Moreninha, baseada no romance de Joaquim Manuel de Macedo (1844) e encenada em 1969, relacionando esta com uma crítica teatral escrita por João Apolinário, visto que este apresenta uma leitura diferente do romance.

Encerrando a sessão do dossiê temático, Wagner Pires da Silva, apresenta um diálogo com base na literatura, para mostrar como os russos se esforçaram na construção de uma Rússia comunista com melhor infraestrutura de ferrovias, estradas e fábricas, após a destruição destes, devido anos de conflitos.

A próxima edição da Revista Faces de Clio também terá o tema de Arte e Política. Felizmente recebemos muitos artigos de alta qualidade e resolvemos dividir a edição em duas partes, o segundo dossiê será lançado no início de 2021. Desejamos a todos e todas uma boa leitura e um 2021 mais leve e de muita luta!

Bárbara Ferreira Fernandes – Editora-chefe da Revista Faces de Clio, doutoranda em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail: [email protected]

Carolina Martins Saporetti – Editora-chefe da Revista Faces de Clio, doutoranda em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail: [email protected]


FERNANDES, Bárbara Ferreira; SAPORETTI, Carolina Martins. Editorial Faces de Clio, Juiz de Fora, v.6, n.12, jul / dez, 2020. Acessar publicação original [DR]

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Interfaces da arte no universo da história marítima e militar: estética, linguagens e representações |  Navigator | 2019

De longa data a arte relaciona-se ao universo militar. No Brasil, a guerra da Tríplice Aliança contra o Paraguai proporcionou aos artistas plásticos o engajamento na história presente. Foram chamados a produzirem a crônica cotidiana dos acontecimentos do front, ilustrando periódicos com suas gravuras, ou a construírem decorações efêmeras em homenagem à volta dos soldados. Pinturas monumentais, a exemplo do Combate Naval do Riachuelo, de Victor Meirelles, ou da Batalha do Avahy, de Pedro Américo, foram encomendadas, visando perpetuar a glória dos vencedores, reafirmando a força do Império brasileiro. Monumentos aos heróis foram construídos, enquanto algumas poucas pinturas e fotografias insistiram em apontar o custo humano do conflito. As Primeira e Segunda Guerras Mundiais, domínio já do fotojornalismo, não engendraram pinturas grandiloquentes no Brasil, mas alguns jovens soldados registraram em cadernos desenhos reveladores de suas emoções. Além dos conflitos, o cotidiano da vida marítima e militar foram igualmente representados.

Neste dossiê, várias linguagens se cruzam. Pinturas, desenhos, gravuras, cartões-postais, projetos arquitetônicos e canções foram analisados. São pesquisas desenvolvidas a partir de variadas fontes, mostrando forte interesse pela representação da História Militar, em seus múltiplos aspectos. Leia Mais

Arte e Historia | Artificios – Revista Colombiana de Estudiantes de Historia | 2020

La entrada, al cambio, sale por un poco más de sesenta mil pesos. Los horarios de visitas del museo suelen llenarse, por lo que las primeras entradas disponibles en línea aparecen para dentro de una semana, más o menos. Para ver la pintura toca hacer fila durante media hora. Aparece. El cuadro, que a esa distancia parece un punto, aparece durante treinta segundos y ya. El tumulto hace que, después de perder una buena parte de ese medio minuto intentando sacar algo de la obra, se termine perdiendo toda esperanza por poder distinguir algún detalle. Un punto. Un afiche. La foto obligatoria de todos los turistas que intentan cumplir con el requisito. El alivio que da haber madrugado para suavizar un poco el tiempo perdido en las filas.

La fama del cuadro se le debe en gran medida al robo cometido en 1911. Un empleado italiano del museo se lo llevó argumentando que un exponente del renacimiento italiano debía estar en Italia. A pesar de que el cuadro ya había pasado por las manos de líderes militares y nobles, este sólo fue puesto detrás de gruesas capas de vidrio blindado después de que, producto de la misma fama que empezó a gozar con el robo, se dieran unos cuantos intentos de vandalismo hacia este. Leia Mais

Mito, arquétipo e arte nas Performances Culturais / Revista Mosaico / 2020

Neste momento, em que estamos escrevendo a apresentação de um dossiê temático que há muitos meses nos ocupa e a humanidade está passando por uma pandemia grave, de proporções inimagináveis a nós todos há pouco menos de um mês atrás, temos que valorizar mais ainda o humano que existe em todos nós, e que desde tempos imemoriais atua como uma força propulsora de ações e pensamentos que, de uma forma ou outra, representa nossas dinâmicas mais profundas. Embora muitas epidemias tenham existido durante o trânsito da humanidade na superfície terrestre, essa em especial nos atinge quando somos todos adeptos de tecnologias virtuais instantâneas e podemos tanto difundir mais rapidamente doenças, ideias e ajudas, como transitar nos mundos pessoais e coletivos ao mesmo tempo. De forma simbólica, o mundo se aproximou, mas também é certo que as ajudas humanitárias viajam mais rapidamente de um lugar a outro. Pensar hoje o mote desse dossiê é pensar na atualidade de alguns mitos, expressões de dinâmicas arquetípicas, e dar vazão a uma das áreas humanas que mais ‘salvam’ o nosso espírito neste momento: a arte. Obviamente que os textos do dossiê não tratam desta pandemia, mas deixamos aqui uma pista para o leitor: pense esta época como o descortinar de problemas escondidos para debaixo do tapete da humanidade e das nações e que não mais poderemos negar daqui por diante. Várias dinâmicas arquetípicas e assuntos coletivos estão em pauta, como a questão do meio ambiente, a pobreza, a ganância, a solidariedade, o binômio saúde-doença e, não menos importante, a questão do amor (por si, pelo outro, pelo coletivo…).

O dossiê “Mito, arquétipo e arte nas Performances Culturais”, coordenado pelos doutorandos Luana Lopes Xavier, Ivan Vieira e pela professora Dra. Nádia Maria Weber Santos, do PPG em Performances Culturais da UFG, congrega 13 breves ensaios (12 nacionais e um internacional), relacionados à temática. Foi pensado inicialmente a partir da disciplina homônima cursada por mestrandos e doutorandos do Programa Interdisciplinar citado, em 2018-2. Porém, o dossiê vai além, uma vez que seu mote interdisciplinar dialoga perfeitamente com inúmeras disciplinas, o que fica óbvio a partir dos artigos publicados, configurando-se, assim, num campo de pesquisa profícuo em que a disciplina História é muito próxima de nossas discussões.

A reflexão principal deste conjunto de textos passa por apresentar e interpretar os diversos sistemas simbólicos em que se inserem os processos imagéticos contidos nas Performances Culturais. Estes sistemas são nomeados como mitologias ocidentais e orientais, contos de fada, folclore, cosmogonias e mitologias religiosas, astrologias, alquimia e outros sistemas culturais da representação humana. Os ensaios apresentam e discutem alguns sistemas simbólicos, incluindo os símbolos universais, isto é, arquetípicos, relacionando-os às temáticas e aos objetos de pesquisa de seus autores. As discussões teóricas dos textos são direcionadas a autores das Performances Culturais bem como a teóricos estudados na disciplina e aprofundados nos artigos, como o filósofo neo-kantiano Ernst Cassirer, o pensador da psique, original e revolucionário no século XX, Carl Gustav Jung e alguns historiadores, como por exemplo, Roger Chartier. Alguns conceitos são explorados pelos autores na inter-relação com seus objetos de estudo, entre eles: sistemas simbólicos, imagens míticas, mitologema, arquétipos e símbolos arquetípicos. Partindo da indagação “como pensar as imagens arquetípicas na produção imagética contemporânea e qual a relação entre imagem, ação e Performance”, os ensaios, embora breves, percorrem o caminho da tentativa de interpretação de algumas destas imagens, correlacionando sempre psique individual e psique coletiva.

Seria profícuo, aqui, esclarecermos, mesmo que rapidamente, nossos motes conceituais. Por Arquétipos, entendemos, a partir da definição feita pela psicologia junguiana, os constituintes (juntamente com os instintos) do inconsciente coletivo. Aparecem de forma mais pura nos contos de fada, mitos, lendas e folclore. Etimologicamente, a palavra arquétipo origina-se no grego archḗ (ἀρχή) e significa início, origem e num sentido mais amplo também arcaico, primitivo, primordial, elementar; e týpos (τύπος), cujo sentidos são impressão ou marca. Arquétipo é, assim, uma marca primordial do humano, dentro do humano (e não fora, não metafísica, como o querem alguns críticos da teoria…). É, sim, a disposição estrutural básica para produzir uma certa narrativa mítica. Ele é, além de “pensamento elementar”, também fantasia e imagem poética elementar, uma emoção elementar, um impulso elementar dirigido a alguma ação típica (situações típicas de vida). As dinâmicas arquetípicas, expressas simbolicamente na produção imagética da humanidade, revelam os dramas humanos mais típicos presentes em todas as sociedades.

Os mitos são a primeira expressão das formas arquetípicas e a linguagem essencial pela qual o conhecimento humano se manifestou por longos períodos, antes que a humanidade desenvolvesse o pensamento filosófico ou científico. Originalmente, a palavra mŷthos (μῦθος) descrevia qualquer tipo de relatos ou narrativas referentes ao presente e ao passado. Esta palavra se cristalizou na preferência de Homero e mais tarde os filósofos antigos preteriram os mŷthoi dos mitógrafos em favor de uma outra palavra: lógos (λόγος). O esforço era feito para desvencilhar a construção narrativa da Filosofia daquela realizada pela Mitologia.

Os filósofos categorizaram o mito e separaram a sua narrativa em funções, dentre as quais podemos destacar a função cosmológica ou teogônica, associadas ao ritual e ao culto religioso; a função etiológica, adequada a seu uso sociológico; a função mística, adquirindo um caráter consolatório para uma humanidade sem condições de desenvolver o pensamento filosófico; ou a função androgógica, estabelecendo uma relação de ensino e aprendizagem entre o mito e o indivíduo. Contudo, a maioria dos artigos reunidos nesse dossiê se interessam pelo que Mircea Eliade chamou de “mito vivo”, quer dizer, o mito que independente da função desempenhada se inseria num contexto de comunicação simbólica com as pessoas de um determinado lugar e contexto. Somente o “mito vivo” desempenha a última função do mito, que é a função psicológica belamente detalhada em muitos aspectos na obra de Carl Gustav Jung. O “mito vivo” apresenta a cada indivíduo da sociedade os modelos para a conduta humana e os velhos caminhos, percorridos uma e outra vez, pelos deuses e heróis da cultura na qual o indivíduo está inserido.

E mesmo na contemporaneidade, onde o mito parece ter perdido sua função explicativa e orientadora, ainda podemos sentir a sua força e perenidade quando descobrimos sua interação com as imagens simbólicas emanadas dos arquétipos. Afinal, os mitos contados e recontados, tantas vezes desde a aurora dos tempos, na infância da humanidade, cristalizaram em si as forças arquetípicas que até hoje conduzem o psiquismo humano.

A arte pode juntar-se a ambas definições acima. Nela encontramos possibilidades de romper com concretudes pré-estabelecidas, de nos reconhecer dentro de nossa condição humana. Somos sujeitos no mundo porque estabelecemos relações simbólicas e culturais que nos circundam.

A arte tem nos mostrado o espírito do nosso tempo e é por meio dela que podemos, sem necessidade racional, compreender a situação atual e os limites da própria existência. Somos corpos sensíveis e reincorporamos símbolos na medida em que criamos o tempo todo; a necessidade de criar se instaurou no ‘aqui e agora’ e é tempo de pensar o sentido da vida e a necessidade da arte. Nesse viés, frente ao capitalismo excessivo de nossa época e aos precipícios que a racionalidade nos impõe, por que não recorrermos a discussões sobre a natureza humana?

A arte, assim como os mitos, ou seja, o simbólico, nos propicia entrar em contato com as camadas primeiras, com as questões fundamentais. Ou seja, nos redirecionam ao ‘ser bruto’ e nos ligam indefinidamente à vida.

Desta forma, alguns exemplos práticos e analíticos foram pensados pelos autores, em suas temáticas e objetos de pesquisa, dialogando sempre com autores importantes. O que une a todos, assim como aos três conceitos sugeridos é a questão simbólica, sendo o símbolo a melhor forma de exprimir um estado de coisas que não pode ser expresso por outra coisa melhor do que por uma analogia.

Por fim, gostaríamos de agradecer à editora da Revista Mosaico da PUC de Goiás, Thais Marinho, que aceitou nossa ideia de publicar este dossiê. A proximidade do PPG de História da PUC Goiás, que esteve presente na formação deste PPG em Performances Culturais da UFG, nos é ainda muito cara e relevante. A disciplina História é um das que está na base desta área de diálogos interdisciplinares, assim com o Teatro, a Antropologia e as artes em geral. Agradecemos, também a todos autores, que se esmeraram em produzir ensaios que refletiram nossas preocupações em discutir o simbólico, através dos mitos, das tradições locais, arquetípicas e ou dentro dos mais diversos campos artísticos.

E que este momento de incertezas quanto à vida humana que estamos passando nos faça crescer em humanidade e em reflexões sobre o que realmente importa daqui para a frente em termos de coesão de propósitos para transformar o mundo em algo melhor.

Ivan Vieira Neto – Professor Assistente do Curso de História da Escola de Formação de Professores e Humanidades da PUC Goiás. Discente de Doutorado do Programa de Pós-Graduação em Performances Culturais da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Federal de Goiás. Universidade Federal de Goiás. E-mail: vieira. [email protected]

Luana Lopes Xavier – Doutoranda em Performances culturais (UFG). Mestre e Bacharel em Filosofia (UFG). Universidade Federal de Goiás. Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected]

Nádia Maria Weber Santos – Doutora em História (UFRGS). Médica, psiquiatra junguiana desde 1986. Bolsista de produtividade em Pesquisa do CNPq. Professora do Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Performances Culturais (UFG). Universidade Federal de Goiás. E-mail: [email protected]


VIEIRA NETO, Ivan; XAVIER, Luana Lopes; SANTOS, Nádia Maria Weber. Apresentação. Revista Mosaico. Goiânia, v.13, n. especial, 2020. Acessar publicação original [DR]

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ArteCidade / Urbana / 2019

Em consonância com o escopo da Revista Urbana, o dossiê ArteCidade amplia suas reflexões – sobre a produção do universo urbano em perspectiva histórica – enfocando desta vez produções e manifestações artísticas que florescem no meio urbano e tensionam suas ordenações.

Se Argan viu a “história da arte como história da cidade”, procuramos ver aqui como a arte tem se relacionado com a cidade, tem transformado o significado de seus espaços, e tem sido suporte para narrativas as mais diversas. Seria a arte que produz narrativas de cidade ou a cidade que produz arte? Da arte intrinsecamente urbana à arte desterritorializada-reterritorializada na cidade, podemos nos esquivar, como em um jogo de corpo de capoeira, dos cânones da história da arte, já amplamente difundidos ou mesmo repetidos, buscando nos concentrar na ginga sempre mutante das mais diversas manifestações artísticas, possibilitadas, inspiradas, cultivadas, provocadas pela atmosfera citadina. Falamos de arte intimamente relacionada com a cidade, que se cria a partir de brechas e das condições de possibilidade de muitas existências, de outras estéticas. Seja na estática de um edifício ou no movimento de um corpo, se há manifestação de posicionamento artístico e / ou ênfase poética, ambos entendem da necessidade-arte da viração na cidade. Das artes faladas, cantadas e escritas às artes caladas pelo cinza da tinta – ou por uma nova norma de uso do espaço público –, este dossiê vem difundir trabalhos textuais, no entanto, sem abrir mão dos referenciais imagéticos, sonoros, [olfativos, táteis] que, nas tensões das múltiplas linguagens, dialogam entre si evidenciando as interações da ArteCidade. O diálogo pode se dar ainda entre diferentes cidades, ou entre diversas formas de se abordar o mundo urbano; material, virtual, imagético.

As possibilidades de diálogos e conexões são muitas e foram aqui incentivadas, assim como as dinâmicas criativas do universo da fabulação, o qual comporta todas as categorias de expressão artística. Por isso, convidamos pesquisadoras / es que se interessam pelas composições da arte urbana, considerando suas dimensões subjetivas, simbólicas e materiais. Com suas inquietações fomos percorrendo outros caminhos, desvios da norma, pontos incomuns, subterrâneos, periferias e margens estilhaçadas. Paredes, muros e becos. Ruas, multidões, grafias e sonoridades. Cidades nas margens do Rio Paraná em Rosário, Argentina, nas paredes de Cachoeira no Recôncavo Baiano, no punk de São Paulo, nas muitas periferias cantadas no rap nacional, e em outras tantas margens – margem do mar, margem do mapa, margem feita de gente – são invocadas aqui.

A Entrevista realizada por Cristina Martins Tavelin com Felipe Marcondes da Costa, inicia o dossiê e nos apresenta um sujeito errante que concebe suas obras na interseção EM OBRAS / EM RUÍNAS. Os trabalhos realizados com Dulcineia e o coletivo paulistano que publica livros cartoneros em conjunto com uma cooperativa de catadoras de papelão, incentiva Felipe a realizar ações literárias em espaços públicos para “quem não tinha o hábito ler”. A partir de suas intervenções poéticas percebemos como os trabalhos coletivos instauram desejos de ações artísticas pela cidade. Incorporando um “espírito amador”, dois caras, “um levando seu corpo e o outro levando sua câmera”, se atiram “pra rua num projeto que é também de formação de público.” Perguntando e pensando sobre as experiências de Felipe, Cristina nos leva a questionar as fronteiras entre os corpos, as artes e as cidades. No centro da cidade de São Paulo, as performances instauram outros encontros além da normalidade — “nunca ouvi tanta gente me lendo em voz alta. É lindo ver um texto acontecendo assim! Quando as pessoas começaram a me abordar e chegaram a deitar comigo ali no chão então, aí foi incrível.” A potência política extravasa da obra e envolve as pessoas para atuarem junto, configurando a potência estética da ruína.

Continuando nesse caminho, Germana Konrath e Paulo Reyes notam e analisam a aproximação até a quase indistinção entre política e estética na obra de Francis Alÿs. Em um texto-ode à espacialização da / na obra do artista, Konrath e Reyes convocam Michel de Certeau, Jacques Rancière e a dupla Deleuze e Guattari para compor o corpo conceitual que explicita o caráter subversivo de ações propostas pelo artista. Este lança à comunidade a proposta de ação e é a partir e somente com a apropriação da comunidade pelo proposto que se configura a obra. A base é o impensável. Segundo Alÿs, dizem os autores, trata-se de “um presente a ser continuado.” Desse método, nascem alguns trabalhos em que a linha reta é subvertida em espaço público, campo da ação político-estética. E o espaço público de montes e mares e mesmo de ruas é subvertido pela linha reta proposta, mas, sobretudo, pela ação que se faz dela. Konrath e Reyes focalizam nas condições de possibilidade criadas e poetisam um texto declaradamente elogioso à obra de Francis Alÿs. “Suas ações simples e seus registros sempre porosos e parciais ajudam a compor diversas narrativas abertas, que atravessam o tempo como um mito que se alastra, operando taticamente tanto no presente quanto no pensamento projetivo de futuro e na memória que inventa passados.”

A interferência do artista e seu uso no / do cotidiano fazem da sua ação uma tática de guerra. A resistência a um ideário de cidade luminosa, espetacular, é o tema do ensaio Cartografia como narrativa, onde o autor delineia a figura de dois artistas como trapeiros contemporâneos, visto que se valem dos restos da vida comum e cotidiana nas cidades para constituir a matéria prima do seu trabalho. Os artistas-trapeiros são os argentinos Guillermo Kuitca e Jorge Macchi, o autor-ensaísta é Ricardo Luis Silva. Este nos põe em contato com as obras de base cartográfica daqueles artistas em um texto que faz um passeio entre algumas das principais referências que tratam das formas de resistência à cidade moderna como modelo de vida. Outros modos de vida não só são possíveis como deixam seus rastros e restos onde quer que queiramos ver. Para ver de perto, um dos trapeiros utilizou-se de um método de desenho de roteiro turístico completamente baseado no acaso: “Macchi coloca um painel de vidro transparente sobre um mapa de Buenos Aires e o alveja com um martelo, gerando uma série de rachaduras.” As rachaduras traçam os percursos a serem visitados e propõem ao leitor da obra uma experiência da cidade de Buenos Aires fora de todos os ditames do mercado de espetáculos urbanos.

Mirando essas rachaduras da cidade, Andre Abreu da Silva nos mostra os assombros da cidade punk de São Paulo. Vasculhando o Acervo Punk preservado no Centro de Documentação e Informação Científica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (CEDIC / PUC), o autor remonta as narrativas sobre o espaço urbano criado a partir das experiências raivosas de jovens adeptos ao movimento punk. A atenção às sensibilidades tramadas naquela prática político cultural, provoca uma leitura que valoriza suas produções. Essa postura errante, que veio se popularizar nas últimas décadas do século XX, via indústria cultural de massa, como punk rock, guarda entre suas performances a herança das / os insubmissas / os revoltadas / os que, em pequenas ações sub-reptícias, desviantes e insurgentes, ou em grandes movimentos coletivos de cólera, abalavam a ordem imposta com sua fúria ressentida. Sua movimentação errante pelos escombros e reconstruções nas grandes cidades revelam as profundas camadas de nossas história de dominação dos corpos. Por isso, concordamos com a sugestão de André de que “Numa incorporação histórica, os punks representariam uma das últimas formas de resistência aos ímpetos da modernidade avassaladora. Modelo de pretensões civilizatórias que devastara a cultura e os modos de vida dos habitantes antepassados da cidade, e que tem levado, sistematicamente, os seus poucos sobreviventes para as margens do espaço urbano.”

Nessa mesma direção, ouvindo ritmos e poesias, Roberto Camargos, investe em uma investigação sobre o campo de valores e modo de vida instaurado nas tensões das grandes cidades. Por meio das práticas culturais que envolvem o hip-hop, que transitaram com as diásporas modernas e nas tramas da sociedade globalizada, o autor, enfatizando as palavras e as batidas do RAP, nos leva a perceber uma abordagem crítica que nasce nos conflitos urbanos. Inseridos nas rimas daquele universo entendemos que: “ao aportarem justamente nos lugares em que a crise social e econômica e as transformações urbanas apresentavam contornos mais perversos, jovens marginalizados introduziram naquele contexto urbano práticas novas que, em alguma medida, mostravam sua interface com as questões que afetavam diretamente a vida da população mais pobre.” De suas experiências arrancaram representações que apontassem criticamente as mazelas sociais, mas que também valorizassem seu território de saber e as heranças de suas ancestralidades, compondo desta forma com uma narrativa em que “cidade, o espaço público, o direito à cidade e seus equipamentos públicos viraram fronts permanentes de batalhas em que as representações da periferia viraram objeto de intensa disputa”.

Seguimos os caminhos de Milene Migliano e Jessica Santana Bruno para lermos as intervenções feministas interseccionais nas paredes de Cachoeira, no Recôncavo Baiano, marcando a presença da diversidade de sujeitos na cidade. As narrativas e indagações de artistas, em sua maioria mulheres, que ocupam as atenções do meio urbano tensionando as linguagens artísticas, com lambes, graffiti, stencil e outras pinturas em muros e construções. Nesses diálogos públicos, “colocam o corpo feminino como foco principal, pondo em evidência o sagrado, a magia, a força e a potência que pulsa nestes corpos.” Além das intervenções, percebemos as produções artísticas gestadas no trânsito e nas trocas entre movimentos feministas no território brasileiro. Mulheres de São Paulo que intercambiam com amigas do Recôncavo Baiano e promovem uma narrativa interseccional na cidade.

Através das inscrições públicas, voamos do Recôncavo para as ruas do centro da cidade de Araraquara, no interior do Estado de São Paulo, onde Lucas Barbosa de Santana e Rafael Alves Orsia notam os efeitos estéticos e desdobramentos políticos dos grafites no centro histórico desta cidade média. Com os olhos atentos as mensagens gráficas nas paredes, os autores apontam para as contradições e disputas políticas no espaço urbano. Eles mostram como “o grafite além de não ser bem vindo, também é inviabilizado nessas áreas da cidade, já que apenas algumas poucas áreas estão realmente dispostas de grafite.” Entendemos no texto que nesse campo de disputas os ataques pintados nas paredes, também são frutos de negociações e acordos tácitos entre narrativas no tecido urbano. Nas ruínas dos lugares de memória e esquecimento, alguns transeuntes consideram aquele lugar um espaço de arte, nas paredes lemos: “A cidade é minha tela”. As tensões da mensagem, escondem os acordos, revelados pelos autores, entre o poder público e os agentes do aerossol com tintas.

As ressignificações das obras de arte pelo convívio [com o] público são observadas no texto escrito pelo grupo de pesquisadoras da Universidade do Estado da Bahia, Ana Clara Sousa e Silva, Beatriz Santos Alves Lopes Boaventura, Isaura Oliveira Figueiredo e Matheus Silva Nascimento, revelando as dinâmicas de interação entre cidade, arte e subjetividades. A partir de um exercício de alinhar diferentes perspectivas teóricas e contrastá-las com obras de artes dispostas na cidade de Salvador / BA, as autoras defendem “a arte para além de uma forma imposta” e percebem que a apropriação da arte na e pela cidade “não nasce no cartesianismo moderno, mas nas demandas subjetivas da contemporaneidade”. Pensando as relações tramadas no espaço urbano e nas tensões em torno das manifestações artísticas “material ou imaterial, numa área predominantemente residencial, comercial ou até mesmo numa zona de interesse artístico e cultural”, elas apresentam as “diferentes leituras da função social da arte e sua relação com o espaço”. Com esse grupo de intelectuais, revisitamos os lugares que compõem as obras: “ A Mãe Baiana” de autoria de Carybé, “As meninas do Brasil” de Eliana Kertész e o Largo de Santana ao Mariquita no Bairro do Rio Vermelho e descobrimos os múltiplos sentidos que tramam Salvador / BA.

Ainda em Salvador, Maria Emília Regina e Erica Checcucci observam como as possibilidades de expressão cultural nas Festas de Largo da capital da Bahia – através da produção das barracas de comidas e bebidas – são estrategicamente apropriadas pelas normas que visam a sua padronização. Estrategicamente, porque visam a ampla atuação do poder público na organização e controle das Festas, conduzindo a sua exploração comercial, e restringindo cada vez mais a participação dos chamados “barraqueiros” na composição do evento. Diferentes marcos regulatórios vão interferir no que é entendido pelas autoras como “sistemas dinâmicos instáveis”: as Festas de Largo de Salvador. Elas analisam especialmente os marcos ocorridos entre 1989 e 2018 e tecem uma crítica propositiva no que concerne ao engessamento padronizador provocado pela regulamentação na produção dos “artefatos culturais”, como são entendidas as barracas que se constituem no principal elemento do cenário das Festas de Largo. Assim, constroem “uma narrativa histórica das intervenções municipais (eventos) nas Festas de Largo, com vistas a entender a perda da expressão artística na construção das barracas”.

Em outra região do cone sul da América Latina, percorremos com Sabastián Godoy as ruas da cidade portuária de Rosário, na Argentina, e topamos com uma série de repertórios de ação artística ativadas naquele espaço. Voltando à década de 1980 e 1990, Godoy apresenta a formação de grupos de artivistas – ARTE&VIDA – que se engajaram em manifestações e insurgências que provocaram intensas transformações na vida urbana. Passamos a conhecer o coletivo Arte en la Kalle que ocupava, com murgas e performances carnavalescas, as marchas do dia 24 de Março – evento fúnebre que se preocupa em lembrar a Ditadura Militar. Lemos o ressoar dos grupos de murga argentina e suas provocações sonoras como os Los Bichicome y Caídos del Puente. Deparamos com as criações circense e as ocupações da cultura punk no Galpón Okupa. E, por fim, a articulação entre três grupos com outros participantes, tais como os organismos e militantes de agrupação “Hijos e Hijas por la Identidad y la Justicia contra el Olvido y el Silencio (HIJOS)”, vizinhos de bairro e advogados cujo objetivo era “poder alertar y ofrecer herramientas de defensa a los menores de edad, las principales víctimas del incremento de la violencia policial. El colectivo de artistas ideó una suerte de “campaña publicitaria”. Os desvios subjetivos narrados pelo autor, lembram os traços de desordenação das produções juvenis intermináveis nas metrópoles comunicacionais, anotadas por Massimo Canevacci em “Culturas Extremas: Mutações juvenis nos corpos das metrópoles” (2018). Por outra via de interpretação, Godoy reconstitui as desordens das revoltas ressentidas a partir das espacialidades tramadas entre, o que ele chama de: a performática, a contecimentação e a paisagem do eventual. Essa composição se materializam, seguindo suas observações, como uma série de possibilidades tramadas entre os corpos, as representações, os imaginários, as subjetividades, os objetos e as relações espaciais que transitam e transformam as dinâmicas no espaço.

A proposta lançada na chamada do dossiê foi ganhando corpo à medida que recebíamos as provocações de autoras / es de diferentes experiências de ArteCidades. As escolhas para integrar o material final demandou tempo, dedicação e a contribuição de nossas / os colaboradoras / es. Após construirmos o diálogo entre os artigos e suas / seus respectivas / os autoras / es, convidamos o artista João Costa para desafiarmos as linguagens convencionais das revistas acadêmicas e produzirmos, estimulados pelas provocações que surgiram no dossiê, um outro material gráfico que pudesse circular e divulgar por outros meios essa arte coletiva. Por isso, além da versão online disponível no site da Revista Urbana, temos uma versão impressa inspirada no formato de FANZINE – uma pequena revista produzida de forma livre e alternativa, criada (na década de 1970) nos meios urbanos por pessoas que não dispunham de recursos técnicos e financeiros para divulgarem suas artes, mas que, seguindo a filosofia do “faça você mesmo”, difundida nos meios underground, criaram táticas para disseminarem seus pensamentos. Partindo dessas ideias, assumimos uma forma que dialogasse com o conteúdo e que tornasse possível a circulação desse material para além das redes da internet. Assim, brindamos nossas / os leitoras / es com uma versão que pode ser baixada e impressa para o formato de FANZINE. Nosso desejo é que possamos usar essas ARTES para ocupar nossas CIDADES, como também usar as CIDADES para compor nossas ARTES.

Este percurso entre diferentes ArteCidades pretende-se apenas o começo ou o pedaço de um amplo território experienciado por essas pessoas que buscam arte na cidade, ou a cidade na arte. Que continuemos percorrendo, mesmo que imageticamente, as nossas ArteCidades, nos colocando disponíveis às suas interpelações estéticas, éticas, poéticas, políticas.

Parte desta edição da Revista Urbana foi feita no contexto da pandemia do coronavírus [2020], agravado pelo descaso do poder público federal e por seu aguçado desejo de morte. Por isso, dedicamos essa ação coletiva às vidas humanas que anseiam por arte e por condições de vida urbana. Que o pós-pandemia seja contaminado de sensibilidade às diversas formas de expressão da vida na ArteCidade.

João Augusto Neves – Universidade Estadual de Campinas. E-mail: [email protected]

Maria Isabel Costa Menezes da Rocha – Universidade Estadual de Campinas. E-mail: [email protected]


NEVES, João Augusto; ROCHA, Maria Isabel Costa Menezes da. Editorial. Urbana. Campinas, v.11, n.3, set / dez, 2019. Acessar publicação original [DR]

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Poéticas feministas na história, arte e literatura / História – Questões & Debates / 2019

Esse dossiê reúne pesquisas e reflexões historiográficas contemporâneas que elaboram a perspectiva poética e criativa de mulheres nas artes, na literatura e na história. As elaborações das subjetividades numa dimensão de gênero, o dinamismo dos processos históricos e as críticas culturais feministas são alguns dos principais enfoques dessas pesquisas que abordam a produção cultural feminina. Os campos literário, artístico e ativista são, assim, estudados em suas articulações culturais, políticas e históricas, tendo como eixo de análise a transformação cultural incitada pelos feminismos contemporâneos, em suas intersecções com as questões étnico-raciais, de classe e geracionais. Poéticas feministas, dessa forma, podem ser encontradas em diferentes práticas discursivas, relações intersubjetivas, militâncias políticas e mais claramente nas produções artísticas e literárias. Esse dossiê, portanto, pretende refletir sobre suas especificidades, sentidos, impulsos éticos e subjetivos.

Tais reflexões advindas da elaboração epistemológica feminista no campo historiográfico e na crítica literária merecem destaque e reflexão, posto que apenas muito recentemente elas têm avultado maior espaço.[1] Os trabalhos aqui reunidos demonstram o esforço inventivo e investigativo de grande fôlego por pesquisadoras do Brasil como Norma Telles, Margareth Rago e Mônica Campo acompanhadas das argentinas Tania Diz e María Laura Rosa. Merece destaque, também, o espaço dado no dossiê para a publicação de um artigo da escritora Julia Lopes de Almeida que repousava esquecido nos arquivos nacionais. Escritora de grande fama em seu tempo, Julia Lopes de Almeida mostrava entre finais do século XIX e início do XX a necessidade premente de dissolvermos a noção de gênio artístico e de compreendermos o rico universo imaginário e político oferecido pelas mulheres. Os esforços da pesquisadora Gabriela Trevisan, junto ao da historiadora Margareth Rago para trazer esse texto a público, nos mostram, assim, como o pensamento sobre a poética feminista é assunto de longa data, com ressonante atualidade. Julia Lopes de Almeida proclamava que “tudo se pode escravizar no mundo, menos o pensamento”.

A imaginação das mulheres ganhou espaço de reflexão crítica por meio da História Cultural, ao lado dos debates de gênero e pósestruturalistas, que advogam a necessidade de investigarmos as contracondutas para utilizarmos o conceito foucaultiano, existentes em formas de vida ligadas às artes, à literatura e aos ativismos. O conceito de contracondutas permite evidenciar a arte como espaço de construção de discursos radicalmente novos e de práticas de liberdade sempre atentas às estratégias de poder-saber em nossa sociedade. [2] Norma Telles, por exemplo, aborda como a imaginação feminina sobre o reino animal, presente nas escritoras inglesas como Leonora Carrington, carrega o potencial crítico das metamorfoses, dos trânsitos interregnos e devires animais: “Bachelard lembra que é possível ultrapassar formas humanas para tomar posse de outros psiquismos, e que é preciso perceber o animal em suas funções, não em suas formas. ‘A vida animalizada é a marca de uma riqueza e de uma mobilidade dos impulsos subjetivos’ E ainda, ‘é o excesso do querer viver que deforma os seres e que determina suas metamorfoses’ (Bachelard:1995:12).” Margareth Rago, ao analisar a produção artística da italiana Carol Rama, inaugura a compreensão de como a imaginação feminista carrega sofisticadas elaborações sobre os discursos de verdade que incidem sobre os corpos femininos. Subversão do corpo, da sexualidade e do desejo são percorridos por Rago: “Aliás, a serpente é uma figura recorrente na obra de Rama, evocando continuamente a figura da primeira mulher diante da tentação do diabo e na iminência da queda. O pecado ronda as mulheres, nessas paisagens quentes, avermelhadas, chocantes dos quadros da pintora italiana.” Sua postura crítica é luminosa: “Aliás, é Rama quem afirma que ‘pecar é uma das coisas mais importantes da vida, (…) pecar é uma das coisas mais bonitas do mundo’ (RAMA apud VERGINE, 2015: 50), e assim ela se coloca no lugar do pecado para produzir rupturas e desfazer a queda.”

Mônica Campo aborda a produção fílmica das argentinas Lucrecia Martel e Albertina Carri, apreendendo suas linguagens, temáticas e perspectivas, sob a ênfase da subjetividade que: “busca compreender como o ponto de vista das narrativas incide sobre a escrita da história e expressa o tempo presente. O uso inventivo da linguagem e possibilidades do audiovisual marcam a produção destas diretoras e constroem suas especificidades enquanto artistas. Em suas obras, se destacam os temas dos conflitos, tanto aqueles referentes à violência existente no interior da família como também relativos ao trato em sociedade, instigando-nos a pensar sobre a singularidade destas como expressões contemporâneas em nossa história.” Tania Diz, abordando a década de 1970 na Argentina, problematiza revistas conectadas ao ativismo homossexual e feminista e seu espaço na arena política: “En las dos revistas se leen las huellas de la historia que tienen en sus espaldas, el feminismo y la disidencia sexual, a la vez que intervienen con una demanda subversiva en años de represión: aparecer. Tanto la afirmación inclusiva de “somos” como la versión más objetivada de “persona” apuntan a sostener el derecho a ser reconocidos como sujetos políticos y desde allí ambos hacen tambalear la certeza del heterosexismo”. María Laura Rosa apresenta os vínculos políticos e afetivos que permitiram às artistas argentinas Alicia D’Amico e Ilse Fusková elaborarem por meio do corpo, em seus trabalhos fotográficos e em sua militância feminista, críticas culturais contundentes na década de 1980: “(…) cómo la libertad sobre el propio deseo y el cuerpo femeninos podían crear otras imágenes de mujeres, diferentes a las que por entonces circulaban masivamente a través de los medios de comunicación. Los géneros del retrato y el desnudo fueron centrales para ello.”

Elen Biguelini colabora com reflexões sobre as escritoras portuguesas e o debate sobre suas visões da masculinidade no artigo “‘Fiar n’um amigo? é homem. / Tem d’essencia a falsidade’. A masculinidade na obra de Francília (Francisca Paula Possolo da Costa) e Sóror Dolores (Maria da Felicidade de Couto Browne)”; Beatriz Polidori Zechlinski e Stéfani Oliveira Verona, no artigo “Do coelho esperto à ratinha corajosa: representações de gênero nas histórias infantis de Beatrix Potter” exploram como as histórias infantis guardam visões históricas complexas, abordando as dimensões do sonho e da fantasia em Potter, e Viviane Bagiotto Botton, com o artigo “A mulher e o eterno feminino em Rosario Castellanos”, abre espaço para a análise de obras dessa importante escritora mexicana do século XX, em que são denunciados o machismo e as narrativas de violência presentes na América Latina, mas em que também se reivindicam espaços de constituição de si fora das normas sociais estabelecidas:

Meditação no umbral: Não, não é a solução / jogar-se debaixo de um trem como a Ana de Tolstoy / nem preparar o arsênico de Madame de Bovary / nem aguardar nos campos de Ávila a visita do anjo com dardo / antes de atar-se o manto na cabeça / e começar a agir. Nem concluir as leis geométricas, contando / as vigas da cela do castigo / como fez Soror Juana. Não é a solução / escrever, enquanto chegam as visitas, / na sala de estar da família Austen / nem encerrar-se no sótão / de alguma residência na Nova Inglaterra / e sonhar, com a Bíblia dos Dickinson, / debaixo de uma almofada solteira. / Debe haver outro modo que não se chame Safo / nem Mesalina nem María Egipciaca / nem Magdalena nem Cemencia Isaura. / Outro modo ser humano e livre. Outro modo de ser (Castellanos, 1972)

Pensadoras feministas têm demonstrado que as poéticas das mulheres no passado e no presente constituem potentes críticas culturais, instigando a desconstrução de discursos binários e hierárquicos, inventando, sobretudo, narrativas e espaços relacionais para a atualidade. Sua pertinência, assim, repousa tanto nas ricas perspectivas teóricas apresentadas nesse dossiê, quanto no esforço de análise das produções, poéticas e práticas das mulheres no intuito de fazer ver sua potência dinâmica e inventividade de vida.

Integra também o volume uma seção aberta que conta com ricas e estimulantes reflexões, com os artigos de Rodrigo Müller Marques e Jane Márcia Mazzarino, “O audiovisual como produtor de histórias”; Fabiana de Oliveira e Maria Aparecida Avelino, “As abordagens acerca da história ibérica medieval em livros didáticos”; Rodrigo Otávio dos Santos, com o artigo “Medo, paranoia, macarthismo e o século XXI: usando o episódio 22 de Além da Imaginação em sala de aula” e o artigo de Rodrigo Cabrera e Renate Marian van Dijk-Coombes, “Desde el Cielo al Inframundo. Reflexiones sobre las representaciones corporales de Inanna y Dumuzi a partir de la evidencia iconográfica y textual”.

Assim, com grande alegria convidamos os leitores e leitoras a percorrerem as páginas desse Dossiê, abrindo espaço aos domínios transversais da criação, do sonho e do devaneio, fundamentais para nossa existência ética e política, sobretudo na atualidade brasileira, em que vemos ameaçadas conquistas feministas históricas, onde vozes de incitação à violência bradam com força cada vez maior. No entanto, as ironias sutis, as zonas de desterritorialização da arte, os espaços de lucidez e reinvenção de si, oferecidos pelas poéticas feministas, permitem-nos saber que nossas tradições femininas não serão facilmente apagadas e que a história das mulheres artistas é um campo primordial desse modo de sublevação.

Notas

1. Além dos trabalhos aqui apresentados, gostaria de destacar as fundamentais produções de Heloisa Buarque de Hollanda, Ana Paula Cavalcanti Simioni, Roberta Barros e Roberta Stubs, que considero fundamentais para tal debate circunstanciado. Cf. TVARDOVSKAS, L. Dramatização dos corpos: arte contemporânea e crítica feminista no Brasil e na Argentina. São Paulo: Intermeios, 2015.

2. FOUCAULT, Michel. Segurança, território e população. São Paulo: Martins Fontes, 2008.

Luana Saturnino Tvardovskas – Departamento de História da Unicamp


TVARDOVSKAS, Luana Saturnino. Introdução. História – Questões & Debates. Curitiba, v.67, n.1, jan. / jun., 2019. Acessar publicação original [DR]

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Educação e Arte: projetos, debates e ações em perspectiva histórica | Educar em Revista | 2019

O objetivo deste dossiê é problematizar, a partir de um enfoque histórico, as relações entre os campos da arte e da educação. Enfatizamos não só a análise da arte como campo específico que envolve áreas profissionais distintas, a exemplo da literatura, artes visuais, música, artes cênicas (dança e teatro), jardinagem (ARGAN; 1992, p. 13), o cinema e as mídias interativas, mas também as concepções estéticas propostas para a educação geral, em diferentes tempos e lugares, por agentes plurais.

É preciso ter em mente, inicialmente, que a palavra arte pode significar coisas muito diferentes, devendo-se tentar evitar, como remarca Gombrich (1979, p. 4), a ideia da existência de uma arte com A maiúsculo e a polarização entre, por exemplo, arte erudita versus arte popular, ou arte de elite versus arte de massa. Leia Mais

Arte, Imagem, Política: Curadoria, Circuitos e Instituições | MODOS. Revista de História da Arte | 2018

As relações entre os termos Arte e Política são complexas e por vezes, paradoxais. Durante o longo processo histórico de constituição do campo artístico em sua forma moderna, posições divergentes têm defendido tanto a total autonomia entre arte e política, quanto a indissociabilidade de suas conexões. Entre um extremo e outro, seguimos com Jacques Rancière, quando argumenta que “arte e política tem a ver uma com a outra como formas de dissenso, operações de reconfiguração da experiência comum do sensível” (2012: 63). Nestes termos, entendemos que as relações entre arte e política passam pelos temas abordados pelos artistas em suas obras, assim como por suas opções formais, estéticas, por seus processos de trabalho e de exibição. Os projetos de curadoria e de exposição, por sua vez, podem ser considerados como tomadas de posições políticas, tanto em relação às questões específicas do mundo da arte, quanto aos limites sobre o que é aceito socialmente como arte em um momento dado ou às transgressões das fronteiras da moral ou do “bom-gosto”. A atuação de historiadores e críticos de arte também pode ser pensada nestes termos, se consideramos suas narrativas como construções de poder simbólico. Por fim, as relações de poder entre os agentes, as instituições – museus, academia – e a lógica contemporânea de funcionamento do mercado produzem e conectam diferentes circuitos, gerando impactos diversos nos papeis e no lugar ocupado pela arte na sociedade contemporânea. Leia Mais

Arte e Literatura na Amazônia Global / Faces da História / 2018

Neste dossiê estão reunidos estudos acerca da arte e da literatura na Amazônia, aproximando pesquisadores interessados em problematizar os processos de criação, circulação, apropriação e consumo da arte e da literatura, assim como refletir sobre sua condição de fonte histórica. Rejeitamos o pensamento que, por um lado, interpreta a arte e a literatura como um universo autônomo, estudados por si mesmo e, por outro, considera-as como mero reflexo do seu contexto, isto é, consideramos que a obra expressa um processo ativo. Dessa maneira, deve-se relacionar o objeto de análise ao seu contexto, entendendo-o como interação social e não determinado por ela, pois compreendemos a arte e a literatura como expressões de cultura, não em sua totalidade harmônica, mas como zona de conflitos, contradições e oposições existentes no universo social. O autor, a obra e o observador adquirem significado quando colocados em seu contexto material e temporal, assim como a obra adquire uma maior significação quando entendida como parte da totalidade histórica.

Desta forma, temos a intenção, com este dossiê, de desconstruir antigos estereótipos que vislumbram a Amazônia, nascida, desde o século XVI, através do olhar do europeu sob o signo margem da margem do mundo, Eldorado: misto de espanto e expectativa (reduto de riquezas materiais), outrossim, na contemporaneidade, por conta de um exotismo herdeiro do oitocentos, apenas como terra de indígena, vazio populacional, localidade de violência, de florestas selvagens e animais perigosos. Interessa-nos expandir a historiografia da Amazônia como condições de possibilidades onde a voz dos artistas e intelectuais contribuíram com a criação / elucidação de identidades e realidades que por vezes são desconhecidas pela região centro-sul do país. Nessa medida, a intensão do dossiê é trazer à balia a Amazônia na sua alteridade. Daí a polifonia perceptível no conjunto de artigos que reunimos nessa coletânea.

Assim, sobre literatura, temos três artigos. Fadul Moura analisa o livro intitulado Frauta de Barro (2011 [1963]), de Luiz Bacellar, em dois momentos específicos: a visão do poeta acerca da cidade de Manaus e a presença poética de autores nacionais e internacionais em sua obra. Enquanto o autor baliza as tradições manuseadas por Bacellar a partir de sua “memória colecionadora”, vai deixando entrever a intenção do poeta em escapar da configuração tradicional do exótico em relação à Amazônia. Marinilce Oliveira Coelho examina a complexa relação entre a literatura e a memória na obra da escritora modernista paraense Sultana Levy Rosenblatt (1910-2007) a partir de elementos do testemunho pessoal e familiar de sua herança judaica. Observando por uma ótica histórica e literária, perpassa pela análise de diversas questões, como o movimento migratório de judeus para a Amazônia no final do século XIX e o antissemitismo. Matheus Villani Cordeiro, ao se basear na literatura produzida por relatos de viagem, apresenta a obra A Amazônia que eu vi: Óbidos – Tumucumaque (1930), de Gastão Cruls, para compreender a perspectiva deste em relação ao espaço amazônico e as influências que propiciaram a produção etnográfica a partir de sua obra.

Outra questão que se mostra importante no dossiê são as relações de intelectuais e artistas da Amazônia com escolas e movimentos artísticos europeus. Assim, João Augusto da Silva Neto apresenta as relações artísticas ocorridas entre o Brasil e a França na primeira metade do século XX por meio do pintor Manuel Santiago, amazonense, que viajou a Paris em 1928 com a finalidade de estudar arte. A partir de uma profunda análise da tela Tatuagem (1929), o autor discute o lugar de Paris no Brasil com base nas noções de centro e de periferia artísticas. Silvio Ferreira Rodrigues apresenta o vínculo entre o ambiente artístico paraense e a Itália, demonstrando que durante o Segundo Reinado Brasileiro a Amazônia foi palco de intenso intercâmbio cultural com o cenário artístico italiano pois, além de receber objetos de arte, artistas e inovadores movimentos estéticos, enviava para as academias italianas aspirantes a artistas, provendo intenso diálogo no campo das artes entre Brasil e Europa. Também em relação ao encontro com a Itália, Amanda Brito Paracampo analisa o meio artísticomusical belenense em relação à música operística e lírica em finais do século XIX e início do XX por meio de companhias italianas que se apresentavam no Teatro da Paz e da trajetória do maestro italiano erradicado em Belém, Ettore Bosio, em cuja modernidade musical incluía o folclorismo. Não só de encontros mas de desencontros trata Domingos Sávio de Castro Oliveira ao considerar a cidade de Belém do Grão-Pará do século XVIII enquanto local de intensa transculturação. O autor demonstra que o contato entre os saberes tradicionais e acadêmicos ocorrido entre indígenas, negros africanos, mestiços, religiosos e o arquiteto italiano Antônio José Landi deu origem a artes ornamentais e obras arquitetônicos repletas de matrizes culturais diversas adaptadas à região. Tunai Rehm, ao analisar a pintura Avenida Independência (1939), do artista belga Georges Wambach, fez uma leitura da história da cidade de Belém recorrendo a um encontro entre duas épocas, 1986, início do governo de Antonio Lemos, e 1939, ano da produção da tela.

As festas e folias como representações culturais e artísticas foram objetos de dois artigos. Letícia Souto Pantoja apresenta diversos festejos, círculos de sociabilidade e artísticos provenientes dos setores populares que habitavam Belém entre 1920 e 1940, período de decadência da borracha e aumento da miséria de grande parte da população do Norte. A autora demonstra que este período também foi de efervescência cultural articulada pelas camadas trabalhadoras pobres, culminando em muitas práticas festeiras cotidianas, como o boi bumbá e as pastorinhas. Já Leandro de Castro Tavares e Oseias de Oliveira pautam-se nas folias de santo nas áreas remanescentes de quilombos do município de Óbidos, Pará, resgatando seus traços étnicos enquanto cultura afro-brasileira. Além disso, ao discutir as dispersões escravas pela região e a formação de quilombos, apresentam cantos, folias e ladainhas das Folias de Santo que foram importantes para a formação de suas identidades.

Por fim, o cinema e o museu tem papel importante na cristalização de ideias e ideários e não poderiam ficar de fora. Para isto, Carlos Gabriel Sardinha de Medeiros analisa o filme Iracema, uma transa amazônica (1974) a partir de seu contexto de ditadura militar e de construção da Rodovia Transamazônica. Enfoca, no artigo, nas representações e alegorias apresentadas pelo filme que fizeram com que fosse censurado haja vista que apresentava, em tom de denúncia, o modo de vida da população amazônica na beira das estradas, assim como a caracterização dos indígenas enquanto entrave à modernização do país. Baseando sua análise em um guia de exposição chamado “Amazônia Urgente – cinco séculos de História e Ecologia”, Ellen Nicolau evoca narrativas e imagens que foram essenciais na ruptura de paisagens genéricas que estereotipam a Amazônia. A autora traz uma Amazônia enquanto fruto de conexões e materialização de diversidades históricas, assim como contribui para se pensar, a partir das exposições, sobre problemáticas ambientais e indigenistas.

Desejamos a todos uma excelente leitura.

Heraldo Márcio Galvão Júnior (UNIFESSPA)

Ana Clédina Rodrigues Gomes (UNIFESSPA)

Aldrin Moura de Figueiredo (UFPA)

Arcângelo da Silva Ferreira (UEA)


GALVÃO JÚNIOR, Heraldo Márcio; GOMES, Ana Clédina Rodrigues; FIGUEIREDO, Aldrin Moura de; FERREIRA, Arcângelo da Silva. Apresentação. Faces da História, Assis, v.5, n.2, jul / dez, 2018. Acessar publicação original [DR]

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Narrativas, arte e contemporaneidade | Revista Brasileira de Pesquisa (Auto)Biográfica | 2017

As narrativas estão presentes em todos os tempos, lugares e sociedades. Pessoas e grupos criam suas narrativas e, frequentemente, compartilham-nas com sujeitos de diferentes culturas. Histórias são contadas de muitas formas, através de diversas mídias, ganhando sentido como representações que emergem e transitam por mitos, rituais, repertórios orais, visuais, musicais e cênicos, sendo emolduradas por práticas subjetivas e culturais que as transformam/qualificam como narrativas.

Temos assistido ao desenvolvimento, sem precedentes, de inúmeras modalidades de narrativas – orais, filosóficas, científicas, literárias, fotográficas, antropológicas, artísticas, educacionais, cinematográficas, videográficas, digitais, de publicidade, gestão, informação etc. A velocidade e o volume de narrativas que nos invadem e interpelam, cotidianamente, constituem uma avalanche, que nos encharca e consome, sem que tenhamos tempo suficiente para refletir, analisar, saber quem são os agentes da sua produção e as figuras da sua construção simbólica, ou, quais mecanismos de poder elas produzem e reproduzem. Além disso, as narrativas não obedecem a um formato, não se submetem à uma perspectiva ou crítica e tampouco se acomodam a modelos estabelecidos, situação que, muitas vezes, incomoda e intriga. Leia Mais

Arte e Ciência, um processo operativo / Varia História / 2016

Apresentamos, nesta nossa publicação, três textos que se inserem no dossier da Revista Varia do Departamento de História da UFMG. Nossa preocupação foi dispor ao estudioso da história da arte alguns textos inéditos dedicados à reflexão do objeto artístico. Estes estudos discutem e investigam a arte sob pontos de vista não apenas históricos ou sob as vestes culturais, mas analisam ainda sob concepções formalistas, numa dinâmica imagética mais atual, apesar dos temas aqui exibidos não disporem de uma mesma cronologia, ao contrário, insistimos numa abordagem diversificada, tanto sob o ponto de vista da forma, como do espectro cultural. Optamos igualmente por uma estrutura diversificada dos temas, muito mais que um processo homogêneo e linear.

É importante ver a História da Arte estudada em sua conjuntura ampla nas possibilidades de investigação. Não apenas uma pesquisa filológica ou de pura catalogação ou inventário, mas um estudo mais abrangente e interdisciplinar. Estão aqui não apenas o curioso objeto como uma pintura ou uma construção arquitetônica, mas um processo operativo vinculado a dispositivos culturais arraigados ao universo de produção do próprio objeto.

O nosso propósito foi o de discutir aspectos do objeto artístico, mas contemplando a História Cultural e a História da Arte (e também a história da ciência) em suas múltiplas e diversas formas de apresentação imagética. Este dossier pretendeu abranger toda e qualquer abordagem no âmbito cultural, seja especificamente com discussões formalistas em relação à arte, seja em reflexões históricas e metodológicas. O universo imagético pressupõe-se a partir de estudos entre os tons culturais, entre as formas e a iconografia. Uma engrenagem voltada para debates profícuos e específicos da História da Arte e da História da Ciência. Este universo tenciona abarcar toda a discussão da imagem como arte, desse modo, novas problematizações, novos conceitos e novas dinâmicas foram utilizados numa experiência interdisciplinar, o que permitiu uma discussão mais profícua e menos engessada dos conceitos tradicionais da História da Arte. O leitor terá em mãos temas (assuntos) diluídos entre os três artigos de modo a promover uma interlocução entre os textos e sua interação nos diferentes conteúdos aqui apresentados. Essa organização permitirá avançarmos em assuntos diversos sem ter de seguir uma linha condutora exclusiva.

leitor-estudioso perceberá nossa preocupação desde o discurso formal, até a discussão histórico-cultural. Não está esquecido o artista e a obra; os trânsitos culturais – legados culturais artísticos; os vestígios e a construção histórica da arquitetura; o saber ver e as discussões culturais; as variantes arquitetônicas e cenográficas; a história da imagem como construção de um ideal cultural; a literatura científica; as considerações técnicas e os processos operativos na obra de arte. Nossas discussões permearam todos esses temas e, sendo assim, os artigos, que hora se apresentam estão inseridos numa ampla contextura. Tencionou-se estimular a abertura de novas propostas metodológicas no estudo do objeto artístico com vistas a renovar as investigações com novas sugestões de pesquisas. O organizador espera que este dossier exponha um tributo essencial aos estudos sobre o conhecimento artístico tanto a partir de enfoques específicos da arte como também da História da Arte, do que vale lembrar que história da arte é, história e arte.

Não nos custa lembrar que a História da Arte ocupa um lugar de destaque nas Ciências Sociais, no entanto, é conveniente realizar uma revisão crítica de seus métodos para então conhecer seus fundamentos e a realidade científica de seus posicionamentos operacionais (ou operativos), sejam no campo da teoria ou das disposições da práxis. A revisão prática historiográfica da arte permitirá saber como se estruturar esta História da Arte e em que situação ela existe. Damos aqui apenas algumas das ferramentas para que o leitor possa construir seu imaginário.

Sabe-se que a História da Arte se formou ao longo de décadas como resultado de conceitos operativos e critérios de investigação diante do manancial de obras artísticas. O uso dos discursos, dos seus métodos depende de circunstâncias plenamente culturais. A principal questão é o enfoque. Muda-se isto, e, consequentemente, a História da Arte apresenta novo leque de proposições. Segundo alguns autores, tantas histórias da arte, quanto práticas historiadoras.

Contextualizado nestas poucas observações o dossier proposto pretendeu absorver reflexões sobre a produção artística em suas mais variadas seções. Os autores escolhidos, Sara Fuentes, Beatriz Hidalgo e Alfredo Morales são investigadores (e professores) que se preocupam com a dinâmica clara e objetiva da Arte, mas igualmente com suas estruturas históricas e contribuições científicas nas diversidades das análises: tudo apresentado numa problemática inédita. No artigo El perfil de Andrea Pozzo como maestro de perspectiva encontramos uma diversa análise e um estudo metódico do jesuíta trentino e um dos perspécticos mais influentes do século de setecentos desde o estudo sistemático da perspectiva, passando pelo simulacro arquitetônico, tudo transformado num método didático e prático, publicado em forma de dois tomos no fim do século XVII, com uma repercussão global entre os séculos XVIII e XIX, atingindo não apenas o Continente Europeu, mas avançando para as Américas e ainda o Oriente. As análises são bem construídas exemplificando não apenas a formação cultural de Pozzo, mas também seus enfoques técnicos e suas preocupações em atender ao artista praticante da pintura de falsa arquitetura com pressupostos perspécticos, isto é, a quadratura ou a pintura de Sotto in sù, como ele mesmo denomina em seu texto. Já o estudo de Beatriz Hidalgo, com o título A originalidade técnica no desenho de Goya e seus contemporâneos. Abordagens sobre o desenho na segunda metade do século XVIII, nos apresenta um estudo instigante sobre “a arte do desenho”, uma expressão artística de grande variedade e que aqui concentra seus esforços durante o século XVIII num dos mais significativos artistas espanhóis: Francisco Goya. O desenho não é apenas a representação da forma sobre um suporte, como o papel, uma parede ou mesmo coberturas abobadadas e cupuladas, mas o desenho expressa o contexto de uma época, de um mecanismo estilístico e, naturalmente, um contexto operativo-cultural. Enfim, adaptações e estratégicas culturais que motivaram Goya em suas criações, mas também com outros artistas, como a autora bem demonstra (ou demonstrou). O estudo de Alfredo Morales sobre Cartografía y cartografía simbólica. Las “Theses de Mathematicas, de Cosmographia e Hidrographia” de Vicente De Memije nos brinda com um tema abordado de modo original e que cobre a rota marítima entre a Península Ibérica e as Filipinas. Para além de apresentar um contexto histórico abordando a missionação no Oriente, este texto expõe de modo analítico e meticuloso nova proposta cartográfica que se pode chamar artística, não apenas por suas concepções imagéticas / simbólicas, mas porque atrela-se a outro valor científico / funcional. Mudanças de paradigmas, evidências num novo contexto entre o espaço tridimensional e a representação no papel. Além da restituição gráfica operacional do relevo territorial e seu controle, o autor nos mostra a fruição consciente de um novo espaço conhecido não apenas em contexto específico da gnomônica, mas em espectros culturais por meio do vasto universo das belas estampas que escondem um mágico universo simbólico que entre Ocidente e Oriente preenchia todo o imaginário dos “homens do mar” e suas dinâmicas de apreensão entre espaço projetado e mensurabilidade, entre áreas percorridas e ícones / imagens em seus mais intrínsecos significados.

Assim, espero que a diversidade destes textos possa ser um estímulo para o jovem leitor e estudioso da arte, mas também do pesquisador mais acurado e determinado em pesquisas específicas, em novos processos e em novas dinâmicas interdisciplinares.

Magno Moraes Mello – Departamento de História, Universidade Federal de Minas Gerais. E-mail: [email protected]


MELLO, Magno Moraes. Apresentação. Varia História, Belo Horizonte, v.32, n.60, set. / dez., 2016. Acessar publicação original [DR]

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Políticas católicas: educação, arte e religião / Revista Brasileira de História da Educação / 2015

Os textos apresentados no presente dossiê resultam mais diretamente de pesquisas empíricas e dos debates ocorridos por ocasião do I Colóquio Internacional: Congregações Católicas, Educação e Estado Nacional. Examinam o lugar das políticas católicas na formação cultural de importantes segmentos da população brasileira e se articulam em torno do debate sobre a dinâmica que animou a Igreja Católica na direção de determinado projeto para a modernidade. Nesse sentido, o principal objetivo que alinhava os trabalhos escolhidos para compor este conjunto é a análise de temáticas e hipóteses que perpassam a complexa rede de indivíduos e instituições que constroem e reconstroem, em contextos e temporalidades diversas, as relações entre educação, Igreja Católica e Estado Nacional.

Nestes artigos, os autores aprofundam o debate, enfrentando conceitos polissêmicos como educação, política, arte e religião, de forma a expor aos leitores diferentes olhares sobre as dimensões nas quais se engajaram e se articularam religiosos e militantes católicos comprometidos com a formação de uma república católica. As análises da atuação dos agentes, seja em colégios, seja por meio de obras artísticas ou, ainda, em organizações profissionais e no exercício político dentro e fora da Igreja, dão sentido à unidade de propósitos desenvolvida.

O Brasil conta com mais de 500 anos de catolicismo e este pode ser considerado um dos temas mais estudados no campo das Ciências Humanas. De um largo espaço de atuação nos tempos da colônia, passando pelo padroado controlado pelo Imperador, a Igreja Católica alcança o período republicano com suas Ordens envelhecidas, seus seminários esvaziados e suas ações inibidas, numa sociedade com milhares de pobres e analfabetos.

Na Europa, os tempos são de conflito aberto entre a modernidade e a Igreja, entre o Estado em processo de secularização e a moral cristã inscrita na escola pública. Os dois contextos favoreceram a política do Vaticano para a América Latina. O resultado foi a intensa migração regional de Congregações e Ordens no interior da própria Europa e a imigração para a América Latina, especialmente para o Brasil. Essa circulação internacional traz um considerável contingente de religiosos que reposiciona a Igreja em relação aos estados nacionais. Trata-se de intelectuais – pregadores, escritores, professores, editores, poetas, artistas, políticos, sensores – cujo objetivo maior é a educação das elites e a recristianização de futuros quadros do Estado republicano. Entender os percursos e as ações decorrentes desse movimento na construção da cultura republicana é o objetivo de distintos estudos contemplados no presente dossiê. Nessas trilhas se encontram e confluem novas e antigas possibilidades de análise e ângulos de leitura sobre conceitos e processos, constantemente revisitados.

José Maria de Paiva desenvolve seu artigo, instigado pelas perguntas: que educação se faz hoje e que proposta de sociedade perseguimos? Vai buscar no passado, na ação dos jesuítas, os elementos para alimentar os estudos contemporâneos. Seu artigo, Estado e educação – A Companhia de Jesus: Brasil, 1549-1600, abre o debate, desafiando o leitor à discussão sobre o significado da relação entre educação, religião e Estado nos primórdios da sociedade brasileira. O Brasil quinhentista é abordado nas dimensões teológica, social e política que traduzem, assim, os múltiplos aspectos de um modelo de sociedade fundado em concepções que conformavam a ordem como unidade: o corpo, desenhando a sociedade, e a presença divina, conduziam os entendimentos. O autor considera, nesse aspecto, as atuações e representações que moldam o agir humano.

Para discutir como essa dinâmica se desenvolveu em distintas esferas da convivência social, José Maria de Paiva busca suas causas e fundamentos na releitura das relações entre os jesuítas, a Coroa Portuguesa e as populações que habitaram as terras brasilis. Para tanto, situa a Companhia de Jesus no âmbito dos interesses do Estado Português. Na visão do autor, a divisão político-territorial portuguesa favorecia a legitimação e o predomínio do poder real junto aos senhores de terras, fazendo valer tanto as representações corporativas quanto os interesses mercantis que ditavam as regras do desenvolvimento econômico europeu naquele momento.

Na busca da gênese da tensa relação entre Estado, Igreja e educação, o autor convida o leitor a refletir sobre o predomínio do indivíduo como elemento chave na constituição do Estado moderno. Nesse sentido, sustenta a tese de que o Estado português preserva o entendimento de corpo social numa gestão da sociedade repleta de linguagens afetivas e mercantis. Afirma que esse é o modelo instaurado no Brasil e que é nas relações entre o interesse mercantil e a tradição do senhorio que se deve pensar a educação.

No esforço de demonstrar como o conceito de educação se encontra imbricado às visões de mundo definidoras do lugar a ser ocupado pelos grupos na sociedade colonial, o autor analisa as implicações da missão de evangelizar e cultivar a fé católica no Brasil. A Companhia de Jesus se inscrevia no trabalho de evangelização do índio, na missão de criar um ambiente harmonioso entre os habitantes das terras conquistadas e na formação instituída pelos colégios. Estes últimos, expressão ativa da educação que permaneceu, embora os estudos ocupassem uma posição menor nessa sociedade e fossem um dos instrumentos do plano mais geral da evangelização, serviam ao pleno desenvolvimento das relações mercantis. Ou seja, os colégios tinham função social mais ampla que a dinâmica escolar, entendida no sentido de uma simples formação acadêmica. Nessa reflexão, desloca-se o foco da discussão da forma da organização escolar para a educação e ‘seu objeto: significado religioso, divino’, naquela sociedade quase estática.

No texto Instrução do povo sob a proteção do catolicismo, militância docente e a expansão da escolarização em São Paulo, Ana Regina Pinheiro está atenta às estratégias empregadas pela Igreja para propagar o catolicismo em espaços de formação docente. Para tanto, problematiza a relação da Liga do Professorado Católico de São Paulo – antiga Liga das Professoras Católicas – com a Escola Normal e a Diretoria de Instrução Pública, na década de 1920. Baseada nos resultados parciais de seu estudo, desenha um cenário no qual a religião encontra-se imbricada à política e às reformas educacionais nas primeiras décadas da República.

A autora persegue as permanências presentes no discurso que enaltecia o modelo escolar paulista e idealizava o pioneirismo da escola republicana. No diálogo com a historiografia, assinala que esse discurso foi um dos fatores que alicerçou as estratégias do movimento docente, em São Paulo, na Associação Beneficente do Professorado Paulista (1902- 1918) e, mais tarde, na Liga do Professorado Católico (criada em 1919). Analisa tais anseios como mediações que favoreceram o alinhamento da categoria às diretrizes da Igreja romanizada. Militantes dos movimentos sociais e indivíduos responsáveis pela elaboração de políticas para a área de educação usam discursos e práticas, frutos de habitus construídos nas igrejas e sacristias.

Coerente com essa abordagem, debate o lugar dos educadores católicos na construção da escola pública, no período de laicização do Estado brasileiro. Por meio da leitura da documentação histórica vinculada à Liga, a autora demonstra que setores da Igreja associavam a busca das meninas pelo magistério ao movimento feminista nascente. Sendo assim, para enfrentar o desafio que representava a crescente profissionalização das mulheres, a Liga visava à atrair, para seu quadro de associadas, professoras que fossem católicas praticantes e que exercessem a catequese. O foco de tal exigência era a difusão do catolicismo na escola pública, local onde as ideias laicas ameaçavam a tradição. Analisa, assim, a permeabilidade do discurso católico no processo de escolarização.

Esse contexto de mudanças exigia a proposição de um programa formativo que fora delegado a essa associação. Nesse sentido, advogados, juristas, médicos e professores de reconhecida competência profissional e com forte ligação com o catolicismo eram frequentemente convidados pelos fundadores ou pelo diretor espiritual para atuar como orientadores das associadas em diversas áreas, promovendo, assim, o acesso das professoras à filosofia e moral católicas. Essas manifestações, ao contrário de reforçar a recusa às mudanças advindas do mundo moderno, indicam que a Igreja se mostrava capaz de conduzir o projeto da modernidade.

Na Espanha, como no Brasil e em Portugal, as relações entre a Igreja Católica e o Estado estão tensionadas em torno da disputa pelo direito de fazer a escola. Maria Fernanda Piñero Sampayo, em Evolución y desarrollo de los colegios religiosos femeninos en España, problematiza a ampla articulação política da Igreja a partir da segunda metade do século XIX, em um estudo que revisita a histórica presença dessa instituição na educação. A autora refere-se ao duplo movimento: o processo de fundação e expansão de colégios para a formação de moças e a circulação internacional das Congregações Católicas, ambos favorecidos pelas políticas e pelos acordos de Estado. Ressalta, por outro lado, que a participação majoritária da Igreja no processo educacional se deveu, sobretudo, aos anseios de uma sociedade cujo amparo espiritual e referência moral eram reconhecidamente católicos.

Em seu texto, o lugar da Igreja Católica na educação é tratado como um fenômeno presente desde a fundação das universidades medievais e potencializado pelas Ordens Religiosas que se estabeleceram no território espanhol nos séculos XVI e XVII, tais como a Companhia de Jesus, os Escolapios, as Ursulinas ou a Companhia de Maria. Situação que se manteve inalterada até a primeira metade do século XIX, quando a corrente política anticlerical acirrou o processo de implantação de políticas voltadas à secularização do Estado e da sociedade. Em várias partes da Europa, a Igreja foi forçada a adotar medidas que a recolocariam na liderança nesse novo cenário político e social. A circulação internacional dessas Congregações pelo continente europeu é tratada pela autora ao focalizar o caso da Espanha, que recebeu as congêneres francesas a partir de 1881. A circulação internacional, analisada pelo lado espanhol, confirma hipóteses sobre a política de imigração de Congregações para o Brasil.

A estratégia da Igreja desencadeou uma série de políticas que confluíram para o desenvolvimento de um modelo de ensino organizado para as meninas de classe média. Dentre elas, a Concordata de 1851, permitindo à Igreja se renovar e fundar novas Congregações em território espanhol. Em distintas áreas da sociedade, sobretudo na educação secundária, a Igreja viu-se em situação de quase monopólio. Ao reforçar os termos da aliança dessa instituição com as forças políticas laicas, a autora aborda os conflitos e as contradições que levaram o Estado espanhol a se autoproclamar católico, na Constituição de 1876, e por meio de outras leis, implementadas nesse mesmo período.

Múltiplos fatores que teriam favorecido o desenvolvimento do ensino secundário são explorados no texto, de forma a demonstrar que esse segmento ficou a cargo do investimento privado, primordialmente confessional, enquanto o ensino primário permanecia sob a responsabilidade do poder público. Nesse sentido, foi a demanda social pela formação escolar das moças que favoreceu o surgimento de colégios, em sua maioria, fundados por Congregações de longa tradição, como a Companhia de Maria ou as Ursulinas, dentre outras, de criação mais recente. Essas Congregações tiveram um surto de crescimento entre os anos 1820-1878 e 1883-1905. No geral, eram colégios com várias modalidades de ensino, cujo modelo de educação integral englobava educação moral e conhecimentos práticos adequados às atividades domésticas.

Os textos até aqui apresentados oferecem pistas para se pensar a educação para além dos muros da escola. Ela faz sentido, como se pode ver no texto de Paiva quando conforma um tipo de sociedade desejada, por isso, ela se processa em todos os espaços da cultura. Ela se dá pela educação do olhar feita pelas artes plásticas, pela educação do ouvido por meio da música ou grava-se na memória ao longo da trajetória de vida.

Em Um pintor na Ordem de São Gregório, Godiva Accioly situa o leitor na história e na arte do pintor Carlos Oswald, quando convida a conhecer as incursões desse artista no mundo das artes sacras, fruto de uma formação erudita, conquistada pela circulação em espaços cosmopolitas.

Filho de pai brasileiro, nascido em Florença, Carlos Oswald passou sua infância na cidade natal, conhecido polo cultural para onde convergiam artistas de todas as artes. Nesse contexto favorável, os pintores que cita como grandes influências de sua arte são Pedro Américo, Rodolfo Amoedo, os irmãos Bernadelli, Antonio Parreiras e José Mariano. A autora ressalta que, na fase de formação, o jovem artista foi marcado pela fé cristã. Em suas idas e vindas ao Brasil, se mostrou determinado a continuar no mundo das artes, reafirmando seus laços com o catolicismo. Além de acompanhar regularmente os rituais da fé ao longo de sua trajetória, Carlos Oswald fez parte de várias associações e grupos católicos e ingressou na Ordem Terceira dos Franciscanos em Petrópolis; foi nomeado, ainda, ‘Comendador da Ordem de São Gregório Magno’ pelo Papa Pio XII. Foi escritor e literato, escreveu em várias revistas e jornais. Presidiu a Sociedade Brasileira de Arte Cristã, criada no momento em que as elites católicas buscavam assegurar seu espaço na cultura brasileira, cuja afirmação girava em torno da Semana de Arte de 1922.

Graças aos registros encontrados em cadernos do pintor, onde aparecem suas leituras e aspirações artísticas, religiosas e filosóficas, e aos depoimentos de seus familiares e pessoas de seu convívio, a autora identificou facetas instigantes de suas atividades artísticas, dando significado à sua produção na arte sacra. Examina as relações desse artista com a hierarquia da Igreja Católica e as nuances presentes na conversão da arte em expressão religiosa. Conhecer as dimensões educacionais e políticas da trajetória do pintor Carlos Oswald significa, para a autora, adentrar os conflitos e as inquietações de foro religioso, explicitados em sua disposição apostólica e no conhecimento teológico, que o tornavam um homem de fé.

Nesse sentido, a autora optou por um tom ‘narrativo’, devido ao teor das fontes que principiam e embasam o desenvolvimento dessa reflexão, sendo elas a autobiografia do artista e uma biografia relativa a ele, de autoria de sua filha. Intentou, por meio dessa escolha, a transposição da essência dessas narrativas ao próprio artigo, buscando imprimir a tais fontes a categoria documental necessária à análise histórica, como potenciais fontes de memória.

O vínculo entre a história de vida do artista, assim como do alcance de seu trabalho artístico, e a reflexão acerca da constituição de uma orientação católica sobre as relações entre a arte sacra, cultura e educação brasileiras vem estabelecido na seleção crítica de pontos considerados centrais em meio a tais fontes. Assim, são aspectos da formação e direcionamentos da obra do artista, resultando, dessa maneira, em um determinado tratamento das ‘memórias’ como fontes.

As contradições de um indivíduo que pautou sua vida pela ortodoxia católica, comprometendo-se com o grupo cristão ortodoxo do fim do século XIX e começo do século XX permeiam o artigo. Em 1915, ao pintar os murais da ‘Sala dos Párocos’ do Palácio São Joaquim no Rio de Janeiro – marco de acervo considerável na Arte Sacra no Brasil e no exterior, o pintor inicia seu engajamento na arte cívico-religiosa. Considerava aproximar o católico da fé cristã. Nesse sentido, ressaltava os fins pedagógicos da obra de arte, atento para os atos do Concílio de Trento. Esses elos, que não estão explícitos nos registros, mas são demonstrados com competência pela autora, colocam em discussão a função pedagógica da arte sacra.

No texto Circulação Internacional, Politização e Redefinições do Papel Religioso, Wheriston Silva Neris e Ernesto Seidl analisam as transformações da natureza e das modalidades da ação pública dos Missionários Combonianos do Coração de Jesus – Instituto religioso de origem italiana, que imigrou para o interior do Estado do Maranhão, em 1952. Os autores buscam abordar os efeitos da constituição de uma rede internacional de religiosos missionários para a construção da sociedade moderna. No processo de expansão dessa rede, destacam a delicada adequação da política e dos métodos do empreendimento missionário às condições de acolhimento encontradas no Brasil, bem como os impactos causados na vida política das cidades.

Os autores iniciam problematizando o conceito de missão, empregado no século XVI com o sentido de envio de religiosos para a conversão de povos não cristãos, e culminam, no século XX, apresentando, pelo menos, três sentidos do conceito: o medieval, que nos remete às cruzadas de evangelização ou da conquista; o da missão moderna, que representa a função da Igreja em ‘instruir, cuidar e construir’; e, por último, a concepção de que a Igreja deve difundir a fé em nome da salvação, deslocando o foco do sentido de evangelização ou conversão.

Para os autores, o missionário que atua no Brasil é um mediador e sua experiência constitui-se em expressão da memória, da identidade e das relações de forças locais. O artigo revela que os Combonianos do Coração de Jesus operam um modelo de missão que atua nas fronteiras da evangelização e se organiza em distintos espaços. Passaram por várias transformações desde o século XIX e sua ação correspondia à estratégia de expansão da Igreja, que estendia suas instituições pelos países da África, da Europa e do Continente Americano. O braço feminino dessa congregação também se expandiu na África, na América Latina e no Oriente Médio entre os anos 1930 e 1960.

Nessa perspectiva, os combonianos começaram a se espalhar pelas cidades brasileiras em 1939, sendo São Paulo, Espírito Santo e Maranhão regiões pilares do engajamento missionário. Dados sobre sua atuação demonstram que era incipiente a presença da Igreja Católica na região do Maranhão, restringindo-se, praticamente, à atuação dos Capuchinhos. Além disso, era recorrente o emprego da desobriga, que mobilizava padres a levar a liturgia aos lugares mais afastados onde a instituição ainda não estava organizada. Os contrastes sociais e as péssimas condições de infraestrutura das cidades localizadas no sertão causaram estranhamento aos missionários, principalmente, os contornos peculiares do desenvolvimento no Maranhão, cujo elemento central eram as disputas políticas em torno da propriedade da terra. A distância que percebiam entre as referências europeias e essas condições singulares proporcionou uma experiência religiosa distante dos dogmas do catolicismo romanizado e repleta de referências à religiosidade popular.

As iniciativas dos Combonianos no Nordeste, no que tange à educação e assistência social, na década de 1960, indicam expansão institucional com aquisição de terrenos, investimentos em escolas e projetos educacionais. Estava no horizonte dessa expansão o enfrentamento do analfabetismo, da ausência de cuidados médicos e da insuficiência de instrumentos agrícolas nas mãos dos sertanejos. Condições que atribuem sentido mais amplo ao processo de educação exercido por professoras catequistas que viajavam para as vilas mais populosas, a fim de instruir as mentes e orientar a alma dos homens da roça, ocupando o lugar do Estado na oferta de serviços básicos aos brasileiros.

Finalizando, este dossiê foi organizado para os leitores que buscam a discussão relativa às várias frentes de atuação de religiosos e leigos católicos na sociedade moderna e contemporânea. Pretende ser útil aos pesquisadores que investigam as políticas e práticas da Igreja, sua capacidade de se reinventar a cada novo obstáculo. Situa-se, porém, longe da pretensão de abranger todas as relações, dimensões, contextos que a política católica e as práticas religiosas representam na busca de construção de uma cultura cristianizada. Os artigos aqui apresentados trazem pistas, detalhes, indagações que provocam o leitor a estender seu olhar para além das ações institucionalizadas, revelando brechas documentais, metodológicas e conceituais que poderão ser aproveitadas em futuras pesquisas.

Ana Regina Pinheiro – Unicamp

Agueda Bernardete Bittencourt – Unicamp


PINHEIRO, Ana Regina; BITTENCOURT, Agueda Bernardete. Apresentação. Revista Brasileira de História da Educação. Maringá, v. 15, n. 2, maio / ago., 2015. Acessar publicação original [DR]

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50 anos de golpe: arte, cultura e poder (Parte I) / Antíteses / 2015

No ano de 2014 o golpe de 1964 completou 50 anos. Se não houve motivo para comemorações também não houve (e não há) justificativa para menosprezá-lo como marco histórico. Fato é que no ano de 1964 deu-se início a uma ditadura que durou mais de duas décadas e cujas práticas são sentidas ainda nos dias de hoje. No entanto, 50 anos depois, o evento (e tudo que ele representa) vem se transformando numa oportunidade de examinar o fenômeno do autoritarismo e suas práticas, difundir as pesquisas sobre o regime militar, também expandi-las através de novas abordagens e fontes, tornando-as conhecidas de um maior número de interessados que, durante um longo período, esteve apartado dos espaços de discussão acerca dos rumos do país ou alijado do processo de construção democrática no Brasil.

Embora tenhamos inúmeras tipologias para abordá-la como, por exemplo, ditadura civil, militar e até empresarial, acenando para a participação de grupos de natureza diversa tanto na concretude do golpe quanto na consolidação do regime, muito pertinente se torna a definição do sociólogo Juan Linz que definiu os casos brasileiro e argentino e também o espanhol de Primo de Rivera e o português de Salazar como regimes autoritários de natureza burocrático-militares que, em linhas gerais, representa “uma coalização chefiada por oficiais e burocratas e por um baixo grau de participação política”, na qual se “falta uma ideologia e um partido de massa; existe frequentemente um partido único, que tende a restringir a participação; às vezes existe pluralismo político, mas sem disputa eleitoral livre” (BOBBIO; MATTEUCCI, PASQUINO, 2004, p.102).

Partido dessas definições gerais em torno do fenômeno do autoritarismo e a versão brasileira dele, podemos tomar a produção bibliográfica no contexto imediato ao golpe de 1964 e no período pós-regime militar como objeto de estudo, analisando os temas mais recorrentes em determinados momentos bem como o impacto dessa discussão no encaminhamento das pesquisas.

Nos primeiros anos do regime militar, de 1964 a 1968, não se sabia ao certo o que estava por vir e não haviam sido fechados os espaços de atuação política, ainda que neles não fosse mais tolerada a interação interclasses como outrora vinha sendo efetivada no plano da cultura por instituições como o Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), a União Nacional de Estudantes (UNE), o Centro Popular de Cultura (CPC), o Movimento de Cultura Popular (MCP), entre outros.

Paulatinamente, o regime militar expandiu suas práticas repressivas, utilizando-se da censura e repressão para coibir manifestações contestatórias da intelectualidade engajada que outrora buscaram a interação com as classes populares e outros extratos da sociedade e, naquele momento, encontravam-se restritos ao contato com as classes médias. Artistas e intelectuais, por sua vez, não se mantiveram passivos às decisões impostas de “cima para baixo” e se uniram em torno do projeto de consolidação da chamada resistência cultural.

Apesar das divergências vivenciadas por artistas e intelectuais no que concerne à construção de uma unidade em torno das reivindicações comuns, houve uma articulação efetiva deles no contexto pós-golpe e pré-AI-5, isto é, entre 1964 e 1968. As discussões anteriormente restritas à produção individual ou de grupos ganharam dimensões mais amplas e coordenadas durante o regime militar, o que podiam transitar de questões pontuais como a liberação de obras e a libertação de artistas até problemas mais complexos como a extinção da censura e um programa de subvenções.

A construção de uma unidade a partir do enfrentamento de um “inimigo comum”, não extinguiu os impasses teórico-políticos entre diferentes grupos. Isto porque a luta de uma intelectualidade contra o regime militar nunca se definiu por uma convivência pacífica entre integrantes da oposição. Como assinalou o editorial do periódico Arte em revista, num volume especial sobre teatro engajado de outubro de 1981, é necessário “relativizar a possível coerência que muitos querem enxergar numa atividade regida pela economia de mercado, pelos modismos artísticos, pelo jogo das influências externas, como as relações com o Estado, a censura, etc.” De qualquer forma, a atuação dos mecanismos de controle e do aparelho repressivo estimularam a convergência de opiniões divergentes em torno de reinvindicações comuns.

Assim durante pelo menos 10 anos, mais sintomaticamente entre 1968 e 1974, o regime militar, através de uma série de restrições, não só ignorou as principais demandas de artistas e intelectuais, sendo a liberdade de expressão a mais importante delas, como também os impediu de se comunicar com a sociedade brasileira, impondo-lhes a censura de peças teatrais, filmes, revistas, livros, jornais, publicidade, programas de rádio e televisão e também sujeitando-os a mecanismos de repressão como a perseguição, prisão, tortura e até morte de artistas e intelectuais.

Como se vê, este foi um período conturbado para artistas e intelectuais que não mais nutriam expectativas de unidade como outrora, dividindo-se cada vez mais. Diante do processo repressivo deixaram de lutar por questões mais amplas para reivindicar questões pontuais, transferiram a luta contra a censura das manifestações públicas para a esfera jurídica e, mais tarde, para o campo econômico, interiorizavam práticas de autocensura no processo de criação e também promoviam alianças táticas para enfrentar este estado de coisas.

Para se entender este embate de forças durante o regime militar (1964-1985), especificamente a partir de 1968 e durante a década de 1970, devemos ir além das interpretações consolidadas que propuseram dicotomias como resistência x cooptação como ocorreu com grande parte da literatura dos anos 1980 que analisou a produção artística e intelectual produzida durante os anos de censura e repressão; mais que isto, esta se insere num processo complexo e contraditório de projeção da cultura na vida nacional com o fechamento dos espaços tradicionais de atuação política, progressivamente a partir de 1968, que tinha como elemento catalisador as políticas culturais em seus múltiplos matizes como as de caráter proativa realizadas pelo Serviço Nacional de Teatro (SNT), a Empresa Brasileira de Filmes Sociedade Anônima (Embrafilme), entre outros, e as de natureza repressiva executadas pela Divisão de Censura de Diversões Públicas (DCDP), pelos Serviços de Censura de Diversões Públicas (SCDPs) e pela “supercensura” (NAPOLITANO, 2010, p.145 e 150).

Somente no contexto de abertura, o governo Geisel tentou uma aproximação a esses grupos permitindo-lhes expressar anseios reprimidos por longo tempo e convidando-os a participar da elaboração de políticas no âmbito do governo. Claro que isto não foi recebido com unanimidade por artistas e intelectuais, alguns consideraram a iniciativa uma oportunidade de subverter as estruturas por dentro ou, pelo menos, ver atendidas as reivindicações mais pontuais, outros viram nisto mais uma forma de cooptação adotada pelo governo militar e se colocaram contra ele e contra todos que, após longos anos de repressão e censura, aceitaram participar de planos do governo na área da cultura. Desse impasse, advém a rivalidade entre os artistas e intelectuais comunistas mais abertos à interlocução com o governo da abertura e o movimento da contracultura contrário a qualquer tipo de negociação.

Na década de 1980, mais especificamente no pós-1985, artistas e intelectuais buscaram entender o que havia acontecido nos 21 anos de regime militar e isto refletiu diretamente na produção bibliográfica e também nos debates públicos que se concentraram em apontar culpados pela passividade da oposição diante do golpe de 1964; não poupando críticas ao Partido Comunista Brasileiro (PCB) e tudo que esteve direta ou indiretamente relacionado a ele, já mencionamos o ISEB, o CPC e o MCP, entre outros.

De meados dos anos 1980 até o fim do século, a ditadura enfim acabara, mas as feridas continuaram abertas… e os arquivos fechados. Durante 30 anos pelo menos, a construção historiográfica acerca do regime militar pautou-se pelas apropriações da memória e a propensão de se confundir com a história. De um lado, militares e aqueles que apoiaram o golpe e a ditadura (a alta cúpula da Igreja Católica, as associações representativas das classes dominantes, os meios de comunicação de grande porte, os partidos e políticos de caráter conservador) contavam a versão deles da história através de restrições plenas ao acesso a arquivos e mecanismos sofisticados de manipulação dos fatos, um dos mais significativos e até hoje confundido refere-se ao tratamento do movimento golpista como revolução ou  redentora (TOLEDO, 2014). De outro, grupos de oposição, nem sempre articulados entre si, colocavam-se como “alvos” do sistema cuja perseguição ostensiva dos agentes da ditadura justificou, em alguns casos, a adesão à luta armada (rural ou urbana). Em ambos os casos, porém de maneiras distintas, consideramos oportuna a observação de Jacques Le Goff acerca da memória coletiva, na qual se tornar “senhores da memória e do esquecimento é uma das grandes preocupações das classes, dos grupos, dos indivíduos que dominaram e dominam as sociedades históricas” (LE GOFF, 1996, p.426) e isto aconteceu também aqui, durante e depois do regime militar, considerando obviamente as diferenças entre eles e seu poder de inserção social.

A memória, no entanto, não é algo concreto e definido, cuja produção e acabamento se realizaram no passado e cumpre transportá-los para o presente bem como preservá-la dos riscos de desgaste através da restauração integral dela nem se resume a um “pacote de recordações” também já previsto e acabado. Ao contrário, “é um processo permanente de construção e reconstrução” (MENESES, 1992, p.10).

Portanto, que memória e história não são termos convergentes, ainda que possam ser considerados fenômenos complementares. Enquanto a memória, filha do presente e tendo como objeto a mudança, “é formação de imagem necessária para os processos de constituição e reforço da identidade individual, coletiva e nacional”; a história, operação cognitiva, tem como referencial o passado e “é a forma intelectual de conhecimento”. Noutras palavras, a História não é o “duplo científico da memória” a qual, por sua vez, precisa ser tratada como objeto da história (Id. Ibid., p.14, 22-23).

Nessas disputas pela consagração da memória coletiva, as restrições de acesso aos documentos de época favoreceram a construção de memórias a partir de questões do presente, sobretudo do primeiro grupo que exercia plenos poderes e controle dos arquivos públicos, inclusive dos critérios de descarte deles, orientados não por técnicas arquivísticas e sim por demandas políticas. Daí resulta a importância de pesquisadores de áreas como o jornalismo, a história, a sociologia, a antropologia e a ciência política que tomam hoje a memória coletiva como objeto de pesquisa e transformam a luta pela democratização da memória social numa das prioridades das pesquisas em Ciências Humanas e, assim, trabalham para que “a memória coletiva sirva para a libertação e não para a servidão dos homens” (LE GOFF, op. cit., p.477).

A produção intelectual e bibliográfica em torno daquele contexto histórico começou a sofrer alterações consideráveis na virada do século quando a sociedade brasileira já se encontrava mais preparada e sem as amarras do passado para discutir nosso passado recente, os arquivos públicos estavam sendo paulatinamente abertos e, através deles, os pesquisadores brasileiros (e não somente os brazilianistas) iniciaram um amplo processo de revisão historiográfica que não só desconstruiu teses cristalizadas no imaginário social  como também apresentou novas abordagens de temas tratados anteriormente pela historiografia oficial.

É exatamente nesse contexto que o dossiê se inscreve. Um momento em que a produção científica e acadêmica no campo das humanidades se volta para reconsiderar uma série de temas que hoje ganham um contorno mais claro e evidente, sobretudo quando se trata, por exemplo, da questão dos direitos humanos. Porque regimes autoritários não atingiram apenas seus opositores e detratores, mas desfiguraram radicalmente os conceitos de democracia e de sociedade civil. Aliás, muitos desses regimes – como foi o brasileiro – usaram da repressão e da violência para impor e proteger uma noção estéril de democracia e de sociedade. Por isso que os estudos, as investigações que ora emergem nesses 50 anos do golpe se apresentam como fundamentais para não somente capitular os eventos que fundaram diversos tipos de oposição ao regime, mas reconsiderar as narrativas e as representações que serviram de fundamento às resistências contra o autoritarismo.

Tanto é fato que cada vez mais pesquisas são elaboradas em torno do tema, que o número de artigos recebidos para esse dossiê ultrapassou todas as expectativas dos organizadores. O montante de material de excelente qualidade serviu para a elaboração de dois tomos da revista. O primeiro deles, intitulado “50 anos do golpe: arte, cultura e poder”, reúne artigos que abordam a produção cinematográfica, teatral, literária, musical, bem como a atuação de artistas e intelectuais na oposição ao regime militar. Publicou-se primeiro porque no conjunto de todos os artigos aprovados, esse tema foi aquele em que os trabalhos de revisão e edição foram concluídos mais cedo. O segundo tomo, intitulado “50 anos do golpe: memória, política e movimentos sociais”, aparece em seguida trazendo consigo um conjunto de artigos que abordam os aspectos comparativos entre as ditaduras do Cone Sul, a construção da memória política sobre a ditadura e o papel da sociedade civil na organização dos movimentos sociais pela abertura política.

Pela realização desse trabalho agradecemos aos autores que colaboraram com esse dossiê e tornaram a publicação possível. Da mesma forma, agradecemos aos pareceristas que emprestaram seu trabalho à Antíteses no processo de leitura e avaliação dos artigos recebidos. A Carolina Sobreira pelos trabalhos gráficos que ilustram as capas dos dois tomos da publicação.

A todos uma boa leitura!

Referências

BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política – de A a J. 5. Ed. São Paulo: Imprensa Oficial, 2004. p. 102.

LE GOFF, Jacques. História e memória. 4. ed. Campinas: UNICAMP, 1996. p. 426.

MENESES, Ulpiano T. Bezerra. A história, cativa da memória? Para um mapeamento da memória no campo das Ciências Sociais. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, São Paulo, n. 34, p. 9-23, 1992. p. 10.

NAPOLITANO, Marcos. “Vencer Satã só com orações”: políticas culturais e cultura de oposição no Brasil dos anos 1970. In: ROLLEMBERG, Denise; QUADRAT, Samantha Viz (orgs.) A construção social dos regimes autoritários: legitimidade, consenso e consentimento no século XX. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010. p. 145 e 150.

TOLEDO, Caio. Quase 50 anos do golpe de 1964: nada a comemorar. Consultado na Internet em 6 jan. 2014: http: / / blogdaboitempo.com.br / 2013 / 03 / 30 / quase-50-anos-do-golpe-de-1964- nada-a-comemorar /

Miliandre Garcia

Rodrigo Czajka

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50 anos de golpe: arte, cultura e poder (Parte II) / Antíteses / 2015

Como parte complementar ao dossiê “50 anos do golpe: arte, cultura e poder”, publicado no primeiro semestre de 2015, chega a público este segundo tomo intitulado “50 anos do golpe: memória, política e movimentos sociais”. A publicação do dossiê em duas partes justifica-se por dois motivos essenciais: a) dividir as contribuições em dois grandes temas de pesquisa sobre a ditadura militar no Brasil; b) contemplar o maior número possível de artigos enviados à Antíteses para este dossiê, que recebeu uma quantidade substancial de colaborações.

Cumpre também constatar, com esse dossiê, que os estudos sobre ditadura militar no Brasil vêm ganhando gradativa repercussão nacional e internacional. Na última década os trabalhos de pesquisa sobre regimes autoritários têm se tornado atuais não apenas pela necessária, ainda que tardia, abertura de arquivos da repressão, mas também pelo modo como ecos do autoritarismo de outrora hoje, mais uma vez, recolonizam o imaginário social, provendo discursos pelo retorno do controle, da repressão, da militarização do sociedade que consagraria, por sua vez, a vitória por revanche de um certo tipo de nacionalismo caduco.

Vê-se hoje setores da sociedade brasileira, sobretudo aqueles comprometidos com a formação de uma opinião pública sobre os rumos da “vida nacional”, engajados às avessas com panelas estridentes em sacadas de edifícios, tornando esse espaço um camarote particular a partir do qual se constrói um falsa noção de democracia: é necessário, pois, participar daquilo que alguns meios de comunicação chamam de “festa democrática”, mesmo que essa festa barre a entrada daqueles que não estão a caráter ou que não foram simplesmente convidados.

Daí que iniciativas da Antíteses, tais como essa, promovem o debate e permitem uma contemporização dos estudos aqui publicados que, a rigor, não estão necessariamente situados há 50 anos. Pois, se a recorrência dos estudos dessa matiz ainda é verificada no ambiente acadêmico, é porque atual nunca deixou de ser o tema do autoritarismo. Mais que isso: é necessário entender como ele próprio se metamorfoseou em instituições, em movimentos, em indivíduos que hoje perfilam os antigos delírios autoritários de tempos sombrios.

Assim, o artigo que abre este segundo volume, “Recordar é vencer: as dinâmicas e vicissitudes da construção da memória sobre o regime militar brasileiro”, de Marcos Napolitano, propõe uma periodização inédita para analisar o processo de construção da memória do regime militar brasileiro. Partindo do princípio que a memória social e a experiência histórica de uma dada sociedade estão conectadas, o autor analisa a construção de uma “memória mutável” sobre o regime desde os anos 1970 até a primeira década do século XXI.

Florencia Lederman, com o artigo “La nación representada en los héroes. Las estrategias de legitimidad de las dictaduras de Brasil (1964-1985) y Argentina (1976-1983): visiones del tiempo y ejercicio del poder”, analisa como as ditaduras deste dois países se apropriaram dos heróis nacionais. Por serem estes protagonistas de “momentos fundantes” da nação, foram amplamente retomados pelos regimes em questão.

Em “O governo Geisel (1974-1979): o ápice da disputa pelo poder entre duros e moderados e sua expressão memorialista entre os militares”, Maria Gabriela da Silva Martins da Cunha Marinho e Sonale Diane Pastro de Oliveira analisam a disputa memorialista entre “duros” e “moderados” acerca da abertura política no Brasil (1974-1985).

Adrianna Setemy no artigo intitulado “Liberdade sob vigilância: um diálogo entre narrativas históricas sobre o exílio latino-americano no Cone Sul”, pretende, a partir da análise das singularidades, confluências e contradições que caracterizam os diferentes registros escritos sobre o exílio de brasileiros nos países do Cone Sul latinoamericano, promover um debate sobre a pluralidade de formas de narrar a saída indesejada do país de origem, a natureza desses diferentes registros históricos e a construção simbólica do exílio enquanto experiência traumática transcorrida fora das fronteiras nacionais.

Também discutindo a relação entre as ditaduras do Cone Sul, Hernán Ramírez, com artigo intitulado “Reflexiones acerca de las dictaduras del Cono Sur como proyectos refundacionales”, pretende evidenciar as ditaduras como eventos estruturais e não apenas simples conjunturas políticas, que repercutiram de forma profunda nas sociedade latino-americanas, não de modo homogêneo, e que ainda hoje se fazem sentir seus desdobramentos, ao ter remodelado aspectos sociais estruturais em diferentes nações da América Latina.

No texto seguinte, Agenor Sarraf Pacheco e Jaime Cuéller Velarde, analisam em “Silêncios da historiografia brasileira: o golpe civil-militar em experiências de pesquisa no Pará” as narrativas sobre a ditadura militar brasileira no Pará, levando em consideração que apesar das difíceis trajetórias que a nação e seus habitantes trilharam em distintas parte de seu território, a experiência dos longos tempos de regime de exceção na Amazônia ficou quase nas dobras das produções historiográficas nacionais.

Carla Brandalise e Marluza Marques Harres em “Brizola e os comunistas: os Comandos Nacionalistas na conjuntura do golpe civil-militar de 1964”, pretende circunscrever as divergências de concepção e ação entre Leonel de Moura Brizola e seus aliados na contraposição aos vinculados a Luiz Carlos Prestes no Partido Comunista Brasileiro (PCB).

Em seu artigo intitulado “Formas de militancia en el Partido Comunista argentino durante la última dictadura militar (1976-1983)”, Natalia Casola analisa como a linha definida pelo PC durante a última década da ditadura militar na Argentina, o apelo a construir a “convergência cívico-militar”, se materializou nas diferentes frentes de militância e nas chamadas organizações de massas.

Discutir alguns usos de termos derivados do campo semântico da loucura quando o assunto é a ditadura civil-militar de 1964, analisar o funcionamento dos mecanismo de suspeição e propor uma análise do aparato repressivo ditatorial, do ponto de vista da paranoia, são alguns dos objetivos traçados por Daniel Faria, no artigo “Sob o signo da suspeita: as loucuras do poder ditatorial”.

Partindo para um conjunto de estudos com objetos mais específicos e pormenorizados, o artigo “Carlos Santos e os usos da ideologia da democracia racial na ditadura civil-militar brasileira”, de Arilson dos Santos Gomes visa conferir visibilidade ao protagonismo político negro no parlamento do Estado do Rio Grande do Sul no período da ditadura civil-militar (1964-1974), analisando a atuação do deputado estadual Carlos da Silva Santos.

Rivail Carvalho Rolim procura dar enfoque a algumas formas de resistência à ditadura militar no Brasil exercidas a partir da organização e mobilização de movimento populares, em seu artigo “Repressão e violência de Estado contra os segmentos populares durante os governos militares”.

No artigo “Todo artista tem de ir aonde o povo está”: o movimento político das Diretas Já no Brasil (1983-1984)”, Vicente Saul Moreira dos Santos tece comentários sobre a relação entre História do Tempo Presente e História Política, com objetivo de inserir o movimento político das Diretas Já, transcorrido no Brasil entre 1983 e 1984. Partindo do pressuposto de ter sido um evento da conjuntura do final da ditadura militar, da luta por democracia e cidadania no país.

No mesmo sentido de compreender e detalhar a organização dos movimentos sociais no curso do regime militar, o artigo “O golpe de 1964 e a repressão ao movimento de ‘trabalhadores favelados’ de Belo Horizonte”, de autoria de Samuel Silva Rodrigues de Oliveira, discute o “Inquérito DVS-096” que atingiu a Federação dos Trabalhadores Favelados de Belo Horizonte (FTFBH). Segundo o autor, mais do que destruir a estrutura associativa que articulava o movimento social, a repressão desconstruiu a gramática pública que permitia aos “trabalhadores favelados” reivindicarem o “direito de morar”.

Tal como o artigo anterior, o seguinte aborda a organização de movimentos sociais na ditadura. Intitulado “Repressão política contra trabalhadores rurais: reflexões a partir de um estudo de caso em Magé (RJ)”, o artigo de Marco Antonio dos Santos Teixeira, discute a ação de um grupo de trabalhadores rurais em Magé, na Baixada Fluminense, que lutou pelo direito de permanecer na terra que ocupava e se transformou num exemplo de resistência em todo estado do Rio de Janeiro.

Em “A reforma agrária em projeto: o uso do espaço legal para garantir o acesso à terra no Pará (1960-1962)”, Edilza Joana Fontes, coloca em discussão a proposta de reforma agrária no Pará, ocorrido no pré-64, tendo como análise os decretos dos governos do Estado do que procuram definir uma faixa de terras em torno das estradas estaduais, para fins de assentamentos de pequenos produtores rurais. Um artigo que retoma um tema importante no seio das resistências do campesinato, mesmo antes do golpe de 1964.

Por fim, o artigo que fecha esse dossiê, de autoria de Reginaldo Benedito Dias, intitulado “Maringá no nascimento da ditadura civil-militar de 1964: análise do processo movido contra o vereador Bonifácio Martins e seus desdobramentos”, objetiva analisar o processo movido pelo Estado brasileiro, após a implantação da ditadura civil-militar de 1964, contra o Bonifácio Martins, que exercia mandato de vereador no município de Maringá (PR). Perseguido por causa de seu envolvimento com lutas sociais e sindicais e por presumido vínculo com o Partido Comunista Brasileiro, Bonifácio Martins, por motivos de segurança, evadiu-se de Maringá, ficando impossibilitado de concluir seu mandato. O texto de redimensiona os efeitos da ditadura militar sobre os aspectos biográfico e políticos de um figura importante da resistência e oferece uma interpretação mais densa do fenômeno da repressão.

Assim, com esse segundo tomo do dossiê “50 anos do golpe” foi elencado um conjunto representativo de colaborações que, assim como no primeiro, demonstram – como dissemos – a atualidade do tema de pesquisa e sua pertinência crítica nestes dias em que fantasmas do autoritarismo ganham força, mesmo que 50 anos depois.

A todos, uma boa leitura!

Miliandre Garcia

Rodrigo Czajka

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Brasil, Portugal e África portuguesa: história e artes / História Revista / 2013

O dossiê Brasil, Portugal e África portuguesa: história e artes traz uma gama de discussões voltadas para diferentes objetos, sob olhares diferentes que traduzem a importância desta temática no mundo atual. Além disso, são apresentados artigos e uma entrevista que agregam contribuições de pesquisadores. Assim o texto de Manuel Ferro assentado em uma fonte, o Canto V de os Lusíadas demonstra a permanência deste como fonte de inspiração na literatura atual. Jorge Pais de Sousa preocupa-se com a existência ou não de uma fração socialista do Partido Republicano Português por intermédio da atuação de Magalhães Lima e Afonso Costa. Maria de Fátima Fontes Piazza aborda a circulação de sensibilidades entre Brasil e Portugal, cotejando a edição de luxo, a Selva, do escritor português Ferreira de Castro com as 12 ilustrações de Cândido Portinari para esta edição. Élio Cantalicio Serpa e Heloisa Paulo discutem as relações entre Brasil e Portugal por intermédio do Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de Coimbra. João Batista Bitencourt traz para o leitor uma discussão historiográfica cotejando trabalhos produzidos em Santa Catarina e Rio Grande do Sul, percebendo uma opção pelo enfoque que credita méritos às tradições lusitanas como componente da brasilidade. Alírio Cardoso trata da conquista do Maranhão e Grão Pará durante o período a União Ibérica (1580-1640). Eduardo Melo França trabalha com notícias, publicadas em Portugal, acerca da proclamação da república brasileira e da queda do imperador. Andreia Martins Torres faz uma interpretação das contas encontradas durante a escavação da Fragata Sto. António de Tána, naufragada em Mombaça no ano de 1697, problematizando o significado da presença destes materiais no contexto das ligações entre a Índia e África. Frank Marcon debruça-se sobre o estilo de música Kuduro usado no Brasil, Portugal e Angola, percebendo as implicações de ordem cultural e mercadológica.

Os artigos apresentados tratam de temáticas variadas. O artigo de Cynthia Machado Campos trabalha sobre a emergência do jovem / violência ou jovem / rebeldia nas ciências humanas. José Adilçon Campigoto, João Carlos Corso e Rejane Klein tratam de questões relacionadas com o uso e posse de terra, tendo como ponto de partida a Irmandade de São José da Água Branca. Filipa trabalha com a obra Il Gattopardo de Lampedusa, tendo como fio condutor o corteggiamento della morte, identificando vestígios de uma herança deixada pelos esquemas mentais da dialética barroca. José Antônio de Carvalho Dias Abreu trabalha com a obra de Joaquim Manuel de Macedo intitulada As vítimas algozes percebendo um processo de inversão no sistema escravocrata: a vitima é o algoz e o opressor é vitimizado. Milton Pedro Dias Pacheco debruça-se sobre monumentos relacionados com a arquitetura das águas existentes em Coimbra.

Acrescentamos ao presente dossiê uma entrevista com a Professora Doutora Maria Aparecida Ribeiro, ex Diretora do Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de Coimbra.

Élio Cantalicio Serpa


SERPA, Élio Cantalicio. Apresentação. História Revista. Goiânia, v. 18, n. 2, jul. / dez., 2013. Acessar publicação original [DR]

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Diáspora, literatura e arte / Revista Brasileira do Caribe / 2012

Como afirma Brah (1996) na diáspora múltiplas posições de sujeitos se justapõem, se questionam, se proclamam, negam e se narram. A região do grande Caribe tem na diáspora experiências fundamentais para entendermos a história de sua sociedade e sua cultura. Seja no que diz respeito às emigrações de caribenhos para a Europa, América do Norte ou do Sul no século XXI, seja no que concerne à diáspora africana, do período moderno, ou as diásporas europeias mais recentes como aquela vivenciada pela comunidade de espanhóis fugidos da queda da República. Isso sem contarmos a diáspora síria, libanesa e chinesa do começo do século XX. Outrossim, a migração de trabalhadores indianos contratados deve ser lembrada.

A diáspora tem sido pensada como intersecção da errância com a fronteira, da localização com o deslocamento; é ponto confluência de processos econômicos, sociais, políticos, culturais ocasionados no trânsito, no deslocar-se. Nesse sentido, como parte da história caribenha, ela marcou as experiências e se constituiu em contextos fundamentais de produção artística e literária caribenha, quando não tema para artistas e escritores caribenhos diaspóricos ou não. Não poucas vezes, para retomar a expressão de Hall (2003) eles foram obrigados a pensar as suas sociedades na diáspora.

Esse número da Revista Brasileira do Caribe reúne textos sobre a relação entre Diáspora, Literatura e Arte no Caribe, fruto do trabalho de cooperação em rede entre grupos de pesquisa das Universidades de Granada, Carlos III y Autônoma de Barcelona, a Filmoteca de Madri, na Espanha, a Universidade Federal do Tocantins, Universidade Federal de Goiás e Universidade Federal de Maranhão, no Brasil e a Universidade do Atlântico, na Colômbia. Abre o Dossiê o artigo “Anecdotario de una visa imaginaria. Diáspora y activismo en la obra de Jean-François Boclé,” que analisa a produção artística da diáspora caribenha a partir da trajetória e do ativismo do artística plástico Jean-François Boclé. Na sequência, Jordi Lladó, “Literatura catalana en la prensa latinoamericana: una nación en la diáspora” trata da relação estabelecida no século XX entre a literatura catalã e o mundo cultural latino-americano, mostrando, por um lado, o enriquecimento da produção cultural na América Latina e Caribe, e, por outro, como as revistas catalãs na América se constituíram como lugar de fortalecimento cultural da língua catalã quando ela era perseguida na Espanha.

O artigo “La ‘primera piedra’: José Gómez Sicre y la fundación de los museos interamericanos de arte moderno de Cartagena y Barranquilla” de Alessandro Armato, reconstrói a história do primeiro lançamento do museu interamericano de arte moderna em Cartagena de Índias e Barranquilla e o envolvimento de personagens diáporicas, como o cubano José Gómez Sicre e a Martha Traba nesse projeto, mostrando o papel de migrantes no desenvolvimento do modernismo artístico na Colômbia. Seguindo uma mesma perspectiva, Danny González Cueto en “Arte, literatura, prensa e intelectualidad en el Caribe colombiano (1917-1980)” escreve sobre a produção cultural na cidade de Barranquilla, focando, entre outros aspectos, a importância de personagens diáporicos como o judeu David Zacarías López (Penha) e o catalão Ramon Vinyes. Ainda no que diz respeito á produção cultural, Alexa Cuesta Flórez apresenta o artigo “Feminismo, género o reivindicación en el arte del Caribe colombiano: Colectivo La REDHADA” no qual se problematiza a produção artística feminina do Caribe Colombiano, fazendo ênfase nas trajetórias diaspóricas de muitas dessas artistas.

Os estudos que seguem tratam de personalidades inquietas e errantes como o crítico Juan Acha, o escritor Alejo Carpentier e o artista Jaime Suárez. No primeiro caso, aparece o artigo de Dagmary Olívar Graterol “Revisión del latinoamericanismo en la propuesta teórica y crítica de Juan Acha”, nesse propõe estudar a obra desse importante crítico de arte em torno da questão do latino-americanismo. Dernival Venâncio Ramos e Marina Haizenreder Ertzogue em “Performance biográfica e narrativa no Caribe: um estudo de La consagración de la primavera, de Alejo Carpentier” problematizam o lugar da biografia como discurso legitimador na narrativa de um dos maiores escritores cubanos. Por fim, Daniel Expósito Sánchez em “Jaime Suárez ante la crítica de arte puertorriqueña. Impresiones de una década (1975-1985)” problematiza o lugar da crítica de arte na projeção do artista porto-riquenho como um dos mais importantes criadores de seu país.

Este dossiê, tenta contribuir para o aprofundamento da discussão sobre o lugar da diáspora na experiência histórica cultural caribenha. Como se pode perceber, o trânsito de gentes do e pelo Caribe foi um contexto importantíssimo para a produção artística regional; no entanto, a experiência da diáspora tem sido também o contexto no qual muitos escritores, artísticas, críticos têm localizado sua produção artística e literária.

Na sequência aparece o artigo “En torno a la Ciénaga de García Márquez: El proyecto de adaptación de La Casa Grande de Álvaro Cepeda Samudio por Luis Alcoriza” de Javier Herrera. Neste se descreve o projeto de filmar a obra La casa grande de Álvaro Cepeda Samudio. Simultaneamente, mostra a faceta cinematográfica do autor de Cien años de soledad. Fecha essa edição o artigo “Filosofía de la Historia y Teoría de la Frontera en el Ensayo Americano” de Luiz Sérgio Duarte da Silva que, centrado na produção literária e ensaísta, chega a insights que podem ser aplicados a outros campos, como as artes plásticas. Para Silva, a arte é produção de sentido, tentativa de dar conta das demandas sociais e, por isso, tenta orientar à sociedades no modo como ela compreende seu passado e futuro.

Referencias

BRAH, Arthur. Cartographies of Diaspora: Contesting identities. New York: Routledge, 1996.

HALL, Stuart. Da diaspora: Identidades e Mediações Culturais. Belo Horizonte: UFMG, 2003.


CUETO, Danny González; RAMOS, Dernival Venâncio; LLADÓ, Jordi. Diáspora, literatura e arte. Revista Brasileira do Caribe, São Luís, v.12, n.24, jan./jun., 2012. Acessar publicação original. [IF].

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Histórias visuais: experiências de pesquisa entre História e Arte | Fênix – Revista de História e Estudos Culturais | 2012

Historiadores interessados em tratar temáticas da cultura por meio da visualidade artística, ou mesmo, historiadores da arte ciosos do status da história em suas pesquisas. Este dossiê poderia ter sido pensado como um diálogo entre historiadores e historiadores da arte, mas se conformou como algo além. Diálogos pressupõem campos de formação distintos, que se confrontam e estabelecem acordos, influências mútuas a partir de áreas estanques. Os resultados deste encontro demonstraram a natureza conjunta deste corpo de estudos entre a arte e a história, espaços intervalares entre a história e as artes visuais. Ontologicamente, história e arte estão imbricadas, embora suas preocupações íntimas possam acentuar especificidades em sua expressão formal, ou mesmo nas bases histórico-culturais que as compõem. As pesquisas apresentadas neste dossiê caminharam nos campos da visualidade, demarcação de amplo espectro, que atende às inquietações teórico-metodológicas dos que lidam com imagens sob a perspectiva cultural. Leia Mais

História, Arte e Cidades / Cordis – Revista Eletrônica de História Social da Cidade / 2011

O número 6 da Revista Cordis: Revista de História Social da Cidade, tem como tema as relações entre História, Arte e Cidades. Os artigos da presente publicação visam registrar a historicidade de diversas experiências artísticas erigidas nas cidades, em que as vivências humanas são recuperadas a partir de estudos na área da cultura. E é por meio de textos, que dialogam com diferentes vertentes da Nova História Cultural, que é dada visibilidade aos símbolos, valores e comportamentos criados / recriados pelos sujeitos sociais em suas tramas na cidade. Nessa perspectiva, os escritos desatam alguns dos fios das tessituras sociais e expressam uma preocupação em incorporar homens e mulheres de múltiplas temporalidades nas cidades, deixando fluir suas sociabilidades, subjetividades, modos de vida, valores e sentimentos que são engendrados no conflituoso e tenso cotidiano da realidade social.

Os textos estão consubstanciados na noção de que documento é tudo o que registra a ação e a experiência humana. Essas reflexões apontam que os ecos das vozes dos sujeitos sociais emergem a partir de olhares, de interpretações históricas atentas às práticas presentes no cotidiano comum e que não estejam contempladas apenas em documentos textuais de arquivos oficiais. Dentro dessa dimensão de análise, os artigos estão coadunados com o que foi enfatizado pelo historiador francês Lucien Febvre, da “Escola dos Annales”, ao afirmar que todo documento ao exprimir o homem, seus gostos e sua maneira de ser é objeto da História.

O eixo temático História, Arte e Cidades parte do pressuposto teórico-metodológico de que a linguagem artística na cidade é fruto da ação de diferentes grupos sociais e que a cada dia inventam / reinventam suas cidades ideais e singulares. Os habitantes das cidades deixam cravadas as marcas de suas passagens no tempo-espaço, enquanto lugares de memória. Seguindo essa linha de raciocínio, os textos expressam o viver urbano por meio de uma diversidade de fontes documentais: literatura, escultura, biografia e logradouros públicos.

As pesquisas que se debruçam sobre a literatura como documento histórico apresentam análises que interrogam as representações produzidas por escritos sobre a sociedade em questão, de modo a apreender o imaginário dos autores e suas implicações político- -ideológicas. É o caso dos textos de “Sessão das Moças: sociabilidades por escrito”, de Alexandre Sardá Vieira; “Habitar o tempo: entre Recife, Barcelona e Sevilha de João Cabral de Melo Neto (1947- 1959)”, de Fernanda Rodrigues Galve e “Relações de gênero e situações de violência no romance O Cortiço, de Aloísio de Azevedo”, de Tânia Regina Zimmermann.

As narrativas que debatem as identidades dos sujeitos históricos e as relações entre história e memória são elaboradas pelos artigos: “O monumento e a cidade. A obra de Brecheret na dinâmica urbana”, de Irene Barbosa de Moura; “Como um canteiro de linguagens e identidades, de história e de arte do Cemitério Municipal São José, Ponta Grossa (PR)”, de Maristela Carneiro; “Praça Willie Davis – Londrina (PR): espaço como memória”, de Lorraine Oliveira Nunez e “Espaço urbano, supermercado de rede: aproximação e distanciamento”, de Desirée Blum Menezes Torres.

A abordagem que entrecruza História, arte e biografia é a de Eugênia Desirée Frota, no artigo “Linguagem e coerência na obra de Pasolini”, em que apresenta as bases político-sociais da obra poética, crítica e contundente, de Pasolini. E, há também o texto “A dança na Ribalta: o Cuballet em Goiânia (1995-2000)”, de Rejane Bonomi Schifino, que investiga as relações entre dança e cidade, a partir de uma perspectiva histórica.

Completam este número, os tópicos: entrevista, resenhas e pesquisas de graduação, que apresentam reflexões inseridas nos novos rumos da escrita historiográfica sobre a cidade.

São Paulo- SP, junho de 2011.

Yvone Dias Avelino (PUC-SP)

Marcelo Flório (Universidade Anhembi Morumbi)

Os Editores


AVELINO, Yvone Dias; FLÓRIO, Marcelo. Apresentação. Cordis – Revista Eletrônica de História Social da Cidade, São Paulo, n. 6, jan. / jun., 2011. Acessar publicação original [DR]

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Arte e Cultura na História | Temporalidades | 2011

Este novo número da Revista online Temporalidades apresenta não somente mais um vasto número de artigos de especialistas e alunos atentos ao estudo da história, mas em especial a edição do primeiro volume em forma de dossiê totalmente endereçado ao campo de investigação da história da arte, intitulado Arte e cultura na história. A organização e disposição dos textos no referido dossiê seguiram uma ordem alfabética, pois dado a ampla diversidade de assuntos não seria possível reuni-los numa escala temática.

Neste sentido, novas problemáticas são abordadas ou reativadas. Dentre elas a questão específica da arte sob o ponto de vista técnico-formal, mas também as questões histórico-culturais como os estudos pertinentes à conservação e ao restauro. O campo de análise investido neste dossiê é amplo e permite criar uma visão panorâmica da história da arte disponibilizando possibilidades de pesquisas num campo pouco investigado, mas nem por isso menos importante. É nesta área de estudos, rica e próspera, as vezes mal compreendida porque não suficientemente investigada, que se vêm alguns textos mais reveladores e inovadores da historiografia da arte geral. Muito tem sido descoberto e quase tudo tem sido repensado e reavaliado. Leia Mais

Entre séculos: Imagens de Arte e Cultura Visual | ArtCultura | 2010

Os textos aqui reunidos versam sobre produção, circulação e recepção de obras artísticas visando contribuir com olhar problematizado a partir das imagens de arte na discussão sobre a cultura visual de fins do século XIX e início do XX. Pensar entresséculos permite alargar as faixas cronológicas tradicionalmente propostas pela historiografia, permite mesclar diferentes documentos consultados pelos autores e transpor marcos temporais esta – belecidos nos arquivos e nos compêndios da história, da cultura e da arte.

São apresentadas, neste minidossiê, diferentes categorias de imagens artísticas e de documentos, em assuntos como pintura, arquitetura, ensino artístico e objetos decorativos, com relevantes contribuições ao debate atual no campo da visualidade. Vale ressaltar o interesse das áreas de história e de arte nas abordagens visuais seja para alargar seus conhecimentos específicos, como no tratamento de material visual enquanto documento e/ou objeto de estudo, seja para provocar o diálogo com outras áreas do conhecimento e levar seus saberes particulares a outros domínios. Leia Mais

História, Arte e Imagem / Esboços / 2008

À época de sua criação, em 1994, a Revista Esboços trazia na capa um estudo do Arqueiro, de Tintoretto, para ilustrar o objetivo da revista: publicação das pesquisas, dos alunos de pós-gradução do Programa, em fase de redação da dissertação. Mas não só. O esboço do Arqueiro queria também enunciar uma perspectiva historiográfica. Os esboços, cada vez mais, nas exposições, museus e galerias de arte, ganham status de obra como parte da produção do artista, momento em que a obra foi sonhada, instante em que se revela a inspiração de seu criador. A obra do historiador, numa ambigüidade salutar, contempla seu momento inicial de inspiração, e nunca se dá por acabada, clamando por seu caráter de obra aberta da qual nos fala Walter Benjamin.

Hoje, a Esboços, depois de longa trajetória e de suas várias mudanças, tanto no perfil acadêmico, com a colaboração de pesquisadores qualificados do circuito nacional e também do internacional, quanto no seu projeto editorial, alçou o status de obra realizada, muito bem avaliada no ranking dos periódicos brasileiros. Além de estar contida nesse objeto impresso, encontra-se também em versão on line no Portal de Periódicos da Universidade Federal de Santa Catarina: http://www.periódicos.ufsc.br/index.php/esbocos. Sua página na internet vale-se da plataforma SEER – Sistema Eletrônico de Editoração de Revistas, a versão nacional do sistema canadense Open Journal Systems (OJS). Este é um programa aberto, inteiramente desenhado para servir de suporte virtual para revistas acadêmicas na rede internacional de computadores e permite ampla indexação de seus conteúdos e ampla divulgação e circulação entre o púbico leitor.

A área de concentração em História Cultural, implantada no Programa já em 1998, ao conceber a cultura como espaço político, referenciado em delimitação ampla para compreender os contextos nos quais sujeitos operam identidades, movimentos sociais, imaginários, processos de urbanização, de modernização, mobilidades e ocupações territoriais, trouxe em seu bojo o amadurecimento e a configuração de grupos de pesquisa, com liderança na área. Os dossiês, organizados a cada vez pela Esboços, representam a inserção desses grupos que têm reunido seus pares afins em torno de questões historiográficas, tais como estudos de gênero, meio-ambiente, religiosidade, história e saúde, história do trabalho e da escravidão, história indígena e imigração, história e arte.

O dossiê que ora se apresenta, História, Arte e Imagem, parte da iniciativa da Linha de Pesquisa “Políticas da Escrita, da Memória e da Imagem”, que abriga projetos que lidam com fatos artísticos: a vida de uma personagem do mundo das artes, um movimento ou uma obra-de-arte, contextos produzidos em meio à linguagens estéticas e imagéticas que levam a efeito a partilha do mundo sensível com suas identidades/identificações, as disputas que cortam e recortam o social, distribuindo espaços e territorialidades, as visualidades que se configuram num regime ou numa cultura visual a contemplar imagens, representações, monumentalizações, lugares de memória. Se nosso mundo contemporâneo encontra-se cada vez mais dominado pela dinâmica da cultura visual, o estudo da imagem na sua relação entre discurso e visualidade vem despertando grande interesse entre os historiadores.

Na universidade de Chicago, Thomas Mitchell enuncia uma Virada Pictórica, A Pictorial Turn e vê na imagem emergir um paradigma dentro das ciências humanas, da mesma maneira que aconteceu nos anos sessenta com a linguagem e com a chamada Virada Lingüística, ou seja, não só como um tópico central de estudo, mas como característica cultural percebida, por exemplo, nas teorias de Guy Debord sobre A sociedade do espetáculo e de Foucault sobre a sociedade da vigilância. [1]

Os pesquisadores convidados a colaborar nesse dossiê História, Arte e Imagem têm todos largo trato na abordagem das artes plásticas, conciliando o acontecimento histórico no seu modo de relação espaço-temporal próprio da prática historiográfica com a compreensão do registro imagético que compõe a visualidade dos contextos circunscritos. Visualidade que requer, para a sua apreensão, a leitura de imagens.

Nota

1 SCHOLLHAMMER, Karl Erik. Regimes representativos da modernidade. ALCEU. PUC-RIO – V.I – n p.28-41 – jan/jun 2001.

Maria B. R. Flores

Ana Brancher

Organizadoras

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[DR]

Política, Arte e Cultura no Brasil (Anos 1940–1970) | ArtCultura | 2007

Expressivos profissionais das áreas de conhecimento histórico e afins aderiram, de forma renovadora, às mudanças de paradigmas metodológicos e temáticos, que ganharam maior consistência nos últimos tempos. Nesse sentido, ocorreu um afastamento das histórias estruturais e da escrita sintética ou holística. Por outro lado, têm proliferado estudos monográficos, muitas vezes inspirados pela abordagem da micro-história e por forte enfoque culturalista, não poucas vezes desprendidos das movimentações sociais e políticas mais amplas da própria história.

O dossiê que o leitor tem em mãos reúne diferentes textos, amalgamados pela temática Política, Arte e Cultura no Brasil (Anos 1940–1970). Seu título define, por si mesmo, que nossa compreensão sobre História Cultural agrega os novos aportes teóricos e as novas abordagens que alargaram o campo de conhecimento abrangido pela História. Mas que também, a par da perspectiva interdisciplinar que os caracteriza, considera que os macromovimentos da história estão relacionados aos micromovimentos e vice-versa. Leia Mais

História, Arte & Imagem | ArtCultura | 2006

Venha amar-me.

Venha.

Vem para este papel branco, Comigo.

Duras

Se para Marguerite Duras o acontecimento amoroso converteu-se em acontecimento de escrita, se amor e linguagem se autoconstituíram em sua obra, nós, leitores, somos por ela incitados a unirmos memória e imaginação, vida e arte, história e ficção. É este o caminho proposto pelo dossiê História, Arte & Imagem. Nele encontram-se textos cujos interesses estão centrados nas imagens de arte e suas problemáticas, nos fios que conduzem a análise no campo da arte visual, imagética, plástica.

Procurou-se agrupar reflexões vindas de lugares distintos, mas convergentes para a arte. Conjugam-se aqui a História, a Literatura, a Filosofia, a Crítica e a História da Arte, áreas que, no espaço acadêmico, comportam suas especificidades e demarcam seus territórios. Entrelaçadas, no entanto, por seus interesses comuns — teóricos, metodológicos, documentais —, debruçam-se sobre uma mesma categoria de objeto de análise, a obra de arte. Para todos os autores aqui reunidos, ela é foco de atenção, mesmo que pensada com base em diferentes pressupostos.

Lúcia Maria Paschoal Guimarães parte do artista. Fleiüss, imigrante alemão num Brasil que se queria “civilizar”, permite ver o Fleiüss gráfico, designer, artista, o qual exige que se olhe para sua obra deslocando-a de lugares comuns. Surge então a técnica inovadora, o traço crítico, a anotação da vida em linhas e cores e o diálogo com a linguagem plástica que levam a História ao encontro da Arte.

Os historiadores não recusam mais essa parceria. Assumem a união e elegem a obra de arte como centro, como objeto de estudo, como acontecimento histórico mais do que documento, como análise de intenções mais do que objetividade do testemunho. Maria Bernardete Ramos Flores encampa tal possibilidade ao propor a utilização da arte para pensar a vida. As atitudes estéticas são lidas nas obras e nos corpos simultaneamente; entre clones, misses e estátuas, beleza e fealdade se conjugam na percepção artística da modernidade.

Nesse mesmo rumo, a análise histórica de Luciene Lehmkuhl explora a feitura e a leitura das obras, o fazer e o perceber, a criação/realização e a recepção. A obra de arte é decomposta, fragmentada para que permita que se capte sua elaboração. Sua circulação é discutida, e as críticas formuladas são expostas e confrontadas, possibilitando compreender a sua recepção, revelando a presença e a influência da arte brasileira no consagrado meio artístico europeu.

O texto de Paulo Knauss aponta minuciosamente, por meio da leitura atenta e da indicação de vasta e atualizada bibliografia, a relação do historiador com as imagens, em especial com as obras de arte. Sublinha a valorização do conceito de cultura visual no campo da história da arte a partir de sua conexão com o caráter histórico do estatuto artístico. Faz pensar nos caminhos teórico-metodológicos percorridos pelos historiadores que se voltam para as artes.

Interessam-nos a interação e a troca com áreas parceiras da História, cujos especialistas, ao lidarem com obras de arte, embrenham-se em terrenos usualmente pouco visitados pelos historiadores e estabelecem roteiros, circuitos e conexões que nos servem de lição. Nesse sentido, Osvaldo Fontes Filho, toma como ponto de partida os meandros da Filosofia e apresenta os procedimentos adotados por Jean Dubuffet, discutindo a relação matéria e forma ao analisar a escritura do próprio artista. Texto e imagem são entrecruzados e confrontados para deixar ver o mundo “escavado” pelo pintor na sua “espessura viscosa”, um mundo a ser tocado mais do que olhado.

Imagens visuais e literárias aparecem no artigo de Raúl Antelo, advindo do campo da Literatura. Composto de maneira fragmentária, seu texto faz ver o também fragmentado livro de Aníbal Machado, que colhe suas “constelações” em Blanchot. Para nos conduzir ao Aníbal leitor de Blanchot, Antelo copila fragmentos das Cadernetas de citações do escritorleitor. Dá a conhecer o “sentido extraviado” do texto de Aníbal por intermédio da colisão de fragmentos imagéticos e textuais, recolhidos em múltiplas leituras.

Annateresa Fabris, ao se lançar a uma investigação no âmbito da História da Arte e da Crítica de Arte, se dispõe a recuperar o debate ocorrido nos anos de 1970 acerca do hiper-realismo. Entre Estados Unidos e Europa são evocados obras, artistas e críticos que trazem à tona as categorias de mimese e estranhamento por meio de oposições entre técnica e valor artístico/estético, entre operação ilusionista e reduplicação do real, onde a fotografia desponta como dispositivo de distanciamento do mundo físico.

Este é o dossiê História, Arte & Imagem, cuja proposta é amplificar a divulgação de pesquisas relevantes e pertinentes ao debate historiográfico da contemporaneidade. Logo, fazemos questão de participar das discussões que vêm sendo travadas nos últimos anos acerca do uso das imagens em geral e das obras de arte, em particular, para a construção de uma História visualmente orientada. Que nossos leitores venham conosco para este papel [branco?].


Organizadora

Luciene Lehmkuhl


Referências desta apresentação

LEHMKUHL, Luciene. A História por entre artes e imagens. ArtCultura. Uberlândia, v. 8, n. 12, jan./jun. 2006. Acessar publicação original [DR]

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Imagens da modernidade: arte, fotografia e tecnologia / Estudos Ibero-Americanos / 2005

O presente número da revista Estudos Ibero-Americanos tem em vista publicar uma série de ensaios que focalizam as “Imagens da modernidade: arte, fotografia e tecnologia”. Os autores analisam a imagem a partir de diferentes olhares, considerando a modernidade, as ideologias do modernismo, as práticas culturais e os avanços científicos e tecnológicos como fios condutores dos processos de interpretação das mesmas. Como esses ensaios são efetuadas por historiadores da arte e da cultura, as imagens são tratadas não apenas por suas representações enquanto fenômenos positivos, mas levando em conta os seus aspectos estéticos e os diálogos que os artistas estabelecem entre si ou entre distintas categorias artísticas, em diferentes momentos históricos. Os diálogos entre pintores ou destes com fotógrafos e a cultura visual em geral fornecem também outros subsídios para a interpretação das imagens e suscitam novas questões. Fora esses aspectos de caráter metodológico assinalados, os estudiosos têm ainda o objetivo de considerar a espacialidade e a temporalidade da imagem, fazendo conexões com fenômenos próprios ao momento em que ela foi concebida e com outros tempos históricos com os quais ela se relaciona.

A imagem na arte moderna exige do historiador um longo processo de reflexão a respeito das questões internas e externas à mesma, visto que essa é resultante de múltiplos saberes, nos quais se confrontam, de forma interdependente, diferentes campos de conhecimento, o imaginário do artista, a cultura visual e as práticas próprias da sociedade em que ele vive. As imagens da modernidade são fecundas, pois evidenciam as suas mudanças de estatuto, bem como expressam as teorias com as quais elas são produzidas. Com isto, elas são resultantes do cruzamento de vários domínios do saber do mundo moderno, associados à memória, ao imaginário, à sensibilidade, às convicções pessoais e práticas culturais.

A inserção da fotografia no elenco de ensaios tem a finalidade de explicitar a sua importância na contemporaneidade, o impacto tecnológico exercido e a construção de novas percepções de mundo que esta evidencia, sobretudo, a partir da sua produção mecânica no século XIX e, mais recentemente, com a imagem numérica. Com isto, visa-se destacar a importância da cultura visual como fator significativo a ser considerado no processo de interpretação da imagem pelo historiador. Conforme Jean-Claude Schimit, todas as imagens interessam ao pesquisador, pois todas têm razão de ser, exprimem e comunicam sentidos, são dotadas de valores simbólicos e se prestam aos mais distintos usos.1

Este número da revista apresenta ensaios mais teóricos relativos à tradição / modernidade das imagens pictórica e fotográfica e a outros estudos que se pautam em análises de casos, que se estendem da pintura à arquitetura. Eles fogem das metodologias tradicionais da História da Arte, que trabalhou durante muito tempo com abordagens idealista, formalista e positiva, trazendo novos enfoques e problemáticas, bem como da História Cultural que identificou a imagem enquanto documento visual enquanto representação do real.

Nota

1. POIRRER, Philippe. Les enjeux de l’histoire culturelle. Paris: Seuil, 2004. p. 310.

Maria Lúcia Bastos Kern – Professora Doutora.

Cláudia Musa Fay – Professora Doutora.

Coordenadoras


KERN, Maria Lúcia Bastos; FAY, Cláudia Musa. Apresentação. Estudos Ibero-Americanos. Porto Alegre, v.31, n.2, dez., 2005. Acessar publicação original [DR]

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Chico Buarque & Vianinha: Arte e Política no Brasil Contemporâneo | Fênix – Revista de História e Estudos Culturais | 2004

O Núcleo de Estudos em História Social da Arte e da Cultura (NEHAC), da Universidade Federal de Uberlândia, completou, em 2004, dez anos de existência. Ao longo desse período, o NEHAC fomentou pesquisas voltadas para o estudo das relações existentes entre História e Linguagens Artísticas, especialmente no que se refere às interlocuções com Teatro, Cinema, Literatura e Música. Nesse sentido, desenvolveu trabalhos ao nível de monografias de conclusão de curso, iniciação científica, mestrado que, integrados aos projetos dos professores Rosangela Patriota e Alcides Freire Ramos, têm contribuído tanto para a formação de profissionais da área de História, quanto com oportunas reflexões sobre o Brasil Contemporâneo sob o olhar da História Cultural.

As expectativas do NEHAC, porém, não se restringiram somente à produção de conhecimento. Pelo contrário, esse grupo de pesquisa participa ativamente de congressos científicos e desenvolve uma produção bibliográfica com o objetivo de tornar públicas essas investigações. Como resultado dessa empreitada, além de publicações especializadas, o Núcleo de Estudos em História Social da Arte e da Cultura assina uma coluna semanal – NEHAC – no Caderno Revista, do jornal Correio, de Uberlândia, além de contribuir, quinzenalmente, no mesmo periódico, com a coluna de cinema intitulada Script Tease. Ambas podem ser acessadas pelo site http://www.jornalcorreio.com.br. Leia Mais

Arte e Linguagens / Revista Brasileira de História / 1998

O Dossiê que se apresenta neste número da Revista Brasileira de História, Arte e Linguagens, abarca múltiplas temáticas e temporalidades. No artigo de abertura, Arnaldo Contier discute, tendo por base a produção de Carlos Lyra e Edu Lobo, o projeto nacional-popular gestado na década de 1960; em seguida, Marcos Napolitano e Mariana Vilaça analisam o significado estético, social e histórico do tropicalismo e suas interfaces com a indústria cultural.

Com Tereza Aline, entram em cena as peças de Ariano Suassuna, Auto da Compadecida, e de Enrique Buenaventura, La Diestra de Dios Padre. Atentando para a ambientação, tipos, temas, microcosmo social e construção formal, o artigo discute a apropriação e a recriação da herança medieval ibérica no continente americano.

A especificidade da linguagem cinematográfica, por sua vez, é posta em evidência pela análise de uma seqüência de Os Bandeirantes (1940), filme de Humberto Mauro que produziu, segundo Eduardo Morettin, significados e sentidos nem sempre compatíveis com a expectativa de Taunay e Roquette Pinto, seus idealizadores.

Nos textos de Ricardo Marques e Sérgio Norte, a cidade é o personagem central. Com perspectivas bastante diversas, a resistência aos mecanismos de controle e condicionamento é tematizada: a Paris do século XIX versus os planejadores urbanos; a São Paulo do início deste século na percepção poética libertária.

Cândido Grangeiro conduz o leitor aos manuais de fotografias do século passado, atentando para a teia de relações que se estabeleciam entre o fotógrafo e os desejos, sonhos e fantasias do cliente, realçando os aspectos técnicos, estéticos e estilísticos que envolviam a produção de um retrato.

Do século XIX voltamos para a Florença renascentista e a poesia de Michelangelo. O processo criativo e as opiniões do mestre a respeito da hierarquia entre escultura, pintura e literatura são discutidos por Luciano Migliaccio, que ressalta o papel de Benedetto Varchi no processo de cristalização de uma determinada leitura desta lírica.

Annatereza Fabris fecha o dossiê com um texto que aborda a problemática da visualidade nas sociedades contemporâneas, tomada como uma nova escritura, alertando para o fato dos diferentes sistemas de produção de imagens remeterem a discursos peculiares que não se circunscrevem a aspectos meramente técnicos.

A diversidade presente na Seção Artigos não é menor. Bárbara Weinstein discute a recente produção norte-americana a respeito das questões de gênero, destacando os embates teóricos que a tem caracterizado; José Batista Mazieiro volta sua atenção para as representações construídas em torno da prostituição na cidade de São Paulo entre 1870 e 1920.

As relações entre técnica, trabalho e natureza na sociedade brasileira a partir da segunda metade do XIX, a supremacia das artes liberais sobre as mecânicas, a permanência de uma cultura literária e os (des), caminhos da cultura técnica no país são abordados por Hermetes Araújo. O seu artigo permite estabelecer um contraponto com o texto de Cláudio DeNipote que acompanha, por meio dos hábitos de leitura de dois intelectuais da década de 1910, a formação típica do homem de letras no Brasil

As questões que envolvem a posse da terra estão presentes nos textos de Vania Lousada, que estuda os projetos nacionalistas e de reforma agrária dos anos 50, e nas histórias de vida de ocupantes de terra na cidade de São Paulo, analisadas por João Carlos de Souza.

Os dilemas políticos atuais são o mote para Alexandre Hecker discutir a tradição democrática do socialismo brasileiro, por ele identificada ao Partido Socialista.

O presente número da Revista Brasileira de História fornece ao leitor um instantâneo significativo da produção historiográfica atual, em sua vitalidade e variedade de temas e abordagens.

Os recursos financeiros que viabilizaram a publicação foram disponibilizados pelo CNPq, ANPUH-Nacional e os núcleos de São Paulo e Santa Catarina.

Conselho Editorial


Conselho editorial. Apresentação. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.18, n.35, 1998. Acessar publicação original [DR]

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