A Privataria Tucana | Amary Ribeiro Junior

A Privataria Tucana e a Prova do Crime

O livro do jornalista Amaury Ribeiro Jr., publicado pela Geração Editorial (São Paulo: 2011) condensa nas suas 343 páginas substanciosa documentação, comentada, relacionando o processo de privatização de parcela considerável do patrimônio publico brasileiro, durante o período fernandista (1990/2002). Nele, o autor dá particular ênfase para os oito anos que correspondem aos dois mandatos do presidente Fernando Henrique Cardoso (1994- 2002), quando o assalto aos cofres públicos pelas autoridades e seus acólitos ‘laranjas‘ no jargão político-administrativo brasileiro – teria adquirido a magnitude de uma quase-acumulação originária, pela grandeza dos valores envolvidos. Faz sentido essa percepção ao se ter presente que iniciadas em 1991, as privatizações no Brasil ganharam grande impulso principalmente durante o segundo governo do presidente Fernando Henrique Cardoso. Do total de empresas privatizadas no Brasil, cerca de 80% concentram-se entre 1997 e 1999, com destaque para os setores de telecomunicações e elétrico.

O termo acumulação originária, aplicado ao presente contexto é simbólico e tem função meramente ilustrativa, porquanto a expropriação demo-tucana da propriedade foi feita ao Estado brasileiro e, não, como explicada na Gênese do Capital, por Karl Marx, diretamente ao camponês, enquanto o que estamos cognominando aqui de acumulação deu-se na forma perdulária, através, sobretudo, do entesouramento do fruto da pilhagem em paraísos fiscais. Portanto, não se deu sob a forma de investimentos produtivos visando a expansão dos setores industriais e de serviço da economia brasileira. Nesse sentido, estimativas extremamente conservadoras de agências internacionais indicam a existência de depósitos superiores a US$ 100 bilhões de brasileiros nas assim denominadas ‘ilhas do inconfessável‘.

Chama atenção a copiosa documentação de que se utiliza o autor para dar suporte à sua argumentação, representada por 133 páginas de fac-símiles, o que significa dizer que cerca de 40% do livro comporta parte do valioso acervo documental, constituído basicamente por comprovantes de operações bancárias, procurações, escrituras, requerimentos, estatutos, fichas cadastrais, pareceres da Justiça e da Fazenda, e documentos afins, escriturados em cartório, por ele utilizados como prova do crime.

Nesse sentido é de causar pasmo e repulsa a reação de José Serra, ministro do Planejamento à época das privatizações, o desdenhar do trabalho de investigação jornalística de Amaury Ribeiro Jr., em declaração ao diário O Estado de São Paulo, nos seguintes termos: É lixo, lixo. (sic).

A questão de fundo que suscita esta resenha é verificar até que ponto um trabalho de jornalismo investigativo constitui fonte segura e consistente para o trabalho acadêmico, posto não se tratar de uma fonte primária, para dela fazer exaustivo uso no encadeamento do seu objeto de reconstituição da verdade informativa.

Vale lembrar que o final do ciclo militar ensejou um marco profícuo do ainda incipiente jornalismo investigativo no Brasil. Tenho aqui em mente, para citar um único exemplo, o nome do jornalista José Carlos de Assis e trabalhos seus como A Chave do Tesouro: anatomia dos escândalos financeiros no Brasil 1974/1983 e, Os Mandarins da República: anatomia dos escândalos da administração pública; ambos publicados pela editora Paz e Terra em 1983 e 1984, respectivamente.

Mesmo que não signifique uma retomada desse tipo de jornalismo sadio porque comprometido com a busca da verdade, de que tanto o Brasil carece, o trabalho de Amaury Jr. é um acontecimento ao qual não se pode ficar indiferente. Aliás, o mutismo da chamada grande imprensa perante o seu lançamento, a maneira hostil com que os donos do poder no período por ele retratado rechaçaram o livro – mesmo admitindo que não o leram – e, mais que isso, as resenhas de encomenda banalizando a obra, são motivos mais que suficientes para suscitar o interesse em conhecer o todo do seu conteúdo, estudá-lo e analisá-lo.

E, para o cientista da área de humanas, em especial aqueles dedicados ao estudo do fato econômico e das relações que ele encerra ter acesso aos acontecimentos das nossas realidades sócio-políticas e econômicas entre outras, através do gradiente do jornalismo investigativo certamente que só enriquece as suas possibilidades de compreensão do seu objeto de estudo, sem que isso signifique uma recusa à manipulação dos frios números das estatísticas censitárias, dos balanços e informes, todos igualmente imprescindíveis à compreensão dos fenômenos econômicos e sociais, e necessários à inferência de políticas públicas progressistas num país de concentração de renda abismal como o Brasil.

Por outro lado, as revelações como contidas no livro A Privataria Tucana têm o mérito adicional de por a desnudo a demagogia solerte, e, sobretudo, a insensibilidade social medonha do governo fernandista, que durante seus oito anos de mandato, praticou uma gestão orçamentária restritiva, em plena consonância com as exigências ortodoxas do Fundo Monetário Internacional (FMI), gestão essa, baseada em drásticos cortes no Orçamento da União e no contingenciamento das verbas públicas, inclusive com efeitos perversos nos Estados e Municípios, no que concerne a repasses, penalizando, particularmente, os segmentos sociais mais vulneráveis, privando-os de atendimento em saúde, educação e saneamento básico. Assim, enquanto os pobres eram privados do minimumexistencia, da responsabilidade do Estado – e aqui reside a hipocrisia maior do ‘príncipe da sociologia brasileira‘ revelada em A Privataria Tucana –via privatização, precarização e aumento de preços dos serviços públicos, recursos comparativamente superiores, expressos em bilhões de dólares norte-americanos jorravam pelo ladrão da corrupção oficial e endêmica.

Apenas para recordar um exemplo mencionado por Amaury Jr., somente através do Banestado foram expatriados rumo a paraísos fiscais cerca de US$ 30 bilhões, em valores da época. Essa quantia, é o que se depreende da leitura do livro, representa uma mixórdia em relação ao montante global descaminhado pelos privatistas da era FHC, considerando-se que cerca de 80% do patrimônio público estatal foram levados à haste pública, sob as variadas formas de desnacionalização. Período este em que coincidentemente (?) a participação de firmas estrangeiras no faturamento da indústria do Brasil saltou de 27% para 42%.

Amaury Jr. vasculha, por assim dizer, os porões soturnos de uma corrupção de dimensões imperscrutáveis onde ele com suas motivações e incentivos consegue, e nisso parece que foi bem-sucedido, mostrar ao leitor uma das pontas desse meio ‗iceberg‘ meio ‗bicho de sete cabeças‘. Nesse sentido, a própria estrutura do livro – me refiro a partir do capítulo 3, que leva por título Com o Martelo na Mão e uma Idéia na Cabeça, até o capítulo 13 – O Indiciamento de Verônica Serra, é reveladora. O Capítulo 4 – A Grande Lavanderia – cumpre, até por seu didatismo, o papel de lição la minute, para os não iniciados no assunto, sobre a prática do branqueamento de dinheiro sujo. Introdução necessária para que o leitor acompanhe a digressão do jornalista na descrição dos tortuosos trajetos que vão dos leilões aos paraísos fiscais.

Os capítulos seguintes que vão do 5 – Aparece o Dinheiro da Propina, ao 8 – O Primo mais Esperto de José Serra, penetram fundo na engrenagem da corrupção e colocam em relevo seus atores principais e coadjuvantes, que, a bem da verdade, não são muitos, algo compreensível, porque no mundo do crime, a seleção de comparsas faz parte do segredo do negócio. Pelas razões evidenciadas pelo autor, trata-se de figuras destacadas dessa quase-acumulação: o próprio presidente da República, à época, Fernando Henrique Cardoso, porta-bandeira da consigna “Vender Tudo que der para Vender”; o seu ministro do Planejamento, José Serra, para quem não havia problemas em “pagar para vender”; Ricardo Sérgio de Oliveira, amigo e ‘caixa‘ das campanhas de Serra e FHC, para o Senado e Presidência da República, descrito no livro como ‘o pai do esquema‘. Sem a pretensão de citar nominalmente todos os coadjuvantes, há, contudo, um nome a reter: o do empresário espanhol naturalizado brasileiro Gregório Marin Preciato, alcunhado por Amaury Jr. de ―mais esperto‘ entre outros motivos porque, com duas empresas falidas, endividado com o Banco do Brasil até o pescoço (devia ao banco estatal R$ 20 milhões), mesmo assim, logrou doar mais de R$ 87 milhões para ajudar a financiar a campanha senatorial do primo José Serra.

Portanto, não restam dúvidas de que dentro dos objetivos a que se propôs, e tendo em linha de conta que os fatos aludidos são rigorosamente comprovados, agravado pelo feito de que nenhum desmentido sério foi apresentado questionando as afirmações ou mesmo ao arsenal de provas esgrimidas pelo autor, o livro A Privataria Tucana, independentemente das razões por ele declaradas ou subjacentes que o tenham motivado à empreitada, constitui um legado documental precioso a se ter em conta nas pesquisas envolvendo o processo de privatizações e a corrupção paraestatal no Brasil.


Resenhista

Wilson Gomes de Almeida – Engenheiro Agrônomo pela Academia de Ciências Agrícolas de Sófia/Bulgária e doutor em História Econômica pela USP.


Referências desta Resenha

RIBEIRO JUNIOR, Amaury. A Privataria Tucana. São Paulo: Geração Editorial, 2011. Resenha de: ALMEIDA, Wilson Gomes de. Revista de Economia política e História Econômica. São Paulo, ano 08, n. 28, p. 229-234, agosto, 2012. Acessar publicação original [DR]

O trabalho escravo contemporâneo: a degradação do humano e o avanço do agronegócio na região Araguaia-Tocantins | Paulo Henrique Costa Mattos

O fenômeno da escravidão rural contemporânea brasileira vem sendo denunciado em âmbito nacional e internacional, pelo menos, desde o início da década de 1970. Na década seguinte, surgiu a primeira onda de estudos sobre o tema ou que o incluem. De certa forma, entretanto, a simples existência da expressão “trabalho análogo ao de escravo”, no artigo 149 do nosso Código Penal de 1940 (este Código é ainda o atual, apesar das inúmeras alterações sofridas), mesmo que efetivamente bem pouco operante como instrumento de coibição, já refletia a admissão de que algo ocorria em nosso território.

Desde o final da década de 1980, mudanças começam a se avizinhar em função do êxito dos protestos de organismos da sociedade civil brasileira, os sindicatos, a Comissão Pastoral da Terra e as entidades de defesa dos direitos dos trabalhadores. Além das mudanças no quadro das representações político-partidárias nacionais, as denúncias contra o trabalho escravo lograram encontrar eco em instituições internacionais. Assim, o governo brasileiro foi pressionado, na década de 1990, pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), a conduzir reformas que aperfeiçoassem o aparato do Estado para o combate à prática do trabalho rural forçado. Leia Mais

Política Externa Brasileira: a busca da autonomia/de Sarney a Lula | Tullo Vigevani e Gabriel Cepaluni

As potências médias têm política externa? O que significa ter autonomia nas relações internacionais? Quais os melhores caminhos para alcançá-la? Como as noções de autonomia se relacionam com a crescente interdependência econômica global? E como é processada diante dos movimentos de integração regional? Guiados por tais problemas, Tullo Vigevani e Gabriel Cepaluni – professores da Universidade Estadual Paulista (Unesp) – pensam a experiência internacional contemporânea do Brasil. Por um lado, as reflexões teóricas sobre os significados de autonomia delimitam o foco do estudo sobre a política externa brasileira após o fim do regime militar. De outro, a investigação empírica confere substância à construção conceitual sobre as formas peculiares de como a busca por autonomia se manifestou em cada contexto. Sob uma abordagem dialógica entre geral/particular e abstrato/concreto, os autores explicitam a co-constituição e a simbiose entre o pensamento teórico e o empírico.

No primeiro capítulo, Vigevani e Cepaluni debatem as diferentes noções de autonomia nas Relações Internacionais e apresentam suas próprias formulações. De acordo com os autores, a literatura latino-americana compreende autonomia como uma noção que se refere a uma política externa livre dos constrangimentos impostos pelos mais poderosos. Nesse sentido, autonomia é o espaço do não-impedimento e da autodeterminação. É a capacidade de resistir ou neutralizar as forças externas que restringem a liberdade de um Estado de traçar seus próprios rumos. Essa visão se contrapõe às noções presentes nas teorias mainstream, que reduzem seu significado à igualdade jurídica da soberania dos Estados. Leia Mais

The Quest: Energy/ Security and the Remaking of the Modern World | Daniel Yergin

Não há menor dúvida de que os assuntos sobre energia se integraram completamente nos estudos de relações internacionais. Nos encontros e congressos, como os organizados pela ABRI e pela ANPOCS, sempre há grupos propensos a debater os efeitos do álcool combustível na política externa brasileira, do papel das jazidas do pré-sal no possível desenvolvimento brasileiro e as razoes que levaram os Estados Unidos ao Iraque em 2003.

Este interesse dos estudos de relações internacionais, ciência política e economia pela energia é algo salutar, uma vez que se preocupam com setor que influencia em grande monta a vida doméstica dos Estados, bem como o relacionamento entre eles. Energia, caso dos hidrocarbonetos, não é apenas uma commodity qualquer, é uma expressão de poder que perdura desde a Antiguidade chinesa, grega e romana e deverá perdurar enquanto o mundo for dividido por Estados e dentro deles houver sociedade produtiva. Leia Mais

La cambiante memoria de la dictadura: discursos públicos, movimientos sociales y legitimidad democrática | Daniel Lvovich e Jaquelina Biquert

Andreas Huyssen, em seu texto Resistência à memória: os usos e abusos do esquecimento público (2004), afirma que a sociedade contemporânea permanece obcecada com a memória e com os traumas provocados pelo genocídio e pelo terror de Estado. Tendo em vista este quadro, o esquecimento teria se tornado sinônimo de fracasso ou, como considera Jeanne Marie Gagnebin (2006, p. 54), o elemento final de tudo aquilo que pesa “sobre a possibilidade da narração, sobre a possibilidade da experiência comum, enfim, sobre a possibilidade da transmissão” da lembrança e da construção histórica. Nesta perspectiva, do culto às memórias sensíveis e do gradativo aumento da produção historiográfica sobre esta temática, está a análise proposta no livro La cambiante memoria de la dictadura: discursos públicos, movimientos sociales y legitimidad democrática, dos pesquisadores argentinos Daniel Lvovich e Jaquelina Bisquert, ambos docentes da Universidad Nacional General Sarmiento.

Em pouco mais de cem páginas, os autores propõem algumas reflexões tanto dos usos políticos da memória sobre a ditadura militar, como sobre as mudanças das representações e dos discursos sobre o período na Argentina. Para tanto, o livro foi dividido em seis capítulos, que abordam períodos distintos, que se iniciam no ano do golpe, em 1976, e terminam no ano de 2007, quando se encerra um ciclo de importantes investimentos por parte do Estado na construção de políticas de memória.

Já na introdução do livro, os autores propõem uma problematização do papel que a memória ocupa na sociedade argentina e que, em seu uso cotidiano, tornou-se uma bandeira que preenche um espaço singular na reivindicação de grupos distintos que clamam por “memória e justiça”. Outro aspecto relevante nesta parte do texto é a importante distinção entre as duas tradicionais formas de representação do passado: a história e a memória.

Na visão de Lvovich e Bisquert, a história tem como função abordar o passado em conformidade com exigências disciplinares, aplicando procedimentos críticos para tentar explicá-lo, compreendê-lo e interpretá-lo da melhor maneira possível. Já a memória está ligada às necessidades de legitimar, honrar e condenar (p. 07). Como parece consensual no debate sobre o tema, a memória tem sua importância na coesão e na formação identitária dos povos, ainda que se deva considerar o quanto operam sobre ela as subjetividades individuais, e como distintos grupos representam o passado de formas – não raras vezes – contraditórias. O que significa dizer que, se o passado é único, imutável, é preciso considerar que os seus sentidos e significados não o são.

À medida que novas demandas sociais ou novos grupos de poder emergem, podem ocorrer substantivas mudanças na construção discursiva do passado. Os autores chamam, assim, a atenção para o fato de que, já há algumas décadas, a memória tornou-se uma preocupação central na cultura e na política, movimento assinalado pela criação de museus, monumentos e comemorações – muito em função da internacionalização das memórias das vítimas da Segunda Guerra Mundial (p. 09).

O primeiro capítulo El discurso militar y sus impugnadores (1976-1982) é dedicado ao estudo da formação do discurso militar sobre sua chegada ao poder e das justificativas construídas para as suas ações violentas. A diferença do golpe militar de 1976 frente aos outros desencadeados naquele país estaria, sem dúvida, no papel adotado pelas Forças Armadas, que assumiram para si a responsabilidade de ser “salvadora” e “revolucionária”, com propostas de mudanças na sociedade argentina, após o caótico governo de Maria Estela Martinez.

O Proceso de Reorganización Nacional tinha por objetivo reestabelecer a “vigência dos valores da moral cristã, da tradição nacional e da dignidade de ser argentino”, bem como, assegurar “a segurança nacional, erradicando a subversão e as causas que favorecem sua existência” (p. 17). De forma semelhante ao que aconteceu em outros países da América Latina, o discurso construído em cima da figura do inimigo do regime recai no subversivo, no antiargentino que, além de praticar o terrorismo, através de suas ideias ofende a moral. Não só mata militares, como também é o que incita a briga familiar, joga pais contra filhos, leva a contestação até as escolas e as fábricas. É contra este indivíduo que o Estado entrou em “guerra interna”, justificando suas violações aos Direitos Humanos.

Outra noção de guerra, agora externa, foi também utilizada pelos militares para justificar a entrada na Guerra das Malvinas (1982), a fim de gerar um consenso na sociedade sobre a necessidade de tal aventura. Abordando tais temas, os autores apontam nesta primeira parte para as formas com que as Forças Armadas conduziram o discurso sobre sua atuação.

O segundo capítulo La transición democrática y la teoria dos demonios (1983- 1986) analisa a primeira mudança na construção do discurso sobre o período. Com a derrota na Guerra das Malvinas (que levou o regime ao colapso), a atuação cada vez mais significativa das organizações de Direitos Humanos e com o julgamento da Junta Militar o discurso do Estado caiu paulatinamente em descrédito. A versão que vem à baila é a trazida pelo Informe Nunca Más, em que aparece a clássica teoria “dos demônios”.

Esta teoria diz que a Argentina esteve durante anos sob a violência política praticada por dois extremos ideológicos: o Estado e a guerrilha. Todavia, a sociedade, sob este prisma, está alheia a tudo isto, e mais, ela é vítima da ação dos demonios e é isentada de qualquer responsabilidade na eclosão do golpe de 1976. No prólogo do Informe se condena abertamente a violência terrorista, independente de sua origem ideológica, e se assume uma perspectiva baseada tão somente na dicotomia entre ditadura e democracia, o que silencia as responsabilidades de civis e militares na repressão surgida ainda no governo de Maria Estela Martinez (p. 35). Outro cambio de interpretação se deu na visão sobre a guerra das Malvinas. Com a derrota da Argentina, os soldados entraram para a história como vítimas, inocentes e inexperientes, que “foram enviados para morrer e não para matar” (p. 40).

O terceiro capítulo, Un pasado que no pasa (1987-1995) trata, principalmente da fragilidade de se abordar essa memória recente da ditadura em um período de reconstrução democrática. Após o período de turbulência durante o governo de Raul Alfonsín veio o governo de “pacificação nacional”, de Carlos Menem. Ou seja, as agitações causadas pelas polêmicas acerca das leis de obediência devida e punto final e pelo ataque ao quartel de La Tablada, o país mergulha em uma tentativa institucional de abrandar essas questões. Tal política, que incluía indultos a militares sublevados, relativizou a questão do terror de Estado. Para o presidente, somente com o passado reconciliado se poderia “abrir as portas para um futuro promissor”. Segundo os autores, Menem incitou a nação a construir uma memória baseada no esquecimento (p. 53), o que, contudo, teve efeito contrário, já que a memória sobre a repressão continuava cada vez mais viva e a sociedade cada vez mais sectarizada.

El boom de la memória (1995-2003) é o quarto capítulo, que trata do período em que a memória sobre a repressão veio à cena pública de modo mais impactante – seja na sociedade, seja nos ambientes acadêmicos. O fator responsável por este fenômeno foi a confissão de Adolfo Scilingo sobre sua participação nos chamados vôos da morte. O acontecimento teve o efeito de desencadear uma série de “autocríticas” entre os militares, que se diziam arrependidos de sua atuação na repressão. Somado a isto, novas organizações de Direitos Humanos, como os H.I.J.O.S (Hijos e Hijas por la Identidad y la Justicia contra el Olvido y el Silencio) passaram também a inovar no método de pedir justiça, sob a forma de escrache.

Essa nova forma de protestar (o escrache) consistia em uma marcha até a residência de algum repressor a fim de grafitar o local e avisar à comunidade que seu vizinho foi um colaborador ou repressor. O avanço dos meios de comunicação, sem dúvida, auxiliou nessa fase de boom, com a divulgação de fotografias, vídeos e filmes, fazendo com que surgisse uma demanda social que clamava pela abertura dos arquivos da repressão. A academia não ficou alheia a este debate e a memória sobre o período e seus desdobramentos tornou-se um objeto de reflexão bastante visitado nas universidades.

A partir do ano de 2001, começaram a surgir os “lugares de memória”, lugares de homenagem às vítimas da repressão. Esta “hipermemória”, como escrevem os autores, converteu as vitimas em heróis revolucionários, estabelecendo uma nova divisão social – ainda simples e maniqueísta, entre bons e maus (p. 74).

Las políticas de memoria del Estado (2003-2007) é o capítulo que encerra o livro, descrevendo e analisando a importância dada à questão dos Direitos Humanos e à questão dos julgamentos durante o governo de Néstor Kirchner. Com a declaração da inconstitucionalidade das leis Punto final e obediência devida, dezenas de processos tiveram que ser revistos e novos julgamentos voltaram a ocorrer. A centralidade deste capítulo está na discussão sobre como a memória das vítimas do regime tornou-se forte, eliminando quase que por completo a versão militar dos fatos.

Outros pontos importantes discutidos dizem respeito à proliferação dos centros de memória, em especial, da Escuela Superior de Mecanica de la Armada (com todo o debate sobre como utilizar este espaço, para transformá-lo em museu) e à importância das manifestações de rua nas comemorações do 24 de março, aniversário do golpe, sobretudo, na comemoração dos seus 30 anos, em que o presidente chamou a atenção para o fato que “não só as forças armadas tiveram responsabilidade do golpe. Setores da sociedade tiveram sua parte: a imprensa, a igreja e a classe política” (p. 87).

Com um texto simples em sua linguagem, mas repleto de importantes referências historiográficas e de fontes jornalísticas acerca do tema, os autores ilustram todo o processo pelo qual a “história da memória” sobre a ditadura e o terror de Estado passou ao longo de aproximadamente trinta anos na Argentina.

O livro lança luzes sobre os debates que aconteceram na sociedade durante este período, mostrando que, mesmo quando uma ou outra visão prevalecia, ela não aparecia sem que houvesse vozes dissonantes no interior dos muitos grupos sociais e políticos. Sendo assim, trata-se de um livro importante para quem quer compreender o estágio atual da sociedade argentina, que levou muito recentemente grandes repressores ao banco dos réus, colocando aquele país como o mais adiantado entre seus vizinhos no que diz respeito à justiça de transição. La cambiante memoria de la dictadura desperta a curiosidade sobre este tema, que ainda rende – e renderá entre os argentinos e entre os brasileiros – apaixonadas e calorosas discussões.

Referências

GABNEBIN, Jeanne Marie. Lembrar Escrever Esquecer. São Paulo: Editora 34, 2006.

HUYSSEN, Andreas. Resistência à memória: os usos e abusos do esquecimento público. In: BRAGANÇA, Aníbal e MOREIRA, Sonia Virginia. Comunicação, Acontecimento e Memória. São Paulo: Intercom, 2005.

LVOVICH, Daniel y BISQUERT, Jaquelina. La cambiante memoria de la dictadura: discursos públicos, movimientos sociales y legitimidad democrática. Buenos Aires: Biblioteca Nacional, 2009.

Diego Omar da Silveira – Universidade Federal de Minas Gerais.

Isabel Cristina Leite – Universidade Federal do Rio de Janeiro.


LVOVICH, Daniel; BISQUERT, Jaquelina. La cambiante memoria de la dictadura: discursos públicos, movimientos sociales y legitimidad democrática. Buenos Aires: Biblioteca Nacional, 2009. Resenha de: SILVEIRA, Diego Omar da; Leite, Isabel Cristina. CLIO – Revista de pesquisa histórica. Recife, v.30, n.1, jan./jun. 2012. Acessar publicação original [DR]

Tierra e Historia, estudios y controversias acerca de la historia del Pueblo Mapuche en Chile, 1950-2010 | Pedro Canales Tapia

La construcción y validación del conocimiento es un campo que en la actualidad se encuentra en disputa, como consecuencia de la supremacía de un conocimiento legitimado y oficializado que tradicionalmente ha desvalorizado al hombre “premoderno” y la comprensión y explicaciones que éste dio a su universo y entorno habitado, construyéndose categorías de conocimiento que extrañamente coinciden con ese cosmos particular y único de ese otro “no moderno”. Es así como desde la investigación histórica y de las Ciencias sociales en general se puede dar cuenta de una “tradición” que aún sigue dominando grandes áreas del conocimiento, y del saber oficializado por los Estado-Nación.

No obstante, como producto de la denominada“crisis de la modernidad”, se ha develado un nuevo escenario en donde es posible observar la presencia de continuas rivalidades entre saberes oficiales que se jactan de provenir desde las escalas sociales más altas y de componerse objetivamente, y aquellos saberes denominados populares, construidos desde las intersubjetividades y experiencias comunales y locales. Es en esta categoría donde podría entenderse el conocimiento e historia del mundo mapuche. Leia Mais

La rebelión de los tirapiedras, Puerto Natales 1919 | Ramón Sepúlveda

La lucha contra el olvido y sus distorsiones constituye el motor de esta reconstrucción histórica, como indica su autor en el prólogo. Su interés genuino en recuperar la historia de personajes y acontecimientos olvidados de Puerto Natales se materializaba en un trabajo previo, en Patagonia Mía, periódico natalino que tuvo mucho énfasis en difundir las crónicas históricas de la ciudad. La desaparición de esta publicación a fines del 2005 y la proximidad al centenario de la fundación de la ciudad en el 2011, fue el momento propicio para que Arriagada comenzara su indagación sobre los “Sucesos de Puerto Natales” del 23 de enero de 1919 en el frigorífico Bories, temática central de la presente narración y que se logró concretar gracias al encuentro en el Archivo Nacional de Chile del expediente judicial de la causa N° 1407 identificado como “Contra Luis Ojeda y otros”, proceso seguido a veintinueve ciudadanos natalinos, todos ellos trabajadores de los frigoríficos de la Sociedad Explotadora de Tierra del Fuego, empresa que formaba parte del “holding” de la inglesa Duncan Fox.

La reconstrucción de estos sucesos, o cualquiera sea el objeto de estudio propuesto, está mediada por el camino que sigue el sujeto de la enunciación en la investigación acerca del pasado, lo cual en este caso se manifiesta, en parte, en la evidente intención de develar estos hechos no tan sólo para contribuir a elevar el orgullo “tirapiedras” (apelativo que identifica a los natalinos) como remarca el autor, sino también para articularlos en relación a una historia nacional que ha soslayado los relatos de estos australes parajes, debido al marcado centralismo de la historiografía chilena, resultando así complejo –no por ello imposible– desprenderse de esta impronta cuando se pertenece al ‘centro’, incluso como lector. Por otra parte, resulta interesante la vinculación de este relato con lo sucedido en la provincia de Santa Cruz en la República Argentina a fines de 1921. De este modo, el libro incorpora distintas espacialidades que traspasan lo local pese a que los acontecimientos del día 23 ocurren en un lugar puntual y delimitado. Leia Mais

Escritos sobre história e internet | Dilton Cândido Santos Maynard

Uma das mais belas apresentações de livros que já li começava assim: “Apresentar um livro é fazê-lo presente”. Ora, mas não é óbvio? Contudo, continua argutamente o autor: “Mas, qual poderia ser seu presente? O da escritura, que já não é, ou o da leitura, que ainda não é?”. Repito as palavras e questionamentos de Jorge Larrosa [1] pensando na velocidade com que se transformam as paisagens da seara em que Dilton Maynard decidiu se enveredar ao eleger como tema central de seu livro as relações entre história e internet.

Sendo assim, a obra Escritos sobre história e internet chama a atenção por um particular interesse pelo tema dos ambientes telemáticos e provoca, em virtude disso, certo conforto antecipado em, ao menos, podermos esperar que sua leitura abrace as discussões sobre o elemento digital e suas implicações para o nosso métier, historicamente analógico e papirofílico. Assim, recomendo o livro desejando que as presenças que dele fizerem, consoantes ou dissonantes à minha, venham incrementar o debate acerca deste Novo Mundo para onde as agitadas águas do ciberespaço nos levam. Por enquanto navegamos à deriva. Leia Mais

India’s Foreign Policy: Retrospect and Prospect | Sumit Ganguly

In this stimulating collection of scholarly essays, edited by Sumit Ganguly, the fifteen authors provide a balanced and insightful overview over India’s foreign policy. In Chapter 1, Ganguly argues that systemic (e.g., the Cold War), national (e.g., the experience of colonialism) and personal factors (e.g., Nehru) have contributed to the country’s foreign relations. It is this concept of three levels that structures the chapters in the book, helping the reader to navigate through often unwieldy and often unfamiliar issues.

In Chapter 2, Basrur analyzes India-Pakistan relations, arguing that domestic politics pose the major obstacles to finding a lasting resolution. However, he strikes an optimistic tone arguing that through increased cooperation and communication, the Line of Control (LoC) could be “transcended”, and that we can expect cumulative improvement rather than a dramatic and unexpected peace deal. In Chapter 3 on India-Sri Lanka relations, Devotta shows that New Delhi’s concerns about security have outweighed Tamil Nadu’s particular preferences when dealing with the war-torn island to the South of India. The chapter is full of important details -e.g. mentioning China’s growing presence in Sri Lanka – but t is unclear to the reader why this chapter is considerably longer and more detailed than the previous one, particularly since Pakistan plays a much more important role than Sri Lanka. In Chapter 4, Thakar sheds light on India-Bangladesh ties, arguing that despite no obvious obstacles relations are difficult mainly because of structural asymmetries and the suspicions that result from this unequal relationship. Recurring domestic instability on both sides further complicated matters. In Chapter 5, Garver elegantly summarizes the history of India-China relations in the context of shifting alliances during the Cold War, describing, among other aspects, the important role the Soviet Union played as one of India’s most reliable allies and a counterweight against the Pakistan – China alliance starting in the 1960s. Chapter 6 on India- Southeast Asia relations shows how difficult it has been in the past for India to exert influence in the region given its low economic integration due to its autarkic model. Despite these limitations, worries about Indian hegemony in the region have surfaced numerous times in the past decades. Leia Mais

New Powers: How to be come one and how to manage them | Amrita Narlikar

Dr. Amrita Narlikar, who teaches International Politics at Cambridge University, has written a very short and elegant book about Brazil’s, India’s and China’s rise. The topic of emerging powers invites, quite naturally, a lot of forward-looking analysis. The now famous paper “Dreaming with the BRICs: The Path to 2050”, published by Goldman Sachs in 2003, offers a seemingly unending number of fascinating discussions, all based on the question of how the world will look like when the five greatest economies are, in that order, China, the United States, India, Japan and Brazil. Will rising powers integrate into today’s world order, or will they overthrow the current system?

Yet Dr. Narlikar resists the temptation of participating in the guessing game and takes a sober look into the past, analyzing India’s, China’s and Brazil’s international negotiation strategies to answer the question mentioned above. She argues that “at one extreme, we may expect the new power to show complete socialisation. At the other extreme, however, we may also see the new power using its newfound status to pursue alternative visions of world order.” This issue already matters greatly today, for Narlikar rightly contends that today’s rising powers, while not yet well-integrated into international institutions, have acquired the de facto status os veto players “whose agreement is required for a change of the status quo.” This has important implications for the stability of today’s world order. If rising powers fail to assume global responsibility, established powers such as the United States may soon no longer be able to provide the global public goods that define today’s global order. Leia Mais

Sin contrincante en el frente. El poder en el México contemporáneo/Historia y Grafía/2011

Cada época encuentra en Shakespeare lo que le atribula. Por eso mismo es posible reconocer en la monstruosidad moral y física de Ricardo III la deformidad de nuestro propio tiempo político. Por sus disformidades internas y externas, este personaje le viene muy bien al pasado reciente del sistema político mexicano. Aquel que se explica por la obsesión –casi manía– del poder. La astucia, la fina simulación, la crueldad, la capacidad para conspirar, las fobias, todo ello ha sido utilizado por el sistema de partido único, sin importar cuán lejos se vaya, para no desprenderse del poder. Al igual que el usurpador conde de Gloucester, el partido hegemónico en México desplegó, desde sus inicios, un discurso y una práctica que buscaban seducir a una sociedad que apenas salía de una cruenta guerra fratricida y así persuadirle de que el suyo era el mejor camino para la reconstrucción nacional. Leia Mais

Os donos de Portugal. Cem anos de poder econômico (1919-2010) | Jorge Costa

Um texto fluído e agradável que prende a atenção do leitor ao longo das suas quase 450 páginas. O levantamento foi primoroso e nos mostra a evolução da elite econômica portuguesa ao longo do século XX, seja no período da ditadura salazarista, caetanista, seja no período da Revolução dos Cravos, suas viradas à esquerda e o período pós adesão à Comunidade Econômica Europeia.

Escrita a cinco mãos, a obra é o trabalho conjunto de historiadores e economistas, professores da Universidade Nova de Lisboa, alguns deles deputados da Assembleia da República. O grupo é liderado por Jorge Costa, jornalista e estudioso de História Econômica do país, que exerce a direção do Bloco de Esquerda, um partido político formado em 1998, a partir da fusão da União Democrática Popular (de orientação marxista), do Partido Socialista Revolucionário (com ideologia trotskista) e da Política XXI, união de ex-militantes do Partido Comunista Português, e pensadores independentes. Leia Mais

Repensando a Geografia Escolar para o Século XXI | José William Vesentini

O livro lançado em 2009 pelo professor Vesentini é uma contribuição importante para pensarmos o papel do ensino de Geografia e da própria ciência geográfica, pois o texto aponta elementos críticos que nos fazem refletir quanto à atualidade e as projeções desta ciência no cotidiano escolar.

Compõem o livro três capítulos, prefácio, perguntas feitas ao autor (faqs) e considerações finais. O primeiro capítulo, “Introdução: uma apologia do ensino de Geografia… e da história, da sociologia, da filosofia, da educação física e artística”, tece críticas necessárias às mudanças que ocorreram na escola nos últimos anos. Destaca como um dos problemas, principalmente no estado de São Paulo, a inferiorização de todas as disciplinas escolares como “auxiliares” para o ensino da matemática e da língua portuguesa. Sublinha ainda como problema a aprovação automática e a opção por uma política educacional vinculada aos interesses do Banco Mundial. O autor compara as mudanças na educação escolar no Brasil com as que ocorreram nos Estados Unidos no governo Bush a partir da legislação “No Child Left Behind Act” (Nenhuma Criança Deixada para Trás) em 2001, que priorizou a subtração dos conteúdos científicos em detrimento dos conteúdos conservadores e de explicação bíblica. Também essa legislação tornava obrigatório aos alunos fazerem testes, os quais comparavam e qualificavam as escolas por esses resultados. Leia Mais

How Enemies Become Friends | Charles Kupchan

Charles Kupchan é professor de relações internacionais na Universidade de Georgetown, nos Estados Unidos. Também é associado ao Conselho de Relações Exteriores. Foi diretor do Departamento de Assuntos para a Europa, órgão do Conselho Nacional de Segurança, durante o governo Clinton. Portanto, um especialista renomado e influente.

Tem estudado sistematicamente o que os americanos já chamaram de «nova ordem mundial». Kupchan, de forma mais contundente, considera o momento como «O fim da Era Americana» («The End of the American Era: U.S. Foreign Policy and the Geopolitics of the Twenty-first Century», publicado em 2002) e um período de transição, não para uma nova, mas para uma outra ordem mundial («Power in Transition: The Peaceful Change of International Order», 2001). Leia Mais

Building peace after war | Mats Berdal

De acordo com o Stockholm International Peace Research Institute (SIPRI), sessenta operações multilaterais de paz, abrangendo um número recorde de aproximadamente cento e noventa mil militares e civis, foram realizadas em 2008 em todo o globo. Nem os fracassos das missões de paz ao longo da primeira metade da década de 90, em Angola, Somália, Ruanda e Bósnia, nem as transformações no ambiente estratégico causadas pelos desdobramentos do “11 de setembro”, lograram êxito em afetar a tendência de crescimento das missões de construção da paz no cenário internacional, as quais tornaram-se muito mais abrangentes e ambiciosas quando em perspectiva com as ocorridas sob a ordem bipolar da Guerra Fria. Esse é o quadro no qual Mats Berdal desenvolve Building peace after war: uma análise crítica dos esforços internacionais atuais para reerguer países arrasados por conflitos.

Partindo das experiências em diversos países, do Camboja ao Iraque, o foco do professor da King´s College London constitui-se em, ao longo de três capítulos, enveredar-se pelos desafios postos aos componentes civis e militares em missões internacionais de construção da paz após conflitos. Estas, segundo Berdal, sofrem de duas fraquezas principais, às quais este livro pode ser visto com uma tentativa de dirigirse: a recorrente falta de prioridades claras no curto e no longo prazo, derivada, basicamente, do seu entendimento conceitual excessivamente amplo; e a tendência marcante de abstrair suas ações do devido contexto político, cultural e histórico local. Leia Mais

Jogos teatrais no Brasil: 30 anos | Fênix – Revista de História e Estudos Culturais | 2010

Quando todos forem

iniciadores

Quem ficará para ser o

seguidor?

Quando todos forem

seguidores

Quem ficará para ser o

iniciador?

Quem ficará para ser

iniciador e seguidor

Quando todos forem

iniciadores e seguidores?

Viola Spolin

Viola Spolin é conhecida internacionalmente por sua contribuição metodológica tanto para o ensino do teatro nas escolas e universidades como para a prática da arte cênica, principalmente para o teatro improvisacional. A “avó do teatro improvisacional norte-americano”, cunhou o termo theatre game, traduzido entre nós como jogo teatral. Os jogos teatrais acentuam a corporeidade, a espontaneidade, a intuição e a incorporação da platéia, indicando como princípios da linguagem teatral podem ser transformados em formas lúdicas, criando um acesso criativo para a atuação no teatro com leigos e profissionais

Na sistematização da prática do jogo teatral é possível divisar a construção de um método no qual, longe de estar submetido a teorias, técnicas ou leis, o jogador se torna artesão de sua própria educação no processo da prática teatral, produzido por ele mesmo ao articular essa linguagem. Como disse um especialista, o jogo teatral está para o teatro como o cálculo para a matemática.

Imigrante russa nos EUA na década de trinta, Viola Spolin recebeu influência de Stanislavski a quem faz uma dedicatória em Improvisação para o Teatro. Tive poucos contatos com Viola em vida, restritas a via postal. Mas soube uma história contada por seu marido Kolmus Greene, ao conhecê-los em Los Angeles (Viola já havia sofrido um derrame). Ela estava coordenando um workshop de jogos teatrais na sala contígua onde Brecht ensaiava o Galileu com Charles Laughton. Ao tentar adentrar a sala para acompanhar o ensaio, foi impedida de ver o “grande” ator. E ela teria exclamado: Eu queria ver Brecht, não Laughton (But I didn`t want to see Laughton, I wanted to see Brecht!). A proximidade entre o jogo teatral e Brecht é maior do que imaginamos inicialmente. Paul Sills, filho de Viola e criador do Story Theater fez estágio no Berliner Ensemble. Viola Spolin e Paul Sills eram contemporâneos de seu tempo.

Ao lado de outras abordagens sensório-corporais, desenvolvidas principalmente na década de sessenta nos EUA e na Europa, o jogo teatral vem se revelando de grande atualidade. Em Texto e Jogo (Perspectiva, 1999) 1 o texto de Bertolt Brecht Lehrstück/Learning Play (jogo de aprendizagem) é utilizado para avaliar o jogo, enquanto, ao mesmo tempo o jogo é utilizado na apropriação do texto pelo atuante.

O princípio do meta-teatro brechtiano, presente em seus textos poéticos exige uma abordagem através da consciência lúdica, promovendo o estranhamento de gestos e atitudes. O jogo teatral iniciado por Viola Spolin tem em seus ramos folhas das principais metodologias de teatro do século XX.

Lembro-me, quando ao experimentar os jogos teatrais com alunos do Curso de Licenciatura na ECA/USP, em 1978, nasceu a descoberta de um método diferente daquele que encontrava na maioria dos livros sobre teatro na educação. Eduardo Amos, então aluno do departamento, tornou-se parceiro de inestimável valor. Vínhamos pesquisando a bibliografia nacional e a matriz do Child Drama de Peter Slade, quando a atriz Maria Alice Vergueiro, docente do então Departamento de Teatro, tendo participado, do III Congresso Internacional de Teatro para a Infância e Juventude, nos EUA, trouxe em sua bagagem um exemplar de Improvisação para o Teatro de Spolin. A leitura do livro e a vontade de entender melhor como se daria a prática a partir deste manual levou à formação do Grupo Foco. A pesquisa prática foi sendo depurada através da encenação de Genoveva Visita a Escola, um relatório para pais de uma escola de Educação Infantil, escrito por Madalena Freire (1979).

Em meu livro Jogos Teatrais (Perspectiva, 1984) descrevo parte desta prática, desenvolvida inicialmente nos anos 1978 e 1979, assim como os trabalhos realizados na APTIJ – Associação Paulista de Teatro para a Infância e Juventude junto a artistas de Teatro Infantil profissional paulistano. No prefácio escrito por Tatiana Belinky ela afirma que esta foi “a primeira dissertação em Teatro-Educação no país, o que veio conferir status acadêmico a um campo entre nós bastante marginalizado”. 2 Originalmente escrito em função de meu Mestrado na ECA/USP, com orientação de Sábato Magaldi, nele Belinky destaca ainda que “na época o sistema de Viola Spolin não era conhecido no Brasil”.

Outros resultados dessa pesquisa foram a tradução de Improvisação para o Teatro, em 1979 (Ed. Perspectiva, tradução Eduardo Amos e Ingrid Koudela). Seguiram-se depois outras traduções e edições, O Jogo Teatral no Livro do Diretor (2004), Jogos Teatrais: O Fichário de Viola Spolin (2001) e Jogos Teatrais na Sala de Aula (2007) também pela Perspectiva.

Inicia-se aí um processo, ao longo destas décadas, em que o sistema de jogos teatrais vem sendo experimentado e adaptado a realidade cultural brasileira por professores-artistas e pesquisadores em todo o país, em distintas realidades culturais, abrindo diferentes abordagens deste sistema de ensino e aprendizagem do teatro e de sua aplicação tanto na área da educação como na da encenação. Esta trajetória configura um entendimento e prática brasileiros.

A múltipla aplicação dos jogos teatrais, direcionada pelo contexto do grupo de jogadores e pela abordagem critica utilizada durante as avaliações, sugere que o sistema oferecido por Spolin, ao mesmo tempo em que regula a atividade teatral, traz em si a possibilidade de sua própria superação como método.

Com o objetivo de refletir sobre a prática dos jogos teatrais entre nós, foi organizado o presente dossiê junto com Robson Corrêa de Camargo, para a revista virtual Fênix – Revista de História e Estudos Culturais.

Robson Corrêa de Camargo, docente da Universidade Federal de Goiás e Ana Paula Teixeira, mestranda na Universidade Federal de Uberlândia analisam intersecções entre Spolin e Stanislavski para o ensino e a prática do teatro. Argumentando a partir de autores como Richard Courtney e Vygotsky aproximam o método das ações físicas de Stanislavski com o sistema de jogos teatrais, visando à formação de profissionais de teatro e professores no Curso de Graduação em Artes Cênicas da UFG.

Beatriz Cabral, docente da Universidade do Estado de Santa Catarina, traz o seu histórico de pesquisa no qual analisa as possíveis interações entre o sistema de jogos teatrais e o método do drama inglês. As aproximações e diferenças são observadas entre significação e contexto; aquisição da linguagem e convenções teatrais. Apontando para as influencias das práticas teatrais pós-modernas, que também se refletiram na sala de aula, demonstra que os métodos não são excludentes, podendo haver inúmeras combinações entre ambos.

Alexandre Mate, docente do Instituto de Artes da UNESP – SP traz apontamentos bibliográficos sobre jogos teatrais entre nós, recuperando material bibliográfico produzido sobre o teatro na educação desde a década de setenta.

Contribuindo para que a dimensão lúdica e artística seja introduzida como campo de conhecimento e formação nos cursos de pedagogia, Lucia Lombardi, doutoranda na Faculdade de Educação da USP, traz os resultados da sua pesquisa na qual os jogos teatrais se revelaram produtivos na formação de educadores de creches da rede pública de ensino em São Paulo. Focalizando a avaliação através do protocolo (instrumento proposto por Bertolt Brecht) aponta para a importância da reflexão sobre a experiência do professor em formação.

Mariana Tagliari, licenciada em Artes Cênicas pela Escola de Música e Artes Cênicas da Universidade Federal de Goiás, traz a sua reflexão sobre o jogo na Educação Infantil, na experiência de jogos com crianças até quatro anos.

Marina Miranda de Carvalho, Iara Fátima Fernandes e Davi de Oliveira Pinto são coordenadores de Jogos Teatrais no Curso de Teatro na Educação do Centro de Formação Artística da Fundação Clóvis Salgado de Belo Horizonte. Ressaltando a relevância e atualidade dos jogos teatrais como abordagem metodológica no trabalho de teatro com jovens, ao longo dos dez anos em que este projeto vem sendo desenvolvido no Palácio das Artes, o artigo reporta a depoimentos de educadores

Apontando para a importante função da Instrução do coordenador de jogos teatrais, Vicente Concilio, docente na Universidade do Estado de Santa Catarina, destaca sua relevância como procedimento artístico e pedagógico, estabelecendo pontos de contato entre o jogo teatral, a formação do professor de teatro e a criação teatral na contemporaneidade.

A Instrução no jogo teatral também é analisada como prática dialógica no processo de montagem do espetáculo Chamas na Penugem (2008). O relato de Raymon Aires, formado pelo Curso de Licenciatura em Teatro da UNISO – Universidade de Sorocaba – SP, investiga o processo de experimentação dos atuantes e a parceria que se estabelece com a coordenação dos jogos.

Apresentando a experiência do modelo espetacular denominado Teatro de Figuras Alegóricas, realizado na UNISO – Universidade de Sorocaba – SP, José Simões de Almeida Junior, encenador com Doutorado pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo traz a fundamentação do jogo teatral aliado à leitura de imagens no processo de construção da montagem teatral. Sua reflexão tem como ponto de partida a discussão do espaço teatral, os procedimentos de espacialização da cena e os seus vínculos com as narrativas visuais na criação espetacular.

Joaquim Gama, doutorando na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo e docente na Universidade de Sorocaba, analisa o princípio da Fisicalização no sistema de jogos teatrais como possibilidade de conciliação entre a imaginação dramática e a corporeidade, fazendo com que o atuante tenha a experiência do aqui/agora no jogo improvisacional.

Introduzindo a discussão acerca do jogo teatral como indutor à construção de dados a serem utilizados em investigações de recepção teatral, Tais Ferreira, Coordenadora do Curso de Teatro Licenciatura da Universidade Federal de Pelotas – RS narra uma experiência empírica desenvolvida durante um processo de investigação com crianças espectadoras.

Alessandra Ancona de Faria, docente na Universidade Paulista traz uma análise do livro O Jogo Teatral no Livro do Diretor de Spolin tendo em vista como o jogo teatral pode contribuir na encenação com grupos de alunos em escolas de Ensino Fundamental, a partir da experimentação que realizou com um grupo de adolescentes de uma escola pública na cidade de São Paulo.

Maria Lucia Pupo, docente no Departamento de Teatro da Universidade de São Paulo faz uma resenha de Jogos Teatrais na Sala de Aula, enfatizando a importância do jogo de regras no processo de aprendizagem do teatro, alertando para a recepção ingênua que poderia indicar o subtítulo ¨manual¨. Acentua o mérito que reside em apontar perspectivas para o fazer teatral numa ótica lúdica, no âmbito das contradições inerentes à instituição escolar.

Por fim, fechando este dossiê, Robson Corrêa de Camargo apresenta uma breve resenha – intitulada O Jogo Teatral e sua Fortuna Crítica…. – em que analisa a recepção dos jogos teatrais em nosso país no artigo.

É possível identificar no pensamento pedagógico contemporâneo brasileiro alguns eixos de discussão recorrentes na área de Arte. Do ponto de vista epistemológico, uma das possibilidades é a articulação metodológica entre o fazer artístico, a apreciação da obra de arte e o processo de contextualização histórico e social. Através do ensino da história e do exercício critico na leitura da obra de arte, o processo expressivo da criança e do jovem é ampliado e inserido na história da cultura e na cultura da história.

No âmbito da Arte na educação vários são os temas que vem sendo discutidos como a concepção polivalente no ensino da arte x interdisciplinaridade. O eixo do conhecimento em uma das linguagens específicas (Artes Visuais, Música, Teatro e Dança) é mantido como norteador de projetos, estabelecendo-se parcerias com outras linguagens, processo enriquecedor da aprendizagem. Outro tema que surge de forma recorrente é a concepção do professor-artista, ou seja, além de mediador esse professor desenvolve projetos com seus alunos na perspectiva da construção e experimentação de formas artísticas.

Os eixos de aprendizagem em Arte levaram, na última década, a uma reflexão e experimentação com a leitura e fruição de obras de arte, notadamente através dos setores educativos dos museus e outros espaços culturais. O mesmo fenômeno pode ser verificado na área de Teatro, estabelecendo pontes entre o teatro para a infância e juventude e platéias em escolas e outras, que até então não tinham acesso aos espetáculos apresentados em teatros nas cidades. A Lei de Fomento da cidade de São Paulo, por exemplo, vem neste sentido modificando o panorama cultural, ao exigir a contrapartida social dos projetos nela inscritos.

O exercício da linguagem artística vem sendo ressaltado em grau crescente na formação do professor de Arte. Na área do Teatro, a tematização do espaço acompanha os processos criativos contemporâneos. A leitura de imagens e/ou textos poéticos, como deflagradores do processo pedagógico e material para a construção da cena, amplia a perspectiva de aprendizagem e do exercício artístico.

Como se vê são muitos os caminhos trilhados. Por meio das oficinas de jogos teatrais é possível construir liberdade dentro de regras estabelecidas por acordo grupal. A matéria do teatro, gestos e atitudes, é experimentado concretamente no jogo, sendo que a conquista gradativa da expressão física, corporificada, nasce da relação estabelecida com a sensorialidade.

Na escola não se aprende normalmente através da experiência, mas por meio da didática (técnicas de organização do aprendizado). No entanto, o aprendizado estético é momento integrador da experiência humana. A transposição simbólica da experiência assume, no objeto estético, a qualidade de uma nova experiência. As formas simbólicas tornam concretas e manifestas, novas percepções a partir da construção da forma artística. O aprendizado artístico desenvolve-se como processo de produção de conhecimento.

Outra tendência verificada nas pesquisas apresentadas é o teatro como ação cultural. Problemas sociais contemporâneos têm surgido como temas privilegiados nos trabalhos realizados com crianças e jovens. Esse trabalho teatral, muitas vezes desenvolvido no âmbito de ONGs, de projetos de pesquisa e extensão nas universidades e através de apoio da iniciativa privada, propõem o tratamento de problemas sociais.

Nos ensaios apresentados no presente dossiê da Revista Fênix essas tendências podem ser reconhecidas, abrangendo os vários campos profissionais da Pedagogia do Teatro e as várias vertentes de pesquisa ora em curso. Os jogos teatrais de Viola Spolin revelaram-se altamente produtivos nas diferentes abordagens, acima de tudo ao promoverem habilidades no processo de aquisição da linguagem do teatro. As reflexões sobre o jogo teatral dentro de nossa realidade nacional certamente abrem novos caminhos para o método de Viola Spolin, ampliando e até mesmo transformando a proposta inicial.

Boa leitura!

Notas

1 KOUDELA, Ingrid D. Texto e Jogo. São Paulo: Perspectiva, 1999.

2 KOUDELA, Ingrid D. Texto e Jogo. São Paulo: Perspectiva, 1999, p. 10.


Organizadores

Ingrid Dormien Koudela – Livre Docente pela Universidade de São Paulo. Docente do Curso de Pós-Graduação em Artes Cênicas na ECA/USP e do Curso de Licenciatura em Teatro da Universidade de Sorocaba. Autora de Jogos Teatrais (Perspectiva, 2002) é tradutora e introdutora do método no Brasil. Pesquisadora de Brecht, com ênfase na Peça Didática, publicou vários volumes de sua autoria propondo uma abordagem alternativa para o ensino/aprendizagem da linguagem teatral e do texto literário.  E-mail: [email protected]

Robson Corrêa de Camargo – Encenador e crítico teatral. Doutor em Artes Cênicas e professor da Universidade Federal de Goiás. Cópias gratuitas de alguns dos trabalhos de sua autoria podem ser acessados em http://ufg.academia.edu/RobsonCamargo  E-mail: [email protected]


Referências desta apresentação

KOUDELA, Ingrid Dormien. Apresentação. Fênix – Revista de História e Estudos Culturais. Uberlândia, v.7, n.1, jan./abr. 2010. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

A economia portuguesa 20 anos após a adesão | Antonio Romão

O ano de 2006 foi o marco das comemorações de 20 anos da entrada oficial de Portugal na Comunidade Econômica Europeia(CEE) e, como tal, foi palco de diversas celebrações, eventos e, também, reflexões sobre o significado da adesão portuguesa ao bloco europeu.

Nesse contexto, o professor doutor Antonio Romão, catedrático do Instituto Superior de Economia e Gestão(ISEG) da Universidade Técnica de Lisboa(UTL), lançou o livro de análise da economia portuguesa nos vinte anos da adesão em obra conjunta com outros 15 especialistas – a maioria, professores colegas da mesma universidade, salvo duas exceções: o professor Manuel Cardoso Leal, assessor do conselho administrativo do Instituto de Financiamento e Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e Pesca, do Ministério da Agricultura português, e o economista Carlos Correia da Fonseca, especialista na área de transportes. Leia Mais

Russia: a new cold war? (T), Vallentine Mitchell Academic | Michel Korinman e John Laughland

Estendendo-se da Europa à Ásia, com uma trajetória marcada por dois séculos de história, a Rússia busca na atualidade o reconhecimento do seu status como potência e a redefinição da sua identidade enquanto país reemergente depois da imediata crise do pós-Guerra Fria. De império soviético à nação russa, Estado em reconstrução, à luz de tal dualidade, o país que fora palco de grandes transformações revolucionárias, vivenciou nessas quase duas décadas, uma situação de rápida mudança. Frente a essa reconfiguração, velhos dilemas se misturam aos novos desafios reascendendo o debate sobre qual é o papel da Rússia. Dessa forma, terá a Rússia perspicácia e desenvoltura para enfrentar uma ordem em transformação ou se renderá às suas heranças e bases ideológicas soviéticas? Ou ainda buscará um caminho diferente como sugerem alguns autores?

Para tentar responder a estes questionamento, o livro intitulado Russia: a new Cold War? é produto de uma cooperação entre o Daedalos Institute of Geopolitics em Chiore e o OGENI (Geopolitical Observatory for Nations and the World) da Sorbonne em Paris, sendo organizado por Michel Korinman e John Laughlan. Em seu conjunto, é uma coletânea de artigos, cujos assuntos diversos são divididos em nove blocos, os quais de uma maneira ou de outra, buscam refletir acerca da pergunta título da obra e discorrem sobre as movimentações russas do Ocidente ao Oriente. O livro traz ao leitor questões concernentes aos problemas internos como demografia, território, economia, identidade, bem como as perspectivas e desafios à nação russa. Leia Mais

A Tirania do Petróleo: A mais Poderosa Indústria do Mundo e o que Pode ser feito para Detê-la | Antonia Juhasz

A publicação de livros sobre a politização do petróleo tem sido alta nos Estados Unidos desde o instante em que o ex-presidente George W. Bush resolveu seguir orientações de seus policy makers para que o país entrasse militarmente no Iraque. Embora nos assuntos científicos, o que deve servir também para a política, não seja conveniente se apegar a reducionismos e justificativas suficientes para explicar acontecimentos, há em voga nas publicações mais recentes o motivo da segurança energética que incentivou a aventura militar da Casa Branca.

Aliar energia, à base de combustíveis fósseis, com política internacional, e seus conflitos, não é originalidade do passado recente. O mais referendado livro sobre o assunto, Petróleo: Poder e Glória, de Daniel Yergin, publicado no Brasil em 1992, faz um largo estudo sobre os esforços que as grandes potências fazem, sobretudo Estados Unidos e Reino Unido para conseguirem a tão importante regularidade de óleo, com a qual se mantém o poder. Leia Mais

A dança dos deuses: futebol, sociedade, cultura | Hilário Franco Júnior

Comecemos com um clichê imperdoável: existem 180 milhões de técnicos de futebol no Brasil. Todo mundo pensa que entende do assunto. É uma reconhecida tradição nacional que praticamente a totalidade desse imenso exército de amadores chame o profissional que comanda a Seleção Brasileira de burro. Muitos, mesmo sem entender totalmente a lógica da regra do impedimento, declaram aos berros que podem fazer melhor. Melhor que os técnicos e melhor que os jogadores. Tudo ou nada é o lema. Um segundo lugar na Copa, medalha de prata ou bronze nas Olimpíadas são consideradas campanhas fracassadas. Erros não são permitidos. Perder um pênalti é imperdoável. Sofrer um frango é motivo de vexame eterno. Fazer gol contra é uma heresia.

A cultura do futebol está entranhada na cultura nacional. Seu jargão, seus hábitos, seus mitos. Estranhamente, até mesmo sua história. Não é tão raro que indivíduos que não sabem dizer quem foi Tiradentes ou D. Pedro I sejam capazes de dar a escalação completa do Guarani de Campinas, campeão brasileiro de 1978. O brasileiro médio que, outro clichê, não faz a mínima questão de cultivar a memória nacional, cultiva cuidadosamente sua história futebolística. Diversos programas esportivos de televisão ajudam nessa preservação, passando diariamente cenas de arquivo. Algumas imagens, de tão repetidas, entraram para o imaginário coletivo. Os resultados práticos desse amplo esforço educacional são continuamente comprovados ao final de cada partida de futebol, profissional ou amadora. Os torcedores, por mais simplórios que sejam, destilam orgulhosamente sua erudição esportiva nas rodas de conversa após os jogos. Enfim, todo brasileiro, de modo macunaímico, além de técnico de futebol também é um historiador do futebol. Leia Mais

O Brasil tem jeito? | A. Ituassu

O título é sedutor. A proposta parece progressista. Entre os textos organizados estão autores como Luiz Gonzaga Belluzzo e Wanderley Guilherme dos Santos. Um transeunte ingênuo na livraria poderia até dizer que a presença de Miriam Leitão, Merval Pereira e Gustavo Franco forneceriam certa pluralidade à proposta dos autores. Se estiver com pressa, e não olhar a orelha do livro que “pretende servir de base para o cidadão nos pleitos que virão”, acaba até levando-o para casa. Confesso a minha desatenção.

Ao começar a folhear o livro em casa, dando-me conta do engodo, tentei me conformar com o argumento de que “afinal, trata-se de uma amostra do pensamento da intelligentsia brasileira”. Pesquisa de campo. No final, a sensação de estar diante de um “museu de grandes novidades” persistiu em uma obra que nada acrescenta ao atual debate sobre a conjuntura brasileira, e, no que visa a propor, comete erros e simplificações grosseiras. Leia Mais

100 años de artes marciales: repertorio bibliográfico de monografías publicadas en España (1906- 2006) | Mike Pérez Gutiérrez e Carlos Gutiérrez García

Dentro del ámbito de las Ciencias de la Actividad Física y del Deporte en España, la figura del repertorio bibliográfico ha estado ciertamente desatendida. Aunque la rápida evolución de muchas de estas Ciencias, así como las formas actuales de acceso a la información, pueden hacer considerar al repertorio bibliográfico como un tipo de recurso poco útil y rápidamente obsoleto, no es menos cierto que para determinadas disciplinas como la Historia de la Actividad Física y del Deporte constituye una fuente fundamental para la investigación.

Es, precisamente, bajo esta perspectiva donde adquiere valor la obra de Mikel Pérez y Carlos Gutiérrez, ya que en ella se recogen la práctica totalidad de registros bibliográficos correspondientes a las monografías de artes marciales publicadas en España desde 1906, año en el que se publicaba la primera obra de artes marciales escrita en español, hasta 2006. En total, los autores han recopilado 1.285 registros, lo que da una clara idea del gran volumen de información producido durante este siglo de permanencia de las artes marciales en España. Leia Mais

Russia since 1980 (the world since 1980) | Steen Rosefield e Stefan Hedlund

A Rússia hoje se apresenta como uma nação fortalecida no condomínio geopolítico mundial. Com aspirações hegemônicas regionais (o “Exterior Próximo”), estabelecimento de relações com Grandes Potências como os Estados Unidos da América (cujo relacionamento é baseado numa alternância de fases – aproximação/distanciamento ou cooperação/ conflito) e com potências emergentes como o Brasil, China e Índia, a nação eurasiana redesenha, a despeito de sua assertividade renovada, um novo caminho no cenário global, ainda que com impasses e dissonâncias em sua retórica interna/externa. Remontar ao passado da Federação e projetar seus passos futuros é testemunhar um percurso interessante de uma nação que se desperta, pós uma série de momentos intempestivos, a um cenário em transformação. Entender essa dinâmica dentro de um espaço brasileiro torna-se um desafio para alguns analistas, principalmente pela carência de bibliografia e autores engajados com a temática no país.

Conforme sugestão do próprio título – Russia since 1980 – os autores Stefan Hedlund e Steven Rosefield – estendem aos leitores o convite a uma viagem por quase 30 anos de história russa, perpassando por acontecimentos impares como as reformas de Leonild Brezhnev e posteriormente de Gorbachev, mudanças que repercutiram na eclosão da União Soviética (URSS) e a política de mercado de Yeltsin (primeiro presidente da Rússia pós Império). Adicionalmente, o livro traz ao leitor debates e discussões acerca de uma possível democratização ou a permanência de um autoritarismo latente na Rússia, adentrando a era Vladimir Putin. Tal era promove a reinserção e fortalecimento do Estado depois da crise do fim da Guerra Fria e a adesão a um modelo dito ocidental de economia e política, bem como a projeção de uma nova postura no contexto global. As complexidades e contradições de Putin são examinadas, assim como a eleição de seu aliado Dmitri Medvedev que surge às sombras do seu antecessor. Leia Mais

Russia – Lost in transition – The Yeltsin and Putin legacies | Lilia Shevtsova

Países distantes e que pouco ainda se conhecem em sua história e política, Brasil e Rússia vem buscando nos últimos anos intensificar sua parceria estratégica como nações emergentes e que buscam seu reposicionamento global no sistema internacional diante das pressões da unipolaridade e da multipolaridade em transição. Ao lado de China, Índia e África do Sul, a Rússia e o Brasil consistem-se no novo chamado “Segundo Mundo”, combinando tendências de potencialidade e vulnerabilidade. E, no caso da Rússia, está-se diante de uma nação que completa, em 2009, vinte anos do início de sua transformação mais recente, que engloba desde o fim da Guerra Fria em 1989 até a desagregação da União Soviética em 1991.

Afinal, após o desgaste e a queda da ideologia comunista, a Rússia se viu diante de grandes desafios, como o de ter que alterar radicalmente seus princípios de Estado e Sociedade, romper com um projeto e modo de vida adotados previamente, além de lidar com a desintegração do seu imenso território. Desde então, o país vivencia um período de transição política e econômica, bem como a busca incansável por um novo caminho de desenvolvimento, o que tem representado desafios internos e externos a sua agenda. Leia Mais

A Nova Configuração Mundial do Poder | Gilberto Dupas, Celso Lafer e Carlos Eduardo Lins da Silva

Qualquer analista que pretenda interpretar a política internacional contemporânea não deve ignorar dois eventos que marcaram a história recente e o debate intelectual entre o final do século XX e o início do XXI: o pós Guerra Fria e os atentados terroristas de 11 de Setembro de 2001. Compreender a dinâmica internacional alheio a estes fatos parece inimaginável, tamanha a relevância e o impacto tanto para a (re)configuração da ordem, quanto para os esforços de sistematização de seu significado e consequências para a atualidade.

Conscientes deste imperativo é que os organizadores de A Nova Configuração Mundial do Poder – Gilberto Dupas, Celso Lafer e Carlos Eduardo Lins da Silva -, reuniram em uma obra vinte artigos que problematizam o cenário internacional à luz desses acontecimentos de nossa história recente. Leia Mais

Desafios Brasileiros na Era dos Gigantes | Samuel Pinheiro Guimarães

O atual secretário-geral de relações exteriores do Brasil, embaixador Samuel Pinheiro Guimarães escreve uma obra fundamental para compreendermos os principais dilemas do desenvolvimento nacional frente ao cenário já consolidado da Globalização enquanto processo no qual o Brasil está irremediavelmente inserido. É interessante localizar este trabalho, para entendermos melhor as suas motivações e apurarmos a nossa leitura.

Nos seus mais de 30 anos de carreira, Guimarães assistiu às diversas transformações na política externa brasileira, incluindo-se atuação na SUDENE e na Embrafilme durante o regime civil-militar. Foi um dos principais advogados da não-entrada do Brasil na Área de Livre Comércio das Américas ao longo dos últimos 10 anos. Contudo, a notoriedade do trabalho do autor só ganhou espaço devido com a guinada nas relações exteriores do Brasil que ocorre inicialmente em 2003 e, mais notadamente, no segundo mandato do governo Lula. Leia Mais

Brasil e China na Globalização | Marcos Cordeiro

O texto coloca a diferença de inserção do Brasil e da China no contexto neoliberal principalmente no período de 1980 a 2006, onde o primeiro cresceu cerca de 2,5% (Produto interno) e o segunda 10% (Produto interno). No Brasil, além da crise da dívida externa e crise fiscal foram adotadas as políticas neoliberais, que consistiam na liberalização do mercado, privatização de empresas, resultando em estagnação, nesse contexto o Brasil seguia o “Consenso de Washington”. Na China foi implementado um acelerado e moderno crescimento, mecanismos de mercado, tais como o investimento externo, também uma estratégia de liberalização, esses sob o controle do Estado, o modelo chamado de “Consenso de Pequim”, o mesmo também foi analisado por Joshua C Ramo, ex diretor da revista Times, que antes encontrou estruturas políticos sociais importantes por de trás de uma estratégia de desenvolvimento econômico. Leia Mais

La huelga del Río Blanco (1907-2007) | Bernardo García Díaz

Así como para nosotros el año pasado estuvo cruzado por las actividades orientadas a recordar y conmemorar los cien años de las masacre de la Escuela Santa María de Iquique, las que entre múltiples congresos, seminarios, foros y debates contaron además con la aparición de variadas publicaciones y otras por venir, –parafraseando a John Womack, prologuista del texto presentado– el nuestro “…no fue el único país donde hace un siglo tuvieron lugar conflictos que resultaron violentos, sangrientos, entre capitalistas protegidos por su gobierno y obreros defendiéndose como podían”, ya que en México asistieron a un centenario de características similares, y tal cual como nosotros clausurábamos el año con la masacre de diciembre, ellos hicieron lo propio al iniciar el 2007 conmemorando uno de los hitos considerados fundantes del movimiento obrero mexicano: la masacre que marcó el fin de la huelga textil de Río Blanco del 7 de enero de 1907. Leia Mais

The Visible Hand of China in Latin America | Javier Santiso

Quando der errado, culpe a China! É uma fórmula de sucesso infalível. Aquecimento global? Culpa da China. Desemprego nos Estados Unidos e na Europa? Culpa da China. Inflação mundial? Culpa da China. Aumento nos preços do petróleo? Culpa da China. Aumento no preço dos alimentos? Culpa da China. Fracasso da Rodada de Doha? Culpa da China. Ditaduras na África? Culpa da China. Desindustrialização no Brasil? Culpa da China. Não há, enfim, problema no mundo para o qual não surja algum “especialista” com a resposta na ponta da língua: é culpa da China!

Até o que não é problema, se ocorre na China, é. Os chineses inventaram muitas coisas, da pólvora ao macarrão, mas não consta que tenham inventado a dublagem. Mas se utilizam esse recurso – que se usa no mundo desde a primeira película do cinema falado – para realizar a mais bela abertura dos Jogos Olímpicos de que se tem notícia nos tempos modernos, é um problema. E se a empresa de material esportivo do ex-atleta chinês que acendeu a tocha olímpica correndo na perpendicular pela borda do estádio aumenta seu valor na Bolsa de Xangai em US$ 30 milhões, é um problema. Se fosse a Nike ou a Adidas, aí tudo bem. Leia Mais

História do tempo presente | Gilson Pôrto Júnior

A obra História do tempo presente, organizada por Pôrto Jr.1 contempla dezessete capítulos cujo tema central perpassa as considerações da História do Tempo Presente (HTP) na educação brasileira e na escrita da História por historiadores. Os demais autores são também professores nacionais e internacionais. Esta obra a ser resenhada apresenta como tema central o ensino da História no e do Tempo Presente. Ela é introduzida pela apresentação da HTP, seguida de contribuições teóricas, passando para a terceira parte na qual se expõe considerações sobre o professor pesquisado, levando a seguinte referente à pesquisa e ensino de História do Tempo Presente e fechando o trabalho com uma parte dedicada a História e Historiografia e seus debates em torno do presente.

O professor de História precisa despertar no aluno o interesse de desenvolver pesquisas que envolvem a HTP. Esta recente abordagem no campo da História, iniciada nos anos 70, portanto situada na História Contemporânea, despertou o interesse da Escola do Annales para as lições de uma história do presente. A partir daí os estudos, seja social ou político tomaram a história de um passado recente como base para suas interpretações. Leia Mais

Emerging Johannesburg: perspectives on the pos-Apartheid city | Richard Tomlinson et al.

Resenhista

Jó Klanovicz


Referências desta Resenha

TOMLINSON, Richard et al (Org.). Emerging Johannesburg: perspectives on the pos-Apartheid city. London: Routledge, 2006. Resenha de: KLANOVICZ, Jó. História Debates e Tendências. Passo Fundo, v. 7, n. 2, p. 265-271, jul./dez. 2007. Acesso apenas pelo link original [DR]

Carlo Ginzburg | ArtCultura | 2007

Os trinta anos recém-completados da publicação original de O queijo e os vermes: o cotidiano e as idéias de um moleiro perseguido pela Inquisição, bem como os vinte anos de sua tradução brasileira, parecem uma data oportuna para refletir sobre a trajetória intelectual do seu autor nas últimas décadas. Aquele livro, como se sabe, foi responsável por projetar Carlo Ginzburg como um dos mais inovadores historiadores de sua geração e — traduzido em vinte e dois idiomas além do italiano — tornou-se uma espécie de marco da renovação dos estudos de história da cultura popular, tanto quanto de um modo de fazer história que aliava a análise atenta das minúcias, o interesse pelo protagonismo individual (ou o ponto de contato entre as estruturas de larga duração e o cotidiano mais banal de um personagem sem importância, cuja vida dificilmente poderia ser considerada como estatisticamente representativa) e tudo aquilo que muito freqüentemente se tem considerado como características centrais de uma perspectiva micro-histórica. Somava-se a isso, ainda, a atenção sobre a exposição e a narração, o flerte entre a história e a literatura.

Todos esses aspectos, imediatamente reconhecidos pela crítica histórica, converteram o livro num clássico, e não apenas na Itália. O exemplo próximo e mais eloqüente é aquele dado pelo público brasileiro, que garantiu não somente as reedições sucessivas da história de Menocchio (incluindo aí mais recentemente uma edição de bolso com grande tiragem), como também a tradução quase imediata da maior parte da produção intelectual desse autor nos últimos vinte anos.1 Leia Mais

Transformação e Crise na Economia Mundial | Celso Furtado

Em fins de 2006, a Editora Paz e Terra lançou, em forma de livro, dez artigos de Celso Furtado, escritos ao longo dos anos sessenta, setenta e oitenta do século passado, sobre economia mundial. Especificamente, os artigos concentram-se nas modificações do cenário externo após o fim da segunda grande guerra mundial. Sobre o fio condutor destes textos, que contém, de modo geral, as mesmas idéias-força desenvolvidas de modo distinto ao longo dos anos em que escrevia, Furtado escreve:

“A idéia central, desenvolvida ao fio de dois decênios, é simples: as modificações políticas causados pelo segundo conflito mundial conduziram à integração dos mercados das economias capitalistas industrializadas, reduzindo a capacidade reguladora dos estados-nacionais, e aumentando a autonomia de ação das grandes empresas. (p.9-10)” Leia Mais

Otro siglo perdido. Las politicas de desarollo em América Latina (1930 – 2005) | V. L. Urquidi

A crescente especialização acadêmica trouxe aspectos positivos e negativos para o campo da História Econômica. Entre os primeiros, destaca-se a melhor compreensão de processos históricos específicos, mediante análises estruturadas sobre dados empíricos sólidos. Entre os segundos, cita-se o perigo da perda da visão do todo. Muitos desses estudos, excessivamente verticalizados, não demonstram capacidade de articulação entre a parte por eles analisada e complexo tecido da história. O resultado é a terrível sensação de um quebra-cabeça, no qual apenas um dos seus inúmeros pedaços se encontra em nossas mãos. Como o resto se esvaiu, torna-se impossível saber qual seria a imagem formada pelo jogo completo. Leia Mais

Neohegemonia Americana ou Multipolaridade? Pólos de Poder e Sistema Internacional | Paulo Vizentini e Marianne Wiesebron

Desde o fim da Guerra Fria, os debates sobre o reordenamento do sistema internacional tem sido uma constante, trazendo diversos desafios para os Estados que se relacionam neste novo sistema e buscam estabelecer uma agenda positiva que responda a esta realidade e a seus dilemas internos. Assim, estamos diante de uma fase de reordenamento do poder mundial, na qual mais do que respostas, apresentam-se perguntas sobre os novos equilíbrios que se construirão no médio e longo prazo. Aprofundando estas reflexões e oferecendo um panorama sobre o tema, surge como essencial a publicação do livro Neohegemonia Americana ou Multipolaridade? Pólos de Poder e Sistema Internacional, organizado por Paulo Vizentini e Marianne Wiesebron.

Editado pela Ed. UFRGS, consolidando sua tradição na área, o livro é composto por uma coletânea de artigos e pertence à Série Estudos Internacionais- NERINT/ILEA. Tais artigos originaram-se de Seminário realizado pelo Instituto Clingendale de Relações Internacionais de Haia, e representam um esforço conjunto de debate sobre os pólos de poder do sistema, tentando responder à pergunta título: neohegemonia ou multipolaridade? Leia Mais

The Global Cold War | Odd Arne Westad

Ao nos aproximarmos do vigésimo aniversário da queda do Muro de Berlin, a prolixidade acadêmica acerca da Guerra Fria continua firme e forte. Assim como The Cold War: A New History, de John Gaddis (resenhado na edição 1/2006 desta revista), o livro de Arne Westad traz novas interpretações, baseadas em arquivos recém-abertos dos Estados Unidos, da União Soviética e de diversos países do Terceiro Mundo, que desafiam antigas visões da Guerra Fria.

Um dos principais problemas para estudiosos da Guerra Fria é a sua definição: ela pode ser vista como um período, um conflito ideológico, uma disputa político-militar ou de uma série de outras formas. Westad propõe estudá-la como um conflito verdadeiramente global entre duas superpotências, cada uma portadora de um projeto ideológico universalista da modernidade. O grande palco da disputa entre esses dois arautos da modernidade – que o autor caracteriza, não sem ironia, como o “império da liberdade” (EUA) e o “império da justiça” (URSS) – teria sido o Terceiro Mundo, que ao emergir do processo de descolonização, buscava alcançar a independência política e o desenvolvimento econômico. O livro é concebido, portanto, como uma história do intervencionismo das superpotências no Terceiro Mundo ao longo da Guerra Fria. Leia Mais

Sistema internacional com hegemonia das democracias de mercado: desafios de Brasil e Argentina | Eduardo Viola e Héctor Ricardo Leis

Um duro retrato da realidade internacional: esta talvez seja a frase que melhor sintetiza o livro de Eduardo Viola, professor titular de Relações Internacionais da Universidade de Brasília, e Héctor Ricardo Leis, professor da Universidade Federal de Santa Catarina. Após quase vinte anos do colapso da União Soviética as transformações operadas no sistema internacional agora podem ser melhor percebidas: coube aos autores descrevê-las de forma coerente e contundente.

A linha central de pensamento dos autores é que o sistema de estados que delineia a ordem internacional vigente é baseado na hegemonia das democracias de mercado. Nesse sentido, o protagonismo norte-americano só é válido em composição com outras grandes potências: juntas, como democracias de mercado consolidadas, fazem da democracia seu modelo político, do capitalismo de mercado sua moldura econômica definidora e da globalização seu veículo de manutenção ou transformação da ordem vigente. Ainda que exaltando o verdadeiro liberalismo, a análise de ambos aponta para uma valorização do progresso social e econômico como metas universais, em detrimento de orientações puramente ideológicas. Leia Mais

O golpe e a ditadura militar: quarenta anos depois (1964-2004) | Daniel Aarão Reis, Marcelo Ridenti e Rodrigo Sá Motta

Em 2004 muitos foram os pesquisadores que se reuniram em seminários, palestras e eventos tendo como objetivo discutir a questão da ditadura militar no Brasil. Foi um momento de refletir um acontecimento – o golpe militar – que marcou profundamente a história do povo brasileiro. Já tinham se passado quarenta anos, mas as lembranças daquele momento permaneciam na memória daqueles que presenciaram os direitos democráticos se desfazerem com as ações políticas dos militares.

A produção historiográfica referente ao golpe civil-militar de 1964 e o governo que se instalou desde então vem aumentando constantemente. Essa preocupação pode ser compreendida devido ao acesso a determinados documentos que anteriormente eram impossíveis de serem analisados, embora o estudo sobre a ditadura ainda careça de fontes. A intensa revisão desse momento histórico pode ser dada pelo fato desse período ainda provocar muitas contradições, como por exemplo a construção de narrativas daqueles que defenderam o regime e dos que foram vítimas desse sistema ditatorial. O que ocorre também é uma tentativa de redefinição desse passado pelos diferentes sujeitos, de um lado aqueles que vivenciaram essa experiência ditatorial e de outro os que investigam e interpretam esse passado com base em documentos escritos e orais. Leia Mais

A violência e o futebol: dos estudos clássicos aos dias de hoje | Maurício Murad

O futebol tem ocupado, cada vez mais, um espaço como objeto de estudo dos vários pesquisadores, cuja formação se liga à História, à sociologia, à antropologia e demais áreas correlatas. Isso significa que o esforço de análise acerca desta temática vem deixando de ser algo restrito a uma prática diletante, para também ser analisada no âmbito das universidades. Neste aspecto, não tenho dúvidas quanto ao pioneirismo e ao brilhantismo do Professor Maurício Murad, quando nos reportamos à reflexão sobre a temática apontada, sobretudo no que diz respeito a um dos principais problemas que habita o universo do futebol: a violência. O livro é parte de amplas pesquisas que o autor já vem realizando há algum tempo, o que o coloca como indispensável para aqueles que estudam ou venham a estudar e/ou conhecer questões relacionadas ao futebol, também numa perspectiva da pesquisa acadêmica.

Desde já, creio ser necessário concordar com uma das principais teses do autor em questão, quando ele nos sugere em seu livro, que não se deve comparar a violência no futebol com a violência do futebol. A partir desta premissa, provavelmente o autor queira nos alertar quanto às ocasionais conclusões que poderiam naturalizar o futebol como algo estruturalmente violento, tal como muitas vezes alguns jornais impressos, programas de rádios e/ou de televisão, enfim, os diferentes veículos de comunicação poderiam nos levar a crer, quando noticiam os jogos de futebol. Não se trata de rejeitar a existência de absurdos ligados à violência absolutamente condenáveis que, de fato, estão presentes no esporte. Leia Mais

China: Infra-estruturas e crescimento econômico | E. Jabbour

Trata-se da dissertação de mestrado do autor, publicada com pequenas alterações de texto e formato. O assunto, a economia chinesa, tem-se mostrado cada vez mais relevante na pauta de assuntos ligados à Economia e à História contemporâneas. O mercado editorial doméstico tem, em concordância com essa demanda, inundado as prateleiras das livrarias especializadas com títulos abordando o desempenho e as razões deste para a China, que adentra o século XXI como um país verdadeiramente emergente no cenário internacional, uma economia interna que mantém as maiores taxas de crescimento mundiais, e um parceiro comercial temido e desejado.

Como em todo boom editorial, a qualidade das obras é bastante heterogênea, com títulos realmente informativos e, por outro lado, livros que, ao refletirem pouco além do senso comum ou de pontos específicos de marketing internacional estadunidense (como no caso das traduções), praticamente deixam o leitor no mesmo lugar de onde o retiraram no início. Seria o caso deste livro? Leia Mais

O Renascimento do Império | Claudia Trevisan

Saiu pela editora Planeta do Brasil o relato da jornalista Cláudia Trevisan sobre sua viagem e permanência na China. Trata-se de obra de cunho jornalístico e, assim, pouco rigorosa, do ponto de vista da análise social e econômica. Mas num contexto onde uma visita à China é difícil, e as informações escassas, mesmo a aparente pouca objetividade do relato biográfico é uma fonte valiosa para a pesquisa social.

O objetivo da autora é revelar informações e impressões que teve no período em que viveu na China. Logo, são as informações que o livro traz as que mais importam para a discussão sócio-econômica da China atual, e não a estrutura da obra propriamente dita, ou suas idéias e teses, explícitas ou subjacentes. Uma seqüência de capítulos da primeira das oito partes do livro é: “Cerimônias em alta, casamentos em baixa; Os esquecidos; A língua; Xangai; Beleza Artificial”. Isto é, faz-se uma miscelânea, lançando-se mão de curiosa diagramação: os capítulos mais formais, com informações sociais e econômicas, esto em formatação comum; os capítulos com relatos sobre costumes, cultura etc., estão em itálico. Leia Mais

Uma associação para a tecnologia brasileira: Abipti 25 anos | Shozo Motoyama, Paulo Queiroz Marques e Maria Anglélica Rodrigues Quemel

Shozo Motoyama, Paulo Queiroz Marques e Maria Angélica Rodrigues Quemel prestam um importante serviço à documentação e historiografia sobre o desenvolvimento da tecnologia no Brasil da segunda metade do século XX ao reunir documentos, depoimentos e informações diversas sobre a formação da Abipti.

A Associação Brasileira de Instituições de Pesquisa Tecnológica (Abipti), criada no início dos anos 1980 com o intuito de representar as instituições de pesquisas em tecnologia, demonstrou ao longo de 25 anos, mesmo em situações de turbulências econômicas, autonomia frente às autoridades governamentais, negociando e mostrando aos mesmos, as reais necessidades de fomento de pesquisa e inovação na área tecnológica. Leia Mais

Integração Regional: os Blocos Econômicos nas Relações Internacionais | Alfredo da Mota Menezes e Pio Penna Filho

Em setembro de 2006, ao comentar a reunião do Grupo Mercado Comum (GMC) que se realizara naquele mês em Brasília, o jornalista Sérgio Léo, do Valor Econômico, comentava: “A burocracia tem suas vantagens, e uma delas é a falta de dúvidas existenciais: enquanto se debate publicamente o risco de dissolução do Mercosul, as instâncias burocráticas do bloco continuam funcionando com certa normalidade.” Provavelmente não assistimos à “dissolução” do bloco, mas, sem dúvida, estamos longe de um período em que o otimismo quase generalizado com relação ao Mercosul justificava-se sem maiores explicações e as notícias dos jornais o reproduziam abundantemente. O que se passou desde então?

Aos interessados em conhecer não só o processo de construção do Mercosul, mas também a história e os principais desafios atuais encontrados em vários processos de integração econômica pelo mundo, uma boa pedida é a leitura do livro de Alfredo da Mota Menezes e Pio Penna Filho. Em linguagem bastante acessível, o livro dirige-se ao leitor não-especialista, que poderá compreender esse fenômeno internacional. Quais as diferenças entre uma união aduaneira e uma zona de livre comércio? A integração deve melhorar o bem-estar social das sociedades integradas, mas como integrar economias tão díspares como as da Alemanha e de Portugal ou como as do Brasil e do Paraguai? Embora, em geral, a integração seja vista pelo cidadão comum como uma forma a ser buscada para que os países atinjam um bom padrão de inserção internacional, obstáculos das mais diversas naturezas devem ser enfrentados, e os de natureza política não são os menores deles. Leia Mais

Desafios brasileiros na era dos gigantes | Samuel Pinheiro Guimarães

Nos últimos anos, intensificaram-se os debates nos meios de comunicação e na academia sobre a política externa brasileira, em decorrência do êxito eleitoral da oposição no âmbito federal em 2002, após três pleitos disputados (89, 94 e 98). Deste modo, o cotejo entre o desempenho das gestões de Fernando Henrique Cardoso e de Luis Inácio Lula da Silva foi constante, ainda mais durante as vésperas da última eleição presidencial (2006), de cujo resultado se extrairia a confirmação do atual titular.

Em face da proximidade das políticas econômicas executadas no último decênio, a política externa tornar-se-ia para muitos o cenáculo em que situação e oposição – manifesta não apenas nos meios partidários se avaliariam, por ela eventualmente possibilitar a diferença das linhas traçadas, posterior execução e, por fim, auferimento dos êxitos. Leia Mais

Do Terror à Esperança: auge e declínio do neoliberalismo | Theotônio dos Santos

Se tivesse que recomendar a meus alunos de história três livros sobre globalização e neoliberalismo que eles devessem levar para uma ilha deserta, facilmente poderia incluir este último livro de Theotônio dos Santos, juntamente com Globalização em Questão, de Paul Hirst e Grahame Thompson (Ed. Vozes, 1998) e Globalization and its Descontents, de Joseph Stiglitz (W.W. Norton & Company, 2002). Hirst & Thompson desmistificam muitas das crenças infundadas sobre a globalização, provando que não é um fenômeno tão novo assim (os movimentos líquidos de capital em relação ao tamanho das economias eram maiores nas décadas do padrão-ouro, anteriores à Primeira Guerra Mundial, do que nas últimas décadas do século XX), nem tão “global” assim (a maioria das companhias ditas “transnacionais” tem claro centro decisório nacional; a maior parte de sua produção é realizada e vendida no país-matriz, o mercado de mão-de-obra absolutamente não é global, etc.).

Já a imperdível obra de Stiglitz me faz lembrar aqueles livros de ex-agentes da CIA que desnudam a Agência por dentro. Stiglitz, prêmio Nobel de economia em 2001, ex-Economista-Chefe do Banco Mundial, critica, com o conhecimento embasado de um insider, o funcionamento de organismos como o FMI, que, em seu afã “globalizante” de disseminar doutrinas de cunho neoliberal nos anos 1990, acabavam por condenar países em desenvolvimento a políticas recessivas. Quanto a este último livro, fica apenas o lamento de que, como as memórias de ex-agentes da CIA, as críticas geralmente vêm post factum, ou seja, após os atualmente criticados golpes de estado, promovidos pela CIA no Terceiro Mundo, ou políticas econômicas equivocadas para os países devedores terem sido implementadas… Leia Mais

Brasil e EUA no novo milênio | Marcos Guedes de Oliveira

O estudo das relações Brasil-Estados Unidos e do reconhecimento do outro dentro do cenário internacional vem gradativamente fornecendo concretos trabalhos e trazendo interesse para os pesquisadores de diversas áreas, principalmente em Relações Internacionais, dada sua multi e interdisciplinaridade. Nesse sentido, a obra organizada por Marcos Guedes de Oliveira busca contribuir para a redução de eventuais desconhecimentos acerca do outro, procurando demonstrar que muito do que se pensa a respeito dos EUA confunde-se com resquícios preconceituosos presentes no imaginário popular.

A primeira parte da obra, composta por textos de Eduardo Viola e Carlos Pio (Doutrinarismo e Realismo na Percepção do Interesse Nacional), Shiguenoli Miyamoto e Paulo César Manduca (Segurança Hemisférica, Uma Agenda Inconclusa) e Antônio Jorge Ramalho (Entre Redes e Hierarquias, Entre Regras Internas e Regras Internacionais: A Projeção dos Interesses dos EUA na Alca), busca trazer à tona questões de extrema complexidade no cenário político-internacional atual, quais sejam, a percepção do outro em um cenário de mudanças, as questões relativas à segurança do hemisfério e a dificuldade de se implementar uma política de segurança comum para o continente, além das disputas políticas e econômicas na formulação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Leia Mais

Chico Buarque & Vianinha: Arte e Política no Brasil Contemporâneo | Fênix – Revista de História e Estudos Culturais | 2004

O Núcleo de Estudos em História Social da Arte e da Cultura (NEHAC), da Universidade Federal de Uberlândia, completou, em 2004, dez anos de existência. Ao longo desse período, o NEHAC fomentou pesquisas voltadas para o estudo das relações existentes entre História e Linguagens Artísticas, especialmente no que se refere às interlocuções com Teatro, Cinema, Literatura e Música. Nesse sentido, desenvolveu trabalhos ao nível de monografias de conclusão de curso, iniciação científica, mestrado que, integrados aos projetos dos professores Rosangela Patriota e Alcides Freire Ramos, têm contribuído tanto para a formação de profissionais da área de História, quanto com oportunas reflexões sobre o Brasil Contemporâneo sob o olhar da História Cultural.

As expectativas do NEHAC, porém, não se restringiram somente à produção de conhecimento. Pelo contrário, esse grupo de pesquisa participa ativamente de congressos científicos e desenvolve uma produção bibliográfica com o objetivo de tornar públicas essas investigações. Como resultado dessa empreitada, além de publicações especializadas, o Núcleo de Estudos em História Social da Arte e da Cultura assina uma coluna semanal – NEHAC – no Caderno Revista, do jornal Correio, de Uberlândia, além de contribuir, quinzenalmente, no mesmo periódico, com a coluna de cinema intitulada Script Tease. Ambas podem ser acessadas pelo site http://www.jornalcorreio.com.br. Leia Mais

Del ABC al Mercosur: la integración latinoamericana em la doctrina y práxis del peronismo | Andrés Cisneiros e Carlos Piñeiro Iñiguez || La dictadura argentina (1976- 1983): del golpe de estado a la restauración democrática | Marcos Novaro e Vicente Palermo || Tiempos de crisis/ vientos de cambio: Argentina y el poder global | Mario Papoport || Crítica de las ideas políticas argentinas | Juan José Sebrelli

O triênio 2000-2003 foi de intensidade singular para a vida social, econômica e política da República Argentina, cenário que tem sido alvo de estudos por parte de internacionalistas e pesquisadores de áreas conexas. No caso dos historiadores, a prudência os leva a aguardar mais alguns anos para se aventurarem a explicar os acontecimentos passados no período. De qualquer forma, a explicação dos fenômenos da atualidade não é feita apenas no presente mas principalmente pelo retorno ao passado, pela apreciação de recorrências factuais e pela utilização de regularidades e analogias.

Nessa linha, a obra de Raul Bernal-Meza, Sistema Mundial y Mercosul(Buenos Aires: Grupo Editor Latinoamericano2000), seria um marco dos estudos argentinos sobre a nova configuração da política internacional, tendo como pano de fundo a inserção da Argentina nesse mundo, característica marcante dos estudiosos portenhos de relações internacionais. Destarte, a dinâmica da produção argentina, tradicionalmente intensa, permaneceria fornecendo trabalhos consistentes sobre a atualidade, valendo-se da perspectiva histórica como instrumento-chave de análise. Leia Mais

Centro de Referência Luso-Brasileira 2000-2001 | Anais do Museu Histórico Nacional | 2001

Organizador

José Bittencourt

Referências desta apresentação

BITTENCOURT, José. Apresentação. Anais do Museu Histórico Nacional. Rio de Janeiro, v.33, p.155-159, 2001. Acesso apenas no link original [DR]

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A miragem da pós- modernidade: democracia e políticas sociais no contexto da globalização | Silvia Gerschman e Maria Lúcia Werneck Vianna

Este livro é uma coletânea de 12 ensaios apresentados originalmente num seminário realizado na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em julho de 1995. O livro inovou ao ressaltar os efeitos políticos e sociais da globalização econômica, rompendo com a tradição economicista predominante nesta área. Os artigos convergiram para três preocupações: o futuro da democracia, os rumos do setor público e a natureza das políticas sociais na época da globalização. Cada tema aglutinou quatro artigos em uma média de 15 páginas.

O primeiro bloco, intitulado ‘Globalização, democracia e questão social’, inclui os artigos teóricos de Schmitter, Reis, Gerschman e Viola. Phillippe Schmitter ressalta a consolidação do sistema político democrático como o fato mais conclusivo da globalização. O mundo aderiu à democracia e assumiu seus mecanismos de representação. Schmitter acredita que o futuro desta sociedade “será incrivelmente tumultuado, incerto e muito acidentado”. Surpreendentemente, o grande desafio à globalização viria das “democracias liberais consolidadas” (DLCs). Países recém-democratizados, ou “neodemocracias recentes” (NDRs), são seguidores de modelos e, naturalmente, não dispõem de condições objetivas para mudar os rumos. Muitas das NDRs são ordenações políticas oligárquicas que se aproveitam do sistema democrático para manter seu domínio. O retrato dado pelo autor é de pioneiros democratas, de um lado, e de seguidores autoritários, de outro, forçados a assumir o sistema de representação por acidente do destino. A verdadeira mudança social sempre acontecerá nos países pioneiros, enquanto os países em desenvolvimento estarão confinados às “democraduras”. Leia Mais

Argentina y Brasil: enfrentando el Siglo XXI | Felipe A. M. de la Balze || Processos de integração regional e sociedade: o sindicalismo na Argentina/ Brasil/ México e Venezuela Hélio Zylberstain, Iram J. Rodrigues e Maria S. P. de Castro || MERCOSUL: direito da integração | Ana C. P. Pereira || Sistema de Solução de Controvérsia no MERCOSUL: perspectivas para a construção de um modelo institucional permanente | Luizella G. B. branco || A ordem jurídica do MERCOSUL | Deisy F. L. Ventura || MERCOSUL: acordos e protocolos na área jurídica | 

A produção acadêmica e a literatura especializada sobre os processos de integração regional na América Latina e, em especial, sobre o Mercosul e o processo Brasil-Argentina, parecem finalmente estar encontrando, no Brasil, uma “velocidade de cruzeiro”. As obras que são discutidas a seguir tratam todas dos desafios jurídicos, político-institucionais e econômicos da construção da integração regional, demonstrando que, se a sua marcha econômico-comercial adota o estilo andante-veloce, o ritmo jurídico-institucional conhece, por motivos diversos, um certo compasso de espera. Se os teóricos e “juristas” da integração impacientam-se com a “resistência anticomunitária” dos burocratas governamentais, os empresários, agricultores e sindicatos operários manifestam visível preocupação com uma certa “pressa livre-cambista” que vigoraria sobretudo no vizinho do Prata.

É precisamente da Argentina que nos vem o primeiro dos livros compulsados neste artigo-resenha, aliás o único da meia dúzia de obras aqui discutidas, confirmando plenamente a fama de boa qualidade analítica dos estudos publicados na outra margem do Prata. Ele foi organizado por Felipe de la Balze para o CARI, o Conselho Argentino de Relações Internacionais. Leia Mais