Viaggi coloniali. Politica/letteratura e tecnologia in movimento tra Ottocento e Novecento | Mario Coglitore

Il percorso scientifico – e letterario sarebbe opportuno aggiungere – di Mario Coglitore si arricchisce ulteriormente con una ampia ricognizione sul mondo coloniale. Viaggi coloniali, politica, letteratura e tecnologia in movimento tra Ottocento e Novecento, che fin dal titolo fa riferimento ad una pluralità di aspetti che contraddistinsero l’epoca dell’imperialismo e che risultano necessari per comprenderla, ci conduce in un avvincente cuore di tenebra1. Scandito secondo i movimenti musicali, il libro ha la capacità di farsi leggere a più livelli: lo studioso come il lettore comune trovano una materia di grande interesse per affrontare quel viaggio al termine della notte che fu il colonialismo2. I tre atti dell’opera di Coglitore costituiscono altrettanti assaggi narrati per il piacere di chi sfoglia queste pagine, costruiti in un ordine studiato che corrisponde alla visione dell’autore: dalla storia dell’irlandese Roger Casement, che non esitò a denunciare con crudezza lo sfruttamento dei lavoratori sudamericani ed africani da parte delle grandi imprese occidentali, al ben noto romanziere Emilio Salgari e all’immagine che offrì del mondo coloniale estremo-orientale senza mai muoversi di casa, ma occupando egualmente un significativo spazio simbolico, analogo in questo ad un personaggio come Jules Verne; fino alla sanguinosa storia della realizzazione da parte dei colonizzatori francesi della linea ferroviaria Congo-Oceano, esempio truce di quanto poco contassero le vite dei locali nella mente dei dominatori coloniali spesso fra loro in competizione rispetto al commercio di materie prime. Coglitore non fa sconti ai protagonisti del sistema coloniale del tempo, che presenta sotto le vesti di barbarie, in linea del resto con la vasta prevalente storiografia del settore. Collocandosi nel filone aperto in pratica ormai quarant’anni fa dal celebre libro di Edward Said, Orientalism, Viaggi coloniali passa con disinvoltura da un argomento all’altro, seguendo un filo ermeneutico ben teso dall’autore3. Forte di una propria cifra stilistica e capace di offrire un terreno di incontro di più generi e aree di ricerca con un’impostazione comune alle varie parti, Coglitore destruttura i tre capitoli del libro per ricomporli poi all’interno di un quadro assai mosso in cui combina il concetto di mobilità, reale o immaginaria, con la letteratura e con l’uso della tecnologia, ridisegnando il mondo sulla base di spazi di sfruttamento economico e sociale appartenenti all’universo culturale occidentale.

Leia Mais

Construir Valparaíso: Tecnología/ municipalidad y estado/ 1820-1920 | Samuel J. Martland

El desarrollo urbano de una ciudad está estrechamente vinculado a las características geográficas del territorio que ocupa, pero también a la manera como se organizan sus gobernantes y a las herramientas tecnológicas de las que disponen sus habitantes. El libro de Samuel J. Martland plantea una aproximación a la historia de Valparaíso durante el siglo XIX a través de un análisis en el cual articula la tecnología urbana, la administración municipal, las empresas privadas y la formación del Estado. En ese sentido, su hipótesis general plantea que “(…) esta ciudad fue un lugar de experimentación y adelantos no solo tecnológicos -el muchas veces citado “progreso”- sino, también, en los reglamentos de seguridad y comodidad, y en la organización administrativa y cívica1. Para su demostración, el historiador norteamericano propone una estructura cronológica basada en cinco capítulos. Ahora bien, antes de entrar en la discusión específica de cada uno, es fundamental abordar algunos elementos generales sobre la propuesta formal, epistemológica y metodológica del autor que se puede observar en la introducción y a lo largo de todo el libro. Leia Mais

O que os jovens brasileiros pensam da ciência e da tecnologia? | Luisa Massarani

Luisa Massarani Tecnologia
Luisa Massarani | Foto: Universo – Sistema de Noticias de la UV

O que os jovens brasileiros pensam da ciencia TecnologiaAs mudanças climáticas, suas origens e seus impactos estão entre os temas mais estudados das últimas décadas. Existe um significativo nível de concordância entre diferentes correntes de pesquisas científicas sobre o tema (Bastin et al., 2019 ). A comunicação dos resultados dessas pesquisas amplia a importância do desenvolvimento científico e tecnológico e fortalece o nível de percepção da sociedade sobre esse fenômeno. Estudos mostram que os jovens tendem a um maior engajamento nesse contexto quando conhecem a dimensão dos impactos dessas mudanças, contudo, com raras exceções, são excluídos das discussões sobre a dimensão desse problema que os desafiará em breve (Lee et al., 22 fev. 2020). E no contexto nacional, o que pensam os jovens sobre mudanças climáticas? Sobre pesquisas científicas? Sobre tecnologia? Esta resenha trata de uma produção muito importante que responde a essas e outras incertezas sobre os jovens brasileiros. Leia Mais

21 lições para o século 21 | Yuval Noah Harari

Yuval Noah Harari é um historiador pop. Pop no sentido de estar nas grandes mídias, fazer TED1 , professor acadêmico, militante em causas no movimento LBTQIA+ ele é autor dos best sellers (mais vendidos) ‘Sapiens, uma breve história da humanidade’ (2011), ‘Homo Deus’ (2015) e do objeto desta resenha 21 lições para o século 21 publicada em 2018 e agora em 2020, um livro sobre pandemia, entre outros livros. Professor acadêmico de história da Universidade Hebraica de Jerusalém, com Doutorado em Oxford e milhões de livros vendidos no Brasil, pela editora Companhia das Letras.

Em ‘Homo Sapiens’ ele estabelece uma análise onde a relação história e biologia e mostra o desenvolvimento de como nos tornamos a espécie dominante. Ele narra e interpreta a história do homem a partir de três grandes revoluções: a cognitiva; enquanto uma mudança no processamento mental do Homo Sapiens, abandonando a determinação biológica criando ficções, culminando no seu deslocamento geográfico. Ela acontece em vários aspectos, que estão ligados a ficcionalização e através dela se cria jeitos de cooperação e cria-se realidades imaginadas, como se estabelecem relações de hierarquia, organizações civilizacionais e institucional. A segunda é da agricultura: para o Harari tem-se um aumento de disputas por poder, espaço, território e acúmulos de comidas. A última é a cientifica: quanto mais nós conhecemos e descobrimos, mais sabemos que somos insignificantes diante do universo. Leia Mais

Ciencia/tecnología y producción agropecuaria. Historia de la cooperación bilateral entre Alemania y Uruguay (1856-2018) | Gerardo Caetano

 

Resenhista

Eduardo Gallardo – Centro de Estudios de Historia Agraria de América Latina (CEHAL).


Referências desta Resenha

CAETANO, Gerardo (Org.). Ciencia, tecnología y producción agropecuaria. Historia de la cooperación bilateral entre Alemania y Uruguay (1856-2018). Montevideo: Editorial Planeta, 2019. Resenha de: GALLARDO, E. Historia Agraria De América Latina, v.1, n.2, p. 138-141, nov. 2020. Acesso apenas pelo link original [DR]

O Pensamento de Pierre Lévy – comunicação e tecnologia | Guaracy Carlos da Silveira

Há algumas décadas, muito se tem refletido e discutido sobre a importância e as aplicabilidades da comunicação e sua simbiose com a tecnologia, principalmente em tempos de disseminação das redes de comunicação digital. Porém, o que vinha sendo debatido de forma parcimoniosa, numa tentativa de compreender de forma mais profunda, ganhou certa notoriedade nos últimos dias, visto a urgência de atender as demandas sociais.

Almejando reflexionar as reivindicações da sociedade sobre essa temática que se insere a obra: O Pensamento de Pierre Lévy – comunicação e tecnologia, de Guaracy Carlos da Silveira, publicada em 2019 pela Editora Appris. A presente composição, tem como escopo, apresentar a evolução das ideias de Pierre Lévy a uma recente geração de leitores que já nasceram imersos em um cenário de constantes mudanças tecnológicas, cotejando a pertinência do seu pensamento no contexto atual. Leia Mais

Dicionário de trabalho e tecnologia – CATTANI; HOLZMANN (TES)

CATTANI, David; HOLZMANN, Lorena (Org.). Dicionário de trabalho e tecnologia. Porto Alegre, Zouk, 2011, 494 p. Resenha de: LIMA, Raphael Jonathas da Costa. Revista Trabalho, Educação e Saúde, v.12, n.2, Rio de Janeiro, maio/ago. 2014.

Organizado por Antonio David Cattani e Lorena Holzmann, o Dicionário de trabalho e tecnologia, publicado em 2011, já em sua segunda edição, tem como propósito capturar e reunir inúmeros aspectos que vêm configurando o mundo do trabalho e orientando um conjunto de mudanças cuja maior profusão passou a ser verificada na fase que se estende das últimas décadas do século XX ao início de século XXI. Obra de caráter coletivo e multidisciplinar, o dicionário contou com a contribuição de 62 especialistas de diferentes áreas, os quais se desdobraram na composição de 107 verbetes dedicados a sumarizar aspectos referentes à implementação da tecnologia ao trabalho. Trata-se da evolução editorial de uma obra originalmente publicada em 1997 com apenas cinquenta verbetes e sob o título Trabalho e tecnologia: dicionário crítico, renomeada em 2002 para Dicionário crítico de trabalho e tecnologia e, finalmente, em 2006, quando ganhou o título atual, reunindo 96 verbetes e incorporando outros autores.

Conforme a caracterização feita na apresentação, os organizadores do dicionário têm como finalidade principal oferecer uma obra capaz de dimensionar as grandes transformações no mundo do trabalho (resultantes de inovações tecnológicas, gerenciais e institucionais), o aumento do não trabalho/desemprego e seus efeitos danosos, segundo eles preocupações já bastante disseminadas entre acadêmicos, trabalhadores e suas organizações. Nesse sentido é que procuram apresentar um panorama o mais completo possível acerca de conceitos específicos unificados sob a alça das macrocategorias trabalho e tecnologia. Outrossim, em sua quase totalidade, o dicionário oferece ao leitor um material com extrema coesão, podendo-se mesmo perceber uma enorme uniformidade nos argumentos e também nas avaliações feitas pelos autores acerca dos efeitos identificados nos processos tratados por cada verbete. Ponto que pesa a favor do dicionário. Em outros termos, prevalece o argumento segundo o qual da conjugação entre (novos) processos de trabalho e formas inovadoras de tecnologia decorre, o mais das vezes, a precarização que de alguma forma atinge os indivíduos em seu espaço profissional com reflexos sentidos nas demais esferas do seu cotidiano, notadamente na familiar.

A constatação acima apontada, afinal, condiz com a argumentação (trivial, é verdade, mas fundamental) segundo a qual a precarização foi o efeito negativo mais percebido e discutido pelas análises que margearam o panorama que envolveu as modificações no mundo do trabalho, sobretudo, no último quarto do século XX, potencializadas por avanços produtivos e organizacionais configurados, dentre outras formas, pela constituição de clusters e distritos industriais espalhados por Europa, Estados Unidos e, finalmente, Brasil. Isso porque, historicamente, a implantação (e manipulação) de práticas inovadoras de organização da produção industrial tem sido associada à intensificação do controle, da vigilância e da exploração do trabalho, sucedidos estes pelo enfraquecimento da ação sindical, fenômeno por sua vez acompanhado da sistemática ameaça aos direitos e às conquistas dos trabalhadores, preocupações frequentemente presentes nesse debate.

Inovações emblemáticas, como a introdução por Henry Ford da linha de montagem movida a volante magnético, em sua fábrica de Highland Park, Michigan, nos Estados Unidos, em 1913 – entendida como um avanço sem precedentes na indústria automobilística, a despeito de ter se apropriado de princípios mecânicos já conhecidos – tornaram-se emblemáticas pelo que passaram a significar em termos de ordenamento social, organização e controle das forças sociais do trabalho pelo empreendimento capitalista em expansão (Beynon, 1995). Nessa época, origina-se o conjunto de processos reunidos sob o nome de fordismo, praticamente consensuais nas práticas empresariais subsequentes, até a sua crise, nos anos 1970. O dicionário contempla o fordismo com uma caracterização extremamente fiel ao que de fato veio a representar para a indústria: uma inovação simultânea no chão de fábrica e nas dimensões macroeconômicas e institucionais. Em consonância com um conjunto de práticas (racionalização, separação entre concepção e execução do trabalho e a individualização na prescrição e execução de tarefas) reunidas sob a nomenclatura de taylorismo (concebidas por Frederick Taylor), o fordismo avançou em sua finalidade de estabelecer um novo princípio de disciplinamento fabril e um novo mecanismo de extração de maisvalor via intensificação do trabalho.

O aparato de procedimentos técnicogerenciais aglutinados a partir da combinação fordismotaylorismo aparece de forma bem sistematizada no dicionário, assim como processos como o toyotismo, o just in time eo kanban, os quais constituem a fase posterior de desenvolvimento das forças produtivas do capitalismo. Essa etapa está mais relacionada à segunda metade do século XX, quando se instaura um regime de acumulação (flexível) caracterizado pelo fim do compromisso fordista e composto pelo amplo quadro de reestruturação produtiva que incluiu, além de alterações tecnológicas e na organização do trabalho, a reorganização de firmas, o estabelecimento do fluxo financeiro em rede e o deslocamento regional incessante de empresas, confirmando assim o princípio básico do capitalismo de buscar novos espaços para reinvestir seu capital excedente e reequilibrar sua taxa de lucros (Harvey, 2005).

O dicionário também caracteriza aqueles instrumentos concebidos como estratégias de resistência frente ao avanço avassalador das mudanças tecnológicas dentro das empresas. O verbete ‘ação sindical em face da automação’ mostra como o aperfeiçoamento técnico da produção visa fragilizar os trabalhadores, seja pelo seu ajuste ao princípio da polivalência, seja pela prática da redução de postos de trabalho. Em contrapartida, a ‘ação sindical em face da automação’ e a ‘greve’ se colocam como os dispositivos capazes de promover modificações nas relações de produção e, sobretudo, na estrutura de poder, usando a rigor os sindicatos como a forma institucional mais expressiva de ação coletiva com essa finalidade. E a processos particularmente problemáticos e polêmicos, como ‘degradação do trabalho’ e ‘divisão sexual do trabalho’, somam-se outros fenômenos, como ‘informalidade’, ‘tecnociência’, ‘teletrabalho’, ‘autogestão’ e ‘economia solidária’, que ajudariam a reduzir o fosso de poder que historicamente vem separando empresários e trabalhadores no seio da economia capitalista. Essas novas formulações conferem um caráter mais diversificado ao dicionário ao passo que são fortes provas de que os estudos sobre trabalho sempre se renovam pela incorporação dessas inovações gerenciais, organizacionais e tecnológicas inauguradas ano após ano.

Vale ressaltar que, logo na apresentação, os organizadores da obra destacam a centralidade da inovação tecnológica ao recordarem ser ela uma componente inquestionável do trabalho, uma vez que “produz artefatos e processos que, cada vez mais, passam a mediar o liame entre o homem e a natureza” (p. 12), não se entendendo essa relação exatamente como saudável, pois implica um progressivo sufocamento das forças sociais do trabalho. De fato, é inquestionável que, no decorrer do seu desenvolvimento histórico, o capitalismo vem procurando beneficiar o processo de trabalho (e não o trabalhador), almejando alcançar um maior grau de eficiência e de produtividade, sobretudo em detrimento do poder das organizações trabalhistas.

Portanto, cabe aqui superar a perspectiva histórica de enxergar unicamente a ruptura entre o par ciência/tecnologia e o conjunto de forças sociais e econômicas do qual faz parte. Esse entendimento de renovação na relação entre tecnologia e sociedade se manifesta no tratamento conferido pelos autores às sociologias da ciência, da tecnologia e, naturalmente, do trabalho, convergindo com a afirmação de Braverman (1987) de não se instituir um cenário de hostilidade à ciência e, por consequência, à tecnologia. Deve-se apenas questionar os seus empregos como instrumentos de criação, perpetuação e aprofundamento do fosso que separa classes sociais. Implica afirmar que a tecnologia não pode ser acusada de produzir relações sociais, em geral conflituosas e de subordinação, porque em sua essência ela é o resultado e não a causa dessas relações representadas pelo capital e que favorecem o processo de acumulação no seio da engrenagem capitalista. Pois bem, como ciência e tecnologia estão intimamente ligadas, o dicionário não poderia desconsiderar este fato e, como resultado, confere certa relevância a processos tais como ‘inovação’, ‘biopoder’ e ‘nanotecnologia’, enfatizando ainda a relação entre ‘tecnociência e trabalho’, ‘tecnologia e desenvolvimento’, de forma a evitar o determinismo tecnológico que caracteriza, em especial, a sociologia (do trabalho). Não obstante, ao lançar luz sobre a tecnologia e sua relação com processos científicos e inovadores, o dicionário não abdica de assinalar os fenômenos que, quase obrigatoriamente, surgem imbricados a essa dinâmica, a exemplo daqueles relacionados à saúde do trabalhador (‘ergonomia’, ‘ergologia’, ‘lesões por esforços repetitivos’ e ‘qualidade de vida no trabalho’).

Cabe aqui suscitar que, possivelmente, o único porém desse dicionário com cerca de 470 páginas é o fato de, em hipótese alguma, se tratar de uma obra orientada a iniciantes no assunto. Por outro lado, revela-se uma preciosíssima fonte de consulta para pesquisadores com relativa experiência e algum aprofundamento nos diversos debates colocados, o que justifica a aparente falta de didatismo que o material deixa transparecer em diversos momentos. Essa dificuldade é ligeiramente amenizada através da inclusão, ao final do manuscrito, de um índice por assuntos e verbetes, ferramenta extremamente útil à medida que permite fazer correlações entre os tópicos elencados e, comparativamente, atestar a maior ou menor ocorrência de cada um no seio do debate.

Não obstante tal constatação, esse dicionário temático, indiscutivelmente, é uma obra de grande utilidade para os estudiosos e interessados no tema e, desde já, ocupa a condição de item de consulta obrigatória em língua portuguesa. Ele permite não só compreender de forma sistematizada o percurso da degradação do trabalho no século XX como identificar os mais significativos instrumentos elaborados para mitigar seus efeitos. Igualmente, conforme salientam Cattani e Holzmann na apresentação a esta edição, almeja-se aqui oferecer uma obra capaz de transpor o caráter tradicionalista dos dicionários, satisfeitos apenas em disponibilizar ao leitor a gênese e o desenvolvimento histórico de conceitos. Conforme entendem, o que orientou a publicação foi a possibilidade de subsidiar o seu público alvo com os instrumentos capazes de qualificar as investigações que porventura estejam em curso. Nesse sentido, não se trata de um glossário repleto de definições desassociadas, mas de um preciso mapeamento a respeito das questões abordadas pelas mais renomadas publicações e evidenciadas durante os principais eventos científicos nacionais e internacionais.

Referências

BEYNON, Huw. Trabalhando para a Ford: trabalhadores e sindicalistas na indústria automobilística. 2. ed. Paz e Terra: São Paulo, 1995. [ Links ]

BRAVERMAN, Harry. Trabalho e capital monopolista: a degradação do trabalho no século XX. 3. ed. LTC Editora: Rio de Janeiro, 1987. [ Links ]

HARVEY. David. A produção capitalista do espaço. 2. ed. Editora Annablume: São Paulo, 2005. [ Links ]

Raphael Jonathas da Costa Lima – Universidade Federal Fluminense, Niterói, Rio de Janeiro. E-mail: [email protected]

Acessar publicação original

[MLPDB]

Entre a razão e a experiência: ensaios sobre tecnologia e modernidade – FEENBERG (FU)

FEENBERG, Andrew. Entre a razão e a experiência: ensaios sobre tecnologia e modernidade. Tradução, ensaios e notas adicionais de Eduardo Beira com Cristiano Cruz e Ricardo Neder. Vila Nova de Gaia, Portugal: Inovatec, 2019. Resenha de: SZCZEPANIK, Gilmar Evandro. Filosofia Unisinos, São Leopoldo, v.21, n.1, p.124-126, jan./abr., 2020.

Trata-se de uma importante obra filosófica escrita em forma de ensaios sobre tecnologia e modernidade. A obra, publicada originalmente em 2010 pela MIT Press, ganhou uma versão em português de Portugal em 2019 cuja tradução foi realizada por Eduardo Beira, Cristiano Cruz e Ricardo Neder, que acrescentaram três ensaios introdutórios e esclarecedores àqueles ainda não familiarizados com os pressupostos filosóficos do autor. Os tradutores e ensaístas fornecem algumas chaves de leitura que são imprescindíveis para uma adequada compreensão dos pontos apresentados. Chama a atenção, por exemplo, que Feenberg desenvolve uma análise filosófica sob uma perspectiva crítica que, por sua vez, se distancia de uma abordagem pessimista, determinista e catastrófica da tecnologia. Embora sua concepção de tecnologia não seja tecnofóbica, o autor também não pode ser considerado um otimista ingênuo que tende a ficar encantado com as fartas maravilhas fornecidas pelo desenvolvimento tecnológico. Em vez de ficarmos inertes e/ou apartados do desenvolvimento dos novos projetos tecnológicos, somos incitados a participarmos das mais diferentes formas, pois, para Feenberg, a tecnologia não pode ficar restrita apenas aos tecnocratas; ela precisa ser democratizada e novos atores devem ser incluídos no processo de gestação, criação e desenvolvimento de novas tecnologias. Além disso, são apresentados a teoria da dupla instrumentalização e os elementos constitutivos da racionalidade sociotécnica. Trata-se de uma abordagem bastante ajustada e inspiradora que tranquilamente pode ser utilizada para pensarmos e compreendermos as relações entre ciência, tecnologia e sociedade no Brasil e na própria América Latina. A obra encontra-se dividida em três partes, sendo que cada uma delas contém três ensaios. Tais partes são precedidas por um prólogo de Brian Wynne e, ao final delas, há um posfácio de Michel Callon. Passo agora a apresentar as partes que compõem a obra de modo mais sistemático.

A primeira parte da obra é chamada de “Para além da distopia” e é composta de três capítulos, cujos títulos são: i) racionalização democrática: tecnologia, poder e liberdade; ii) paradigmas incomensuráveis: valores e ambiente; e iii) daqui a cem anos, revendo o futuro: a imagem variável da tecnologia. No primeiro capítulo, Feenberg (2019, p.27) “apresenta os temas centrais deste volume: distopia e democracia, a dupla dimensão – técnica e social – da democracia, a reforma ambiental dos sistemas técnicos e a contribuição do construtivismo social para a filosofia da tecnologia”. Além disso, combate tanto o determinismo tecnológico quanto o determinismo econômico, mostrando que o projeto da sociedade é politicamente contingente. Utilizando-se de exemplos históricos (p. ex., trabalho infantil, a regulamentação das caldeiras, etc..), o autor demonstra a ambivalência dos projetos técnicos e defende que a democratização da tecnologia não se resume à democratização do acesso aos bens de consumo, mas envolve necessariamente uma efetiva participação nas decisões tecnológicas. No segundo capítulo, Feenberg recusa a versão do ambientalismo pautado em trocas compensatórias, pois não acredita que seja possível e/ou adequado lidarmos com questões ambientais tendo como pano de fundo a relação entre custo e benefício. Como é característico de sua postura reformista e/ou reprojetista, Feenberg julga necessário incorporar valores sociais e ambientais em futuros códigos técnicos, sendo preciso até mesmo, em muitos casos, uma regulamentação, pois est a pode fornecer um cenário favorável à economia sem necessitar ainda de uma estratégia compensatória. “Não é o ambientalismo que irá empobrecer a nossa sociedade”, diz Feenberg (2019, p.80). O terceiro capítulo, por sua vez, estabelece uma análise crítica comparativa entre as utopias e as distopias tecnológicas dos séculos XIX e XX que tinham como propósito traçar o destino da humanidade mediado pelas tecnologias. Entretanto, utópicos e distópicos dos séculos passados não conseguiram prever em suas profecias os desdobramentos da moderna tecnologia e, por esse motivo, muitos de seus diagnósticos carecem de verossimilhança.

A segunda parte da obra é intitulada “construtivismo social” e contempla três capítulos (iv, v e vi), chamados, respectivamente: “teoria crítica da tecnologia: uma visão geral”; “da informação à comunicação: a experiência francesa com videotexto” e “tecnologia num mundo global”. No capítulo quatro, o autor parte dos estudos construtivistas da tecnologia para desenvolver sua teoria crítica e procura romper com a imagem de que a tecnologia é uma atividade independente do contexto social no qual ela é gestada e produzida, pois argumenta que os códigos técnicos sistematizam tanto a especificação técnica disponível quanto as exigências sociais. Em outras palavras, os códigos técnicos são estabelecidos pelos valores dos atores dominantes. Assim, compete à teoria crítica explicitar quais os atores e os valores que são predominantes nos projetos tecnológicos, pois as decisões tomadas nesse processo possuem enormes implicações políticas. Para Feenberg, as decisões tecnológicas não podem ser tomadas exclusivamente pelos tecnocratas, pois elas são ações de poder que acabam influenciando, direta e indiretamente, o restante da sociedade. Por esse motivo, faz-se necessário democratizar a tecnologia, e esse processo de democratização somente será possível através da inclusão de novos atores e de novos valores que sejam capazes de pensar para além das capacidades técnicas, abarcando, por exemplo, possíveis consequências sociais, culturais e ambientais.

O capítulo cinco destina-se a descrever de forma pormenorizada a relação entre a máquina e seus usuários a partir da experiência dos franceses com o minitel, uma primitiva rede de computadores que teve seu propósito inicial alterado: de um sistema de busca de dados para um sistema doméstico de bate-papo entre usuários anônimos que identificaram no artefato técnico um canal de paquera e de encontros sexuais. Em linhas gerais, pode-se dizer que o minitel é um dos casos favoritos (juntamente com a proibição do trabalho infantil e a regulamentação das caldeiras) utilizados por Feenberg para demonstrar o aspecto não determinista e construtivista dos projetos tecnológicos.

O sexto capítulo relata o processo de modernização tecnológica ocorrido no Japão, sendo est e um dos primeiros países não ocidentais a se modernizar. Para entender as transformações ocorridas no país do sol nascente, Feenberg recorre a Kitaro Nishida, tido como fundador da moderna filosofia japonesa, que esclarece, de forma pormenorizada, o processo de globalização e as transformações dos hábitos e da cultura japonesa, apontando também para as resistências e para as adaptações pelas quais a ciência e a tecnologia ocidental tiveram de passar para atender as necessidades dos japoneses. Em síntese, pode-se dizer que os valores que orientam as escolhas técnicas ocidentais eram quase imperceptíveis para os pertencentes a est a cultura, mas tornaram-se gritantes e, em muitos casos, incompatíveis quando a tecnologia ocidental chegou ao Japão.

A terceira parte do livro denomina-se “modernidade e racionalidade” e inclui os capítulos vii, viii e ix, cujos títulos são, respectivamente: “teoria da modernidade e estudos tecnológicos: reflexões sobre como os aproximar”; “da teoria da racionalidade à crítica racional da racionalidade” e, por fim, “entre razão e experiência”, capítulo est e que dá nome ao livro. No sétimo capítulo, Feenberg observa que as teorias da modernidade e as teorias da tecnologia realizaram grandes avanços nas últimas décadas, embora ainda permaneçam isoladas, mesmo tratando basicamente dos mesmos objetivos. O grande desafio apresentado pelo autor consiste em encontrar meios e desenvolver estratégias para que esses dois ramos possam se aproximar. O viés cultivado pelo autor para fazer essa ponte consiste na retomada das abordagens hermenêuticas comuns, nas quais “tecnologia” e “sociedade” não pertenceriam a esferas separadas, pois os seres humanos fazem, criam, desenvolvem tecnologias que, por sua vez, ajudam a moldar e a configurar os próprios seres humanos. Trata-se de um processo de “co-construção” tanto dos seres humanos quanto da própria sociedade.

No oitavo capítulo, Feenberg investiga os tipos de racionalidades existentes nas sociedades modernas, estabelecendo uma análise comparativa entre os modelos de racionalidades das sociedades pré-modernas. Ademais, introduz o conceito “racionalidade social” que se encontra fundamentada nos princípios de troca de equivalentes; classificação e aplicação de regras; e, por fim, na otimização do esforço e cálculo dos resultados. Além disso, chama a atenção para a teoria geral da instrumentalização e para os códigos de projeto que se referem à est andardização de sistemas racionais que são duráveis, mas passíveis de revisões devido àsalterações nas leis, nas condições econômicas, nos desejos públicos e no próprio gosto dos usuários e consumidores.

O nono capítulo trata da temática central da obra, a saber, da tecnologia como a aplicação da racionalidade técnica e científica tendo como pano de fundo o mundo da experiência cotidiana. Feenberg destaca que nas sociedades pré-modernas, por exemplo, o domínio do conhecimento e o domínio da experiência eram próximos, enquanto nas sociedades modernas tais domínios se encontram isolados. No intuito de promover uma adequada compreensão da técnica, Feenberg retoma as abordagens da essência da técnica de Heidegger e da transformação da técnica através da est ética de Marcuse para, a partir delas, tecer sua abordagem crítica e democrática em torno da tecnologia.

Em síntese, a presente obra de Feenberg mantém os pressupostos filosóficos de sua abordagem crítica presente em seus textos anteriores e enaltece os aspectos políticos e democráticos envoltos nas tomadas de decisões tecnológicas. Como muito bem observa Callon (p. 321) noposfácio de Entre a razão e a experiência, “não há democracia boa sem democracia técnica! Inversamente, não há boa técnica sem democracia”. Enfim, encontramos em Feenberg uma genuína e fértil reflexão filosófica sobre a tecnologia. Genuína, pois apresenta uma forma original de ver e compreender o processo tecnológico. Fértil, porque lança luzes sobre problemas e questões que ainda permanecem em aberto, desafiando a comunidade filosófica a encontrar respostas adequadas aos desafios suscitados pela tecnologia.

Gilmar Evandro Szczepanik – Professor Adjunto do Departamento de Filosofia da Unicentro/ PR – Universidade Estadual do Centro-Oeste. Guarapuava, PR, Brasil. E-mail: [email protected]

Acessar publicação original

The Cultural Revolution of the Nineteenth Century: Theatre – the Book-Trade and Reading in the Transatlantic World. I. B. | Márcia Abreu e Ana Cláudia S. Silva

É recorrente a ideia, trazida especialmente pelos clássicos estudos sociológicos, de que a intensa conexão entre as nações ocorreu devido aos avanços técnicos e informacionais desenvolvidos durante o século XX, sobretudo em seu último quartel. Graças à rede mundial de computadores, os fluxos de deslocamentos de pessoas e a comunicação online favorecem a troca de informações e conhecimentos entre os vários países do globo, além de promover a ampliação das fronteiras no campo econômico e despertar novas modalidades de conflitos políticos. E se parte desses processos de fluxos mundiais já estivessem – para usar uma metáfora da época – a pleno vapor no século 19? Foi com base em indagações como essa que Márcia Abreu (Universidade Estadual de Campinas) e Ana Cláudia Suriani (University College London) organizaram The Cultural Revolution of the Nineteenth Century: Theatre, the Book-Trade and Reading in the Transatlantic World. Sua ideia central é que ao longo do século XIX havia fortes indícios da formação de uma “Aldeia Global” como conhecemos hoje.

Segundo o argumento geral do livro, as decisivas transformações socioculturais do Oitocentos puderam correr o mundo graças às Revoluções Atlânticas do final do século XVIII, ao crescimento demográfico sem precedentes na história humana e ao avanço tecnológico visível nas chamadas linhas de conexão (estradas de ferro, navios a vapor, cabos telegráficos). O encurtamento da distância e o maior contingente populacional aceleraram a circulação de símbolos e ideais culturais, entre eles o dos impressos. Circulando com muito maior liberdade e alcance através do Atlântico, jornais, livros, magazines, circulares, panfletos e folhas volantes se tornaram mercadorias internacionais e vetores das trocas culturais entre as nações. No século XIX era possível a manutenção do que, hoje, intitula-se globalização cultural.

The Cultural Revolution é resultado do projeto temático “A circulação transatlântica de impressos: a globalização da cultura no século XIX”, que reúne uma série de pesquisas, inseridas no campo da micro-história, que pretendem compreender a “revolução cultural silenciosa”, para utilizar a noção de Jean-Yves Mollier (Université Saint-Quentin Yvelines). O objetivo do grupo foi o de analisar os impressos e a circulação de ideias entre Brasil e demais países da Europa entre 1789 e 1914, intervalo inspirado no clássico de Eric Hobsbawm, A Era dos Impérios. Com características transnacionais, The Cultural Revolution reúne trabalhos de cientistas nacionais e estrangeiros de diversas áreas como a história, a sociologia, a antropologia e a literatura. Tal ponto denota a intenção de interdisciplinarizar as Ciências Humanas, passo fundamental para responder à questão que motivou a pesquisa: como se deram as transferências culturais entre a Europa e a América do Sul no século 19?

O livro possui quatro partes, e a primeira delas, Methodology Issues, como o próprio nome indica, consiste em analisar as questões metodológicas. Os três capítulos dessa parte tratam da análise dos agentes, do suporte, da materialidade e dos textos a partir das perspectivas da história do livro, ou da imprensa periódica, e da história da leitura. O primeiro capítulo, de Roger Chartier (École des Hautes Études en Sciences Sociales), analisa simultaneamente o texto para publicação e a fabricação do livro, dado que os escritos estariam sujeitos a mudanças de acordo com a produção editorial. “What is at stake here is not only the production of the book, but of the text itself in its material and graphic forms” (p. 17). Tal noção já se encontra em trabalhos anteriores do autor. Entretanto, a questão amplia-se agora às mercadorias ideológicas transnacionais, uma vez que é possível abordar como ocorreram as apropriações de livros e impressos confeccionados em determinado espaço e adaptadas para outra realidade.

No segundo capítulo, Jean-Yves Mollier (Université de Versailles Saint-Quentin-en-Yvelines) preocupa-se com a história da formação da casa editorial e da profissionalização do editor, analisados segundo aspectos socioeconômicos, ideológicos e políticos. Além da construção cultural dos objetos, Mollier considera o aspecto material e lucrativo da elaboração dos impressos. Esse espaço de produção e concorrência gerou o início da profissionalização do editor, que, não apenas empenhado em disseminar a cultura, também almejou a obtenção de lucros quando adequou conteúdos, fossem textos ou gravuras, para livros e outros suportes impressos, a fim de fazer circular as obras dentro de um espaço transnacional.

Após abordagens sobre o livro, a leitura e o editor, encontra-se o trabalho de Tania Regina de Luca (Universidade Estadual Paulista). A autora debruçou-se sobre o gênero impresso periódico, principalmente jornais e revistas. O texto abordou dois aspectos do fazer historiográfico em torno dessas publicações. O primeiro disserta sobre o universo mais amplo do uso de documentos para a pesquisa histórica que surgiu, sobretudo, com a renovação teórica e metodológica. O segundo ocupa-se com a metodologia aplicada ao estudo da imprensa, em particular a revista, como forma de analisar os problemas históricos de uma época que vão além das transferências culturais.

Com a primeira parte dedicada ao tratamento metodológico dos livros, editores e periódicos, as demais partes de The Cultural Revolution discorrem sobre os três seguimentos inseridos em contextos históricos específicos. A segunda, intitulada “Editing, selling and reading books between Europe and Brazil”, aborda pesquisas em torno de suportes de impressos, livros e periódicos, com foco nas casas editoriais e “editores” em formação.

À luz da abordagem de Mollier, João Luís Lisboa (Universidade Nova de Lisboa) tratou da profissionalização do editor em Portugal. Se num primeiro momento a elaboração de impressos tinha o intuito de informar sobre a política ou disseminar entretenimento, a partir da segunda metade do século 19 iniciou-se o processo de vulgarização de conteúdos variados, principalmente por meio de revistas. Tal mudança necessitou de maior demanda de trabalho e maior agilidade, o que ocasionou o início da profissão de editor na virada para o século XX. Por sua vez, Lúcia Granja (Universidade Estadual Paulista) versou sobre a expansão do mercado livreiro e do desenvolvimento da impressão de livros no Brasil do Oitocentos. Assim como Lisboa, Granja também observou com atenção os agentes em torno do comércio de livros e suas vinculações políticas com os episódios do país. Sua análise destaca Baptiste-Louis Garnier (1823-1893), elo crucial na corrente de circulação de impressos entre Europa e América do Sul. A segunda parte da obra encerra-se com o artigo de Claudie Ponciani (Université Sorbonne Nouvelle), dedicado à figura do engenheiro francês Louis-Léger Vauthier (1815-1901). Vauthier fora pela reforma infraestrutural de Pernambuco, além de vendedor de livros franceses sobre questões técnicas de engenharia e sobre ideais do “socialismo romântico”. O texto inseriu Vauthier na legenda passeur (mediador), noção discutida por Michel de Espagne, que também trouxe à tona a problemática das transferências culturais. Atualmente, a noção de mediação tem sido trabalhada pela historiadora Diana Cooper-Richet, integrante do projeto Transfopress que visa à análise de periódicos em língua estrangeira publicados na França.

Com o título “Cultural exchanges through periodicals”, a terceira parte do livro dedica-se à investigação dos periódicos pela perspectiva das trocas culturais. Eliana de Freitas Dutra (Universidade Federal de Minas Gerais) analisou, sob o ponto de vista da materialidade, como sugere Tania de Luca, a Revue des Deux Mondes (1829-), editada na Cidade Luz e, a título de curiosidade, a preferida de D. Pedro II. Recortando sua análise entre os anos 1870 e 1930, a autora observou o aumento de colaboradores e uma maior discussão sobre diversos países. Na época, o Brasil figurou em várias páginas como alvo de debates que o exibiam como país não desenvolvido por possuir natureza tropical abundante. Os textos de Ana Claudia Suriani da Silva, bem como de Adelaide Machado (Universidade Nova de Lisboa) e Júlio Rodrigues da Silva (Universidade Nova de Lisboa), tomaram os periódicos como fonte de pesquisa. Suriani trabalhou com a moda francesa difundida por impressos franceses e pelos brasileiros Correio das ModasNovo Correio das Modas e A Estação; e Adelaide Machado e Júlio Silva, com problemáticas mais amplas resultantes da integração cultural, como a imigração entre Brasil e Portugal, ponto discutido nas folhas ilustradas Jornal do Brasil (1897-8) e Portugal-Brasil (1899-1914), ambos de Lisboa.

A quarta e última parte do livro, “Plays and novel between Europe and Brazil”, volta-se para a análise ideológica dos teatros e romances modernos, difundidos no século XIX pelos autores ingleses Ann Radcliffe (1767-1823) e Sir Walter Scott (1771-1832). Com o objetivo de comparar e intersectar os diversos interesses de leitores do Brasil, França e Portugal, Márcia Abreu analisou trabalhos de ficção que circularam entre o Rio de Janeiro e Paris. Daniel Melo (Universidade Nova de Lisboa) também se debruçou sobre o gosto dos novos públicos-leitores brasileiro e português, porém com o intuito de examinar o desenvolvimento da leitura em distintos grupos sociais. Por fim, dois artigos examinaram a difusão da produção teatral francesa (tanto a dramática como a lírica). Jean-Claude Yon (Université de Versailles Saint-Quentin-en-Yvelines) abordou a disseminação dos espetáculos em diversos espaços nacionais ao longo do século XIX, a fim de demonstrar o apogeu do teatro francês no início do século e o seu declínio no desfecho do Oitocentos. Orna Messer Levin (Universidade Estadual de Campinas) associou as peças teatrais no Brasil aos impressos periódicos com a finalidade de demonstrar que ambos revelaram a predominância da cultura francesa no país. Levin ainda chamou a atenção para a produção de outras nacionalidades em convívio com a francesa, pois, apesar da hegemonia da língua de Voltaire, a competitividade teria aberto espaço para a expansão do mercado e a profissionalização de editores e de profissionais do teatro no início do século XX.

Ao abordar a circulação de objetos e ideias através de um mercado em expansão entre o Brasil e a Europa, a obra The Cultural Revolution of the Nineteenth Century evidenciou encontros culturais transatlânticos de primeira grandeza. Do ponto de vista da escrita da história, o livro é um contraponto à historiografia nacionalista-desenvolvimentista que suprimiu documentos e fontes de origem estrangeira em detrimento de produções vernaculares. Graças à história do livro e da leitura, em consonância com a história cultural, os historiadores e outros estudiosos das Ciências Sociais vêm demonstrando que a flexibilização das fronteiras nacionais é muito mais antiga do que se pensa. A “Aldeia Global” de hoje teve suas próprias formas de existir antes da internet, seus bits e bytes.

Referência

ABREU, Márcia; SILVA, Ana Cláudia Suriani. The Cultural Revolution of the Nineteenth Century: Theatre, the Book-Trade and Reading in the Transatlantic World. I. B. Tauris: London, New York, 2016.

Helen de Oliveira Silva – Universidade Estadual de São Paulo (UNESP). Assis – São Paulo – Brasil. Graduada em História e Mestranda no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Campus de Assis. Bolsista Fapesp, processo nº 2017-20828-4. E-mail: [email protected]


ABREU, Márcia; SILVA, Ana Cláudia Suriani. The Cultural Revolution of the Nineteenth Century: Theatre, the Book-Trade and Reading in the Transatlantic World. I. B. London, New York: Tauris, 2016. Resenha de: SILVA, Helen de Oliveira. Entre Brasil e Europa: a Revolução Cultural do século XIX. Almanack, Guarulhos, n.21, p. 617-622, jan./abr., 2019. Acessar publicação original [DR]

The reinvention of Atlantic slavery: technology – labor – race and capitalism in the Greater Caribbean | Daniel B. Rood

There has been a revival of the capitalism in the United States since the great recession of 2008. The New Historians of Capitalism (NHC) have created new academic programs and departments at Harvard, Cornell, Brown and the New School for Social Research. This is welcome relief from the “linguistic turn”, returning historical inquiry to the systematic investigation of social and economic structures. However, the New Historians insist that in order to reinvent the study of capitalism, they must abandon any attempt to specify what they mean by capitalism [3]. However, as Althusser argued – “silences are not innocent” -, the New Historians do have an implicit conceptualization of capitalism. Essentially, they adapt Adam Smith’s notion of “commercial society” [4], where capitalism is any economy geared toward profit maximization through productive specialization and market exchange. They also include among capitalism’s features as warfare, finance and legal-physical coercion in the appropriation of surplus labor. Put another way, the New History of Capitalism identifies capitalism with social processes like trade, finance and violence, which have existed for most of the last eight to ten thousand years.

This implicit understanding of capitalism contrasts with most Marxian accounts which view capitalism as a distinctive set of social property relations (social relations of production) with specific rules of reproduction (laws of motion) [5]. From this perspective, capitalism is the first form of social labor in which both non-producers (capitalists) and producers (workers) reproduce themselves through market competition. Capitalists are thus compelled to specialize output, continually introduce labor-saving technology, and accumulate capital in order to reduce costs and maximize profits in a competitive “war of all against all.”

Not surprisingly, the New History of Capitalism has radically altered the study of new world plantation slavery. Walter Johnson, Edward Baptist and Sven Beckert [6] argue that new world slavery was not some atavistic throwback to pre-capitalist societies, but a thoroughly capitalist form that was the foundation to the development of industrial capitalism in both Britain and the United States in the late eighteenth and early nineteenth century. Despite their commonalities, there is considerable debate among these historians about the respective role of physical coercion and technological innovation in the increases in productivity of slave labor, in particular in the harvesting of cotton in the antebellum United States [7]. Daniel Rood’s The reinvention of Atlantic slavery clearly situates itself in the emerging cannon of the New History of Capitalism on plantation slavery, while coming down clearly on the side of those who argue that the master-slave relation was no obstacle to the introduction of labor-saving technology during the “second slavery” of the nineteenth century.

The “second slavery” refers to the revival of plantation slavery in the nineteenth century, after the “colonial slavery” of the seventeenth and eighteenth centuries ended with the Haitian Revolution, the British attempt to suppress the Atlantic slave trade, and the gradual emancipation of slaves in the Jamaica and other British colonies. Most studies of the “second slavery” focus on the US slave produced cotton providing the raw material for British industrialization [8] and Cuban and Louisiana plantations providing the sugar that began to substitute for other, more nutritious and expensive foods in the diets of British workers [9] Rood broadens this discussion by incorporating the “Great Caribbean” nexus between Cuba, Brazil and the upper US South, in particular Virginia.

Faced with sharpening competition from European beat sugar producers and US and British tariffs, Cuban cane sugar planters “responded by adapting European industrial technologies, combining planting with finance, taking control of modern transport infrastructure, and vanquishing small landholders to grab a larger share of the market” (p. 2). The transformation of Cuban slavery forged new connections with the upper US South, which provided extensive engineering and technical expertise to build mills and railways and slave cultivated wheat to feed the island. Simultaneously, the shift in Brazilian slavery from declining sugar plantations in the northeast to more dynamic coffee cultivation in the southeast created new ties with Virginia wheat planters and railway engineers. Throughout this “Great Caribbean” nexus, new labor-saving technology was applied to both production and transportation, and the “race management” of labor was transformed as African slaves’ practical knowledge was appropriated to “creolize” new machinery, and planters began to use new forms of coerced labor, in particular Chinese indentured servants.

Rood begins by retelling the now familiar story of the transformation of the Cuban sugar refining mills and the construction of railroads during the 1830s and 1840s [10]. Faced with increased global competition, Cuban sugar planters built railroads to quickly transport cut cane to the mills from their ever expanding plantations before it spoiled, introduced steam powered crushing of the cane, and replaced the labor-intensive Jamaica train with the vacuum pan in the refining of white sugar. Rood breaks new ground with his investigation of innovations in the preservation of white sugar, where racially ‘tinged” science that assigned manual labor to “darker” people is linked to the struggle to preserve the “purity” of sugar for the US and European markets. His discussion of the transformation of the port of Havana is especially insightful. Havana had experienced a shift from the dominance of middling merchants, whose profits depended upon storage fees, and sales commissions, to a “new generation of Spanish-born elite merchant-planters” whose income came “from buying and selling sugar on the world market, financing illegal slaving voyages, and underwriting sugar-mill operations” (p. 67). To facilitate their new role in the global sugar trade, these merchant planters rebuilt the ports in Havana, introducing railway depots, constructing new warehouses and mechanizing the ports in order to keep “sugar in gentle but unceasing movement” (p. 67). While profiting from the increased speed of circulation, the merchants also remade the port work force replacing black (free and slave) workers with Europeans and Chinese laborers.

Railroad construction in both Cuba and Brazil in the mid-nineteenth century created new connections with the upper South. Rood details how Virginia construction engineers and their slaves were essential to the construction and operation of railroads in new, tropical terrains in the “Great Caribbean”. Skilled slaves were crucial, in the upper US South, Cuba and Brazil in constructing rail lines and operating them – despite widespread planter and merchant fear of relying upon these bonded, racialized workers. The spread of railways also created a new, modern iron industry in the upper South. The Tredgar Iron Mills in Richmond, Virginia was one of the largest and most technologically advanced iron producers in the US, relying on the labor of slaves leased by the mill owners from their owners.

The mid-nineteenth century also saw the shift in the center of Brazilian slavery from the increasingly uncompetitive sugar plantations in the northeast to the highly profitable coffee plantations in the southeast, the hinterland of Rio de Janeiro. Again, railroad construction, often by US trained engineers, was central to the expansion of the coffee frontier. As the population of Rio grew, and more and more lands were shifted from the production of foodstuffs for domestic consumption to the cultivation of coffee for export, a new market emerged for the fine white flour produced in Virginia. In the early nineteenth century, Virginia planters began to shift from tobacco to wheat, breaking up their plantations and selling off excess slaves to the booming cotton frontier of the US southwest. By the 1840s and 1850s, the growing Brazilian demand for high quality white flour transformed both flour-milling technology and the preservation and storage of white flour in the Richmond area. The Richmond mills continued to rely on water-power but were relatively capital-intensive and utilized the labor of skilled, leased slaves.

The deepening Virginia-Rio nexus also transformed the harvesting of wheat in Virginia. Rood reveals how the expanding wheat farms of the Shenandoah Valley were the incubator for Cyrus McCormick development of his mechanized grain reaper in the 1830s and 1840s. Ripened wheat has an especially short window before it spoils, placing tremendous pressure on wheat producers to harvest and thresh the wheat as quickly as possible. Rood outlines how McCormick relied on the labor of skilled slave black smiths, wheat cradlers, and carpenters in the development of the harvesting machine that would radically transform US small grain agriculture in the mid-nineteenth century.

Rood’s book bring important new insights to the history of the “second slavery” by broadening its scope beyond the US cotton-Cuban sugar-British textile industry node, to include the “Great Caribbean” nexus of Cuban sugar-upper South technical expertise, iron and wheat-Brazilian coffee. His accounts of the transformation of the port of Havana, and of wheat cultivation and processing in Virginia are important additions to our historical knowledge. However, the book suffers from a number of conceptual and historical problems.

First, Rood uses the term “creolization” to discuss the adaptation of technologies to specific production processes in specific geographic-ecological locations. While Rood reestablishes the role of slaves in the adaptation of existing techniques in railroad construction, flour milling and farm implement construction, he sometimes implies that there is something unique about the pragmatic sharing of experimental information on technology among agricultural and industrial producers. This was actually quite typical of technical innovation before the late nineteenth century, when miners, skilled artisans and midwives were often the most important figures in the development and application of scientific knowledge [11]. It was only during the second industrial revolution (steel, chemicals, electrical power-machinery) of the 1890s, that capital took control of scientific research with the proliferation of “research and development” departments in major corporations.

Rood’s use of “race management” is also problematic. As developed by David Roediger and Elizabeth Esch [12], race management referred to the pragmatic way in which the ideological notion of race (the division of humanity into groups with distinct and unchangeable characteristics) is used to classify and distribute workers into various positions in the production of commodities. These categories were highly flexible in light of the ever-changing demands of the market-driven production of commodities. Rood tends to emphasize the racial anxieties experienced by slave owners as technology changed labor-requirements, but has little to say about how they adapted their “racial theories” to meet the new requirements of production. This often goes hand in hand with important errors in analyzing the impact of new techniques on labor requirements. Specifically, Rood reiterates Moreno Fraginals’ claim that the introduction of the vacuum pan raised the level of skill and knowledge required in the refining of sugar, creating a crisis of “racial management.” As Dale Tomich points out [13], it was the earlier technology – the Jamaica Train – that relied heavily on the intelligence and experience of skilled slaves. The vacuum pan, by automating the process of sugar refining, actually deskilled labor in that phase of sugar production.

The greatest problems with Rood’s analysis flow from his uncritical acceptance of the New Historians’ common sense that slavery was a capitalist form of production. There is no question that slave-owners in the US were, for the most part, subject to “market compulsion.” Slave holders throughout the new world had to borrow capital to purchase their basic means of production – land and slaves. In the British colonies and most of the southern United States faced the loss of land and slaves if they failed to pay these debts. Put in another way, they were subject to what John Clegg has called “credit market discipline” [14] – they had to successfully compete in the global market in order to preserve (no less expand) their ownership of land and slaves. Rood never makes the case that Cuban planters faced these constraints, or whether, like French colonial planters, they were exempt from the loss of land and slaves for the failure to pay debts [15] Clearly, those planters subject to “credit market discipline” sought to cut costs in order to remain competitive – they sought to adapt the most up to date innovations in crop varieties, fertilizers, tools and methods.

The master-slave social property relation, however, prevented the planters from continually adapting the latest, labor-saving tools and methods [16]. The obstacle to the continuous adaptation of labor-saving techniques was not any lack of motivation or skill on the part of their bonded laborers. Instead, it was the reality that slave-holders did not purchase the labor-power of the slaves (their ability to work for a set period of time), but the laborers as “means of production in human form”. Put in another way, the slave was a form of fixed capital – a constant element of the production process that could not easily be expelled from production in order to facilitate the relatively continuous introduction of techniques that improved labor productivity. So, if planters introduced cost-cutting techniques that saved labor, they would not be able, like their capitalist counterparts, to simply lay that labor off. They would be stuck with continuing ownership of the laborer(s), having to keep them around until they could find purchasers for their surplus slaves.

It is true that, like other non-capitalist forms of social labor, slavery did bring about episodic improvements in productivity. However, unlike under capitalism, which tends to spur more or less ongoing technical change, innovation under slavery had a “once and for all” character [17]. Thus, the introduction of labor-saving techniques in Cuban sugar production and shipping, or in Virginia wheat cultivation did not set off a process of continuous technical innovation. Like other technical innovations under slavery, they corresponded to the introduction of new products or the movement of production to a new frontier. Once established, these new labor-processes remained relatively unchanged until new products were introduced, new geographic regions were brought under production, or slavery as a form of social labor was abolished. Those industries where there was continuous technical innovation, Virginia’s iron works and Rio’s bakeries, utilized leased slaves. Leased slaves were, like indentured servants, a form of legally coerced wage labor. Those who leased slaves essentially purchased their labor-power for a set period of time, and could easily expel that labor when new, more productive tools and methods became available.

The limitations the master-slave social property relation on continuous technical innovation is most evident in the case of the mechanized reaper. While Rood’s discussion of how McCormick’s initial motivation was to revolutionize Virginia’s wheat harvests is quite insightful, he never poses the question of why McCormick abandoned Virginia for Chicago when he turned to mass producing his mechanical reaper. Rood recognizes that there were serious obstacles to the diffusion and generalized adaptation of the reaper in Virginia’s slave based agriculture. Rood acknowledges that two large wheat planters who adapted the reaper found themselves “burdened by the presence of too many workers” (p. 189). Unlike wage laborers who could easily be laid-off when they were no longer needed, slave owners had to maintain their slaves in order to preserve their value as “means of production in human form”. While the wheat producers of Virginia were a relatively narrow market for the mechanical reaper, the petty-capitalist family farmers of north were an ever expanding market for the reaper and other labor-saving tools and machinery18. Not surprisingly, despite his personal sympathy for slavery, McCormick relocated his factory to be closer to his customers in the dynamic capitalist north.

Referência

ROOD, Daniel B. The reinvention of Atlantic slavery: technology, labor, race and capitalism in the Greater Caribbean. New York: Oxford University Press, 2017

Notas

3. ROCKHMAN, Seth. What makes the history of capitalism newsworthy? Journal of the Early Republic, n. 34, p. 442, Fall 2014. Similar arguments are made by most of the participants, including BECKERT, Sven. Interchange: the history of capitalism. Journal of American History, 101, n. 2, p. 503-36, September 2014.

4. SMITH, Adam An inquiry into the nature and causes of the wealth of nations. New York: Modern Library, 1937 [1776].

5. The concepts of social-property relations and rules of reproduction are derived from the work of BRENNER, Robert. Property and progress: where Adam Smith went wrong. In: WICKHAM, Chris (ed.). Marxist history-writing for the twenty-first century. London: British Academy/Oxford University Press, 2007. p. 49-111. Brenner’s work, of course, is rooted in Marx’s mature work in the three volumes of Capital.

6. JOHNSON, Walter. River of dark dreams: slavery and empire in the cotton kingdom. Cambridge, MA: Harvard University Press, 2013; BAPTIST, Edward. The half has never been told: slavery and the making of American capitalism. New York: Basic Books, 2014; BECKERT, Sven Empire of cotton: a global history. New York: Alfred A. Knopf, 2014. For a lengthy discussion of the strengths and weaknesses of these works, see POST, Charles. Slavery and the New History of Capitalism. Catalyst, 1, n. 1, p. 173-192, Spring 2017.

7. Baptist (2014) is the most articulate exponent of the physical coercion/torture thesis, while Alan J. Olmstead and Paul W. Rhode make a convincing case for the role of technical innovation in raising the productivity of slave labor in cotton harvests, in OLMSTEAD, Alan J.; RHODE, Paul W. Biological innovation and productivity growth in the antebellum cotton south. Journal of Economic History, 68, n. 4, p. 1123–71, 2008.

8. Beckert (2014) summarizes this literature.

9. MINTZ, Sidney. Sweetness and power: the place of sugar in modern history. Harmondsworth: Penguin Books, 1985.

10. FRAGINAL, Manuel Moreno. The sugarmill: the socioeconomic complex of sugar in Cuba, 1760- 1860. New York: Monthly Review Press, 1976.

11. CONNOR, Clifford D. A people’s history of science: miners, midwives, and low mechanicks. New York: Nation Books, 2005.

12. ROEDIGER, David; ESCH, Elizabeth. The production of difference: race and the management of labor in U.S. history. New York: Oxford University Press, 2012.

13. TOMICH, Dale. Slavery in the circuit of sugar: Martinique in the world economy, 1830-1848. Baltimore: The Johns Hopkins University Press, 1990. p. 199-201, 221-225.

14. CLEGG, John J. Credit market discipline and capitalist slavery in antebellum south Carolina. Social Science History 42, n. 2, p. 343-376, 2018. As it will become clear, I do not believe that market dependence made slaveholders capitalists.

15. BLACKBURN, Robin. The making of new world slavery: from the baroque to the modern. London: Verso, 1997. p. 282-83, 444-45.

16. The following is a summary of my argument in POST, Charles. The American road to capitalism: studies in class structure, economic development and political conflict, 1620-1877. Chicago: Haymarket Books, 2012. Chapter 2.

17. BRENNER, Robert P. The origins of capitalist development: a critique of neo-smithian Marxism. New Left Review 104, p. 36-37, July–August 1977.

18. POST, Charles, 2012. p. 94-97.

Charles Post – University of New York – New York – United States of America. Professor, Sociology, borough of Manhattan Community College and the Graduate Center-City University of New York. E-mail: [email protected]


ROOD, Daniel B. The reinvention of Atlantic slavery: technology, labor, race and capitalism in the Greater Caribbean. New York: Oxford University Press, 2017. Resenha de: POST, Charles. Capitalist slavery in the great Caribbean? Almanack, Guarulhos, n.19, p. 321-330, maio/ago., 2018. Acessar publicação original [DR]

Revolucionarios cibernéticos. Tecnología y política en el Chile de Salvador Allende | Eden Medina

El libro que vamos a reseñar a continuación corresponde a la traducción al castellano del primer trabajo de la historiadora Eden Medina, publicado originalmente en Estados Unidos el año 2011 con el título Cybernetic Revolutionaries: Technology and Politics in Allende’s Chile. En este estudio la autora, abocada al estudio de la historia de la ciencia y tecnología desde una perspectiva social, se propone como principal objetivo investigar la relación que se dio entre tecnología y política durante el gobierno de la Unidad Popular, período en donde los profundos cambios que se intentaron llevar a cabo en nuestro país, generaron un clima propicio para la aplicación de novedosas ideas del campo de la cibernética, ciencia interdisciplinaria enfocada en el control y la comunicación, y que permitirían a su vez efectuar tales transformaciones, principalmente en el ámbito de la dirección del sector estatal de la economía chilena, por medio de un sistema tecnológico llamado Cybersyn en inglés, o Synco (Sistema de Información y Control) en nuestro idioma. También en esta obra se busca entender la manera en que se integraron principios e ideas políticas en el diseño técnico, así como las dificultades y limitaciones que se presentaron en este ámbito, y la utilidad que conlleva el estudio de la tecnología para tener una mejor comprensión de una época determinada. Para lograr estos fines, Medina hace uso de una amplia gama de fuentes, desde cartas e informes oficiales hasta entrevistas con los principales actores involucrados, principalmente científicos y técnicos, considerados por la autora como “nuevas voces” que la historiografia no había incorporado hasta ahora, este aspecto a nuestro juicio constituye uno de los méritos de este trabajo; por otro lado el marco teórico que orienta la investigación se basa en la historia de la tecnología, abocada al estudio de las relaciones entre el desarrollo técnico y el marco social y político en el que se desenvuelve. Leia Mais

Um século de conhecimento: arte, filosofia, ciência e tecnologia do século XX – SIMON (FU)

SIMON, S. (Org.). Um século de conhecimento: arte, filosofia, ciência e tecnologia do século XX. Brasília: Editora UnB, 2001. Resenha de: NEDEL, José. Filosofia Unisinos, São Leopoldo, v.13, n.2, 199-208, mai./ago., 2012.

A obra e o século XX

O organizador da obra, Samuel Simon, professor adjunto do Departamento de Filosofia da Universidade de Brasília, faz a apresentação, falando do seu objetivo, de sua abrangência, além de traçar uma síntese dos acontecimentos mais relevantes do século relacionados ao tema.

Objetivo

O principal objetivo da obra, em 31 capítulos, em 1.282 páginas de 24 x 17 cm, é a análise completa, escrita em língua portuguesa, das teorias científicas nas várias áreas do conhecimento do séc. XX e dos desdobramentos daí advindos. A cada autor foi solicitada a análise crítica e prospectiva de uma área de conhecimento, compreendendo: situá-la historicamente, referir seu desenvolvimento na passagem do séc. XIX para o séc. XX, quando fosse o caso, oferecer uma análise propriamente dita, e apresentar as tendências possíveis da respectiva área para o séc. XXI.

Abrangência

O livro resultou sendo uma versão crítica do que tem sido feito no séc. XX, fora alguns domínios do conhecimento, não contemplados, por não ter sido possível contar com os respectivos especialistas (p. 18).

As informações abrangem ciências humanas, da natureza e exatas; saúde e nutricionismo; tecnologias e artes. Estão contempladas as seguintes especialidades, umas mais desenvolvidas que outras: Administração, Agronomia, Antropologia, Arqueologia, Arquitetura, Biologia, Botânica, Ciência cognitiva, Ciência da informação, Cinema, Computação, Comunicação, Cosmologia, Ecologia comportamental, Educação física e esporte, Engenharia aeroespacial, Engenharia de minas, Estatística, Filosofia, Física, Geografia, História, Matemática, Museologia, Música, Nutrição, Paleontologia, Química, Relações internacionais, Sociologia e Teoria literária.

Panorâmica do séc. XX

A descrição geral do séc. XX pode ser composta pelo que consta da Apresentação (p. 7-19) e do Prefácio de Roberto A. Salmeron (p. 21-26). Uma advertência oportuna é a de que o conhecimento teórico e aplicado, que obteve grande desenvolvimento no séc. XX, não se iniciou nele, nem mesmo no séc. XVII, com a revolução científica. Com efeito, as atuais definições da teoria científica são herdeiras de uma tradição de 2,5 mil anos de conhecimento ocidental e oriental. Ao lado do desenvolvimento científico e tecnológico, ocorreu também o das artes e da filosofia.

Desenvolvimento

Em síntese, o conhecimento científico no séc. XX ensejou o aparecimento de novas áreas, aprofundando duas tendências iniciadas no séc. XVII: a crescente especialização do conhecimento e o estabelecimento de interconexões entre áreas até então bastante distintas (p. 7). A história das ideias ensina que a aproximação entre fenômenos antes sem conexão, integrando um mesmo conjunto explicativo, é uma tendência definitiva. Segundo Roberto A. Salmeron, as novas interconexões das várias ciências, ao lado da matematização crescente em vários domínios científicos e da abstração, são, talvez, os traços mais característicos das ciências no séc. XX (p. 14).

Interconexões

Como exemplos, vale notar as interconexões nos seguintes tópicos: O uso da matemática constitui-se a base da física moderna (Galilleu Galilei e Newton). A física, até então, fundamentalmente qualitativa, apropria-se da matemática e a desenvolve, como se vê do cálculo diferencial e integral nos estudos de Newton e Leibniz. A química também tem fortes vínculos com a física e a matemática. A biologia mantém conexões com a química e a matemática, importante desde os trabalhos de Mendel. A sociologia, a antropologia e a área das relações internacionais são tributárias da história que, de maneira recíproca, examina novos fatos à luz dessas ciências e de outros domínios das ciências humanas. A museologia mantém estreitas relações com a arqueologia (p. 8). O uso cada vez mais relevante da computação compete com a matemática em muitos casos. Herdeira disso é a inteligência artificial, conduzindo a novos domínios, como o da vida artificial (p. 15).

Abstração

Para Salmeron, “a característica mais importante do séc. XX […] é a passagem para a abstração, nas ciências e nas artes” (p. 23 e 26). É assim que Louis de Broglie, em 1924, apresentou tese de doutorado na qual mostrou que a cada partícula se pode associar uma onda. Foi a origem da mecânica ondulatória, posteriormente chamada mecânica quântica, que tem fundamentos abstratos, isto é, sem relação com nossa experiência diária. E ela é fundamental para a interpretação da física moderna, em particular dos fenômenos atômicos. Uma teoria abstrata tem inúmeras aplicações, das quais nem nos damos conta: máquina fotográfica digital, ressonância magnética, scanner, transistor, etc. Mais de 30% da indústria moderna de vanguarda são baseados em fenômenos quânticos. Outro exemplo de abstração: a psicanálise que trata da mente humana sem medicamentos, sem intervenção física no corpo (p. 24).

Também na arte houve mudança radical, com a introdução da abstração no modo de pensar. A primeira obra nesse sentido foi o quadro de Picasso Les Mademoiselles d’Avignon, de 1907: cinco mulheres nuas, com desenho simplificado, rostos de três delas representados por máscaras africanas, o fundo com cores vivas sem gradação e contrastes violentos. O quadro, que suscitou escândalo e forte rejeição na época, abriu nova perspectiva para a pintura: a produção de obras que não representam objetos reais. Isso logo foi seguido por outros artistas, como o inglês Thomas Moore, que desenvolveu a abstração na escultura, e Arnhold Schönberg, que o fez na música, com seu dodecafonismo, vindo ele a tornar-se o precursor do que se convencionou chamar música moderna.

Avanços

Os avanços nas ciências e no domínio da natureza ao longo do séc. XX são notáveis. O desenvolvimento tecnológico tem sido extremamente acelerado. O homem conseguiu sobrevoar os oceanos em poucas horas, ir à Lua, desenvolver computadores de altíssima velocidade e pequeno porte, manipular o código genético, aumentar a expectativa de vida, propor conceitos altamente abstratos, como de sinergia (administração), estruturalismo antropológico (antropologia), axialidades (arquitetura), totipotência (botânica), sistemas especialistas (ciência da informação), espiral do silêncio (comunicação), frases protocolares (filosofia), cadeia trófica (paleontologia), etc. Pôde ainda olhar para os confins do universo e obter evidência empírica sobre a existência de um objeto extragaláctico, chegando à cifra de 100 bilhões de galáxias em contínua expansão (p. 8-9).

As artes também conheceram mudanças importantes: o cinema, produto genuíno do séc. XX, tornou-se uma poderosa indústria. Além de oferecer entretenimento, tornouse espaço para a reflexão sobre o homem, sua diversidade cultural, seus valores (p. 9).

Qualidade de vida

O resultado de pesquisas das ciências fundamentais e do aprimoramento da técnica ajudou a minorar o sofrimento de milhões de pessoas. Desde o início do séc. XX, o aumento da oferta de alimentos foi maior que o crescimento da população. Houve enorme progresso social: o homem vivia melhor no fim do que no começo do século, apesar das injustiças e desigualdades existentes em muitos lugares. Trabalha com muito mais conforto e produz muito mais, goza de saúde melhor, vive 30 anos mais e tem mais lazer do que no começo do século (p. 22).

Pela metade do século, iniciando a descoberta dos antibióticos, a medicina deu um salto: muitas doenças passaram a ser curadas, e a procura de medicamentos para tratar ou prevenir doenças tornou-se rotina. Com os avanços da genética e a descoberta da biologia molecular, a biologia se transformou: passamos a ter nova visão da herança da vida e dos fenômenos vitais. Inúmeras aplicações da física tornaram-se inseparáveis de nossa vida cotidiana, tais como telégrafo, telefone, rádio, televisão, computador, novos materiais, aparelhos domésticos e de aplicação na medicina, no transporte, etc. (p. 22).

Limitações

Contudo, são de notar também limitações do conhecimento científico. Muitas questões não estão resolvidas até hoje. Há implicações éticas da ciência aplicada, v. g., da engenharia genética. O conhecimento produzido e acumulado ao longo de milênios tem pouca influência sobre os governantes no tocante à sua adequada utilização em prol de uma vida mais digna (como as questões ecológicas). Esse conhecimento também não tem conseguido reverter o uso indevido, muitas vezes com a ajuda de cientistas, de alguns de seus resultados (p. 10-11).

Algumas observações pontuais

Os autores deste livro monumental, no âmbito da respectiva especialidade, procuram dar conta do que aconteceu no séc. XX, tão rico em desenvolvimento e novidades científicas e tecnológicas. Uma súmula de cada um dos capítulos não caberia nesta simples nota bibliográfica. Por isso apenas alguns tópicos são selecionados e trazidos à consideração dos leitores, não mais do que para despertar o interesse pela leitura exaustiva da obra.

Roque de Barros Laraia (“Da ciência biológica à social: a trajetória da antropologia no século XX”, p.95-117) chama a atenção para o postulado da unidade biológica da espécie humana, já afirmada por Confúcio, 400 anos antes de Cristo, nestes termos: “A natureza dos homens é a mesma; são os seus hábitos que os mantêm separados” (p. 103). Segundo Laraia, aliás, “a antropologia reafirmou o princípio da igualdade da mente humana” (p. 116). A reafirmação dessa verdade reconhecida pela antropologia científica abala, com toda a pertinência, o próprio fundamento de concepções ou teses a favor da desigualdade qualitativa entre raças humanas, que ao longo da história têm ensejado discriminações e exclusões, hoje universalmente condenadas, mesmo que na prática por vezes apenas em vias de superação.

Waldenor Barbosa da Cruz (“Herança e evolução: aventuras da biologia no século XX”, p.195-288). Merece destaque esta observação do autor: “Nenhuma tecnologia científica tem consequências mais profundas sobre o homem do que a derivada da biologia: a biotecnologia. Isto porque afeta não somente nosso estilo de vida, mas também nossos valores éticos e morais e até mesmo põe em questão a evolução de nossa espécie. Por essa razão, os avanços da biologia, particularmente da biotecnologia, são tão amplamente discutidos em todos os meios de comunicação social […]” (p. 279).

O autor pondera que, nesse contexto, surge a bioética. A biologia molecular possibilitou o mapeamento físico do genoma humano e a criação de técnicas para sua manipulação. Isso possibilita ações com objetivos médicos (prevenção, diagnóstico, tratamento de doenças), práticas de exclusão social de indivíduos com genes não desejáveis e construção de indivíduos perfeitos (em suma, processos de cura e eugenia). A mesma tecnologia aplicada a genomas vegetais leva aos alimentos transgênicos, que também envolvem discussões éticas. O patenteamento de genes humanos é inaceitável. Aliás, a UNESCO já o deixou claro na Declaração universal sobre o genoma humano e direitos humanos, 1997 (p. 281). E o autor conclui: “Não é preciso ter bola de cristal para prever que a bioética será cada vez mais importante nas próximas décadas” (p. 282).

Bem apropriadas são as ponderações do autor. É que as questões de bioética são por via de regra polêmicas. Volta e meia retornam à pauta das discussões em âmbito nacional, como já tem acontecido com o aborto, inclusive de feto anencefálico, o uso de embriões humanos na pesquisa, alimentos transgênicos e outras questões que envolvem a vida e a dignidade humana. Nesses casos, a pura ciência biológica, não tendo o alcance necessário para a solução, deve mesmo ser socorrida pela ética em sua vertente aplicada, no caso a bioética.

Aluizio Arcela (“Computação: uma ciência exata com aspirações humanas e sociais”, p.503-557), em meio à explicitação de sua “ciência exata” da computação, faz um juízo crítico da psicanálise, nestes termos: “A psicanálise […] mostra-se vítima de seus próprios ensinamentos ao demonstrar dificuldades de sair da sua infância científica e, assim, ainda não traz uma luz suficiente, algo que explique formalmente, como convém à computação, o que são os complexos, os medos, os desejos e tudo o mais que se manifesta nesse domínio chamado inconsciente, se possível na mesma medida que a lógica o faz para o raciocínio” (p. 554).

Em verdade, exigir da análise da mente humana o rigor da lógica ou da computação, no mínimo, não é devido nem razoável. É que a psyché é misteriosa, apenas acessível de forma indireta, por introspecção, e nunca de modo cabal. Aliás, cada saber tem o rigor e a exatidão que seu objeto permite ou requer, como Aristóteles já ensinou in illo tempore. Se o teorema da incompletude de Kurt Gödel, segundo o qual todos os sistemas matemáticos suficientemente fortes são incompletos, porque neles há teoremas que não podem ser demonstrados nem negados (proposições indecidíveis), tem aplicação na própria computação na versão segundo a qual “nem todos os enunciados verdadeiros da aritmética podem ser demonstrados por computador” (p. 515), não deve causar espécie que na análise dos complexos, medos e desejos da alma humana não haja clareza insofismável como a que é possível na lógica e na computação. Há outros modelos de ciência, particularmente na área das ciências humanas.

Luiz Martins (“Teorias da comunicação no século XX”, p.559-604) faz judiciosas observações acerca do mundo atual e da qualidade da comunicação despejada sobre todos diariamente. Segundo ele, a humanidade foi vitoriosa no campo tecnológico e do ponto de vista das possibilidades de uma interconexão global. Porém, a sociedade moderna está marcada por exclusões e alargamento dos abismos sociais. O mundo sistêmico venceu o mundo da vida, dito em categorias habermasianas (p. 564-565). Há livre trânsito de capital financeiro e mercadorias, mas barreiras à circulação de pessoas, sobretudo em busca de trabalho e asilo. O mundo globalizado se caracteriza por exclusões: fechamento de fronteiras e apartheids sociais (p. 588). “Tal como ironicamente aconteceu no período das circunavegações, novamente o mundo se completa enquanto esfera, mas fragmenta-se em matéria de humanismo. A ‘aldeia global’ totaliza-se para explodir em estilhaços, sucumbindo às categorias dominantes do poder e do dinheiro, diabolicamente fragmentadoras” (p. 589). Pelo visto, a influência do discurso de Habermas sobre o autor é palpável, aliás, expressamente admitido.

O autor pondera que, em relação aos MCM, não raro vence o mau gosto, o grotesco. Na radiodifusão educativa há muito input e pouco output. O papel dos MCM, especialmente da TV, tem estado mais para a deseducação das massas do que para a elevação do nível educacional e cultural das populações, a julgar de obras recentes publicadas pela UNESCO. As crianças são mais vítimas do que beneficiárias dos meios de comunicação: os conteúdos educativos perdem para as programações repletas de violência e degradação dos valores morais e humanos. Os meninos são fascinados por heróis agressivos, como o Exterminador do futuro (p. 573-574).

Obviamente, o alerta do autor deve ser levado em conta. A qualidade das apresentações artísticas e de diversão é ruim, quando não péssima, na maioria dos canais da TV brasileira. O exemplo atual mais chocante disso é o programa Big Brother Brasil que anualmente é encenado e continua no ar, apesar das muitas críticas, por razões de faturamento da empresa de comunicação que o promove, desprezados os bons costumes, os valores educativos e a qualidade artística do espetáculo digno de um zoológico humano.

Carlos Eduardo Guimarães Pinheiro (“A abordagem evolutiva no estudo do comportamento animal e humano”, p.631-659) defende em sua abordagem evolutiva que não há dicotomia verdadeira entre o genético e o cultural; que a cultura também é vista como manifestação genética dos animais, evoluída dentro das populações e moldada por seleção natural. Segundo ele, somos seres culturais porque fomos moldados pela seleção natural para sermos assim. Por sinal, atualmente se acredita que há genes até mesmo para a religiosidade. O principal argumento em favor dessa ideia é que, apesar da enorme diversidade étnica e cultural entre os homens, até hoje não se descobriu povo ou civilização totalmente ateu sobre o nosso planeta (p. 651). Assim, “para desvendarmos as virtudes e maldades da natureza humana, precisaremos conhecer um pouco mais sobre os genes” (p. 655).

Com certeza, uma antropologia de feição mais clássica não teria dificuldade em relativizar esse entendimento biologista do autor. O ser humano é um composto psicofísico que ultrapassa seu patrimônio genético. Nessa condição, realiza atos orgânicos em que o corpo (no caso, a parte biológica) e a psique são concausas; e outros atos, os da inteligência e da vontade, em que o corpo entra apenas como condição, não como causa. Nesse nível situa-se o mundo da cultura criado pelo ser humano ao longo de sua rica aventura sobre o planeta. Na cultura, nela incluída a religião, os genes intervêm, não como causas (que produzem o resultado), ou como determinantes, mas como condições (necessárias para que a causa – a alma, a mente, o espírito – possa produzir o resultado). Entre genético e cultural há, sim, uma distinção radical. Mas distinção não quer dizer separação, pois ambas as partes funcionam sinergicamente no ser humano hígido. A valer a tese do autor, de que a cultura, inclusive a religiosidade, é genética, caberia indagar: por que dela não ocorre nenhum indício entre os chimpanzés, cujo patrimônio genético, segundo pesquisas recentes, é idêntico ao dos humanos em noventa e nove por cento? Não chegaram lá ainda? Ou porque, encerrados na mera perspectiva biológica, não têm acesso ao mundo simbólico? Essa, porém, não é uma questão científica, de antropologia física, mas de antropologia filosófica. A luz da biologia é insuficiente, de curto alcance, para resolvê-la.

Aldo Antônio de Azevedo e Alexandre Luiz Gonçalves de Rezende (“As dimensões humanas da educação física e do esporte na cultura”, p.661-710) fazem um grave alerta sobre Educação Física nas escolas brasileiras. Segundo eles, com as mudanças na concepção educacional, a ginástica foi perdendo espaço no contexto escolar para o esporte, passando a consolidar-se nas academias, ao lado da musculação, como prática orientada para a modelagem estética do corpo. No Brasil, a esportivização da Educação Física resultou na perda de sua identidade pedagógica e no questionamento de seu papel dentro da escola. O professor passou a ser técnico esportivo interessado em treinar seleções, relegados a segundo plano os alunos apontados como desprovidos de aptidões naturais para o esporte (p. 700).

Se a denúncia é verdadeira, deve ser levada em conta pelos educadores e instituições de ensino, a fim de que não se perca uma prática indispensável à educação integral, consagrada ao longo da história da educação no Ocidente, e não se induza a discriminação dos educandos havidos como menos prendados para o esporte.

Nelson Gonçalves Gomes (“Os progressos da filosofia no século XX”, p.795-871) escreve um valioso ensaio de síntese das reflexões filosóficas no séc. XX. Passa pelas principais correntes, como o idealismo, o positivismo, a fenomenologia, a filosofia analítica, até a pós-analítica para a qual as lógicas intensionais abriram horizontes (p. 867). Observa que na filosofia não há progresso consensual (p. 861), mas progressos controversiais, isto é, formação de correntes, em processo contínuo, com diferentes posições diante dos grandes problemas. As concepções exercem influência umas sobre as outras e evoluem, por exemplo, o neotomismo analítico (p. 861-862).

Da filosofia analítica o autor aponta os resultados mais interessantes: o papel privilegiado conferido à linguagem, como instrumento de pensamento; o emprego de métodos formais no tratamento das questões filosóficas; o uso da lógica como recurso auxiliar (p. 864). Afirma: “A filosofia analítica, tal como existiu na primeira metade do século XX, esgotou-se. ‘Filosofia analítica’ tornou-se uma espécie de guarda-chuva que abriga toda uma família de filosofias, que têm em comum o cuidado no uso da linguagem e a exigência do emprego de argumentos” (p. 867). Informa que, a partir daí, alguns falam em “filosofia pós-analítica”, que retoma grande parte da tradição, mas não de forma conservadora, uma vez que discute grande variedade de problemas novos. O retorno dos temas clássicos se faz muitas vezes com emprego de linguagens sofisticadas e argumentação rigorosa, frequentemente formulada com o auxílio de lógicas intensionais. Esclarece que essas lógicas, desenvolvidas na segunda metade do séc. XX, são sistemas nos quais se trabalha com frases regidas por expressões como necessariamente, possivelmente, obrigatoriamente, surgindo assim a lógica modal, a deôntica, a epistêmica e outras, para as quais são construídos sistemas peculiares de semântica, as semânticas dos mundos possíveis (p. 867).

Pelo visto, o autor traz a análise até os dias atuais e transita por tudo com objetividade e desenvoltura. No mais, oferece preciosas dicas para extensão e aprofundamento dos temas por parte dos interessados.

José David M. Vianna (“A física e o século XX”, p.873- 916) apresenta um longo estudo sobre os avanços da física no último século e faz uma observação sobre cuja pertinência a história futura da ciência dirá, a saber.

No início do séc. XX, pelo menos o primeiro quarto de século, a física foi marcada por desdobramentos de resultados e propostas da segunda metade do séc. XIX: a sintetização das leis do eletromagnetismo (Clerk Maxwell); a descoberta dos raios catódicos (Johann W. Hittorf e William Crookes); do efeito fotoelétrico (Hertz e Philipp von Lenard); dos raios X (Wilhelm K. von Roentgen); da radioatividade (Henri Becquerel); a confirmação da existência de ondas eletromagnéticas (Heinrich Rudolf Hertz); o desenvolvimento da teoria clássica do elétron (Hendrick A. Lorentz), etc. (p. 873-874). Isso leva a pensar sobre quanto das ideias surgidas nos últimos 25 anos do séc. XX poderão influenciar as descobertas do séc. XXI. Nessa situação encontram-se estes tópicos: a informação quântica, as cordas e supercordas (strings e superstrings), os materiais nanoestruturados, o confinamento e os novos materiais, o caos, os quarks, os campos de calibre (gauge), a unificação da interação forte com a fraca e a eletromagnética, e a superunificação das quatro interações básicas, etc. Tudo pode entrar como itens de uma pauta de projetos cujo desenrolar continuará a fazer da física uma ciência de interesse cada vez maior (p. 912). E ela tem de assinalar novos progressos, porque desafios múltiplos lhe estão postos. Um deles é não menos do que este, como afirma o autor: “Um dos desafios para este século que se inicia é encontrar um modelo para a estrutura fundamental da matéria” (p. 898).

Haverá de encontrá-lo? Se acontecer, com certeza, não será pouco.

Ignez Costa Barbosa Ferreira (“A visão geográfica do espaço do homem”, p.817-944) traça um estudo preciso do desenvolvimento da geografia, das origens até as perspectivas atuais. Enquadra-se no novo paradigma de base ecológica, surgido em decorrência da pressão dos problemas ambientais, preocupado com a atuação antrópica sobre a natureza, em que o próprio homem seja visto como elemento do ecossistema (p. 935). A autora pensa que “a preservação do hábitat do homem na superfície da Terra é a grande questão da sociedade” (p. 918). Por isso, “desenvolvimento e preservação do ambiente torna-se uma das grandes questões atuais e um dos maiores desafios para a produção do espaço geográfico pela sociedade” (p. 940). Sobre o papel da geografia entende que sua principal contribuição está em “apontar saídas, a partir do território, no sentido de se construir um espaço socialmente mais justo e ambientalmente sustentável” (p. 941). Pelo visto, a postura da autora é coerente com o paradigma da sustentabilidade do nosso planeta, hoje elemento precípuo de agendas internacionais.

Estevão de Rezende Martins (“A renovação contemporânea da historiografia”, p.945-985) conclui seu estudo pelo caráter científico de sua disciplina, nestes termos: “A história do século XX tornou-se, indiscutivelmente, ciência histórica. Seus procedimentos metódicos, suas práticas de pesquisa e seus resultados satisfazem aos critérios da confiabilidade, verossimilhança e controlabilidade. Seu produto – a historiografia – submete-se ao crivo intersubjetivo da comunidade profissional” (p. 979).

É de notar, porém, que a submissão ao crivo intersubjetivo não é marca exclusiva da ciência, mas de todo produto cultural. A rigor, não representa critério de cientificidade, nem que conduza ao consenso, pois nem este não é indicativo infalível de verdade. Com efeito, o consenso pode estar alicerçado em falsas evidências capazes de ensejar juízos e afirmações equivocadas. Disso a história universal registra exemplos abundantes.

Conrado Silva (“O século mais instigante de toda a história da música”, p.1049-1067) faz uma observação que suscita preocupação, nestes termos: “É um fato singular do século: pela primeira vez em toda a história da música, não existe um cânone que sirva de base para definir as características do estilo. O próprio conceito de cânone hoje já não tem mais função. A divergência de critérios é o que importa” (p. 1052). Nesse contexto, compreende-se quiçá melhor o próprio Schoenberg com sua música atonal (sistema dodecafônico).

O autor continua sua observação, quase uma lamentação: “Ainda na primeira geração pós-internet, a realidade mostra uma nivelação por baixo da criação musical. A difusão de programas de criação e de sequenciação de som permitiu a entrada no meio musical de uma quantidade enorme de aprendizes de feiticeiros interessados em mostrar suas experiências, em geral objetos sonoros banais, de pouco interesse musical, resultado de pouca reflexão nos princípios básicos de confecção da estrutura musical” (p. 1064).

Essa situação, profundamente lamentável, não representa sequer novidade para um consumidor leigo de música, porque a indigência cultural, literária e musical muitas vezes salta aos olhos de qualquer pessoa minimamente informada. Infelizmente, esse experimentalismo permeado de pobreza, banalidade e mau gosto denunciado pelo autor não é exclusivo da música, mas atinge também outras áreas, como a das artes plásticas e da literatura, especialmente na poesia. Qualquer garatuja ou instalação por mais abstrusa que seja vai para bienal… Uma simples prosinha empilhada, em geral hermética ou sem sentido, sai premiada em concurso de poemas. A exemplo do abandono dos princípios da estrutura musical, também foram descartadas para o cadoz das antiqualhas as regras clássicas da composição poética. Cada um agora faz a sua regra, o que transforma a suposta arte em pura facilidade, impulso emocional, sem racionalidade. Entretanto, a verdadeira arte, como toda virtude, é da ordem do difícil, segundo a lição indescartável de autores como Platão, Aristóteles, T. de Aquino e outros. Salústio a recolheu dos gregos e a transmitiu a César: Ad virtutem una ardua via est (Epistolae ad Caesarem 1, 7) – O caminho da virtude é um só, e este é árduo. É urgente um retorno aos clássicos.

Marcus Faro de Castro (“De Westphalia a Seattle: A teoria das relações internacionais em transição”, p.1153-1222) examina com amplitude o complexo das relações internacionais em sua gênese e transformação. Passa pelo realismo de Edward Carr e Hans Morgenthau, o neorrealismo de Kenneth Waltz, a teoria da interdependência de Robert Keohane e Joseph Nye, e chega ao construtivismo dos tempos mais recentes, perspectiva constituída de apropriação e adaptação de contribuições oriundas sobretudo da teoria social europeia, que surgiu em meados de 1980 e teve seu florescimento nos anos 1990. Nessa perspectiva, os fatos do mundo, inclusive a política, o uso do poder, a violência exercida pelo Estado, são socialmente construídos, em parte com base em elementos subjetivos (significados linguísticos, valores, crenças religiosas, aspirações, normas morais, preconceitos, valores culturais, sentimentos), que formam estruturas motivacionais da ação. Esses elementos ideacionais podem ser criticados ou expostos à interpretação e possível reelaboração por meio de práticas sociais participativas (p. 1205-1206).

O autor visualiza, para a Teoria das Relações Internacionais, como perspectiva profícua no futuro previsível, tanto como atitude do trabalho intelectual quanto como prática política, a abertura ao pluralismo de valores (p. 1211), o que será consentâneo com a preservação da liberdade. Obviamente, essa perspectiva é coerente com a tendência majoritária hoje de progressivo apreço dos direitos humanos pelos povos e a sua efetiva aplicação na prática das nações.

Vilma Figueiredo (“Do fato social à multiplicidade social”, p.1223-1253) faz observações que ressumam a humildade que deveria ser o apanágio do todo cientista. Lembra esta palavra de Max Weber: “Nenhuma ciência […] será capaz de, definitivamente, ensinar aos homens a melhor maneira de viverem, ou às sociedades, de se organizarem, e tampouco de dizer à humanidade qual será o seu futuro: sempre existirão as esferas ou dimensões da sociedade nas quais a ação social não-racional prevalece e a ciência pode expressar-se, apenas, em termos de probabilidades” (p. 1230). Em outras palavras, a ciência é limitada, quer na extensão, quer no aprofundamento das questões de seu objeto. “O século ensinou que a teoria sociológica não deve pretender ser abrangente no sentido de não deixar lugar para o desconhecido, para o indefinido. Isso não é desejável nem necessário. A ciência apenas é possível porque se pode afirmar algo sem que se saiba tudo. A ciência é inexaurível” (p. 1245).

Ninguém jamais saberá tudo, nenhuma ciência humana exaurirá o cognoscível. Por isso, a correta organização das sociedades há de ser sempre criação humana, em condições históricas concretas, observadas algumas verdades incontestes que a história, inclusive a recente, nos ensinou: que é falaciosa a busca exclusiva da igualdade social em detrimento da liberdade. A prova dessa falácia, já a deu o rotundo fracasso da marcante experiência histórica que mudou a face do mundo contemporâneo, ou seja, a implantação do comunismo na Rússia e a criação da União Soviética (p. 1232).

Em suma, a experiência soviética permitiu confirmar hipóteses derivadas de Durkheim e Weber sobre a natureza do vínculo social e da dominação política: que o vigor das sociedades se origina da relação equilibrada entre igualdade, disciplina e regulação de um lado, e liberdade, inovação e criação de outro. “O excesso de disciplina leva à rotinização e ao marasmo; a liberdade sem controle opõe-se à formação do consenso e dá origem à anomia social” (p. 1232). Em verdade, a eterna questão política é encontrar o equilíbrio entre liberdade e disciplina: o grau ótimo de liberdade que não só não prejudique, mas ainda assegure a estabilidade e a segurança desejadas no convívio social.

Henryk Siewierski (“Correntes e perspectivas da teoria da literatura no século XX”, p.1255-1281), na questão da intertextualidade, termo que Julia Kristeva propôs em substituição à intersubjetividade, rejeita a crítica desconstrucionista, ou pós-estruturalista, dos que negam a autonomia do texto. Esses autores questionam o caráter objetivo da estrutura de uma obra literária (p. 1272), dizendo que qualquer texto é inconcebível isolado de outros textos, por ser privado de autonomia ou significado fixo (independência da intenção do autor e do contexto histórico), de objetividade (estabilidade estrutural e independência da interpretação) e unidade (unicidade e integralidade) (p. 1269). Para os desconstrucionistas, “não há texto em si”, sendo impossível seu “fechamento” (p. 1270).

Para o autor, esse radicalismo leva ao ceticismo extremo segundo o qual “toda leitura é desleitura” (misreading), porque todo texto dependeria de interpretação, e essa seria imprevisível (p. 1270). Aponta, ao final, para a moderação, nos termos do aviso de Gadamer, no posfácio de Wahrheit und Methode: “Seria mau hermeneuta aquele que imaginasse que a ele pertence a última palavra”. Com certeza, a moderação, tão exaltada por Aristóteles e a tradição ocidental, vale como caminho seguro, mormente em matérias distantes da evidência cartesiana das ideias claras e distintas.

Considerações finais

Os destaques feitos até aqui não pretendem mais do que despertar a curiosidade para toda a obra, inclusive para os capítulos não mencionados, por motivo de espaço. Trata-se de uma obra que merece não apenas ser lida, como também estudada, pelo alto valor de seu conteúdo quase enciclopédico. As lacunas mencionadas pelo organizador com certeza serão preenchidas em alguma reedição. Talvez até, na questão das relações internacionais, ou na da filosofia, uma referência à importante contribuição recente de John Rawls, Alasdair MacIntyre, Charles Taylor e outros. Como o trabalho está, porém, já comprova à saciedade, relativamente à oportunidade de sua publicação, o que a coautora Vilma Figueiredo afirma da ciência, em si inexaurível, em relação à qual “se pode afirmar algo sem que se saiba tudo” (p. 1245). O dito já é mais do que suficiente para atrair não só o leitor comum, a exemplo deste da nota bibliográfica, mas também o estudioso de cada área, inclusive o especialista.

José Nedel – Universidade do Vale do Rio dos Sinos. São Leopoldo, RS, Brasil. E-mail: [email protected]

Acessar publicação original

[DR]

 

O Mundo em 2050: como a Demografia, a Demanda de Recursos Naturais, a Globalização, a Mudança Climática e a Tecnologia Moldarão o Futuro | Laurence Smith

Editado recentemente pela Editora Elsevier, o livro do geocientista americano, especialista em impactos geofísicos da mudança climática e consultor do governo dos Estados Unidos Laurence C. Smith, com o título em português O Mundo em 2050. O Futuro de Nossa Civilização, a partir do próprio título deixa o leitor curioso a respeito do seu conteúdo.

Smith não se concentra somente em um setor, como o crescimento populacional, ou mesmo, o futuro das fontes energéticas. Ele procura mostrar, com a ajuda da Geografia e da História, como as condições atuais de tratamento da Natureza, deixarão marcas duradouras no futuro.

Para isso, se utiliza de modelos computacionais altamente sofisticados, pois, como se sabe, essas forças – demografia, demanda de recursos, globalização e mudança climática – estão intimamente interligadas, tendo o poder de moldar o nosso futuro. Daí, com a ajuda desses modelos, o cientista acredita ter condições de analisar tendências, convergências e possíveis paralelos entre elas. Pretende, através de uma base científica, formalizar uma ideia do que poderá ocorrer nos próximos 40 anos, a partir das tendências atuais, uma vez que estas poderão ser previstas e extrapoladas para o futuro.

Nas suas pesquisas, Smith chegou à conclusão que o aquecimento ampliado do clima começou no Norte, daí, faz as seguintes perguntas: qual o significado disso para os povos e ecossistemas da região? Quais as suas tendências políticas e demográficas? O que isso representaria no que diz respeito aos vastos depósitos de combustíveis fósseis que se acredita haver abaixo do leito dos seus oceanos? De que maneira se transformaria, por pressões ainda maiores que vem se acumulando ao redor do mundo? Que aconteceria se, como sugerem muitos modelos climáticos, nosso planeta for assolado por ondas de calor insuportáveis, secas e a consequente queda da produção agrícola? Será que haveria a possibilidade de surgir novas sociedades humanas em lugares que, hoje, nos parecem inóspitos?

São essas as questões que o autor tenta responder ao longo da discussão que, como vemos pelo próprio título da obra, trata do futuro do planeta. No diagnóstico desse futuro, o autor analisa, por exemplo, os gases do efeito estufa e a oferta de recursos naturais. O autor tem, ainda, a preocupação de projetar quarenta anos no futuro, estudando de perto o que se passa hoje na natureza e o porquê dos fatos.

Para discutir o futuro é preciso entender o passado. Assim, em ordem histórica de importância, o autor analisa as quatro forças globais que há séculos vem, em processo, contribuindo para moldar o nosso mundo em 2050: a demografia, a demanda por recursos naturais, a globalização e a mudança climática.

Ao tratar da primeira força, a demografia, o autor traz uma série de números a respeito do crescimento populacional, desde o advento da agricultura, quando “havia talvez um milhão de pessoas no mundo”, até os dias de hoje, quando a população mundial chegou aos “sete bilhões em 2011” (p.9). A crescente demanda por recursos naturais e serviços, resultante de uma população mundial que não para de crescer também é motivo de sua análise. O fenômeno da globalização é visto pelo autor, como um conjunto de processos econômicos, sociais e tecnológicos, que está tornando o mundo mais interconectado e interdependente – aí ele percebe implícita uma política cultural e ideológica.

No que tange às mudanças climáticas, faz um histórico do desenvolvimento do efeito estufa que, já em 1820, teve sua existência deduzida pelo matemático francês Joseph Fourier (que deduziu que a terra estava muito mais quente que costumava ser, dada a sua distância em relação ao sol). Smith não deixa de citar, neste sentido, o papel da tecnologia, considerada por ele a quinta força, que pode servir de capacitador ou freio para as quatro forças globais, na medida em que tem condições de corrigir problemas.

A partir desta introdução o autor passa a fornecer ao leitor dados e tendências essenciais que ajudam a entender a dinâmica do desenvolvimento que engendrará a imagem do ano 2050. Para isso, recorre ao debate que os cientistas vêm fazendo em nível mundial e que diz respeito à substituição de combustíveis fósseis por tipos de energias renováveis, assim como a possibilidade de reciclagem e poupança dos citados materiais. Abalizando os prós e contras da utilização de diferentes tipos de energia e matérias primas, Smith não descarta o grande potencial de conflito que poderá se desenvolver na exploração de recursos naturais, como água, petróleo e gás natural.

Nesse sentido, de onde viriam essas novas fontes de energia, em 2050? Através do hidrogênio como nos filmes de ficção científica? Dos biocombustíveis (etanol, a partir da cana ou da beterraba)? Da energia nuclear com seus riscos a saúde pública? Da energia hidrelétrica que gera atualmente 16% da eletricidade do mundo? Da energia eólica ou solar, setores em crescimento, sobretudo em países de altitudes médias e altas?

O autor é conclusivo no que diz respeito ao aumento de fenômenos climáticos extremos ou a elevação do nível do mar, mostrando como a mudança climática conduz a tempestades devastadoras.

Nesta perspectiva, cita a catástrofe que se abateu em 2008 sobre o estado de Iowa, que se destacou como a segunda maior em 136 anos. Em maio do mesmo ano, um tornado de categoria f5 atingiu o estado, além de outros 48 menores, todos eles com vítimas fatais. Enquanto isso, em 4 de junho do mesmo ano, o governado Arnold Schwarzneger anunciou uma grande seca no estado da Califórnia, grande produtor de produtos agrícolas dos EUA. Assim, de repente, a Califórnia se viu em meio a uma crise econômica histórica que atingiu o setor da habitação e os mercados de crédito globais, na eminência de perder mais de 80 mil empregos e U$$ 3 bilhões em receitas agrícolas.

Secas excepcionais castigaram países no mundo inteiro, ameaçando a agricultura e provocando incêndios (p.70), como os que alcançaram a Austrália, matando 200 pessoas. Em Chattisgarh, na Índia, 1.500 agricultores cometeram suicídio porque, com a seca, tiveram suas terras confiscadas pelo não pagamento das dívidas.

Para Smith, o problema central no futuro é que uma parcela crescente da população mundial viverá em locais onde a água, sem dúvida, será escassa. Na página 75, o autor comenta que,

enquanto 8 em cada 10 pessoas tem acesso a algum tipo de água melhorada, essa media global mascara intensas discrepâncias geográficas. Alguns países como Canadá, Japão e Estônia fornecem água potável a todos os seus cidadãos. Outros, especialmente na África, oferecem água potável a menos da metade da sua população. (SMITH, 2011, p. 75)

Outro fato aterrorizante, discutido pelo autor, é que já se pode constatar que cada vez mais multinacionais estão privatizando e consolidando os sistemas de abastecimento de água. Cita três exemplos destas: Suez Veolia Enviromental Services (ex- Vivendi) e Thames Water, que, expandindo-se, transformaram-se em empresas de comercialização de água em todo o mundo em desenvolvimento. Em 2009 a Siemens pagou um U$$ bilhão pela U.S Filter, maior fornecedor de produtos e serviços para tratamento da água da América do Norte. A General Eletric e a Dow Chemical também estão entrando no ramo da água (p.77) ao lado da Nalco, ITT e Danaher Corporation.

Contrariando o senso comum, o crescimento populacional e a industrialização representam, para o suprimento de água global, um desafio ainda maior que a mudança climática. O fornecimento de uma quantidade adequada de água para essa produção, a expansão dos parques industriais e, paralelamente, a necessidade de manter a água limpa nesse processo, será, para o autor, o grande desafio do século.

Ao considerar as mudanças climáticas o autor se concentra na análise da elevação das temperaturas no Norte, fato que está ocorrendo mesmo no período do inverno e em altíssimas altitudes. Ele afirma que qualquer processo de mudança climática “é errático ao longo do tempo” (p.104). A mudança climática apresenta ainda um segundo fato: a sua geografia nem sempre é global e nem sempre tende ao aquecimento. A mudança climática não é apenas errática no que diz respeito ao tempo, mas também em termos geográficos. Outro fato é que a mudanças climáticas ocorrerão diferentemente no globo, assim como as situações a elas ligadas: quando existe um aumento de temperatura em um local, não significa que em todos os lugares do globo ela sofra o mesmo aumento. Em alguns locais poderá ocorrer um aumento mais acentuado e em outros poderá ocorrer até mesmo um resfriamento.

O segundo cenário considera igualmente uma população mundial estabilizada e uma pronta adoção de novas técnicas de produção de energia, advindas tanto dos combustíveis fósseis como de combustíveis não fósseis. O terceiro cenário pressupõe um mundo heterogêneo, com forte crescimento populacional, um lento desenvolvimento econômico e uma lenta transição para novas tecnologias que produzam energia.

Smith mostra, ainda, de forma clara, que a mudança climática será bem mais pronunciada na região Norte. Em 2007 foi comprovado que 40% da calota polar derreteu, desaparecendo em questão de meses. Os modelos climáticos existentes não haviam previsto um fenômeno como esse, até pelo menos em 2035. Tais modelos não acompanharam a rapidez que o fenômeno se deu de fato. A fauna e a flora também sofreram o impacto dessa mudança de temperatura.

O autor mostra a mudança de comportamento do urso polar cujo lar é o gelo flutuante, onde caça, dorme e se acasala. O urso polar não hiberna no inverno. No verão, quando o gelo se desintegra e diminui, eles são forçados a migrar para a terra, por conseguinte sendo forçados a jejuar até a volta do gelo. Com isso, em 2004, foram confirmadas pelos biólogos três ocorrências em que ursos polares caçaram e comeram uns aos outros. O que significa dizer que a cadeia alimentar como um todo – do microscópico fitoplâncton ao urso polar –, que está intrinsecamente associada à presença do gelo oceânico está sendo prejudicada.

Não se pode esquecer que seres humanos também dependem do gelo, como os esquimós que vivem no litoral do Oceano Ártico, caçando focas, ursos polares, baleias, e outros peixes, onde já se vê uma mudança de hábitos. Milhares de quilômetros de distancia, nem por isso se entregam ao desespero. Toda essa discussão precedente levará o autor ao ponto principal, ou seja, as consequências dessa situação de aquecimento global e esgotamentos das fontes de energia tradicionais para os oito países que estão na zona do ártico: Rússia, EUA, Canadá, Islândia, Noruega, Finlândia, Dinamarca e Suécia, que terão possibilidades de se beneficiar, haja vista as riquezas do subsolo da região e outros valiosos recursos naturais. A partir dessas novas previsões, esses países estão, pelo menos, avaliando a implementação de novos esquemas na região.

Ampliando suas análises a respeito de 2050 o autor calcula que: a) a população mundial terá aumentado neste ano quase 50%, formando aglomerados urbanos próximos as latitudes mais baixas e quentes do planeta; b) estão surgindo países com grande potencial econômico como China, Índia e Brasil; c) grande parte da população viverá nas cidades e estará mais velha e mais rica; d) a água em muitos locais se tornará escassa; e) cidades sofrerão com a elevação do nível do mar; f) a agricultura irrigada praticamente não existirá.

Comprovadamente, o livro de Laurence C. Smith vale a pena ser lido. Escrito de modo fascinante o livro mostra metodologicamente as consequências socioeconômicas que derivam das mega-tendências do desenvolvimento mundial até o ano 2050, se valendo, para tanto, de dados respaldados em estudos econômicos, sociológicos, ecológicos e geológicos. O livro impressiona ainda pela abundancia de dados apresentados de forma clara e inteligente, numa leitura leve que não cansa o leitor (apesar das interligações feitas entre passado, presente e futuro). É leitura obrigatória para aqueles que se preocupam com a história ambiental e o futuro do planeta.

Ana Maria Barros dos Santos – Doutora pela Universidade Friedrich Alexander Erlangen-Nurnberg (Alemanha). Professora do Departamento de História da Universidade Federal de Pernambuco. AMBS/UFPE.


SMITH, Laurence C. O Mundo em 2050: como a Demografia, a Demanda de Recursos Naturais, a Globalização, a Mudança Climática e a Tecnologia Moldarão o Futuro. Trad. Ana Beatriz Rodrigues. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. Resenha de: SANTOS, Ana Maria Barros dos. CLIO – Revista de pesquisa histórica. Recife, v.30, n.1, jan./jun. 2012. Acessar publicação original [DR]

Biopunk: DIY Scientists Hack the Software of Life | Marcus Wohlsen

O movimento punk emergiu na década de 1970, na América do Norte e na Inglaterra, em resposta às mudanças causadas pelas guerras e pelos rearranjos geopolíticos ocorridos na época. Teve como principais adeptos jovens londrinos, de famílias tradicionalmente operárias, ou que viram-se frustrados com as políticas conduzidas no Reino Unido e nos Estados Unidos. Provocou rupturas estéticas e conceituais, buscando autonomia política e social. Cunharam o termo do it yourself (DIY) para propagar a ideia do faça-vocêmesmo.

Em contraponto da estética hippie que, uma década atrás, cultuava valores espitituais, ligação com a natureza e o viver em comunidade. O punk trouxe a estética do improviso, do escuro, do sujo, como representação da sociedade que, para o movimento, desprezava as práticas e os contextos que não se adequavam ao sistema capiltalista.

Quase meio século depois, na década de 2010, o conceito de punk é revisitado. Surge o biopunk: um movimento diverso que busca possibilidades de pesquisa, produção e engajamento em processos muitas vezes restritos aos moldes da comunidade científica contemporânea, fomentados em instituições de ensino e pesquisa tradicionais ou em grandes laboratórios.

Biopunk: DIY Scientists Hack the Software of Life (em tradução livre, BioPunk: Cientistas do faça-você-mesmo raqueando o software da vida) do jornalista científico Marcus Wohlsen, publicado em 2011, traz uma abordagem lúdica da ciência, enquanto relata experiências possíveis, aplicadas em laboratórios estabelecidos em cozinhas ou garagens. O livro reforça que biopunks não precisam de estruturas perfeitas ou honrarias acadêmicas pois estão focados a equacionarem suas pesquisas.

Wohlsen revisita a ciência como atividade secular, e afirma que o DIYbio (a ciência do faça-você-mesmo) não é uma nova ciência, mas sim uma nova forma forma de fazer ciência: na maioria das vezes autodidata, baseada em processos de tentativa-erro, encontra-se sob os pilares da ciência clássica que abrange experimentação, observação e análise de resultados.

A obra faz alusão ao movimento hacker que, em meados de 1980, concebeu descobertas e criações revolucionárias, conectou pessoas e ideias a partir de um modelo descentralizado e compartilhado, proporcionado pela internet. Assim como o movimento biohacking que compartilha informações sobre biotecnologia e desenvolve pesquisas descentralizadas em plataformas que proporcionam a inteligência distribuída, como: redes sociais, redes peer-to-peer e grid computing [1].

O livro traz exemplos de biohackers que estão usando o crowdsourcing [2] no desenvolvimento de medicamentos para a cura do câncer, e reconfigurando bactérias presentes no iogurte para gerar análises de contaminação do leite. Wohlsen enfatiza que a tecnologia de manipulação do DNA está disponível, e já é utilizada por cientistas DIY em suas garagens ou cozinhas, com baixo custo, de forma descentralizada e inovadora.

Notas

1. Modelo que permite alta taxa de processamento dividindo as tarefas entre diversas máquinas.

2. Utiliza a inteligência e os conhecimentos espalhados na internet para desenvolver novas tecnologias.


WOHLSEN, Marcus. Biopunk: DIY Scientists Hack the Software of Life. Inglaterra: Penguin Group, 2011.Resenha de: BEGALLI, Maira. A História da Ciência revisitada: os cientistas do faça você mesmo. Revista Ágora. Vitória, n.15, p.210-212, 2012. Acessar publicação original [IF].

A Marinha Brasileira na era dos encouraçados/ 1895-1910. Tecnologia/ Forças Armadas e política | João Roberto Martins Filho

Até o outono da marinha veleira o Brasil podia ser considerado uma potência naval. O arsenal da Marinha e outros armadores empregavam madeiras e saberes há muito disponíveis para construir e manter grande variedade de navios. O avanço da Revolução Industrial trouxe o vapor e as estruturas metálicas; já a Revolta da Armada, no início da República, destroçou boa parte da Marinha brasileira, de modo que o seu poder naval no final do século XIX tornou-se uma sombra do que fora cinquenta anos antes. O livro do João Roberto Martins Filho investiga os caminhos, motivações e implicações do processo de modernização naval brasileiro, que, em meio à febre tecnológica dos encouraçados, procurou reposicionar a Marinha brasileira entre as potências mundiais. Leia Mais

MAIOR, Paulo M. Souto. Nos caminhos do Ferro: construções e manufaturas no Recife (1830-1915) – SOUTO MAIOR (CA)

 

SOUTO MAIOR, Paulo M. Nos caminhos do Ferro: construções e manufaturas no Recife (1830-1915). Resenha de: PESSIS, Anne-Marie. Clio Arqueológica, Recife, v.25, n.1, 2010.

Anne-Marie Pessis

[MLPDB]

Acessar publicação original

Discursos, tecnologias, educação – BARRETO (ES)

BARRETO, Raquel Goulart. Discursos, tecnologias, educação. Rio de Janeiro: Editora da UERJ, 2009. 186p. Resenha de: SCHAPPER, Ilka. Por entre discursos, tecnologias e educação. Educação & Sociedade, Campinas, v.31 no.110 jan./mar. 2010.

No livro intitulado discursos, tecnologias e educação, Raquel Goulart Barreto, logo na primeira linha da Apresentação, demarca o território em que a obra transita: “é um livro teórico-metodológico”. Este binômio já prepara o leitor para um texto circunscrito na fronteira do trabalho de pesquisa. Seus diálogos, nos dez capítulos, são tecidos a partir de cursos, percursos e discursos inscritos no grupo de pesquisa “Educação e Comunicação”, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Tendo como eixo a educação, a obra trata da análise crítica dos discursos (ACD) sobre as apropriações das tecnologias da informação e da comunicação (TIC).

O discurso pedagógico contemporâneo é o elemento que articula a tríade do título. Fundamentada em Norman Fairclough, Barreto estabelece significativa interface com autores como Mikhail Bakhtin e Eni Orlandi, que possibilitam ampliar o debate dos diferentes aspectos dos recortes selecionados.

Os capítulos estão organizados em três partes, que trazem o movimento entre fundamentação teórica e sua aplicação em “exercícios analíticos”. Na primeira parte, três capítulos traçam o horizonte teórico-metodológico da obra. Em “Para começo de conversa: texto, discurso(s), intertextualidade”, o leitor tem notícia das trilhas percorridas no livro: dimensiona o discurso como conceito teórico-metodológico, nas acepções discutidas por Fairclough. Essa discussão toma corpo no segundo texto, “Análise crítica do discurso (ACD): realismo crítico, performatividade e ideologia”, em que Barreto aborda as relações dialéticas entre elementos semióticos (“discurso”, no sentido mais amplo) e as outras práticas sociais, demarcando, em oposição ao idealismo, o realismo crítico na objetivação da linguagem. No terceiro texto, a autora, trazendo também Felinto e Mattelart, discute a tese de que as TIC têm sido fetichizadas no imaginário tecnológico, no enredo dos discursos nodais da globalização e da “sociedade do conhecimento”.

Na segunda parte do livro, o leitor tem um interessante encontro que é um interregno entre o primeiro e o terceiro momento da obra. No texto “O discurso da inclusão”, Barreto, em coautoria com Leher, discute os sentidos atribuídos ao termo, com base no materialismo histórico-dialético. Em “Cenários enunciativos no Admirável Mundo Novo“, em parceria com Ramos, há uma aproximação entre Bakhtin e Fairclough, a partir do recorte de cenas enunciativas do livro de Huxley.

Na terceira parte da obra, temos os exercícios analíticos em que podemos encontrar interessantes pesquisas que retomam a tríade do título. Em “Não só palavras: dos textos multimidiáticos à ressignificação das práticas escolares”, Barreto e Guimarães discutem a configuração multimidiática dos textos contemporâneos, focalizando, no conjunto das tendências discursivas transnacionais, as linguagens articuladas na produção, circulação e legitimação dos sentidos.

O debate se aprofunda no texto “Formação de professores: entre o discurso da falta e propostas de substituição tecnológica”, em que Barreto analisa a tendência a desqualificar a formação e o trabalho docente, no movimento de produzir alternativas centradas apenas nas TIC. O encaminhamento parte do conceito de recontextualização e assume como parâmetros as ressignificações de ensino e aprendizagem.

Os capítulos seguintes tratam de aplicações do referencial teórico-metodológico. Em “Dualidade escolar: os sentidos das TIC”, Barreto e Magalhães trazem o conceito gramsciano para a discussão dos sentidos atribuídos às TIC nas vozes de coordenadores, professores e alunos de dois contextos escolares caracterizados pelo atendimento a classes sociais desiguais. Em “Discursos de professores do ensino público noturno: entre o cotidiano e o imaginário”, Barreto e Fernandes abordam possibilidades de acesso ao imaginário tecnológico de professores, procurando detectar reflexão-refração do sentido hegemônico atribuído às TIC, nos territórios demarcados pelo título. Em ambos, a ACD é desenvolvida a partir de pontos de entrada que remetem a Fairclough: pressupostos, modalidade e escolhas lexicais.

No último capítulo do livro, a autora traz como título uma pergunta: “Ponto final?”. Barreto destaca que o que cabe no desfecho “deste desmonte das tramas constitutivas da ideologia como hegemonia de sentido, na objetivação das relações entre as TIC e a educação, é a aposta na produção de possibilidades outras” (p. 177). Uma aposta que traz as marcas de outra interrogação: o que fazer com tudo isso? E, na tentativa de responder à questão, mais uma vez, a autora presenteia o leitor com uma importante reflexão: pensar um projeto “que aponte para o redimensionamento da formação de professores a partir de alternativas de formação-trabalho docente que estão sendo forjadas nas universidades e nas escolas” (idem). Nas produções do grupo de pesquisa “Educação e Comunicação”, a autora desenvolve, junto com os demais pesquisadores, estudos que buscam compreender essas tensões e trazer possibilidades outras para o encaminhamento de questões que atravessam a relação entre os discursos presentes na díade tecnologias/educação.

No entremeio das discussões sobre discursos, tecnologias e educação, Barreto traz importantes contribuições para o debate das TIC no cenário educacional. Trata-se de uma obra de densidade teórico-metodológica que instiga a importantes reflexões e, por isso, a pergunta no último capítulo: Ponto final? A dúvida procede, já que, da maneira como a autora dialoga e instiga o leitor a novas construções, não há ponto final na obra, mas uma vírgula, materializada como reticências, uma pausa em um diálogo que continua com você, leitor.

Ilka Schapper – Doutoranda em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem (PUC-SP) e professora adjunta da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). E-mail: [email protected]

Acessar publicação original

Mesolithic Europe – BAILEY; SPIKINS (DP)

BAILEY, Geoff; SPIKINS, Penny (Eds.). Mesolithic Europe. New York: Cambridge University Press, 2008. 27p. Resenha de: BUDJA, Mihael; PETRU, Simona. Documenta Praehistorica, n.36, 2009.

The book is a collection of interpretative essays, local and regional, on the Mesolithic in Europe. The chapters are organised in broadly geographical order and focus on the definition of the Mesolithic, chronology, technology and subsistence, arts and rituals, settlements and social organisations.

The opening chapter is an introduction to a different perception of the Mesolithic, and suggests we shift from narratives of passive Mesolithic societies to a new generation of interpretations. The final chapter, follows a discussion of Mesolithic-Neolithic transition, dominates many contributions. This chapter actualises the ‘Neolithic’ interpretative model of ‘demic diffusion’, suggesting that there is no evidence of interaction between the Mesolithic and Neolithic populations of the Balkans and the Mediterranean.

However, the book suggests that elsewhere different elements of the ‘Neolithic package’ were introduced and adopted selectively and separately. Unfortunately, the book overlooks relevant information such the recent discussions of the origins and diffusions of ‘Mesolithic’ and ‘Neolithic’ Y-chromosomes and mitochondrial DNA haplogroups, and human population trajectories in the context of processes in the Mesolithic-Neolithic transformation. It does not reflect the discussion on the 8600–8000 and 6000– 5200 calBP climate anomalies, which undoubted correlate chronologically with the Mesolithic and the Neolithic and drastically affected global environmental conditions.

‘Mesolithic Europe’ offers an interesting regional synthesis of the Mesolithic in different parts of Europe and is a perfect complement to Barker’s volume ‘The Agricultural Revolution in Prehistory. Why did Foragers become Farmers?’

Mihael Budja and Simona Petru

Acessar publicação original

[IF]

 

Uma associação para a tecnologia brasileira: Abipti 25 anos | Shozo Motoyama, Paulo Queiroz Marques e Maria Anglélica Rodrigues Quemel

Shozo Motoyama, Paulo Queiroz Marques e Maria Angélica Rodrigues Quemel prestam um importante serviço à documentação e historiografia sobre o desenvolvimento da tecnologia no Brasil da segunda metade do século XX ao reunir documentos, depoimentos e informações diversas sobre a formação da Abipti.

A Associação Brasileira de Instituições de Pesquisa Tecnológica (Abipti), criada no início dos anos 1980 com o intuito de representar as instituições de pesquisas em tecnologia, demonstrou ao longo de 25 anos, mesmo em situações de turbulências econômicas, autonomia frente às autoridades governamentais, negociando e mostrando aos mesmos, as reais necessidades de fomento de pesquisa e inovação na área tecnológica. Leia Mais

Calendários de eventos em Geociencias e Tecnologia – GEOCINF/DNPM/MME (RBG)

GEOCINF/DNPM/MME. Calendários de eventos em Geociencias e Tecnologia. Mineral, Brasília, DNPMv.1, n.1, 38p. Resenha de: CARNEIRO, Celso Dal Ré. UM serviço de grande utilidade do GEOCINF: Calendário de eventos. Revista Brasileira de Geociencias, v 18, p. 322, 1988.

Celso Dal Ré Carneiro – São Paulo. SP

Acesso apenas pelo link original

[IF]